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terça-feira, abril 17, 2018

A questão Síria
-- a palavra a um Leitor que sabe do que fala --


A questão Síria e, nesse sentido, dos recentes ataques levados a cabo pelos EUA (como o apoio dos seus caniches europeus, como o R.U. e a França) explica-se de uma forma muito simples. Tem a ver com o projecto do gasoduto do Qatar, que quer os EUA, quer a UE, desejam, desde há algum tempo a esta parte, e que se estenderia dali até à Europa, passando entre outros países pela Turquia e…precisamente, também e sobretudo pela Síria. Os EUA, com o apoio subserviente dos seus aliados europeus actuaram mal, logo no início, ao tentarem pressionar o regime de Bashar al-Assad a aceitar a passagem desse gasoduto. Como Assad se negava a deixar passar esse pipeline pelo seu país, Washington passou a destabilizar o seu regime, desacreditando-o politica, diplomática e economicamente.

Uma das formas tentadas foi fazer crer que a Síria não só possuía armas químicas, como as utilizava contra o seu povo.

Já em 2007, 2008 e 2009 a Organização para a Proibição das Armas Químicas – OPAQ - discutia a questão Síria quanto às armas químicas. Nessa altura, conseguiu-se um compromisso do governo sírio, já com Assad no poder, para que desmantelasse os seus depósitos de armas químicas. Os sírios receavam sobretudo Israel, que possuía armas químicas e nucleares, mas que não as declaravam à OPAQ, porque, por sua vez, receavam a Síria e o Irão (que tinha deixado de as possuir, embora Telavive mantivesse reservas quanto a essa versão – que veio a provar-se ser verdadeira). O Irão deixara de as possuir. Recorde-se que o Irão foi vítima de um ataque de armas químicas perpetuado pelo Iraque, durante a guerra em que se envolveram. E quem apoiava o Iraque de Saddam Hussein, na posse de armas químicas, contra o Irão? Os EUA! Washington, por exemplo, nunca pressionou Israel a desembaraçar-se daquelas armas - químicas e nucleares. E os próprios EUA e a Rússia, nessa altura, possuíam ainda um enorme arsenal de armas químicas que iam destruindo progressivamente, acção essa supervisionada – parcialmente – pelos inspectores da OPAQ.

Ora, a Síria já nessa altura estava num processo de se ver livre dessas armas químicas. Estamos a falar de 2008, ou seja, de há uns 10 anos atrás.

Todavia, com a destabilização da Síria um par de anos depois, o governo de Assad passou a ter um menor controlo dessas armas químicas que acabaram parte delas em mãos estranhas, como os terroristas islâmicos, a CIA, opositores do regime de Assad, etc.

Entretanto, a destabilização da Síria foi levada ao extremo pelos EUA, após o regime de Assad manter a sua postura de não autorizar a passagem do dito gasoduto. A ideia do gasoduto do Qatar tem a ver com a redução da dependência da Europa do Gás proveniente da Rússia. Mas, Assad compreendeu que o passo seguinte depois de autorizar essa passagem seria a sua destituição e colocação em Damasco de uma marionete dos EUA, que naturalmente, permitiria, a troco de uns tantos milhões de USD, que o negócio viesse a cair nas mãos das grandes multinacionais ligadas ao petróleo e à exploração do gás, naquela região.

Para além de vir a perder o apoio político que recebia de Moscovo. Na altura esse apoio era ainda e apenas político (e de algum modo económico, através de alguns acordos bilaterais).

Após Obama ter decidido começar a retirar as suas forças armadas da região, onde se incluía a Síria, depois de alguns ataques aéreos dirigidos às bases do ISIS, Assad, que nunca confiou nos EUA e sabia que um próximo Presidente poderia vir a ter uma opinião diferente da de Obama, aprofundou os laços com Moscovo, que incluíam uma estreita cooperação militar. Como sucede até hoje (desde há cerca de 3 anos).

A Síria é xiita (como o Irão), ao contrário da Arábia Saudita, sunita, e nesse sentido muito mais liberal nos seus costumes. As mulheres não são obrigadas a andar de véu (hijab), têm uma maior liberdade no que respeita ao seu vestuário, podem conduzir, dirigir empresas, etc. Em comparação com o Irão, igualmente xiita, as mulheres gozam de uma maior liberdade na sua forma de estar e actuar na sociedade síria do que no Irão, igualmente xiita. Já na Arábia Saudita o cenário é radicalmente diferente, como se sabe. Este último é um regime reaccionário, ultra-conservador, fundamentalista, intolerante do ponto de vista religioso e absolutamente anti-democrático. E, como se não bastasse, Riad é o maior financiador dos diversos grupos terroristas islâmicos. Todavia, os EUA e alguns países europeus, como o RU e a França, mantêm bons e rentáveis negócios com o regime inqualificável de Riad, sobretudo no que respeita à venda de armamento (a Arábia Saudita é o principal importador de armamento do R.U e os EUA o maior exportador para Riad, desde armas, a equipamento militar, aviões, etc) e do petróleo.

Os sauditas, por incrível que possa ser, são também aliados de Israel (com o apoio dos EUA) naquela região do Golfo, pois partilham os mesmos inimigos: a Síria e o Irão.

Assim e deste modo, havia que criar um conflito artificial na Síria, como sucede desde há uns 7 anos e picos. E pouco importa (aos EUA e europeus) que o resultado seja aquele que é conhecido, por outras palavras, que as principal vítimas desse conflito sejam os civis, entre crianças, mulheres, idosos, etc. Para além da economia (gado, terras, indústrias, enfim todo um tecido económico de um país e a consequente ruína financeira), Washington tem-se empenhado desde então, na destabilização da Síria com acusações diversas ao regime de Assad, que estando longe de ser recomendável, está a anos-luz do da Arábia Saudita, por exemplo.

Os alegados ataques de armas químicas de que se fala e levou à justificação dos ataques recentes dos EUA deveriam ter sido inspeccionados pela OPAQ, com inspectores independentes, nomeados por aquela Organização e depois de devidamente autorizados pelos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU. E ali, uma vez se concluísse existirem provas irrefutáveis de que a agressão fora levada a cabo, com a conivência de Assad, então sim actuar-se-ia em conformidade.

