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terça-feira, maio 22, 2012

No final do passeio pelo Douro Superior, a seguir à visita ao Museu do Côa, Ana desnuda-se perante um Tomás que, na véspera, praticamente já se tinha desvendado perante Ana e a história chega ao fim - The End


Música, por favor

Música com sons da natureza



Tomás olhou para Ana, 'Deve estar a achar que isto está a parecer uma novela mexicana'. Ana sorriu. 'Que ideia... Não, Tomás, estou a ouvir com atenção e com curiosidade.' 

'Não gosto de falar nisto, nunca falei. Mas mil vezes tive, dentro de mim, a conversa que estou aqui a ter. Mil vezes relatei, em silêncio, a conversa que um dia teria com alguém a quem explicaria o que se passou. Mas, apesar de mil vezes ensaiado, agora que estou a falar a sério, tudo me parece pouco credível, tudo me parece exagerado ou destituído de lógica. 

Mas foram anos de cansaço, Ana, anos de trabalhar quase sem dormir, anos de querer sempre mais, mais clientes, mais horas, mais quadros, mais livros, mais carros, anos de muita pressão, ter relações no período fértil, exames médicos, frustrações, análises, mais exames, e as frustrações, as minhas, as dela, as depressões dela, as dores de cabeça dela, as indisposições e eu já não sabia se as indisposições eram físicas, se eram imaginadas, se eram fruto da depressão, tantos anos assim, tantos, eu sei que é difícil de perceber mas foram anos e anos, eu estava tão exausto, nem sabia quanto'.  E passou as mãos pelo cabelo.

'Mas, dito assim, parece uma tragédia vulgar, não gosto de me ouvir a dizer isto. Uma perda é uma coisa má mas uma perda envolta em culpa é uma coisa péssima. É uma garra no nosso peito, é uma angústia que não nos deixa respirar, nem viver. Nem falar, Ana'. E olhou-a como se fosse incapaz de dizer mais uma palavra que fosse.

Ana levantou-se e foi sentar-se ao lado dele, 'Não conte, Tomás, não quero ouvir. Mas conte como foi parar à vila.'

Tomás deu-lhe a mão, 'Larguei tudo, tudo. Andei por aí, por onde calhava, andei até gastar o dinheiro todo, anos a andar por aí, em acções humanitárias, por aí. Até que, quando se acabou o dinheiro, comecei a trabalhar, também onde calhava. Uma vez estava numa serração, apareceu o dono da carpintaria da vila para escolher umas madeiras. Gostou da forma como eu pegava ou cortava na madeira, precisava de um ajudante, fui com ele. E foi ali, a trabalhar a madeira e a aprender com ele que reencontrei o amor que antes tinha pelo corpo humano. Os veios da madeira, descobri-los, o corpo da madeira, a forma de transformar aspereza em suavidade, a forma certa de cortar sem ferir, a forma certa de tratar sem traumatizar. Fui ficando. Ali também ninguém me conhecia e ali poderia, finalmente, estar em paz sem ter que andar de um lado para o outro. Depois, há uns dois ou três anos ele parou, reformou-se e vendeu-me a carpintaria. Foi só isso, nada demais, afinal.'

Ana, fez-lhe uma festa no cabelo e ficaram um bocado em silêncio. Depois ela disse, 'É tarde, ficamos por aqui. Vamos jantar e falar de coisas divertidas. Bom, bom, seria se encontrássemos um sítio para dançar.'

Tomás levantou-se, 'Dançar!? Tudo menos isso. Por muito que lhe queira agradar, isso é que não, peça outra coisa mas isso não. E, além disso, agora é a sua vez de falar'.

Ana hesitou, 'Tomás, peça outra coisa... mas isso não, hoje não... tenho que ver se invento uma história credível para lhe contar porque a minha história verdadeira é escabrosa demais'. Ele olhou-a, espantado. Ana riu-se, 'Não, escabrosa também não será, mas é maçadora, tenho que ver se invento alguns pormenores picantes'.

Jantaram no hotel e depois, antes de irem dormir, ficaram um bocado a combinar o percurso do dia seguinte.


Freixo do Numão - a beleza  pura da simplicidade


De manhã foram até Numão, localidade encantadora onde passearam como turistas, vendo o castelinho, a vista do castelo, as casas. Uma mulher, ouvindo as vozes, veio espreitar à porta, depois recolheu-se. Passado um bocado, discretamente veio até à rua, devia querer ver bem aquele casal para depois poder reportar o evento. Ana deu o braço a Tomás e sorriu para ele, enternecida, até para a senhora poder acrescentar esse dado relevante.



Contentor do lixo em Numão


Tomás apontou a Ana o contentor do lixo. Ana fartou-se de rir e fotografou. 'Não colocar cinzas quentes', que coisa mais engraçada para se escrever num contentor do lixo. São as particularidades da vida na terra.

Dali partiram para Foz Côa.



O Douro Superior avistado pela última vez em Foz Côa - uma imagem que não se apaga da memória
Os montes que se vão tornando azuis à medida que se escondem atrás de outros montes e um rio
que reflecte o céu e que desliza ante os nossos olhos assombrados


Ana não conhecia o museu, ia céptica. Mas o cepticismo logo se esbateu. A vista era, como sempre, magnífica, com todo o esplendor que caracteriza toda esta zona.

E o edifício do museu é espectacular.



Entrada do Museu do Côa
O céu que se vai estreitando à medida que entramos na terra, isto é, no belo edifício


A entrada deixa logo antever que vamos entrar num espaço onde a luz entra por frinchas. E depois toda a organização do museu nos 'leva' aos espaços em que foram observadas as gravuras rupestres.



Interior de uma sala do museu do Côa


Avançamos por espaços pouco iluminados mas o suficiente para vermos o que nos é mostrado, os traços que alguém, muito antes de nós, nestes mesmos locais, vendo estas mesmas paisagens, e vivendo numa natureza fulgurantemente bela, foi desenhando nas rochas.


Outro aspecto de outra sala do belíssimo (e moderno!) Museu do Côa


O que vemos são réplicas, ou figuras iluminadas, ou peças descobertas, ou recriações de ambientes e há uma música suave que nos acompanha, sons da natureza, bichos, passos de gente nos rochedos ou de animais, pássaros, o vento na folhagem.


Ana andou feliz, descansada, o ambiente de museus deixa-a sempre assim, descontraída e bem disposta. Tudo ali a encantou.

Quando saíram, Ana deu a mão a Tomás, puxou por ele. 'Venha, vamos encontrar um recanto confortável, sossegado'. Abriu o saco que trazia ao ombro e mostrou-lhe pão, bolos, fruta, sumos. Tomás admirou-se: 'Mas de onde veio isto?'. Com ar gaiato, Ana confessou, '...Não diga nada... Trouxe do hotel, do pequeno almoço, bad, bad girl... vamos, vamos fazer um picnic'.



Se a música lá de cima ainda não acabou, por favor, parem-na, que a música agora é outra.

Damien Rice - I can´t take mey eyes off you
(Banda sonora do filme Clser)




Pormenor da paisagem do Douro Superior, Douro Vinhateiro, Reino Maravilhoso


Foi Tomás que descobriu o sítio ideal. Sentaram-se e, como se estivessem no ventre da terra, no meio do nada, ali estiveram comendo, rindo. Depois Ana, resoluta, avançou, 'Então, vá, vamos lá: agora eu!'

