Já o contei aqui. Eu era bebé, tinha seis meses, uma leve penugem loura na cabeça, e estava no meu quarto, na minha caminha branca que tinha na cabeceira uma fita com uma lua de prata. E estava a dormir.
A minha mãe estava noutra divisão. Lá fora um cão ladrou e, a seguir, a minha mãe ouviu uma voz de bebé a dizer 'cão'. Assustada a minha mãe foi a correr ver que coisa estranha era aquela. Eu estava acordada e provavelmente a sorrir já que me dizem que eu estava sempre a rir e as fotografias assim o mostram. Depois o cão ladrou e eu disse outra vez: 'cão'. A minha mãe assustada largou a correr a ir chamar a vizinha da casa do lado: 'a menina falou!'. A vizinha disse que podia lá ser, são sons que os bebés às vezes fazem. Mas a minha mãe que não, que eu tinha dito distintamente 'cão'. Vieram as duas a correr e abeiraram-se da cama, queriam que eu repetisse mas eu não. Até que o cão ladrou e eu disse 'cão'. Quando o meu pai chegou encontrou-as assustadas e também não acreditou. Até que o cão ladrou e eu voltei a dizer 'cão'. Logo depois, ia eu ao colo do meu pai visitar a madrinha dele e, quando acenderam a luz, eu disse 'luz'. E toda a gente ficou assustada, um bebé tão de colo. Depois foi um dos meus tios, mais novo que os meus pais, o Manuel, a quem, na brincadeira o irmão e os amigos chamavam Lela. Quando cheguei ao pé dele, disse Lela. Aos poucos foram acreditando que eu estava mesmo a começar a falar. A minha mãe conta que devia eu ter uns oito meses e já dizia tudo, foi comigo ao mercado e eu não me calava, a dizer o nome das frutas e a perguntar tudo. E que as pessoas ficaram admiradas, um bebé de colo, praticamente ainda só com uma penugem na cabeça, a falar assim: 'Mas que idade tem o bebé...?!' e mal acreditavam no que viam.
E contam que eu falava, falava. Perguntava tudo, queria saber tudo e não me calava. Com um sapateiro que trabalhava ao pé da casa de uma das minhas avós ou com o pai de uma que viria a ser minha tia. Eles tinham paciência e eu, sem querer, abusava. Adorava as explicações que eles me davam, a forma como falavam, as palavras desconhecidas que usavam.
A minha mãe estava noutra divisão. Lá fora um cão ladrou e, a seguir, a minha mãe ouviu uma voz de bebé a dizer 'cão'. Assustada a minha mãe foi a correr ver que coisa estranha era aquela. Eu estava acordada e provavelmente a sorrir já que me dizem que eu estava sempre a rir e as fotografias assim o mostram. Depois o cão ladrou e eu disse outra vez: 'cão'. A minha mãe assustada largou a correr a ir chamar a vizinha da casa do lado: 'a menina falou!'. A vizinha disse que podia lá ser, são sons que os bebés às vezes fazem. Mas a minha mãe que não, que eu tinha dito distintamente 'cão'. Vieram as duas a correr e abeiraram-se da cama, queriam que eu repetisse mas eu não. Até que o cão ladrou e eu disse 'cão'. Quando o meu pai chegou encontrou-as assustadas e também não acreditou. Até que o cão ladrou e eu voltei a dizer 'cão'. Logo depois, ia eu ao colo do meu pai visitar a madrinha dele e, quando acenderam a luz, eu disse 'luz'. E toda a gente ficou assustada, um bebé tão de colo. Depois foi um dos meus tios, mais novo que os meus pais, o Manuel, a quem, na brincadeira o irmão e os amigos chamavam Lela. Quando cheguei ao pé dele, disse Lela. Aos poucos foram acreditando que eu estava mesmo a começar a falar. A minha mãe conta que devia eu ter uns oito meses e já dizia tudo, foi comigo ao mercado e eu não me calava, a dizer o nome das frutas e a perguntar tudo. E que as pessoas ficaram admiradas, um bebé de colo, praticamente ainda só com uma penugem na cabeça, a falar assim: 'Mas que idade tem o bebé...?!' e mal acreditavam no que viam.
E contam que eu falava, falava. Perguntava tudo, queria saber tudo e não me calava. Com um sapateiro que trabalhava ao pé da casa de uma das minhas avós ou com o pai de uma que viria a ser minha tia. Eles tinham paciência e eu, sem querer, abusava. Adorava as explicações que eles me davam, a forma como falavam, as palavras desconhecidas que usavam.
