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quinta-feira, setembro 01, 2016

O cinema e o topless
- ou quando o cinema (e a sociedade) não era moralista e os seios das mulheres não eram maldição a evitar


 Brigitte Bardot e Jane Birkin no filme Don Juan 73 ou si Don Juan était une femme, 1973





Se já soube que havia um Dia do Topless esqueci-me. Pois se nem o dia da mãe eu tenho de memória quando é, fará isto, o dia do topless. Mas parece que há e que já foi.


Leio um artigo e gosto do que leio: por estética, transgressão ou desinibição as mulheres descobrem os seios, em especial no cinema.

Sofia Loren em La Traite des Blanches, 1952
(naõ sei o nome original ou, se passou cá, qual a tradução)

Mas cada vez se vê menos pois as redes sociais parece que vieram para estimular o lado mais populista e primário dos seus aderentes que, sendo aos milhões, se tornam efectivamente numa imensa mole, informe, de moralismo e força de pressão.

Aqui no Algarve, por onde ando, é raro ver alguma mulher em topless, muito menos a fazer nudismo. Circulo por estes dias entre gente que notoriamente não tem nada a ver com os alternativos de Sagres ou o com o de tudo um pouco de Lagos. Aí o topless não é raridade e, em alguns recantos de algumas praias mais solitárias, também se podem ver, com toda a naturalidade, pessoas nuas. Parece-me ser tão normal que uma mulher desnude os seios que aqui me espanto com a sua ausência.

Charlotte Rampling no filme Portier de Nuit, 1974.

Nas televisões - e ainda no outro dia mostrei como a estupidez americana já vai ao ponto de desfocar ou tapar a imagem de seios em obras de arte, mesmo em obras abstractas - já é raro vê-los de forma natural. Por outro lado, por cá - em alguns canais de cabo - passam filmes que são pura pornografia. 

Pois bem, é quase com alívio que, circulando por uma revista online dou com uma homenagem a alguns chamados filmes de culto no qual as mulheres mostraram, orgulhosas, os seus seios.

O dia do topless já foi no dia 28 de Agosto mas penso que os meus Leitores relevarão o meu atraso já que isto das férias me traz alguma indolência suplementar.

Poderão ver toda a escolha aqui mas, para que conste, cá estão cinco magníficas portadoras de cinéfilos seios. A preto e branco, que sempre têm mais patine,

Monica Bellucci no filme Malena, 2000.
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Algum de vocês, meus Caros Leitores, se sente chocado com estas imagens?

Se se sente, lamento (que se sinta).

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quarta-feira, fevereiro 03, 2016

Aquelas que, em tempos, foram mulheres muito belas


Bem, agora que que se ouvem tantas meninas a gritarem que vem aí o lobo e que eu já disse o que tinha a dizer sobre o assunto -- deixando umas sugestões para os senhores que nos governam -- vou intervalar.

De qualquer maneira, a quem não aguentar a espera e quiser já ouvir-me a dar conselhos ao Costa, ao Centeno (que, coitado, tão estafado parece estar, dá ideia de já mal poder com uma gata pelo rabo) e ao Mister Foreign Affair e, tagarela como sou, também a falar do orçamento, de caniches que não largam, de incontornáveis popotas e de galinhas bronzeadas e sei lá que mais, pois que salte já daqui até lá para baixo.

É que, aqui, agora, vou falar de mulheres. Da beleza das mulheres quando deixam de ir para novas. (Hélas, como é o meu caso).

 Jennifer Lawrence, 25 anos, e Jane Fonda, 78 anos -  por Annie Leibovitz para a Vanity Fair, 2016



Silêncio e tanta gente - Maria Guinot


Hoje fui ao supermercado à hora de almoço. Todas as semanas levamos as compras mais pesadas para que a terceira idade não tenha que o fazer. Quando me atraso, o meu marido despacha tudo num ápice: as compras cingem-se ao estritamente necessário. Quando eu vou, dou-lhe cabo do sistema nervoso porque o tempo é limitado e eu, sem querer, perco-me. 

Jane Fonda, 1978

Geralmente, mal o apanho de costas, pisgo-me a ver se há promoções na zona dos cremes. Vejo para que idades são eles recomendados para ver se são mesmo os que eu deveria usar, se apagam as rugas, se eliminam a flacidez, e mais qualquer coisa de que agora não me lembro. Vejo se são de dia, de noite, se são tratamentos reafirmantes, se são daqueles que simulam preenchimento, etc. (O que será a outra coisa de que não me lembro?) Adiante. Depois vou ver os mais caros, para ver as novidades. Um balúrdio. Arrepio caminho e, se estou a precisar, fico-me pelos mais básicos.