Tomás deu o mote: 'O que é que uma mulher como você tem a ver com aquele sujeito intragável que a foi visitar no outro dia... com flores?!'.

Ana riu, maliciosa, 'É intragável, é. Mas tem o seu lado tragável...'.

Como ele não se risse, ela continuou: 'Vá, agora a sério. Fomos colegas. Depois cada um seguiu o seu trajecto profissional mas a nossa amizade continuou. Sempre houve um ambiente de picardia entre nós e dali até haver uma chispazita era um ar. Uma adrenalina, uma atracção, nem sei bem dizer. Mas ele ultimamente está um convencido, um arrogante, um verdadeiro palerma, é verdade. A empresa onde ele estava, como sabe, foi comprada por chineses, eu na brincadeira até o trato por chinês. Sou amiga da mulher dele, não tem nada a ver. E gosto dele, apesar das parvoíces e vaidades. Em privado é divertido, é outro. Andou a querer divorciar-se, queria ficar comigo, uns dramas. Era escusado que eu nunca iria viver com ele mas, de qualquer maneira, a mulher também não aceitou o divórcio amigável e ele, com a exposição mediática que tem, nunca poderia ir para um litigioso. Continuámos amigos como antes, embora desde há algum tempo pouco nos encontremos'.

Ana estava com calor, tirou o casaco e apeteceu-lhe sentir a terra, tirou os sapatos. Continuou de olhos postos em Tomás: 'Mas, enfim, são coisas da vida. Mas o homem da minha vida não é ele. É outro, sempre foi. É o pai dos meus filhos.' Tomás abriu os olhos, com espanto. 'Sim, tenho filhos, Tomás.'

Tomás olhava-a, calado. Ana continuou: 'Que calor que se está a pôr. Não leve a mal, Tomás, mas vou tirar também a tshirt'. Despiu e ficou de calças e soutien. Tomás engoliu em seco, tentando não ser indiscreto, não ver os seios de Ana que eram bem visíveis com o soutien decotado.

Ana continuou sem conseguir tirar os olhos de Tomás: 'Mas o homem da minha vida, o ano passado recebeu um convite que achou que era irrecusável, ir arrancar com uma unidade no Brasil. Queria, naturalmente que eu fosse com ele. Claro que eu não ia, tenho cá a família, o trabalho, tudo. Depois meteu na cabeça que eu não queria ir por causa do 'chinês'. Nós, que antes sempre nos tínhamos dado tão bem, começámos a viver numa discussão permanente. Cenas de ciúmes permanentes, uma estupidez, queria que eu confessasse, cenas parvas, coisas pelas quais eu, nunca na minha vida!, quis passar, odeio ciúmes, odeio. Uma vez no meio da maior crise, farta das inquisições e ciumeiras, disse-lhe para se ir embora e para me deixar em paz, que eu, por muito que gostasse dele, não iria viver para longe dos meus filhos, nem dos meus pais e que fosse chatear outra e essas coisas que se dizem no calor das discussões. A verdade é que saíu porta fora e aceitou, finalmente, o convite. Depois arrependeu-se mas já era tarde demais. Furiosa, disse-lhe que escusava de me telefonar, que eu nunca mais queria pôr-lhe os olhos em cima. E, no dia em que ele embarcou, eu fiz o mesmo, saí de casa, avisei os meus filhos e os meus pais e fui parar à vila. Todos os dias lhes telefono e todos os fins de semana são sagrados mas a ele não, não lhe perdoo, e ele liga aos filhos, pede-lhes para eles me convencerem, uma chatice.'

Tomás olhava para o chão, inibido. Percebeu que Ana estava a despir as calças mas não levantou os olhos. 'Que bem que se está assim, Tomás, a sentir o sol na pele'. Tomás não disse nada.

Ana colocou-se bem na sua frente, assim, e continuou, olhando-o: 'Quis afastar-me, estava furiosa, furiosa comigo por ter esticado a corda até partir, furiosa com ele porque se foi embora, furiosa, triste, aborrecida. Uma vida inteira para acabar assim, estupidamente. Nem sei quem é que teve razão ou se alguém teve, nem isso me interessa. Tratei de tudo no trabalho para deixar de ter funções executivas, passei a tratar de tudo por mail ou por telefone ou em reuniões ao fim de semana. Era para ser um mês, dois meses, três meses. Mas comecei a arranjar a casa, comecei a interessar-me pela terra, por tudo e... pode alguém ser quem não é? Quando dei por mim já estava a dinamizar negócios, a motivar pessoas, enfim, aquilo que sempre fiz. E isto apesar de ter ido para lá para mudar de vida. De tal maneira que quando o dono da oficina me perguntou o meu nome, me saíu um nome que não o meu...'

Tomás olhou-a então de frente, como se sentisse enganado: 'Não?! Não se chama Ana? Então como é que se chama?"

Ela despiu então a última peça de roupa e assim, de frente para Tomás, deixando que ele a visse em toda a sua nudez, olhando-o nos olhos, respondeu: 'Eva'. 


***

Para o caso de alguém querer ler esta história do princípio até ao fim, poderá procurar a etiqueta 'Ana muda de vida' aí ao lado, mais lá para baixo.

E, para o caso, de haver algum resistente que, depois desta longuíssima história, ainda lhe apetecer ler mais qualquer coisa, convido-vos a visitarem-me lá na minha outra casa, o Ginjal e Lisboa, a love affair. Hoje as minhas palavras voam, mas hoje voam mesmo, em volta de um poema de Tatiana Faia. A música só poderia ser Va, pensieri, sull'ali dorate e, claro, é Verdi.

***

Cansada de tanto escrever, desejo-vos uma bela terça feira. 

E, se me permitem um conselho de ordem prática, não seria de jogarem o euromilhões? Parece que há um jackpot  jeitoso que talvez venha a calhar para uns devaneios. 

Seja como for, divirtam-se à grande, está bem? 

segunda-feira, maio 21, 2012

Do almoço em Ferradosa até ao deslumbramento no Alto de Vargelas - e eis que Tomás, finalmente, começa a contar a Ana a sua história


Música, por favor

Ennio Morricone - Banda sonora do filme 'A missão' 
(com Robert de Niro e Jeremy Irons)



Chegaram, pois, a Ferradosa, pequeno local abrigado na beira do rio.

Chegando ali, Ana pensou que lhe apeteceria sonhar, apetecer-lhe-ia pensar que seria possível morar para sempre num sítio assim e ali ficar na maior paz, no maior silêncio.

Tomás dirigiu-se a um restaurante com um pequeno cais, com uma varanda sobre o rio. Nessa varanda um homem magro, com um chapéu escuros de abas, com um cão enorme de pêlo curto, claro, que afagava enquanto lia, espantou-se ao ver Tomás. Depois levantou-se, abraçaram-se, quase sem falarem. Tomás apresentou-lhe Ana, apresentou Pedro a Ana, contou que tinham brincado muito quando eram pequenos, que muitas viagens de comboio tinham feito desde o Porto, mas depois não deu grande seguimento à conversa; parecia querer evitar perguntas pois, logo a seguir, fez tenção de ir ao que ali o trazia, ao almoço, e conduziu-a até uma mesa. O homem parecia ser pessoa calada e, coisa curiosa, era fisicamente bastante parecido com Tomás; não insistiu na conversa e, acto contínuo, retomou a sua leitura e as festas ao cão.