Mas, como sabemos, não foi isso que se passou. Os EUA, a França e o Reino Unido agiram sem um mandato das N.U e do seu Conselho de Segurança e nesse sentido actuaram à revelia do Direito Internacional. Como já tinha sucedido anteriormente.

As Nações Unidas hoje em dia estão desacreditadas. Pelo facto de 3 membros permanentes do Conselho de Segurança - EUA, França e R.U - agirem contornando-a e ignorando-a, e por Israel não respeitar nenhuma decisão das N.U, no que respeita às agressões que pratica na Palestina.

Em resumo, tudo isto não passa de um cenário bem montado, com fins propagandísticos. Fez-se uma manipulação dos factos e dos acontecimentos. A arte de bem enganar e ludibriar as pessoas e a verdade é hoje em dia uma das mais relevantes armas políticas das potências mundiais.

Por fim, este recente ataque à Síria teve também um segundo propósito: o de tentar intimidar Moscovo. Porém, tendo em conta a diminuta proporção daquele ataque, ao que se foi sabendo, é caso para nos perguntarmos, quem temia quem. Na verdade, a contenção do ataque acaba por revelar as muitas cautelas que quer Washington, quer os seus aliados europeus têm hoje para coma Rússia.

Como dizia e muito bem no seu Post, já somos suficientemente crescidos para nos deixarmos enganar e ludibriar.

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Este texto foi-me enviado por Leitor a quem muito agradeço

segunda-feira, abril 16, 2018

Porque é que não digo nada sobe o ataque dos 3 estarolas à Síria em resposta a um ataque com armas químicas e mais não sei o quê com a Rússia à mistura....?
Eu explico.


The Bathers -- Ahmad Nashaat Alzuaby,1964

Não gosto de falar sobre o que não sei. E a verdade, verdadinha, é que não percebo boi do que se passa na Síria. Só sei que o que lá se passa não é coisa boa, nada, nada boa. Melhor: uma desgraça de todo o tamanho e, pior, sem contornos. Se quisesse remeter-me para o léxico topológico nem saberia enquadrar o que lá se passa, na melhor hipótese diria que se trata de um qualquer espaço homeomórfico que se transmuta consoante quem o olha.

Do nada que sei, não consigo apontar um dedo convicto ao suposto facínora Bashar al-Assad como sendo o único mau da fita tal como não consigo fazê-lo em relação a qualquer um dos outros, terroristas, extremistas, aliados ou bandidos.

Mas uma coisa eu sei e tem a ver comigo: não embarco no que me dizem quando a coisa não é óbvia e quando não têm provas para mostrar (excepto se for gente credível a toda a prova -- o que, convenhamos, está longe de ser o caso). 
Uns quantos resolveram atacar um país e fizeram-no por sua alta recriação; acontece que, ainda por cima, se trata de gente de índole mais do que duvidosa, gente doida, gente parva, gente a quem não se conhecem grandes escrúpulos, -- e isso a mim não me inspira qualquer confiança. 
O espaço político (ou palco de guerra, como se diz) é mais do que conturbado e de lá nunca a informação nos chega escorreita; do palhaço do Trump já mais do que conhecemos do que a casa gasta; sobre o Reino Unido sabemos também bem como aquela tropa anda a deitar a mão a qualquer farsa para afastar o mau olhado do Brexit e a baixíssima popularidade da desajeitada May. Portanto, desculpem mas não vou na cantiga disto de ter sido uma boa coisa terem atacado o arsenal químico da Síria. E não vou por todos os motivos e mais um, sendo que esse um é que podem ter atacado muita coisa mas um arsenal químico não atacaram de certezinha absoluta. Não sou a única a dizê-lo e estou bem acompanhada nisso: não apenas o Pata Negra como várias testemunhas, cientistas e vozes informadas.
Horse market, Syria -- Alberto Pasini, 1893

Portanto, havendo na minha mente a dúvida não esclarecida sobre se este ataque tem alguma coisa a ver com alguma coisa do que é dita ou se é mais uma patranha como a das armas de destruição maciça que justificaram a invasão do Iraque -- e, nessa altura, também com meio mundo a acreditar nos aldrabões que se juntaram nas Lajes pela mão do faxineiro Durão Barroso -- deixo-me ficar calada. Que fale quem souber do que fala.

Outra coisa que eu também não percebo bem é que ideia é a do Macron para meter a França nisto, ao lado do anormal do Trump e do caso-perdido da May. Mas, enfim, nestes tabuleiros tudo se joga e, portanto, alguma é -- e, provavelmente, não é boa.
[Nem por coincidência acabei de receber, por mail, um vídeo desmontando imagens e notícias, tentando demonstrar a manipulação pegada que dali nos chega. Mas como também não sei se é verdade ou não, agradeço a quem mo enviou mas, por via das dúvidas, não o mostro].
No meio disto tudo o que lamento, mas lamento de coração, é a destruição de tantas vidas e de tantas cidades. Houvesse maneira segura de interromper este ciclo de loucura e restaurar uma vida digna e feliz naquele país e era isso que eu apoiaria. Agora isto...?

Syria — Ruins by the Sea
Frederic Edwin Church, 1873/1874

domingo, agosto 13, 2017

Who by fire


Mulher na Aldeia do Mato, Abrantes
by Rui M Pedrosa



Acordei com cheiro a fumo. Cheguei a casa dos meus pais e na rua um cheiro a fumo. Cheguei aqui, in heaven, e cheiro a fumo e uma névoa pardacenta no ar. De tarde, uma gigante onda de fumo crescia no céu, o cheiro sempre presente.

Muito calor, nenhuma humidade, um pasto perfeito para a besta. 

Vejo a televisão: fogo por todo o lado. O meu país em chamas. Mais de 4.000 bombeiros no terreno. Autoestradas fechadas.