Depois foi a ler e escrever. Aos quatro anos, quando entrei para a infantil, já lia e escrevia. Quando cheguei à primária lia correntemente. Uma vez mostrei à professora umas fotografias e numa estava eu a ler a Crónica Feminina. O meu pai tinha-me apanhado a ler aquela revista e achou graça. A professora disse: 'Sabendo já ler, devias ler coisas melhores, isso não presta'. Fiquei incomodada. Gostava tanto de ler a Crónica Feminina. Tal como gostava de ler tudo o que me vinha parar às mãos.
Ainda gosto. Para onde quer que vá, vou com livros.
Mas, se páro na estação de serviço, ponho-me a ver as capas das revistas e, se tiver tempo, até folheio alguma. Se estou parada à espera que me chamem pela minha vez, seja onde for, estou no smartphone a ler o que calhar. Se apanho uma revista qualquer, mesmo que tenha meses, leio-a de uma ponta a outra.
Mas, se páro na estação de serviço, ponho-me a ver as capas das revistas e, se tiver tempo, até folheio alguma. Se estou parada à espera que me chamem pela minha vez, seja onde for, estou no smartphone a ler o que calhar. Se apanho uma revista qualquer, mesmo que tenha meses, leio-a de uma ponta a outra.
Quando era adolescente escrevia cartas a amigas que conhecia em intercâmbios de escolas, em acampamentos, a namorados, a pen friends que não conhecia de lado nenhum. Adorava receber cartas e escrever de volta. Longas cartas.
Aqui é o que se vê, escrevo como se não houvesse amanhã. Mais do que paixão por palavras, é quase um vício. Coisa de nascença, como se viu.
Aqui é o que se vê, escrevo como se não houvesse amanhã. Mais do que paixão por palavras, é quase um vício. Coisa de nascença, como se viu.

Eu, que era omnívora na leitura, agora, tal como na comida, estou cada vez mais exigente. Se já não consigo suportar comida muito puxada, carnes com muita gordura, coisas assim, e cada vez mais gosto de um bom peixe fresco cozinhado muito simplesmente e até pode ser acompanhado só com batatas e feijão verde cozidos, ou de boas saladas, bem temperadas, e fruta de época - ou seja, a simplicidade, o sabor verdadeiro das coisas - nos livros parece que é a mesma coisa.
Tem a escrita que me parecer fluida, simples, genuína. E soar-me-á bem se contiver uma melodia que me leve nos braços ou se for surpreendente e me sacudir o espírito. No fundo, acho que, por um qualquer motivo, deve conter um fio que me conduza pelo caminho das palavras.
Tem a escrita que me parecer fluida, simples, genuína. E soar-me-á bem se contiver uma melodia que me leve nos braços ou se for surpreendente e me sacudir o espírito. No fundo, acho que, por um qualquer motivo, deve conter um fio que me conduza pelo caminho das palavras.
________
Poderia agora enunciar alguns dos livros ou autores que, apesar de muito incensados, eu acho um saco ou quais os que, por estes dias, me têm por companhia -- mas, dado o adiantado da hora, por aqui me fico.
Acrescentarei apenas -- e não serei original ao dizê-lo -- que encontro em alguns blogs as características que me prendem tanto ou mais do que muitos livros que por aí vejo recomendados. Alguns estão aqui ao lado, na minha galeria lateral. Outros não.
Mas o título do post era 'As mulheres que lêem são perigosas?' e acabei por não responder.
Muito sucintamente direi que acho que depende. A maioria será completamente inofensiva. Mas haverá outras que são perigosas. Muito. Cuidado com essas.
Ao longo do texto, as pinturas são, respectivamente, de Gustave Courbet, Berthe Morisot, Raffaello Sanzio, Renoir, Robert Delaunay.
Leonard Cohen interpreta The letters.
Acrescentarei apenas -- e não serei original ao dizê-lo -- que encontro em alguns blogs as características que me prendem tanto ou mais do que muitos livros que por aí vejo recomendados. Alguns estão aqui ao lado, na minha galeria lateral. Outros não.
____
Muito sucintamente direi que acho que depende. A maioria será completamente inofensiva. Mas haverá outras que são perigosas. Muito. Cuidado com essas.
_______
Ao longo do texto, as pinturas são, respectivamente, de Gustave Courbet, Berthe Morisot, Raffaello Sanzio, Renoir, Robert Delaunay.
Leonard Cohen interpreta The letters.
______
Queiram, se para aí estiverem virados, é claro, descer até ao post seguinte: Veneza como nunca antes foi vista.
.......