Ana notou que Tomás, apesar de se terem cumprimentado com notório afecto, parecia ter cortado laços com Pedro, mas não fez perguntas.

A sobriedade de Tomás afastava espontaneamente qualquer tentativa de intromissão mas, de qualquer maneira, Ana estava com  mixed feelings. Por um lado tinha curiosidade e ele próprio se tinha prontificado a falar mas, por outro, ainda tentava manter alguma distância - é que a proximidade estava a ser, para ela, uma tentação.



Elegante traço branco na paisagem verde: navio sai de Ferradosa e faz-se ao rio que não é só água,
é também um espelho  tranquilo


Um navio longo e branco que estava atracado mais à frente fez uma vagarosa curva e passou na frente deles, deslizando nas águas suaves. Por um momento Ana desejou ir ali com Tomás, como se tivessem nascido há pouco tempo, sem vidas para trás, como se pudessem começar juntos uma vida simples, sem explicações a dar. Mas logo se arrependeu da ideia pois a verdade é que não se arrependia da nada do que tinha feito até então e não trocava a vida que tivera por quimera nenhuma do mundo.

Escolheram o almoço. Tomás escolheu filetes e Ana uma jardineira que se veio a revelar deliciosa, caseira, apaladada, uma carne de vaca muito macia, um molhinho grosso, apurado, a puxar pela deliciosa broa. O vinho da região, tinto, excelente. E ali estiveram. Tomás não falou da sua vida e Ana também não puxou pelo assunto. Além do mais, ele dizia que depois de contar, esperava que ela fizesse o mesmo e ela, ao ter ido para a vila, era como se tivesse passado a usar uma burka, cobrindo a sua identidade perante todos. Não lhe apetecia falar na sua vida pois, ao fazê-lo, iria ver-se forçada a equacionar o seu futuro e não estava a conseguir raciocinar com isenção e objectividade.



O verde da Ponte mistura-se com o verde dos montes e atravessa com suavidade o rio 


Quando acabaram de almoçar já Pedro se tinha ido embora. Ana e Tomás ficaram ali, em silêncio, a olhar o rio, a pequena ponte verde, o barquinho que passava por baixo e parecia de brincar, os montes que pareciam desenhados e pintados às cores por uma mão inocente de criança. Ana pensou que, acontecesse o que acontecesse, nunca se iria esquecer destes locais tão belos que Tomás a tinha levado a ver. A inocência que parecia envolvê-la, provinha talvez, muito, deste local mágico.

A seguir ele disse, 'Vamos ali acima, quero mostrar-lhe outro miradouro, talvez aquele de onde a vista é mais bonita, o Alto de Vargelas. O miradouro em si não é um local acolhedor e arranjado como o S. Leonardo da Galafura ou S. Salvador do Mundo mas a vista é fantástica, vai ver. Fica junto à entrada da quinta onde o pai do Pedro era comissário, a Quinta das Vargellas'.



Avistado do Alto de Vargelas, o rio atravessa os montes que estão atrás dos montes,
que estão atrás dos montes, que estão atrás dos montes e nós, se pudéssemos,
afagá-los-íamos com as nossas mãos devotas e mergulharíamos as mãos nesta beleza imensa


Quando chegaram, Tomás ficou parado a olhar. 'Tantas vezes aqui vim ter com o Pedro. Tempos tão distantes. Nessa altura eu ainda não sabia o que seria a minha vida.'

Ana olhou em silêncio. Os montes sucediam-se e, à medida que se afastavam, iam-se tornando azuis, iam-se dissolvendo no céu e o rio era um longo leito brilhante que parecia vir de lá, do alto, talvez as nuvens feitas uma fita de água azul. Tudo tão belo, tão grandioso, uma escala que minimizava os pequenos dramas humanos. Mas Ana sentia que Tomás se debatia com o seu, sentia que ele queria falar.

Aproximou-se, então, de Tomás, deu-lhe o braço e encostou ao de leve a cabeça no seu ombro. 'Talvez aqui seja, então, o local para começarmos a nossa conversa, não?'

Tomás disse, 'Então deixe-me olhar mais uma vez e já vamos para o carro, falamos lá, enquanto andamos.'



A vista do Alto de Vargelas, uma paisagem abençoada:
a terra que deus e o homem moldaram com vagar, com minúcia e carinho,
a água que desliza em todo o seu esplendor, o ar puro e perfumado, e, sempre, na terra amanhada,
nas estradas que serpenteiam, o trabalho incansável do homem


Ana deixou-se estar ali, de braço dado com Tomás, calados, a olhar a imensidão do horizonte, o rio que se revelava e escondia, os montes belos, orgânicos.

Depois entraram no carro, estava frio lá fora. E Tomás começou a contar, pausadamente, silêncios entre frases, voz surda, por vezes mal se ouvia, mas Ana nunca o interrompeu, por respeito, por receio que ele se arrependesse: 'Nunca contei a ninguém. Eu sou médico, Ana. Ou melhor, eu era médico. Há muito tempo. Trabalhava muito. No hospital, e tinha um consultório. Fazia bancos e ia directamente dali para o consultório, quase não dormia. Era bem sucedido, consultório sempre cheio. Ganhava muito dinheiro. Tinha uma casa muito grande no Estoril, tinha um apartamento no Algarve, tinha três carros e uma mota. Pinturas. Esculturas no jardim. Tinha tudo o que me passava pela cabeça. E era casado. A minha mulher era professora. Dávamo-nos muito bem e ela tinha muita compreensão pelas minhas ausências, tinha dias de quase não a ver. Era uma mulher de mão cheia, muito boa pessoa, uma companheira. Mas tinha uma mágoa muito grande, tinha sempre aquela mágoa. Perante os outros tentava disfarçar mas, em casa, estava sempre muito triste. Durante muitos anos tentámos ter filhos. Mas em vão. Ainda engravidou duas vezes mas abortou logo. Fez tratamentos e mais tratamentos. Mas nada.'




Entretanto, chegaram ao hotel e Ana entrou directamente para o quarto de Tomás. Depois de um dia um pouco cansativo, apetecia-lhe pôr-se à vontade. Descalçou-se e deixou-se ficar a ouvir Tomás que continuava com a voz nervosa: 'Só quem passa por este processo é que sabe a expectativa que renasce para logo se gorar, a angústia, a ansiedade, e as pessoas todas a perguntarem quando é que encomendávamos um bebé, toda a gente a dizer que já estava na altura antes que fosse tarde demais, e os nossos pais sempre a quererem um netinho e nós aflitos, já quase sem esperança. Não falávamos disso aos outros, escondíamos como se fosse um defeito de que nos envergonhássemos, era um pudor, era uma defesa, nem sei. Foram anos de tentativas frustradas, de lágrimas, de ilusões que se transformavam em grandes desgostos, isso é que foi. Até que desistimos. O desgosto era mais dela que meu, que sempre a animei dizendo que podíamos adoptar mas só se convenceu a isso quando, depois de muitos anos, perdeu a esperança. Um dia, tínhamos dado entrada dos papeis para a adopção, estávamos emocionalmente exaustos e eu fisicamente cansado de tanto trabalhar, resolvemos ir de férias para um daqueles destinos longínquos, uma praia de sonho. Lá fomos, ela deprimida, mal disposta, quase nem queria sair do quarto de hotel. Eu, para espairecer, resolvi ir fazer um curso de mergulho, o primeiro dia era um dia inteiro, aulas teóricas, práticas.'