Não é o calor e a falta de humidade que desencadeia os fogos, isso apenas ajuda a propagar. Isso e o vento. O rastilho tem mão humana: seja por incúria, distração, interesse económico, maldade ou loucura. Ouço as notícias: muito fogo posto. Muita gente detida, outros apenas interrogados. Um dos grandes incêndios, um que devorou serras e vales, e galgou estradas e rios e lambeu casas e cegou árvores aos milhares foi ateado por uma mulher de cinquenta anos. Chegou-se ao mato e com um isqueiro pegou-lhe fogo. Saíu de casa e deliberadamente provocou o incêndio que destruíu milhares de hectares de floresta e colocou em risco a vida de quem vivia naquelas aldeias e dos bombeiros que por lá andaram a consumir-se. Que razões terá a mulher? Que loucura ou desespero tomou conta dela?


Parece que o perfil típico dos incendiários se divide entre doentes com depressão ou alcoólicos. Por isso, não sei como se podem prevenir estas catástrofes quando os causadores são pessoas que não obedecem a comportamentos racionais.


Espanto-me com este fenómeno. Um país tão pequeno, gente aparentemente normal, pacífica, agora com o desemprego a diminuir, o poder de compra a melhorar, supostamente menos razões para se cair no desespero e, no entanto, isto que se vê. 

Parece não haver outro país na Europa onde tanto fogo seja ateado. Será que as televisões não deveriam mostrar tantas imagens de fogos e de gente aos gritos? Será que quem ateia fogos, por um motivo ou por outro, quer causar destruição e pânico idênticos aos que vê na televisão?
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Na Albânia também a braços com uma onda de calor
by Gent Shkullaku

Mas, enfim, de uma forma ou de outra, em maior ou menor escala, e fogo por incêndio ou por bombas ou rebeliões, parece que uma onda abrasiva está a invadir o mundo (e nem vou falar da anormalidade a que se assiste entre as aberrações que estão à frente dos Estados Unidos e da Coreia do Norte).

Bombardeamento aéreo em Damasco, Síria
by Ammar Suleiman

Nas ruas de Caracas, Venezuela
by Ronaldo Schemidt

Tomara que chova, que arrefeça, que tudo volte ao normal, que os ânimos serenem, que o bom senso e a saúde mental prevaleçam. Se isto dura muito mais tempo corremos sérios riscos de que o mundo se torne um lugar ainda mais perigoso.
E claro que isto que estou a dizer é uma banalidade mas, perante o que está a passar-se, não consigo formular ideias originais.
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Vi as fotografias que aqui usei no The Guardian e, para nos fazer companhia, lembrei-me da canção do Leonard Cohen embora a letra não tenha especialmente a ver.

And who by fire, who by water, 
Who in the sunshine, who in the night time, 
Who by high ordeal, who by common trial, 
Who in your merry merry month of may, 
Who by very slow decay, 
And who shall I say is calling? 
(...)
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E, a propósito ainda de fogo, lembrei-me de quando eu era pequena e, pelos santos populares, havia fogueiras nas ruas e da atracção pelo risco que aquilo me provocava, levando-me a saltar por cima, mesmo quando elas eram largas e estavam com fogo alto. Mas o dia foi algo cansativo (mas muito bom!) e eu estou aqui só a adormecer enquanto escrevo. Por isso, não sei se vou conseguir escrever sobre isso e chegar ao fim.

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Até já ou até amanhã

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domingo, janeiro 31, 2016

Um outro tipo de rapariga. Um outro tipo de mundo.




De vez em quando preciso de parar. Não sei explicar porquê. Se me ficar pela superfície, direi que o que conheço acaba por me entediar. Mas sei que não é bem isso. Sei que há uma parte de mim que parece querer viver do outro lado, lá onde me desconheço por entre paisagens e culturas desconhecidas. De vez em quando preciso de rasgar a parede do mundo em que vivo e espreitar o que há para além dele. Apercebo-me, então, de um mundo real, tão real como este meu, apercebo-me de como é finita e precária a realidade que conheço e de como é imenso o que me atrai do outro lado.

Diz Carlo Rovelli,
As imagens que construímos do universo vivem dentro de nós, no espaço dos nossos pensamentos. Entre essas imagens -- entre aquilo que conseguimos reconstruir e compreender com os nossos limitados meios -- e a realidade da qual fazemos parte, existem inúmeros filtros: a nossa ignorância, a limitação dos nossos sentidos e da nossa inteligência, as próprias condições que a nossa natureza de sujeitos, e sujeitos particulares, impõe à experiência. 
Para nós, justamente pela sua natureza efémera, a vida é preciosa. Pois, como diz Lucrécio, "a nossa fome de vida é voraz, a nossa sede de vida insaciável" (De RerumNatura, III, 1084).(...)
Porém, imersos nessa natureza que nos fez e que nos impele, não somos seres sem casa, suspensos entre dois mundos, parte apenas em parte da natureza, com a nostalgia de algo mais. Não: somos a casa.
A natureza é a nossa casa e na natureza somos a casa. Este mundo estranho, variegado e espantoso que exploramos, onde o espaço se esfarela, o tempo não existe e as coisas podem não estar em lado nenhum, não é algo que nos distancie de nós: é apenas aquilo que a nossa curiosidade natural nos mostra da nossa casa. Da trama de que nós próprios somos feitos. Somos feitos da mesma poeira das estrelas de que são feitas as coisas e, tanto quando estamos mergulhados na dor como quando rimos e a alegria resplandece, não fazemos senão ser aquilo que não podemos senão ser: uma parte do nosso mundo. (...)
Por natureza, amamos e somos honestos. E, por natureza, queremos saber mais. E continuamos a aprender. O nosso conhecimento do mundo continua a crescer. Existem fronteiras onde estamos a aprender e onde arde o nosso desejo de saber. Situam-se nas profundezas mais ínfimas do tecido do espaço, nas origens do cosmos, na natureza do tempo, na sorte dos buracos negros e no funcionamento do nosso próprio pensamento.
Aqui, na margem daquilo que sabemos, em contacto com o oceano do que não sabemos, brilham o mistério do mundo, a beleza do mundo, que nos deixam sem respiração.
......

E, abaixo, pode ver-se o mundo tal como Khaldiya Jibawi, a jovem síria de 17 anos, o vê nesta realidade em que agora vive, no Za'atari Refugee Camp na Jordânia. O pequeno filme (com menos de cinco minutos) que abaixo se vê ganhou o galardão juvenil 2015 UNAOC PLURAL+ Free Press Unlimited pela excelência de jornalismo e informação. Apesar do prémio concedido e de já ter sido divulgado no youtube há cerca de dois meses e meio, à data a que escrevo isto, ainda teve apenas 237 visualizações.