Volta e meia encontro na casa de banho do escritório algumas colegas retocando as maquilhagens. Só vejo coisas de marca. Eu não. Abasteço-me na fancaria e, de preferência, no que estiver em promoção. Perdulária só sou com livros (ou coisas para a descendência, claro).

Pois bem, hoje havia promoções das boas, 35% de desconto. Abasteci-me, claro está. Agora já apliquei um creme de noite, dos novos. Com um descontão destes, trouxe um daqueles que, só pela embalagem, a gente já vê que é coisa técnica, certamente mais eficaz do que um lifting.

(Só espero amanhã, quando me vir ao espelho, poder constatar que estou com a cara que tinha aos 15 anos, sem uma ruguinha, pele quase de bebé.)

Helen Mirren, 2016
Tenho na parede do meu quarto, umas fotografias de quando me casei, banhada de sol, eu de calças brancas, justinhas, túnica Augustus branca, quase transparente, com uns bordadinhos brancos, cabelo curtinho, risonha, completamente in love e abraçadinha a um moreno sóbrio parecido com um sírio cabeludo e barbudo. 

Helen Mirren por Lord Snowdon, 1995

Por baixo dessas fotografias coloquei uma minha e uma dele quando tínhamos eu um ano (quase careca, apenas uma penugem clarinha, e toda risonha) e ele com dois (cabelo escuro, muito penteadinho e muito sério).

Volta e meia páro a olhar: eu com 1 ano, eu com 20 anos e, depois, se me olhar ao espelho, eu agora. E tento perceber quantas das minhas células actuais sobreviveram desses meus verdes anos. Penso que já devem ter ido todas à vida e, no entanto, sou eu, a mesma.

Mas os traços da idade estão cá e mais virão. Melhor: tomaram que venham que será sinal que estou viva. E, de resto, com cremes milagrosos, quem sabe se não parecerá que cristalizei no tempo, sempre com carinha de vinte anos.

(Estou a brincar, bolas, não quero parecer um fóssil, senão, às tantas, ainda me confundiam com a Senhora Dona Lady).

Diane Keaton por Annie Leibovitz, 2016
Diane Keaton, 1985
Dantes eu pensava que as mulheres eram bonitas quando eram novas e que, depois, eram o que tinha sobrado. Agora já não penso assim. Agora já acho que há beleza em todas as idades. Além disso, quando me distraio, logo penso: olha, de qualquer maneira uma mulher aos 70 ainda é capaz de parecer toda gira aos olhos de um homem de 80. Mas é um pensamento parvo, claro, até porque o que não faltam são mulheres que despertam paixões em homens bem mais novos.

E o que se passa com mulheres, passa-se com homens. Contudo, a pele dos homens parece que resiste melhor ao passar do tempo. Ou, então, sou eu que sou mais benevolente com eles. Mas que os homens ficam mais interessantes, mais inteligentes, melhores companhias, isso é inquestionável -- isto, claro, se não ficarem velhos babacas, taralhoucos.

Mas volto às mulheres para referir aquilo que verdadeiramente penso a propósito disto: interessantes são as mulheres que não têm medo de parecer velhas, feias, sem graça. Interessantes são as mulheres que amam a vida e a querem viver, toda, tenham a idade que tiverem. Interessantes são as mulheres que ousam, que desafiam, que seduzem. Interessantes são as mulheres que gostam do seu corpo, que querem amar e ser amadas. Interessantes são as mulheres que têm prazer em despertar interesse e que estão disponíveis para se interessar pelos imprevisíveis instantes de felicidade que a vida tem para oferecer. Tenham 20, 40, 60 ou 80 ou mais anos.

Charlotte Rampling por Helmut Newton, 1974

Charlotte Rampling, Annie Leibovitz, 2016


Mulheres brancas e pretas, sempre belas em qualquer idade

As mulheres que dão cartas em Hollywood - por Annie Leibovitz para a Vanity Fair  2016

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Hoje, quando cheguei aqui à sala vinha numa de falar de um certo lobo com um filósofo à mistura. Mas, depois de umas boas charutadas (vide post abaixo), nada como dar uma espairecida e, por isso, desviei-me para isto das mulheres. A ver se amanhã venho, então, de lobo pela mão que agora, com o sono com que estou, vou mas é pregar para outras pradarias.