Aí parou, estava emocionado, tenso. Ana disse, 'Pare um bocadinho, Tomás. Venha até aqui à janela, respire fundo. Já continua. Mas só se quiser, Tomás, deixe'.


***

Bom, se chegaram até aqui e vos apetecer também espairecer, hoje, lá no meu Ginjal as minhas palavras voam em volta de um poema de Soledade Santos e eu gostaria muito de vos ter por lá. Acompanha com La Traviata que, assim, abre a semana que vou dedicar a Verdi. Grande semana, portanto.

***

E é isto. Mais uma semana que começa e que comece bem para que toda ela seja uma festa. Divirtam-se!

sábado, maio 19, 2012

Depois da ternura no Pinhão, Ana sente-se a resvalar e Tomás segura-a em S. Salvador do Mundo - a magia do Douro Superior a voltar a cerzir a ficção com a realidade


Música, por favor

John Barry, Banda sonora de Dances with Wolves 



Ana e Tomás combinaram encontrar-se ao pequeno almoço para depois irem fazer uma caminhada pela beira do rio. 

Quando começaram, repararam numa grande agitação, muita gente na ponte pedonal a espreitar a margem, e, lá em baixo, uma ambulância, bombeiros, a guarda. Como sempre acontece nas pequenas cidades, a notícia tinha-se espalhado e, enquanto andavam, pelos fragmentos que iam captando das conversas que dominavam todas as atenções, aos velhos sentados nos muros, às pessoas com quem se cruzavam na caminhada, iam percebendo - 'apareceu', 'foi lá à frente mas vão trazê-lo'. Deliberadamente afastaram-se, não queriam contaminar a boa disposição com uma coisa tão triste. Mas, um pouco depois, passaram os dois pequenos barcos que traziam alguém de quem a alma se tinha já soltado, alguém que já não era mais que um corpo. É assim mesmo, os rios têm momentos de desolação como este.

Tomás afastou o olhar quando os barquinhos passara e chamou por Ana, incomodado, 'vamos'. Ana não resistiu a fotografar mas não deixou que Tomás percebesse e, logo depois, foi com ele. A beira do rio continuava bela e tranquila, indiferente à tristeza que o rio naquele momento transportava.



Nas margens do Douro - a quietude absoluta que se sobrepõe à inquietude  momentânea


Pouco depois voltaram ao hotel para um duche e saíram para o seu percurso.

Ana sentia-se, de novo, um pouco inquieta. Tomás era, para ela, apenas um amigo, um amigo por quem sentia afecto, curiosidade, respeito, e assim pretendia que continuasse. Porém, sentia que para Tomás talvez fosse um pouco mais que isso. Talvez. Mas também não queria aprofundar, não queria falar sobre o assunto, nem sequer pensar. Mas talvez a inquietação não resultasse apenas disso. Não sabia, não percebia com exactidão e Ana era mulher de ciências exactas. Sentia-se muito bem com Tomás, gostava de estar com ele e começava a recear essa sensação.

Tentou, pois, afastar o clima de intimidade que parecia sempre formar-se quando falavam deles próprios. Pediu a Tomás que conduzisse. Ele não queria, disse que se sentia inseguro mas Ana insistiu, aliás ele conhecia bem melhor que ela a região. Como a estrada tinha muitas curvas, não dava para prosseguirem com as leituras e, aliás, com o esplendor da paisagem, não faria sentido ir de olhos presos num livro.

Dirigiram-se ao Pinhão. Aí o rio adoça-se, a paisagem envolve a pequena terra que se aninha rente ao rio e tudo parece mimoso. Ao mesmo tempo parece que o tempo parou. A beleza pura em suspensão no tempo. A estação da CP é bonita, muito arranjada, muito colorida. Tem azulejos de um belo azul, tem um relógio antigo, e, sobretudo, tem montes ao longe.



A estação da CP no Pinhão - tão limpa, tão bem cuidada


E Ana começa, ela também, a adoçar-se. Ri, fotografa, e Tomás, orgulhoso, está feliz por Ana gostar tão exuberantemente da magia das suas terras. Ana enternece-se com a simplicidade harmoniosa da estação.



Interior da Estação da CP no Pinhão - a luz que entra, o tempo que parou


Passa a mão pela bela mesa que está no centro da sala de espera e Tomás sorri, passando também a sua mão. 'O tempo faz bem à madeira, torna-a macia. Sente, Ana? Passe a mão no sentido do veio, assim, sinta. É a macieza da madeira, não há superfície mais macia...', disse ele. Ana já se estava a deixar contagiar pelo local, tudo parecia apelar ao romance: 'Nem a pele de uma mulher, Tomás...?'

Tomás olhou-a, sério: 'Há muito tempo, Ana, que não passo a mão pela superfície de uma mulher.' Ana não soube que dizer. Depois, ele acrescentou como se quisesse ser mais preciso: 'Tenho ideia, sim, que é macia a pele de uma mulher, as costas que ondulam, ou a barriga que se arredonda, tenho ideia, sim, mas é uma ideia muito longínqua, nem sei se é imaginação minha...'. 

Depois, para disfarçar uma afloração de emoção, foi observar o belo móvel de madeira escura com uma porta de vidro que estava num recanto, passou-lhe a mão com ternura. Ana viu e teve vontade de lhe fazer uma festa a ele. Mas não fez.

Ouviram, então, o som de um comboio. 'Venha cá, venha ver', chamou Tomás, puxando-a pela mão até à linha de caminho de ferro.



O comboio percorre o cenário - mas o colorido comboio, as flores, as casinhas e os montes
tão bem desenhados... são mesmo a sério...!


Ana desatou a fotografar. Um comboio deslizava a caminho da paisagem. 'Parece que estou no meio de um filme, Tomás.'

'Pois parece... vamos lá a ver é,  no final do filme, quem é que fica com a miúda...', gracejou Tomás.

Ana fez de conta que não percebeu.

A seguir, ele puxou de novo por ela, 'Vamos, quero mostra-lhe um sítio especial' e já iam de mão dada. Ana pensava que não queria, não queria, não queria mesmo, que tinha que lhe dizer que tirasse daí o sentido, que parvoíce o que estava a acontecer. Mas não foi capaz, não disse nada, deixou-se levar pela mão.

Quando entraram no carro, Ana não dizia nada e Tomás também não. Ela não perguntou para onde iam e ele também não disse nada.

Até que chegaram a um local, a mais um local mágico. 'São Salvador do Mundo' disse Tomás pausadamente como se dissesse o nome de uma prece.

E ela ficou ali, a respirar o ar doce e perfumado dos campos floridos, um ar tão limpo, tão cheiroso, o cheirinho doce dos campos puros. E a olhar. A olhar. A olhar até o olhar se perder de si própria. 