Mas, apesar da indiferença do grande mundo, o que vale é que, apesar de tudo, há sempre alguém em quem brilha a alegria de viver e em quem habita o maravilhoso dom de ver luz para além das sombras.


Another Kind of Girl


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As duas fotografias de pequenas bailarinas debaixo de água são da autoria de Alix Martinez

Lá de cima puderam ver  as·phyx·i·a, um vídeo experimental, da autoria de Maria Takeuchi & Frederico Phillips.

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, um belo dia de domingo.

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sexta-feira, novembro 20, 2015

Onde dormem as crianças sírias refugiadas


O foto-jornalista sueco, Magnus Wennman, fez um conjunto de fotografias para o jornal Aftonbladet sob o título “Where The Children Sleep”


As imagens são tocantes e se aqui partilho algumas convosco não é apenas pela sua comovente beleza: é, sobretudo, porque quero contribuir para desfazer os medos que tanta gente tem de quem foge da guerra. Centenas de milhares de pessoas fogem das atrocidades, das carnificinas, do terror diário. Atravessando mares frios e revoltos, em barcos sem condições ou andando quilómetros a pé, dia ou noite, dormindo onde calha -- famílias inteiras em fuga tentam, sobretudo, dar um futuro aos seus filhos.

É certo que a nossa decrépita Europa não terá condições extraordinárias para acolher tantos milhares de pessoas. Mas terá que as encontrar. Por razões humanitárias, por razões de consciência, por tudo, e até por razões egoístas (para ajudar a equilibrar a demografia nos países envelhecidos), terá que as encontrar.

Vendo as condições em que vivem estas crianças, difícil será não sentirmos compaixão por estes pequenos e indefesos seres. Podiam ser os nossos filhos, os nossos netos. E nós podíamos não ter tido a coragem que os pais deles tiveram ao arriscarem a vida para os trazer para o que julgam ser um mundo melhor.

Walaa, 5, wants to go home. She had her own room in Aleppo, she tells us. There, she never used to cry at bedtime. Here, in the refugee camp, she cries every night. Resting her head on the pillow is horrible, she says, because nighttime is horrible. That was when the attacks happened. By day, Walaa’s mother often builds a little house out of pillows, to teach her that they are nothing to be afraid of .



Berliner Messe VII Agnus Dei  - Arvo Pärt
Elora Festival Orchestra & Singers

Abdullah has a blood disease. For the last two days, he has been sleeping outside of the central station in Belgrade.
 He saw the killing of his sister in their home in Daraa. “He is still in shock and has nightmares every night,” says his mother. Abdullah is tired and is not healthy, but his mother does not have any money to buy medicine for him.

Eight-year-old Maram had just come home from school when the rocket hit her house. A piece of the roof landed right on top of her. Her mother took her to a field hospital, and from there she was airlifted across the border to Jordan. Head trauma caused a brain hemorrhage. For the first 11 days, Maram was in a coma. She is now conscious, but has a broken jaw and can’t speak.


Fara, 2, loves soccer. Her dad tries to make balls for her by crumpling up anything he can find, but they don’t last long. Every night, he says goodnight to Fara and her big sister Tisam, 9, in the hope that tomorrow will bring them a proper ball to play with. All other dreams seem to be beyond his reach, but he is not giving up on this one.
....

[Depois destas imagens até me custa convidar-vos a entrar num domínio de vulgaridade mas, caso queiram saber da atitude chocarreira, desbocada e desconchavada da deputada Teresa Caeiro do CDS, na AR, uma Miss Piggy extremada, desçam, por favor, até ao post já a seguir]. 

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segunda-feira, novembro 16, 2015

Imaginemos que o mundo não é um lugar perigoso. E tentemos que o não seja - apesar de o ser cada vez mais.


Enquanto escrevo, vejo na televisão que Ismael Omar Mostefai -- francês, de 29 anos, um dos terroristas que perpetrou, a eito e com a maior das calmas, uma carnificina, filho de pai argelino e mãe portuguesa, com quatro irmãos, empregado numa padaria -- era uma pessoa recatada, alegre, com mulher e filha, e que ninguém alguma vez desconfiou de algum indício de alguma coisa de estranho. 


Há uns 4 ou 5 anos, sem que se tenha, então, percebido porquê, supostamente terá optado por radicalizar a sua atitude perante a vida. Terá estado na Síria há um ou dois anos.

E é tudo isto que inquieta: a frieza que, nestes casos, se abate sobre algumas pessoas (que até então todos julgavam ser pessoas afáveis e amistosas) tornando-as despegadas da vida, com vontade de destruir e sem medo de ser, no acto, destruídas. Porque acontece isto? A infância ou a adolescência passadas num meio pobre, talvez a experiência de algum racismo, poderão explicar que o coração se feche desta maneira?

Ou não é isto? É outra coisa? Revolta, desejo de vingança? São pessoas facilmente manipuláveis? Estão a ser instrumentalizadas por outros mais fanáticos que eles?

Agora uma coisa é certa e é importante que nos fixemos nisto: Ismael não era um refugiado sírio -- era um francês enquadrado na sociedade. 

Muito difícil,pois, deve ser controlar estas situações, evitar as mortandades que um qualquer jovem possa entender levar a cabo. Mas, apesar do medo*, a única resposta possível é a união contra o terror, é a firmeza na defesa da democracia e da liberdade. E da inclusão.

Imaginemos que o mundo é um lugar onde é bom viver. E façamos por isso, façamo-lo com todas as nossas forças, sem reacções imediatistas, sem futilidades, sem emoções estéreis e efémeras.
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David Martello estava a ver o jogo França-Alemanha no pub Konstanz na Alemanha quando soube dos atentados. Resolveu, de imediato, fazer qualquer coisa com algum simbolismo. Conseguiu transporte para o seu piano, cerca de 650 km, e fez os últimos metros puxando-o com uma bicicleta até à rua Richard Lenoir, a dez metros do Bataclan, o teatro que na noite de sexta-feira foi palco de um dos mais sangrentos ataques terroristas em Paris. De seguida, sentou-se e começou a tocar Imagine de John Lennon. Quem por ali andava, acercou-se e ficou a ouvi-lo.