Caso estejam fartos de tanta mulherada, aceitem o meu convite e venham dar vivas a Portugal, enquanto as maria-amélias suspiram de saudades pelos algozes. É já aqui abaixo.

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domingo, janeiro 31, 2016

Uma mulher que ama mulheres, uma faiseuse d’images


No post abaixo falei de uma rapariga diferente. Claro que, quando se diz que alguém é diferente, se deve dizer em relação a que é que ela é diferente. Pois bem, direi que a sua vida é diferente da da maioria das raparigas que conhecemos, que o seu mundo é diferente do mundo que conhecemos. E, no entanto, tão intrinsecamente igual a todos nós, ela. E o mundo em que vive tão perto de nós. 
Que me tenham ocorrido as palavras de um físico que fala como um poeta talvez não seja mera coincidência.
Há coisas que me comovem mesmo. Mais do que um murro no estômago é como se uma mão puxasse por mim. Mas isso é a seguir. 

Aqui, agora, vou falar da fotógrafa de que ontem queria falar. Já outras vezes aqui a tive, de visita a Um Jeito Manso mas é sempre muito bem vinda. Bettina Caroline Germaine Rheims é francesa, nascida de uma família ligada à arte, é casada e fez há cerca de um mês 63 anos.

A sua vida tem sido dedicada à fotografia mas, maioritariamente, à fotografia de mulheres. E, quando não fotografa mulheres, fotografa a ambição de o ser ou o paradoxo dos géneros que se confundem.

Charlotte Rampling, por Bettina Rheims

Mas, para nos acompanhar vamos ao som de uma inesperada aventura: 
a fusão entre a Lacrimosa de Mozart e o Hello de Adele. 


Há gostos que são paixões e paixões que se tornam vícios. A escrita é um deles. A fotografia é outro. Não sendo eu senão uma amadora acidental de qualquer destas artes, não poderei sequer trazer-me para dentro de um texto em que se fala de uma mulher que vive de e para a fotografia, que conhece os meandros do mundo da fotografia, que reinventa a condição feminina a cada fotografia que faz. Mas não estou a trazer-me para me comparar: apenas quero dizer que reconheço nas suas obras o prazer enorme de fotografar. Mais: o prazer da procura do momento perfeito em que tudo parece convergir.

Kristin Scott Thomas playing with a blond wig,
Bettina Rheims

Fotografar alguém não é fácil. O resultado é da responsabilidade de quem fotografa e de quem se deixa fotografar. 

Eu que faço fotografias em quantidades escandalosas e que me deixo encantar por tudo e por nada e que adoro fotografar pessoas, apenas me sinto motivada a fotografá-las quando não sabem que as estou a fotografar ou, então, em ambiente normal, sem poses, sem preparação. Não me dá para pedir às pessoas para rirem, para dizerem cheeeeese, para se virarem para aqui ou para ali. Se alguém está com sol na cara e eu gosto, então é assim mesmo, com o rosto banhado pela luz, que farei a fotografia. Se alguém está com sombras no corpo e eu penso que a sombra parece tatuar-se na sua pele, então é isso que eu a quero captar pelo que jamais me ocorreria dizer, saia daí porque está com sombras. 

É a naturalidade que me atrai nos objectos fotografáveis. Por isso, anulo-me, coso-me contra as paredes, espio de longe -- de modo a que a minha presença em nada perturbe a espontaneidade do que fotografo, sejam pessoas, gatos ou paisagens.

Breakfast with Monica Bellucci, Bettina Rheims

Por isso, admiro as pessoas que conseguem fazer fotografias encenadas e em que a fotografia capta a beleza do momento sem que se sinta que há algo forçado ou artificial. Mais: admiro quem consiga imaginar uma pose ou uma situação em que o que resulta é uma história ou a imagem de uma persona que representa uma cena.

Monica Bellucci, uma mulher sensual, cujo rosto e corpo remetem para o prazer dos sentidos aparece, na fotografia de Bettina, como a pecadora apanhada em falta, toda ela gula, sensorialidade, vontade de mais. 

Kristin Scott Thomas, a versátil artista, que tanto nos aparece frágil ou corajosa, santa ou pecadora, aparece, sob a lente de Bettina, desfazendo-se de uma cabeleira loura, mostrando que, de disfarces, se faz a sua carreira e a sua imagem.