S. Salvador do Mundo - o local em que Deus começou o mundo


Nem sentiu Tomás a aproximar-se. Apenas sentiu quando ele se encostou às suas costas e passou os seus braços em torno do seu pescoço. Ana encostada ao corpo esguio de Tomás, ambos olhando a paisagem em silêncio. Apetecia-lhe chorar, cair por terra - mas Tomás estava a ampará-la e ela sentiu-se feliz por estar presa a Tomás num momento tão tocante.



S. Salvador do Mundo - o Douro e os montes. E uma beleza esmagadora, uma beleza absoluta


Depois ele levou-a pela mão, 'Olha Ana'. Ana olhava assombrada, quase sem respirar, tanta beleza não é possível. 

Depois perguntou-lhe: 'Quando se vive num sítio deste como é que se arranja coragem para o deixar?'



S. Salvador do Mundo - a magia de um local em que o Homem melhorou a obra de Deus


Tomás respirou fundo, pensou, depois disse, 'Vivia por aqui, não sabia como era o mundo, pensava que era melhor, queria descobrir outros mundos, fui para a cidade, fiquei por lá até que mudei de vida, andei aos tombos, e depois fui parar lá à vila'.

Ana, olhou-o, tão sério que estava. Mas teve medo de ouvir mais porque sabia que quanto mais soubesse mais se envolveria. Então atalhou: 'Depois me conta, Tomás; está bem? Agora deixe-me apenas olhar, quero que esta paisagem fique gravada dentro de mim. Olhe comigo, Tomás, posso eu depois, quando estiver longe, querer tirar alguma dúvida' e sorriu para ele não perceber que estava com medo.

Mas iam abraçados quando foram de novo até ao carro. 'E agora para onde me vai levar, Tomás? Para que mundos me leva, senhor meu salvador?'



A elegância viril dos ciprestes e dos cedros pontuando a paisagem em contraponto
com a sinuosidade feminina dos socalcos, toda ela refegos e folhos gentilmente trabalhados à mão


'Agora vamos para a beira do rio e vamos almoçar, vai gostar' e enquanto desciam para Ferradosa e Ana se ia deslumbrando com a paisagem, Tomás disse: 'Agora, ao almoço, conto-lhe, então, um pouco da minha vida e, a seguir, conta-me a Ana de si.' 

Ana estremeceu por dentro.


***

E é isto, por hoje, meus Amigos.

Relembro que se quiserem ler esta história (que me está a levar para caminhos inesperados) poderão procurar 'Ana muda de vida' nas etiquetas aí de lado, lá mais para baixo. 

Tenham, meus Caros, um belo sábado. 

Apreciem o que vos rodeia, apreciem a vida, apreciem cada pequena coisa. 
Há milhares de coisas boas para serem vividas. E, se as não têm à mão e não as podem procurar, então, não faz mal: sonhem, imaginem - também é bom.

sexta-feira, maio 18, 2012

Ana e Tomás vão de férias, juntos - e, excepcionalmente, a ficção e a realidade misturam-se. (É da magia do lugar, meus amigos...)


Música, por favor

Banda sonora de Braveheart





Ana estava de novo numa encruzilhada. A imprevista visita do seu amigo veio agitar as suas calmas águas. Além disso, do lado de lá do telefone, todos os dias lhe pediam que voltasse ou, pelo menos, que desse autorização para ser visitada. A curiosidade do lado de lá estava a dar lugar à impaciência, à incompreensão. 

Não é de um momento para o outro que se vira costas a uma vida preenchida e feliz. Tinha querido afastar-se para pensar em paz, sem pressões, sem chantagens emocionais, tinha também resolvido dedicar-se a coisas simples, a coisas terrenas e palpáveis farta que andava de coisas complexas e, tantas vezes, aparentemente intangíveis.

E, no entanto, aquilo que deveria ser não mais que um hiato, vinha progressivamente a conquistar espaço na vida de Ana.

Era a expansão das vendas, o aumento do emprego na vila que atraía gente de fora para arranjar trabalho, era o aumento de investimento (inclusivamente, tinham pedido a Ana para dar opinião sobre a construção de um hotel e Ana estava tentada a propor sociedade pois sentia que havia, do outro lado, também vontade disso), era o sucesso escolar e o envolvimento empenhado da escola, era o ambiente receptivo das pessoas com quem lidava, e era a amizade com Tomás, o carpinteiro - tudo a motivava e prendia a esta vila, a esta nova vida.

A carpintaria tinha-se expandido desde que tinham formado a empresa de arranjo de interiores. Tomás tinha agora alguns aprendizes e até tinha convidado um velho marceneiro para ajudar a enquadrar os jovens inexperientes. Trabalhava bastante e como vivia sozinho e amava o seu trabalho, ficava sempre até tarde na carpintaria. A forma como ele passava a mão pela madeira até a sentir macia, a forma como desbastava, afagava, polia a madeira deixava Ana maravilhada. Não se cansava de o observar, com encantamento e respeito. Nas suas mãos a madeira era um corpo moldável, um corpo que não oferecia resistência.




Habituado durante anos ao silêncio, o carpinteiro ao princípio tinha estranhado as invasões de Ana mas, vendo que ela respeitava os seus silêncios e gostava de ouvir as suas deambulações pelos caminhos secretos das palavras, começou a habituar-se e já se inquietava se ela se atrasasse. 

Ana sabia que essa amizade era comentada na vila mas isso não a incomodava nem um pouco. Tomás era livre e ela sempre se tinha sentido, também, uma mulher livre. E, se o não era oficialmente, isso não coarctava os seus movimentos. Claro que numa cidade grande os movimentos de uma mulher quase passam despercebidos, enquanto num meio pequeno tudo se sabe. Mas o facto de se saber o que quer que fosse, não incomodava Ana. Era a dona exclusiva do seu destino e fazia questão de o demonstrar. Além disso, sempre tinha achado que só é atacado quem mostra medo.

Desde que estava na vila ainda não tinha tido férias. E, assim, um dia pediu ao dono da oficina se poderia ter três dias, precisava de descansar. O dono riu-se, 'claro que sim, ora essa, nem precisava de pedir'.

E, portanto, ao fim do dia, Ana perguntou a Tomás se queria ir mostrar-lhe a sua terra natal. Tomás riu, 'que ideia...', irem os dois? Ana disse que, 'claro, os dois, a menos que queira levar mais alguém....' Tomás sorriu. Depois lembrou que não tinha carro e que há anos que não conduzia. Ana disse que isso, obviamente, que não era problema.



E assim, numa manhã quente, lá foram. Ana ia toda animada, parecia uma adolescente. Tomás, sempre mais sério, ia inquieto. Será que aquela mulher percebia que o efeito que produzia nele? Será que percebia que cada vez lhe custava mais passar sem a sua presença?

Parecia que não. 

Ana conduzia e, a seu lado, Tomás ia calado. Ana colocou o rádio na Antena 2. Depois perguntou-lhe se ele se tinha lembrado de trazer um livro para lhe ler durante a viagem. Tomás tirou um livro da mochila. Disse: 'Para o sítio que a vou levar a ver, tem que ter os olhos em bom estado, tem que conseguir ver tudo muito bem. E, ao ver, talvez o coração se lhe agite. Por isso o coração também tem que estar muito bom. Por isso, vou ler-lhe conselhos médicos - mas não uns quaisquer. Escute com atenção.'