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Como forma de homenagear as vítimas dos atentados de Novembro, sexta feira 13, a orquestra do Metropolitan Opera de New York, dirigida por Placido Domingo, inesperadamente, tocou neste sábado "La Marseillaise".



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Por todo o lado, as capas de jornais e revistas mostram ou o pânico ou a vontade de lhe reagir.



Do mesmo modo, as ruas enchem-se de orações e solidariedade.






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E, por todo o mundo, os principais monumentos ou edifícios emblemáticos reflectiram as luzes francesas. Em Portugal também, claro.

Teatro Rivoli no Porto

Torre de Belém em Lisboa
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Sobre o medo que nos tolhe perante alertas de ameaças terroristas, já aqui o contei.

Por razões inadiáveis estive por duas vezes em Paris em alturas de ameaças de ataques terroristas.

Sei bem o medo que sentia quando tinha que estar em lugares que pensava poderem ser alvos preferenciais ou a inquietação que sentia quando via grupos de polícias, movimentações estranhas.

Estava também em Barcelona num dia em que houve um ataque bombista, com as ruas atravessadas por carros de polícia, com a população ansiosa, com informação difusa sobre por onde se podia circular. Imagino o que será viver debaixo do medo todos os dias e não apenas quando se está na condição de turista, mesmo que turista acidental.

Mas bem pior, muito, muito pior, será viver debaixo de constantes ataques de morteiros, de mísseis, com as casas destruídas, com as ruas desfeitas, com a família desfeita. Sem tecto, sem raízes, sem esperança num amanhã de paz.

Portanto, nunca confundamos as causas com os efeitos, os culpados com as vítimas. E saibamos ser firmes todos os dias: não apenas nos dias de grande comoção colectiva.

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Raid aérien français sur Raqqah en Syrie



Ce soir à 19H50 et 20H25 (heure française), une dizaine d’aéronefs français de la force Chammal ont frappé et détruit, lors d’un raid, un centre de commandement et un camp d’entraînement de Daech situés à Raqqah en Syrie.


[Chaîne officielle de l'état-major des armées]


Acabo, entretanto, de ouvir que França atacou, neste domingo, alvos do ISIS na Síria.
130 pessoas terão já morrido. Quid pro quo?
Hollande avisou: a França está em guerra.

Dez caças franceses lançaram esta noite 20 bombas sobre Raqqa, no Norte da Síria, que o Estado Islâmico tornou na sua capital, anunciou o Ministério da Defesa de Paris, no que está a ser visto como uma resposta aos atentados de sexta-feira na capital francesa, que o Presidente François Hollande tinha classificado como “um acto de guerra, cometido por um exército terrorista.”
E eu não sei se, com esta ofensiva, o mundo fica mais ou menos perigoso. Mas tomara que menos.

....

Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa semana, a começar já por esta segunda-feira.

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domingo, novembro 15, 2015

Os lobos entraram em Paris - a palavra ao Xilre, ao Pipoco mais Salgado, ao Jumento e ao João Ramos de Almeida no Ladrões de Bicicletas





Xilre


Os que são contra a chegada dos refugiados, encontrarão nos atentados motivos de validação das suas posições; as fronteiras no espaço europeu ir-se-ão fechar, definitivamente; os que fugiram de um dia a dia, nos seus países, idêntico aos horror que ontem se viveu em Paris, continuarão a morrer aos milhares na travessia do Mediterrâneo ou no trajeto por terra; se lá permanecerem, provavelmente morrerão também — porquê ficarem?; os bombardeamentos irão aumentar na Síria, no Líbano, no Iraque; os que sobreviverem a tudo, sobretudo os mais jovens, só conhecerão como horizonte a vingança, o ódio, o desespero, a violência — não terão qualquer perspetiva de educação, de futuro, de normalidade em países inteiramente arrasados. Sem modo de vida na sua terra, traumatizados por anos de guerra (alguém fará ideia do que será crescer em Aleppo?) que farão? Que adultos se tornarão? Onde, e quando, se irão fazer explodir?


in História do Futuro





e

Eu penso em você, minha filha. Aqui lágrimas fracas, dores mínimas, chuvas outonais apenas esboçando a majestade de um choro de viúva, águas mentirosas fecundando campos de melancolia,

tudo isso de repente iluminou minha memória quando cruzei a ponte sobre o Sena. A velha Paris já terminou. As cidades mudam mas meu coração está perdido, e é apenas em delírio que vejo

campos de batalha, museus abandonados, barricadas, avenida ocupada por bandeiras, muros com a palavra, palavras de ordem desgarradas; 

(...) e penso em Paris que enfim me rende, na bandeira branca desfraldada, navegantes esquecidos numa balsa, cativos, vencidos, afogados... e em outros mais ainda!


in Carta de Paris (citando Ana Cristina César, Poética)





Pipoco mais Salgado


Isto não aconteceu em França, aconteceu-nos a nós e à nossa maneira de viver. Isto é connosco, os que podemos escolher se nos apetece ou não crer num Deus e, escolhendo crer, podermos optar pelo Deus que mais nos convém, isto é connosco, que escolhemos gastar o nosso dinheiro em livros, em todos os livros, a conhecer outros mundos ou a dançar tango, olhando nos olhos as mulheres com quem dançamos. Isto é connosco, os que não temos medo do que ainda não conhecemos nem dos que não pensam como nós ou não fazem como nós, os que aceitamos as diferenças porque serão sempre as diferenças que nos inspiram a avançar, mais sábios e mais capazes, os que não têm medo de véus nem de barbas compridas nem de livros estranhos nem de quem nos vem tirar os trabalhos que nunca quisemos ter, os que não precisámos de Paris para saber de que fogem os refugiados.