Madonna por Bettina Rheims

Madonna, a provocadora, a que não teme rótulos, anátemas, censuras, aparece na fotografia de Bettina como a irreverente, a pronta a tudo, aquela para quem não há limites nem no vestuário, nem nos comportamentos, nem em nada. Cansada depois de uma noite de excessos, descansando depois de um concerto, não o sabemos, mas até da incompreensão das suas quase excessivas encenações se tem feito a vida de Madonna.

Charlotte Rampling, quando era mais nova, era bem a imagem da sedução sofisticada, do convite à partilha de momentos vividos numa intimidade cheia de mistérios, com algum toque de rebeldia, de elegante desafio. Assim a soube captar Bettina Rheims. 

Catherine Deneuve por Bettina Rheims
Catherine Deneuve, bela, discreta, dela se dizia que era fria, apática. Ou que facilmente se poderia tornar uma mulher submissa. E, no entanto, como Belle de Jour apareceu-nos como uma mulher capaz de procurar os prazeres proibidos durante as tardes de tédio. Bettina trouxe-a misteriosa, bela, sofisticada -- mas sobre uma cama, seios acessíveis.

Todas elas sabiam que Bettina as olhava através da câmara e, apesar disso, não se inibiram. Mostraram-se tal como ela as imaginou e, no entanto, aparecem inteiras, entregando o seu rosto ou o seu corpo à imaginação da fotógrafa e de quem viesse a contemplar a fotografia. Há coragem em quem se deixa assim fotografar tal como há em quem pede a alguém que se vista de uma determinada maneira, que se coloque numa determinada posição ou que olhe para a câmara de uma determinada maneira. Os retratos de Bettina têm isso: a cumplicidade entre a fotógrafa e quem se deixa fotografar é evidente.

Mas Bettina Rheims não fotografa apenas mulheres célebres nem faz apenas fotografias para grandes marcas como a Chanel ou a Lancôme. 



Não. Ela tem feito outras séries. Começou por fotografar mulheres que faziam striptease. ou acrobacia. 


Noutra altura fotografou mulheres que, de alguma forma, aludiam a motivos religiosos, I.N.R.I. e, como seria de esperar, a polémica foi grande.


Outra série dedicou-se à androginia ou à transsexualidade, Modern Lovers e Gender Studies


Em Heroínes, quis trazer a escultura para o terreno feminino. Mas quis vestir as mulheres com modelos originais. usou modelos famosos. E o resultado foi surpreendente.


Noutra, Chambre Close, um livro feito em parceria com um novelista, Bettina dedicou-se a mulheres que se aborrecem em casa e, que, sem saber o que fazer com o tempo vazio, se entretêm com o seu próprio corpo. Pretendia parodiar a pornografia mas o resultado foi uma interessante mostra do erotismo a solo.



E outras. Ou mulheres anónimas. Muitas. Em qualquer das séries, o interesse que o género feminino é evidente: Bettina Rheims não se cansa de olhar as mulheres e de mostrar a sua diversidade, de mostrar as muitas naturezas que podem encarnar ou encenar, de espreitar os mecanismos da sedução ou da solidão. E as mulheres que ela fotografa deixam-se mostrar, deixam que ela as tente desvendar. Bettina é uma mulher que gosta de mulheres - e é uma excelente retratista, uma talentosa fazedora de imagens.

Maison Européenne de la Photographie, um local de culto da fotografia, em Paris, tem desde dia 28 de Janeiro e até 27 de Março uma exposição de Bettina Rheims.

É do texto do site que o anuncia que retiro estas belas e justas palavras

L’œil de Bettina Rheims embrasse les transgressions et abolit les conventions pour révéler l’intimité la plus profonde et la plus universelle. Dès lors, c’est un jeu de miroirs qui s’enclenche…
Bettina Rheims s’est approprié les codes de la photographie de nu pour les détourner et placer la question de la féminité au cœur de sa pratique. Elle met en danger autant qu’elle sublime la beauté de ces modèles. Mises à nu, vacillantes ou triomphantes, elles bousculent et intimident le spectateur.
Portraitiste brillante, Bettina Rheims a su imposer dans l’imaginaire collectif les visages qui peuplent son monde. Bettina Rheims est avant tout une faiseuse d’images, qui défend dans sa pratique une tradition picturale séculaire. La plupart des photographies de Bettina Rheims témoignent de cet héritage, par un travail sur la composition et la narration notamment.
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Por falar em mulheres, permitam que relembre que, já a seguir, tenho uma outra mulher, uma mulher muito jovem, que também gosta de ver o mundo através da lente mas, por todos os motivos,  rapariga diferente. Não deixem de a ver, por favor.