E leu:

Os olhos são órgãos brilhantes, redondos e radiosos, cobertos por sete túnicas e três humores. Os olhos são as janelas da alma, para se verem através deles, como por uma varanda, as cores e as figuras. Faz-lhes bem (...) olhar para as montanhas e a verdura.

O seguinte faz mal aos olhos. Choro, fome, jejum, (...), toda a embriaguez e excesso. Sono demasiado depois das refeições e vigílias imoderadas. Canto em demasia e coito frequente.

O coração é um órgão côncavo, cavernoso em baixo, amplo em cima, e é o termo de todas as operações da alma racional (...). As operações do espírito começam no cérebro e recebem o seu complemento no coração.

Eis o que faz bem ao coração. Canto aprazível e alegria moderada. (...) E todo o cheiro aprazível que há nos pomares e prados, na estação da primavera, faz bem aos melancólicos e cardíacos.

Coisas que fazem mal ao coração. A inchação, tristeza, preocupações e qualquer causa que provoca a síncope. Excesso de estudo e muita meditação, coito frequente e tudo o que fizer mal ao baço faz mal ao coração. (...) E o que quer que faça a alma entristecer-se, porque o coração é o princípio da vida e o termo da morte.

Ana ria-se. E depois brincou: 'Há uma coisa que faz mal quer aos olhos, quer ao coração...'. Tomás riu-se também: 'Não acredite em tudo o que ouve e, de qualquer maneira, a ciência evoluíu muito desde que este tipo escreveu isto'. Ana concluíu: 'Seja como for, como vamos ficar em quartos separados, não corremos riscos...'. Tomás não se ficou: 'Não vejo o que é que uma coisa tem a ver com outra e, além disso, dois quartos com esta crise...?'. Ana virou a cara, espantada: 'Não lhe conhecia essa veia malandreca, Tomás...'.

Depois Ana pediu-lhe de novo que ele lhe falasse de si, que contasse a sua história. Tomás disse que o faria no dia seguinte e apenas se Ana fizesse o mesmo. Mas, entretanto, animados com a conversa, nem tinham dado pelos quilómetros a passar e estavam a chegar ao destino. Pararam e saíram do carro.

Ana, então, ficou sem palavras. Era uma beleza quase excessiva.


S. Leonardo da Galafura

Tomás passou o braço sobre os ombros de Ana e leu as palavras de Miguel Torga: 

'O Doiro sublimado. O prodígio de uma paisagem que deixa de o ser à força de se desmedir. Não é um panorama que os olhos contemplam: é um excesso de natureza. Socalcos que são passadas de homens titânicos a subir as encostas, volumes, cores e modulações que nenhum escultor, pintor ou músico podem traduzir, horizontes dilatados para além dos limiares plausíveis da visão. Um universo virginal, como se tivesse acabado de nascer e já eterno pela harmonia, pela serenidade, pelo silêncio que nem o rio se atreve a quebrar, ora a sumir-se furtivo por detrás dos montes, ora pasmado lá no fundo a reflectir o seu próprio assombro. Um poema geológico. A beleza absoluta.'

E era assombro o que Ana sentia, as lágrimas quase a saírem do coração para lhe toldarem o olhar.


S. Leonardo da Galafura por Miguel Torga

Ana tinha chegado, pois, às terras detrás dos montes, às terras mágicas, imaginadas pelos poetas, desenhadas linha a linha pela inocência mais genuína dos homens de coração puro como Tomás.

Ana estava deslumbrada. Ao ver esta terra pelos olhos de Tomás descobria o mundo virginal de Miguel Torga. Uma beleza imaterial, longínqua e, no entanto, ali, envolvendo-a, uma beleza absoluta, uma imensidão de verde e azul. Um espaço limpo, de imensa pureza.


O Douro Vinhateiro, Trás os Montes, espaço de paz, de imensidão, de beleza e silêncio

Tomás tinha os olhos brilhantes e, através deles, via Ana também emocionada. Que força misteriosa vinha daquela terra que se desdobrava ali, a seus pés, em montes e montes e outros montes...! 


Quando o sol já se punha e os montes quase se douravam, um grande pássaro
saíu dos montes para voar, para reinar, silencioso e  sublime, sobre o Douro que se tinha posto prateado


Tomás puxou a mão de Ana, 'Olhe. Não são só as gaivotas que voam sobre os rios... Olhe este grande pássaro, repare nas grandes e fortes asas'. 'Que beleza, que beleza, meus Deus...', disse Ana num fio de voz. 'Que lindo que tudo isto é, Tomás, que lindo... '

Depois foram para o hotel, cada um para o seu quarto. Mas, passado um bocado, Ana foi bater-lhe à porta: 'Empresta-me aquele livro que vinha a ler, o dos cuidados médicos?'. Tomás apontou para a varanda, 'está ali, estava a lê-lo'.


'A caneta que escreve e a que prescreve - doença e medicina na Literatura Portuguesa',
organização de Clara Crabbé Rocha --- na varanda do quarto do hotel

Ana foi buscá-lo e disse, sorrindo com ar malicioso: 'Então, sendo assim, vou ler que é para ver se amanhã tenho os olhos e o coração em bom estado...'.


***

O trecho em itálico pertence ao livro acima referido e é da autoria de Pedro Hispano, c. 1210-1277.

***

E, por hoje, é isto. Tal como refiro na resposta aos comentários de ontem, li-os, claro que li!, com atenção e carinho mas, porque estou de férias e com um programa apertado e porque, como de costume passa das 2 da manhã e tenho que apagar a luz (... não, eu não estou num quarto sozinha...), não poderei responder individualmente, como gosto, a cada um dos comentários. As minhas desculpas.

E tenham, meus Caros, uma esplêndida sexta feira... porque eu, bem, eu não me posso queixar, não é? ... Por aqui ando, atrás da Ana e do Tomás, a segurar a vela e a servir de narradora o que, dado o local que eles escolheram, me deixa encantada.

Finalmente, aos meus Leitores que me fizeram ter esta enorme vontade de vir (re)descobrir esta terra de uma beleza indescritível, o meu muito, muito, sincero agradecimento.

quinta-feira, maio 17, 2012

Ana e o carpinteiro na noite de todas as palavras


Música, por favor
Johann Strauss - Valsa de Viena





Na noite do baile, Ana dançou com o altivo carpinteiro (que surpreendeu toda a gente, de tal forma estava outro), dançou com o dono da oficina, com o presidente do município, com o rapaz das tintas e com vários outros pares. Se as mulheres a olhavam de soslaio, enciumadas pelo interesse que ela despertava nos homens, era coisa que não a afectava. Se falavam veladamente sobre algum possível romance com o carpinteiro, era coisa que também não lhe despertava qualquer interesse. Sempre fez o que quis, tendo como únicas preocupações o não magoar ninguém e o agir de acordo com a sua consciência. Se queriam comentar, censurar, especular, era coisa que não a preocupava minimamente. Sempre assim fora, não era agora que ia mudar. Se tivessem alguma coisa de relevante a dizer, que lhe dissessem a ela; se consideravam que era irrelevante e preferiam falar pelas costas, melhor, era da maneira que não a maçavam.

Naquele ambiente de baile e festa, Ana sentia que o carpinteiro estava talvez pouco à vontade mas era um homem orgulhoso, que respirava dignidade e, portanto, disfarçava muito bem a insegurança, ostentando altivez  e indiferença. Ana apreciava muito a atitude, e, por vezes, atravessava o salão de braço dado com ele, mas com naturalidade, deliberadamente mostrando que não tinha nada a esconder.