O Jumento


(...) O Estado Islâmico foi o grupo terrorista que mais foi apreciado pelo Ocidente, ajudou Israel a livrar-se do seu grande inimigo e, muito provavelmente, a anexar definitivamente os Montes Golan, daí que sejam muitos os que apontem o dedo à Mossad. Ajudou a Turquia a matar curdos e xiitas. (...)Os inimigos do Irão, da Rússia ou da Síria, do Hezbollah  ou dos palestinianos  são amigos do Ocidente, de Israel, da Turquia e da Arábia Saudita. Desde que as coisas não passem para a comunicação social podem matar indiscriminadamente, podem matar livremente os alauitas e curdos na Síria, podem fazer desaparecer os Houttis do Iémen, podem eliminar xiitas na Síria, Iraque, Líbano, Israel.

Recordo-me de ver os mesmos chechenos que hoje são os mais extremistas entre os extremistas do Estado Islâmicos serem recebidos na Europa Ocidental como democratas e libertadores vítimas da tirania russa, os fascistas ucranianos que querem fazer desaparecer culturalmente quase metade da população ucraniana e que tiveram um passado de apoio ao nazismo serem agora aclamados como grandes democratas

Só que os terroristas são mesmo terroristas e não hesitam fazer como a aranha Viúva Negra, não resiste à tentação de se alimentar do seu próprio parceiro. Os franceses não foram apenas vítimas dos terroristas, foram-no também de governos feitos de gente suja, para quem tudo vale. Isto é a versão em política internacional do mesmo a que estamos a assistir na economia e em todos os domínios da sociedade. Estas são as consequências da transformação da velhacaria em ideologia do Ocidente. (...)






Ladrões de bicicletas
 - João Ramos de Almeida

(...) Em cada época, cada guerra é devidamente preparada para enlevar a população. Agora é Hollande, um político socialista, que acaba de afirmar que a guerra foi declarada a França. Espera-se mais uns milhões de contratos de armamento, uma expectável maior ousadia militar (sobre a triste figura feita pela França, leia-se o último número de Le Monde Diplomatique). Mais mortes a prazo.

E tudo isto acontece precisamente no mesmo momento em que terminavam as conversações em Viena, nomeadamente com a administração norte-americana e o governo russo, fixando um cessar-fogo na Síria, com um acordo de 3 páginas, prevendo um governo de transição de 3 meses e eleições em 6 meses.  

As guerras podem ser paradas por quem as combate. E nós somos soldados sem o saber. Morremos como soldados, como peões adormecidos na nossa vida pequena.(...)


in Triste Europa


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Serge Reggiani interpreta Les Loups Sont Entrés Dans Paris

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[As notícias que me chegavam à medida que eu ia escrevendo sobre os atentados de sexta feira, 13 de Novembro de 2015 em Paris, podem ser vistas no post seguinte]


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terça-feira, setembro 22, 2015

A crise europeia dos refugiados (e a situação da Síria) - uma explicação em meia dúzia de minutos. Vale a pena ver, ouvir e pensar.


Sem mais, aqui deixo um curto vídeo traduzido em que, de forma simples, se fala de algumas razões que levam à crise brutal a que se assiste, com milhares de refugiados a tentarem desesperadamente entrar na Europa, das motivações de quem se encontra nestas desesperadas situações com pouco mais do que uma mochila, os filhos ao colo e um telefone, das implicações da integração desta gente nos nossos países, dos riscos, dos benefícios, dos deveres cívicos, morais, de solidariedade  - e, até, de razões económicas que justificam uma actuação inteligente e inclusiva.


The European Refugee Crisis and Syria Explained


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segunda-feira, setembro 14, 2015

Àqueles que um dia perderam o coração


Pudesse eu e acolhia no meu coração todos os que me amam. Pudesse eu e nunca, nunca, faria sofrer quem me ama.

Pudesse eu e deixaria ainda espaço para amar também os que, não me amando, precisam de amor na sua vida.




Pudesse eu e escolheria para governar o meu país e o mundo quem mostrasse ter coração, um coração incapaz de ferir pessoa, animal, árvore, pedra ou palavra, um coração também capaz de acolher todos quantos precisam de um canto onde respirar e amar em paz.

Pudesse eu e partiria pelo mundo tentando que, quem um dia perdeu o coração, o tentasse reencontrar para que, de novo, sentisse o calor dos gestos de generosidade.

Pudesse eu e cuidaria de todos quantos têm o coração ferido. Um dia ouvi dizer que o coração é uma ferida aberta e, apesar disso ter sido dito num outro contexto, nunca mais o esqueci. Uma ferida aberta, que sangra. Essa ferida dentro de peito é fundamental à vida, talvez também para que nunca nos esqueçamos do que é sofrer. Sofrer por amor, sofrer por uma perda, por uma ausência, por tudo o que nunca poderá ser, por uma vida que se deixa para trás.




A minha mãe hoje, ao falarmos dos refugiados, dizia, com ar contristado, que ficam por lá os velhos, os que não conseguem fugir. Imagem talvez ainda mais triste do que a dos que se fazem ao mar ou à estrada, arriscando tudo - mas com esperança. Não tinha pensado nisso: os velhos, os que mal andam, os doentes, os acamados, esses estão a ficar para trás, vendo filhos e netos partir.




Vi há pouco na televisão: ao lado das auto-estradas, filas compactas de gente, crianças ao colo, sacos nos braços, quase nada, quase apenas a vida que lhes corre ainda nos corpos. Agredidos, insultados, os corpos cansados - avançam, nem sei como, avançam, dia e noite, dormindo ao relento, ou dormindo em tendas em campos onde são tratados como animais incómodos. Já não há agora onde os acolher, na Alemanha já estão a ficar em campos de concentração.

A história, qual bicho raivoso, parece que desatou a morder as mãos e o coração das pessoas. Não sei o que é isto. Os deuses vomitam as entranhas, cospem fogo, arrancam os olhos às crianças - a terra está a parir monstros sem coração. Não sei.




Em Portugal também há pessoas que não querem acolher as desgraçadas pessoas que fogem da guerra, da miséria, da loucura à solta. Dizem temer que venham tirar o trabalho aos portugueses ou que, entre eles, haja gente desalmada, terroristas. 

Gente desalmada sempre a há e de algumas pessoas bem falantes, que não têm cara de terroristas (e o que é ter cara de terrorista?) quem diria o poder de destruição que têm sobre um país? E como sabemos se quem, com ar pacífico, está ao nosso lado numa rua, não está a preparar alguma? Não, não é por aí.