Mas, sem saber porquê, estava um bocado inquieta. Talvez sentisse que aquela fase da sua vida estava a chegar ao fim, talvez sentisse saudades do que tinha deixado para trás, talvez a visita do outro dia a perturbasse, talvez não quisesse pensar na ideia de deixar a vila, estas pessoas tão afáveis, talvez lamentasse afastar-se do altivo carpinteiro - não sabia, era uma inquietação difusa.

No final do baile, o carpinteiro foi levá-la a casa. Ana convidou-o a entrar. Tenso, sem perceber bem qual o intuito e pensando também que no dia seguinte não se falaria noutra coisa, lá entrou.


Música, de novo, por favor

 Bach, Misha Quint interpreta Air in the G String





Foram para o quintal, Ana escolheu uma música, depois foi pôr-se mais à vontade, arranjou um sumo fresco para cada um. 'Conte-me alguma coisa de si', pediu-lhe.

'Não sou disso, de conversas. Nem tenho nada a contar; mesmo que quisesse, não tenho nada, é tudo muito normal, sem interesse', disse em voz baixa o carpinteiro. Estas intimidades deixavam-no muito pouco à vontade.

'Tem, com certeza que tem, conte-me algumas coisas da sua vida, gosto de ouvir... conte-me...', Ana insistiu, queria mesmo escutar uma conversa mansa, lenta. Conversar sem pressa tranquilizava-a. Apetecia-lhe imenso ouvir a voz do carpinteiro, apetecia-lhe imenso ouvir uma conversa vinda da alma. 'Pode ser uma recordação marcante, memórias de outros tempos, ou então, fale de coisa nenhuma, ou do que pensa quanto está na carpintaria a afagar a madeira, qualquer coisa'.

Então ele começou na sua bela voz profunda, e a fala fluía, densa mas intangível: Aquilo de que me lembro (num presente que me parece também já passado) está cheio não só de estranhezas e improbabilidades mas igualmente de vazios, de hesitações e imprecisões, pois se calhar não me recordo de factos mas da minha recordação deles. Pode por isso suceder que o que recordo não seja o que ouvi; ou que o tenha ouvido a outra pessoa, noutro lugar, noutras circunstâncias; ou mesmo que o tenha eu próprio sonhado ou imaginado. Ouvi e li muitas coisas desde a minha distante primeira viagem ao estrangeiro, onde tudo (pelo menos aquilo de que me lembro) começa. Talvez, quem sabe?, nem essa viagem tenha acontecido, ou eu a tenha lido, ou ouvido contar a alguém. A matéria da memória é indefinida e insegura e nela, como na matéria da vida (e a vida é provavelmente apenas memória), se confundem acontecimentos e emoções, imagens e conjecturas, cuja origem nem sempre nos é dado com clareza reconhecer e cuja finalidade a maior parte das vezes nos escapa. E, no entanto, é tudo o que temos, memória. Lembro-me, pois, como quem procura alguma coisa ou alguém, e amparo-me por isso cuidadosamente às minúcias como se caminhasse sobre um chão incerto ou como se receasse perder-me. Porque é talvez a mim mesmo (isto é, à minha memória) a quem, tantos anos depois, falo daquilo que me lembro.

Ana ouvia-o abismada, imóvel e em silêncio, não fosse a magia do momento perder-se. Ele falava baixo, era uma toada, e as palavras soavam a Ana como uma estranha música em que finalmente tudo parecia fazer sentido. A memória, o sonho, a interiorização, a matéria das emoções, a beleza das palavras puras, o assombro.

Ana sentia que as lágrimas estavam prestes a saltar-lhe tal a emoção que sentia. Não conseguia falar.

E o carpinteiro continuou falando assim e Ana sentia-se embalada, num colo, num berço macio.

Depois, já muito tarde, já toda a inquietação tinha saído do seu corpo, estava já ela tapada com uma manta e o carpinteiro ainda dizia, falando, então, da solidão na sua carpintaria:

                                O dia sobe sobre os surdos ruídos da casa
                                sobre os calendários que ninguém teve tempo de
                                tirar das paredes e agora prolongam nos nossos olhos
                                paisagens de rios e açudes que nunca
                                existiram em lado nenhum a não ser
                                na saudade que alguém há-de ter deles
                                pelo meio de uma infância de aldeias
                                morrendo ao sol


                                e abrimos os livros que tínhamos deixado
                                nas estantes cobertas de silêncio


                                e agora escorre a noite pelas paredes
                                desta casa que a tua ausência torna
                                subitamente    enorme

mas, então, já Ana tinha adormecido, já não ouviu a última parte. E vendo-a assim, aninhada e adormecida, o carpinteiro pegou nela com muito cuidado e levou-a ao colo para o quarto. Depois tapou-a com carinho. Quando ia a sair, voltou atrás e deu-lhe um beijo na testa, chegando-lhe o cabelo para o lado.

****

O texto em prosa em itálico é um excerto do livro 'Os papéis de K.' de Manuel António Pina e o texto em itálico mas em poesia é um excerto de um poema de Alice Vieira pertencente ao livro 'O que dói às aves'.

E, já agora: hoje, lá no meu Ginjal e Lisboa as minhas palavras são confessionais e voam em volta do meu amor e de um poema de Maria do Rosário Pedreira. A música é de Donizetti.

Desculpem que me repita: caso tenham aterrado agora aqui e queiram ler a história de Ana desde o princípio, poderão procurar 'Ana muda de vida' nas etiquetas aí ao lado, mais para baixo.

****

E, já sabem, desejo-vos, meus Caros Leitores, uma belíssima quinta feira. 

Aproveitem bem cada pequeno instante da vossa vida. E, claro, divirtam-se, está bem?
                            

quarta-feira, maio 16, 2012

Ana e os homens


Música, por favor

Katie Melua - Lucy in the sky with diamonds
(As versões dos Beatles que encontrei estão interditas para incorporação nos blogues)


Ana, chegou, portanto, bastante atrasada à oficina. Fosse porque estivesse com um brilho especial nos olhos, um resto de rubor no rosto, talvez um vestígio de malícia na forma como, sem querer mordia um pouco o lábio ao recordar-se do que se tinha passado ou, mais simplesmente, porque as vizinhas já tivessem feito correr a notícia, a verdade é que mal entrou, todas as outras mulheres a olharam pelo canto do olho tentando perceber o que se teria passado, querendo adivinhar se Ana estava feliz, assustada, se estaria prestes a ir-se embora, enfim, tentando descobrir qualquer coisa; talvez o mistério de Ana estivesse prestes a ser desvendado.




Ana percebia o que se passava, compreendia a curiosidade e imaginava o que pensariam aquelas mulheres tão habituadas a uma vida regular, tranquila, boa. Quase adivinhava as conversas à volta do homem do carrão, talvez o tivessem reconhecido, deveriam referir  e trouxe-lhe um ramo de rosas e tudo... e meteram-se em casa... E deveriam interrogar-se quem será? o ex-marido, algum antigo namorado? quem?