E, com os níveis de desertificação humana que há em tantas zonas do nosso país e com a lástima que está a nossa demografia, com tão poucos nascimentos, pode ser uma bênção que entrem mais uns milhares de habitantes no nosso país. Há apoios europeus para acolher refugiados e, as pessoas uma vez instaladas, começarão a desenvolver actividades, as crianças precisarão de escolas e haverá mais trabalho para professores e precisarão de assistência médica e já tantos enfermeiros não terão que emigrar. E arranjar-se-ão estradas abandonadas e arranjar-se-ão casas antigas, e crescerá o emprego. Será bom para a economia e, a longo prazo, até para a Segurança Social. Mas, ó senhores, e que não fosse... Como fechar as portas, os olhos, as mãos, o coração a toda esta pobre gente?




E Portugal é um país que sabe receber bem quem precisa, que respeita as diferenças, que saberá oferecer carinho, protecção e que beneficiará culturalmente. Um país fica sempre mais rico quando pratica o bem, quando é inclusivo em relação a outras religiões, raças, culturas. 

Tomara que os portugueses que hoje se manifestam contra os refugiados encontrem o coração que um dia perderam e venham a acolher com estima, respeito e carinho estas pobres pessoas que deixaram parte do seu coração para trás.



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O apelo de Benedict Cumberbatch a favor dos refugiados




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Permitam que vos informe que, caso queiram mudar de registo e partir para a comédia ao serviço da política, chega via Trump seja via PaF, é descerem, por favor, até ao post já a seguir.

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Desejo-vos, meus Caros leitores, uma bela semana, a começar já por esta semana.

Felicidades a todos.

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sábado, agosto 29, 2015

De que fogem estas hordas de imigrantes, de refugiados, de invasores esfaimados e aflitos que um dia poderemos ter à nossa porta?


Há dias em que tenho uma em mente mas que me custa tanto que faço de tudo para a evitar. Sei que não conseguirei o tom adequado, sei que posso parecer fútil, leviana, sei que há coisas para as quais não há palavras. Por isso, este é o quarto post de hoje e já andei pelo sex-appeal, pelo humor, pela poesia, pelo amor - tudo para resolver se fujo ao assunto ou se tento abordá-lo. E aqui estou a hesitar. Não sei como mostrar o que penso sem correr o risco de, emocionada que estou, me mostrar lamechas; também não quero parecer panfletária. Ou vulgar.

E, no entanto, já falei algumas vezes disto. Vou falando. Mas acho que me fico sempre pela rama.

Centenas de milhares de pessoas de todas as idades, condições sociais e raças e de ambos os sexos têm vindo a deixar as suas casas e, correndo todos os riscos e sofrendo todos os horrores possíveis e imaginários, põem-se a caminho, morrendo, deixando familiares mortos para trás, em busca de um mundo em que possam viver com dignidade e esperança. Para isso, entregando todas as suas economias e pertences, colocam-se nas mãos de contrabandistas e bandidos e, procurando a Europa - que julgam ser um bom destino - metem-se dentro de barcos ou camiões onde muitos nem respirar podem, ou põem-se a caminho, crianças e velhos ao colo. Imagens que não parecem deste mundo chegam-nos a casa dia após dia, uma sucessão infindável de horrores. O sofrimento daquela gente parece não ter fim. Todos os dias mais dezenas ou centenas de mortos. Afogados, asfixiados. E as estradas cheias, cheias de gente. E comboios pejados de gente assustada, suja, exausta. E acampamentos a deitar por fora. E muros que se erguem. E arame farpado que dilacera os corpos e as almas. 

Andou a civilização a fazer-se, o mundo a desenvolver-se, a ciência e a tecnologia a superarem-se para que tantas centenas de milhares de pessoas passem por isto, como animais fugindo do fogo, como cães esfomeados percorrendo as ruas.

A cambada que ajudou a desestabilizar os países de onde esta gente foge não é agora capaz de ir para lá garantir um mínimo de ordem de modo a que as pessoas não tenham que fugir espavoridas, deixando as raízes para trás, correndo riscos de vida, pondo a vida dos filhos em risco. Ficam-se pelas palavras balofas e de circunstância. Quando foi para decidir ou apoiar as guerras ou os movimentos que provocaram isto, souberam tomar decisões. Agora que o inferno está lá instalado, lavam as mãos e entretêm o mundo com pífias considerações. Um asco de gente.

Não é com conversa que alguma coisa se fará: é indo para lá. Já lá deveriam estar tropas, Capacetes Azuis, não sei - gente que ajude a pôr cobro ao desatino e à crueldade sem rei nem roque que por lá impera.

Não sou capaz de dizer mais que isto porque me faltam as palavras e porque o peito se me enche de angústia. Vou, pois, ficar-me apenas pelas imagens.


De que foge esta gente?



Un drama con rostro

En la imagen, una mujer mira cómo la policía bloquea a un grupo de refugiados que hacen la ruta Macedonia-Grecia. El primero de estos países declaró el Estado de Emergencia el 20 de agosto, abrumado por el número de inmigrantes que llegaban a su país, y movilizó a su Ejército para que vigilara la frontera.


(ROBERT ATANASOVSKI (AFP))


Jugarse la vida

En la imagen, un inmigrante escondido debajo de un tren intenta colarse en él para dirigirse a Serbia, en la estación de Gevgelija (Macedonia). En los últimos días, más de 120 cadáveres de inmigrantes han sido descubiertos en vehículos que se dirigían a Europa y en los que los refugiados viajaban escondidos.


(BORIS GRDANOSKI (AP))


Miles de niños entre los refugiados

Inmigrantes sirios duermen en un parque de Belgrado, Serbia. Son más de 10.000 los refugiados que han cruzado con sus bebés y niños pequeños la frontera de Serbia en los últimos días.


(MARKO DROBNJAKOVIC (AP))

Estado de emergencia

La policía macedonia trata de bloquear a los inmigrantes que intentan entrar en su país. Alrededor de 39.000 personas, la mayoría de origen sirio, han sido registradas a su paso por Macedonia en el último mes. La cantidad abrumó al Gobierno macedonio, que declaró el Estado de emergencia.


(VLATKO PERKOVSKI (AP))


El miedo como compañero de viaje

Reacción de un inmigrante que sostiene a un niño mientras es detenido por las autoridades de Macedonia. Alemania espera este año la llegada de 800.000 refugiados a Europa, “el mayor reto al que se enfrenta nuestro país desde la unificación”, advirtió Sigmar Gabriel, líder socialdemócrata, partido en coalición con los conservadores de Ángela Merkel.


(DARKO VOJINOVIC (AP))


Un hogar en cualquier lugar

Rashina viene de Kobani, Siria. Tiene cuatro años y ha bajado por medio mundo para llegar hasta Europa. En la imagen, descansa en una cama improvisada mientras espera un tren en la frontera macedonia que les lleve a otros puntos de Europa en busca de un lugar donde establecerse.


(OGNEN TEOFILOVSKI (REUTERS))



Fogem de situações como estas, na Síria 




Uma criança síria (Hudea, 4 anos) teria levantado as mãos ao confundir uma câmara fotográfica com uma arma.

(Foto: Osman Sargili)


Homem sírio chora enquanto segura o corpo de seu filho perto de Dar El Shifa hospital em Aleppo , Síria. O menino foi morto pelo exército sírio.

(Foto: Manu Brabo)


Uma mulher ferida, ainda em choque, deixa o hospital Dar El Shifa em Aleppo, Síria em 20 de setembro de 2012, após um bombardeio da artilharia das forças do governo sírio na cidade, no norte da Síria.

(Foto: Manu Brabo)


Uma mulher chamada Aida chora enquanto se recupera de ferimentos graves após o exército sírio bombardear sua casa em Idlib, norte da Síria em 10 de março de 2012. O marido de Aida e seus dois filhos foram mortos no ataque.

(Foto: Rodrigo Abd)


Um menino chamado Ahmed lamenta a morte do pai (Abdulaziz Abu Ahmed Khrer, que foi morto por um atirador de elite do exército sírio) durante seu funeral em Ibid, norte da Síria.

(Foto: Rodrigo Abd)
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A favor da Síria, pela mão atenta e amorosa de Banksy


[Graffiti artist Banksy has reworked his Young Girl piece for the With Syria campaign, to mark three years since the crisis began. The campaign is a coalition of 115 humanitarian and human rights groups from 24 countries, including Save the Children, Oxfam and Amnesty International. According to the coalition their aim is to ensure this is the last anniversary of the Syrian crisis. At the Zaatari camp in Jordan 100 young refugees lit candle and released red balloons, inspired by Banksy to carry messages of hope to Syrians. Report by Genelle Aldred.]

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Obtive as primeiras fotografias, as que têm legenda em espanhol, no El País.
Obtive as últimas fotografias, da Síria, na Obvious

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Por indicação do Leitor ECD em comentário aqui abaixo fui ler e, de tal forma, me revejo no que ali está escrito que me permito transcrever o artigo quase na íntegra.

Os campos, novamente


ANTÓNIO GUERREIRO in Público


Os campos, sob a forma de centros e lugares de retenção, voltaram à Europa e disseminaram-se por toda a fronteira do Sul da União Europeia. São espaços geridos pela polícia, subtraídos à ordem jurídica normal, que funcionam como diques para reter o enorme caudal dos “fluxos migratórios”. A situação está fora de controlo e assemelha-se àquela “explosão” que se deu no coração do continente europeu entre as duas guerras mundiais, assim descrita por Hannah Arendt em O Imperialismo, num capítulo em que a filósofa analisa o declínio do Estado-nação e o fim dos direitos do homem: “[As guerras civis] desencadearam a emigração de grupos que, menos felizes do que os seus predecessores das guerras de religião, não foram acolhidos em nenhum sítio. Tendo fugido da sua pátria, viram-se sem pátria; tendo abandonado o seu Estado, tornaram-se apátridas; tendo sido privados dos direitos que a sua humanidade lhes conferia, ficaram desprovidos de direitos”. E num artigo de 1943, We Refugees, escrito para um jornal judeu de língua inglesa, Arendt terminava em tom de exaltação, como se tivesse acabado de identificar um novo sujeito da história: “Os refugiados representam a vanguarda dos seus povos”. Mas o refugiado que Arendt definiu a partir do modelo do apátrida — produto de uma dissociação entre as fronteiras administrativas do Estado e a realidade política dos homens — implicava, como o nome indica, a ideia de refúgio, tanto geográfico como jurídico: os refugiados judeus que, no início da Segunda Guerra Mundial, conseguiram embarcar para a América tinham um destino que os orientava à partida e contavam com a vontade política de uma protecção. Os actuais “migrantes” que se lançam ao mar para alcançarem o território europeu são, pura e simplesmente, “deslocados”, fogem da guerra e da miséria, na esperança de conseguirem encontrar um lugar, uma direcção, um sentido. Verdadeiros refugiados na Europa, no sentido jurídico da Convenção de Genebra de 1951, são uma ínfima parte deste fluxo de forçados migrantes que, mal entram em território europeu, são ainda menos do que párias: são uma massa incontrolada de indesejáveis estrangeiros, assaltantes contra os quais a fortaleza europeia não consegue erguer muros eficazes nem fazer valer as suas armas de dissuasão. À nossa frente, está a passar-se algo que não queremos olhar: o regresso a formas de brutalização e barbárie, a instauração de espaços anómicos onde, novamente, “tudo é possível”. Sem conseguirmos vislumbrar soluções para o problema, desistimos também de uma vigilância capaz de nos lançar este alerta: os campos que regressaram à Europa, em grande número e por todo o lado, muito embora não sejam regidos pelo regime de excepção que presidiu à tanatopolítica — à política da morte — dos regimes totalitários, não nos dão garantias de que nenhum descarrilamento terá lugar e nenhuma inclinação criminosa latente poderá seguir o seu curso. Não podemos hoje ignorar que há uma lógica terrível imanente ao campo como figura: ele acaba por desenvolver uma zona cinzenta onde todas as situações-limite, à margem de todos os direitos, se tornam possíveis.  (...)

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Permitam que vos informe que a seguir há mais três posts, leves, levezinhos
(uma tentativa de aliviar a consciência)

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, um bom sábado.

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