Ana ria-se interiormente mas o sorriso transparecia. Lançou então: 'Já vos falei do meu irmão?' e reparou como elas se viraram num ápice e Ana pensou que elas sentiam que estava desvendado o segredo, ah afinal era o irmão... E Ana continuou: 'É professor universitário, está nos Estados Unidos, só cá vem nas férias' e elas arregalavam os olhos mas...afinal...? é ou não é...?  e ela continuava 'e eu vou lá uma ou duas vezes por ano, estou a pensar ir lá para o mês que vem'. E não conseguiu esconder a vontade de rir, com a curiosidade baralhada que se espelhava, agora, no rosto das colegas ah, não é o irmão... mas então quem é...? o amante, mais que certo...

Mas onde a coragem para perguntar...? 

Uma ainda arriscou: 'Veio mais tarde... Aconteceu-lhe alguma coisa?'. 

Ana olhou-a nos olhos, depois olhou as outras e disse: 'Um grande amigo conseguiu descobrir a minha morada e apareceu para me fazer uma surpresa. Bem, descobriu é uma maneira de dizer. Parece que um ex-espião não só lhe enviava um resumo das notícias como pôs os ex-colegas a espiar-me.'

As mulheres olhavam de olhos arregalados. Não sabiam se haviam de acreditar pois Ana parecia falar a sério. Ana continuou: 'Não sei que raio de espiões são aqueles que, pagos por nós, andam para aí a coscuvilhar a vida dos outros, armados em detectives de meia tigela. Uma anedota estes serviços secretos.'

Mas depois achou que as colegas mereciam mais do que meias-palavras, do que brincadeirinhas, e acrescentou: 'Estou a brincar, enfim... acho eu. Não sei como é que ele me descobriu. Mas descobriu-me. Vim para cá, entre outras razões, também para me afastar dele e das confusões na minha vida das quais ele fez parte. Mas, tenho que vos confessar: gostei de o rever. Gostei que ele não tivesse obedecido à ordem que lhe dei por carta, quando para cá vim. Gosto de homens que não me obedecem.' E não disse mais nada, baixou os olhos, entregou-se ao bordado.

As mulheres perceberam que o assunto estava encerrado, não perguntaram mais nada. De resto, não estavam habituadas a histórias assim, nem sabiam como continuar a conversa com Ana. Haveriam depois, entre elas, de tentar perceber o que queria tudo aquilo dizer.

Nesse dia, depois de ter saído da oficina, de ter mudado de roupa, de ter feito os seus telefonemas, Ana fez a refeição do dia a contar com o almoço do dia seguinte mas, antes de jantar, saíu.

Foi com a roupa confortável com que estava em casa. Atravessou a vila e dirigiu-se à carpintaria. Se o carpinteiro não estivesse lá, bateria na porta ao lado, onde ele dormia.

Mas ele ainda lá estava, trabalhava sempre até tarde. Como de costume ouvia música e fumava.


Música, de novo, por favor
Ryuichi Sakamoto - Solitude 


Ana entrou, ele continuou a trabalhar.




Ana começou então a falar: 'Daqui por duas semanas é o baile que estamos a organizar para recolher fundos para os miúdos com dificuldades em prosseguir os estudos. Preciso de um par e lembrei-me de si. Aceita?' e sorriu com vontade que ele aceitasse.

O carpinteiro olhou-a nos olhos: 'Não brinque comigo. Sou solteiro porque nunca me quis casar mas sou um homem igual aos outros. Não brinque comigo'

Ana não se admirou da reacção. 

E continuou: 'A minha vida tem sido muito boa. Não me queixo de nada. Mas não suporto ter que dar explicações, não suporto fazer o que quer que seja apenas para estar de acordo com as convenções porque não quero saber de convenções. Fui tendo tudo aquilo a que me propunha até que cheguei a um ponto em que apenas me apetecia recomeçar, partir, de novo, do nada. Tive amores, tenho amores. Mas cansei-me, não quero dar explicações porque também não as peço.'

O carpinteiro tinha parado de trabalhar e ouvia-a. Ana continuou: 'Tenho saudades, claro que tenho. Mas não quero voltar à vida que tinha. Vim para aqui para espairecer, para arejar a cabeça, para fazer umas férias mas até sair de casa não sabia ao certo para onde iria. Como não me imagino estar sem nada que fazer, à última hora resolvi fazer umas férias diferentes, lembrei-me de vir até aqui, estar tranquila, bordar, trabalhar no meio de outras mulheres e estar numa casita alugada, simples. Mas comecei a gostar. Comecei aqui quase do zero, sozinha. E só não digo que comecei do zero porque tinha dinheiro para gastar. Mas gostei de arranjar uma casa e pô-la a meu gosto, gostei das pessoas. Sem querer, sem quase me dar conta,  comecei a fazer aquilo a que estou habituada: a trabalhar, a dar ideias, a mover-me em equipa, a empreender. E a vila cativou-me, os miúdos, os professores, as mulheres da oficina, a modista, o rapaz das pinturas, o jardineiro. Você também. Gente tão boa, tão boa. Gosto de vocês. São gente aberta, gente franca. Tive que tomar uma série de providências lá, de onde vim, para poder estar aqui afastada. Mas resolvo muita coisa por mail e há os fins de semana e há a paciência das pessoas. Agora já não sei se quero voltar. Não sei mesmo. Mas hoje aconteceu uma coisa de manhã. E agora não sei mesmo o que fazer, nada é simples, nada, nada'.

E a voz era fraca, era uma Ana sem certezas, sozinha, insegura. O carpinteiro olhava-a com alguma surpresa. Depois quase com carinho.

E, então, disse: 'Está bem, pronto, vou'. Ana sorriu-lhe. Depois, quando ia a sair, o carpinteiro perguntou-lhe: 'E o que é que eu levo vestido? Não tenho roupa para coisas dessas'.

Ana riu: 'Nada que não se resolva, não é?'.

Ele abanou a cabeça, com um quase sorriso, esta mulher.... Depois ficou sério, já preocupado com a inesperada carga de trabalhos. E sério com o que lhe ia na alma.

No dia do baile estava irreconhecível. Elegante. Nervoso mas elegante. Toda a gente estava perplexa com o elegante par de Ana. O carpinteiro e Ana faziam um belo par. Ela bela, quase simples na sua elegância natural, ele alto, magro, altivo, sóbrio, muito bonito.




Mas, nessa noite, Ana sentia uma leve inquietação. Estava satisfeita com o sucesso que estava a ser o baile, mas parecia pressentir alguma coisa.


***

Relembro que, caso vos dê para ler esta história de carreirinha, poderão fazê-lo procurando 'Ana muda de vida' nas etiquetas ai ao lado, lá mais para baixo.

E caso também estejam para isso, gostaria de vos ver na praia, lá para as bandas do meu Ginjal e Lisboa. Hoje as minhas palavras mergulham num poema azul de Pedro Tamen e a música de Donizetti, imaginem, está a cargo de duas portuguesas.

****

E é isto, meus Caros. Como de costume já é tarde, já passa das 2 da manhã. Ponho-me a escrever e dá nisto, credo.

Desejo-vos uma quarta feira com surpresas boas, com alegrias inesperadas, se possível com abraços e beijos. E, se não for possível, procurem a beleza e a magia nos livros, nos filmes, na música, na natureza, onde calhar. Divirtam-se, sejam felizes.