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segunda-feira, novembro 03, 2014

Miguel Veiga a Clara Ferreira Alves no Expresso: "Este PSD entristece-me e revolta-me". Bela entrevista (com Charlotte Rampling, Benjamin Britten, Sylvia Plath, Paula Rego, Graça Morais, Júlio Pomar e Mário Eloy - aqui por perto).


No post a seguir a este enviei à Margarida palavras escritas para um poeta, jardins, bichos, flores à beira rio. Tudo para ver se consigo mostrar como gostei do chapéu de rosas que no outro dia me enviou.

Mais abaixo ainda tenho uma história sobre juízes num motel, uma cena no futebol que mete um tal de Macedo e, ainda, uma colagem da Lovely Lídia sobre os banqueiros portugueses.

Mas tudo isso é a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra.









O que é este PSD, o de Passos Coelho? Não é o teu.

Não! Não é o PSD, mas talvez possa voltar a ser o que foi, se mudarem os órgãos dirigentes. É difícil, porque os que lá estão agarram-se com unhas e dentes. Fizeram daquilo a sua vida. Ou melhor, a sua vidinha. É um mundo que me é completamente estranho e, pior do que isso, e não me quero enfeitar, que me repugna.


Entristece-te ver o partido refém de interesses que rejeitas e sem inteligência programática?

Entristece-me e revolta-me. Revolta-me. Andámos nós a dar o coiro ao manifesto para chegarmos a este estado de coisas.


Donde vem esta nova geração? Há quem diga que é um partido de retornados nos lugares dirigentes. Gente que quando chegou de África se sentiu rejeitada por Portugal, estrangeira. Há quem diga que são os apparatchiks que nunca passariam de ínfimos actores no velho PSD. Concordas?

É verdade tudo isso. É a gestão e aproveitamento dos interesses.



Se Sá Carneiro não tivesse morrido o partido teria tido outro rumo?

Tinha, Indiscutivelmente. O Barroso já é um produto híbrido. E no mau sentido da palavra. É o que os franceses chamam "un profiteur". Um aproveitador.


E a figura de Cavaco? Às vezes penso o que teria sido um encontro dele com Sá Carneiro. Uma coisa cómico. O cavaquismo tornou-se o PSD e o país tornou-se o cavaquismo.

Cómica ou trágica. Tens toda a razão. Por incrível que pareça, o PSD tornou-se o cavaquismo. E de que maneira. Cavaco é um elemento espúrio.




Fundaste o PPD. Não me digas que ser expulso de algo que se fundou não traz violência emocional. Amargura?

Claro que traz, mas esta gente que domina o PPD é tão baixa que não me afecta. É gente sem história, sem princípios. Tudo é possível. Se me expulsassem não me fazia mossa. Amargura não, desilusão sim.

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O que acima se escreveu são excertos da entrevista concedida por Miguel Veiga a Clara Ferreira Alves para a Revista do Expresso deste sábado. Miguel Veiga, nascido em 1936 no Porto, é advogado, portuense, fundador do PSD, de que foi vice-presidente, membro de comissões políticas e conselhos nacionais (e recentemente ameaçado de expulsão por ter apoiado Rui Moreira para a Câmara do Porto). Vive na Foz. Gosta de livros, pintura e escultura.


(E, como acima se mostrou, é pessoa de duras verdades. Mas também de grandes amizades. Sobre a sua amizade com Mário Soares diz: Uma indestrutível amizade. Sempre apoiei as candidaturas presidenciais do Mário soares. Sou um amigo e admirador indefectível. É o grande político do século XX. Um internacionalista.]


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O vídeo lá em cima mostra The Night Dances e transcrevo parte do texto que acompanha o vídeo: 

Explore the subtleties of Benjamin Britten's composition for cello through the lens of the American Poet, Sylvia Plath, considered one of the leading cultivators of confessional poetry. Actress Charlotte Rampling reads in French and English, and Sonia Wieder-Atherton performs cello suites of Britten, in a moving performance, the only UK & Ireland date before a 2015 tour.


As imagens que usei ao longo do texto são fotografias que fiz este domingo no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian e mostram respectivamente obras de Paula Rego, Graça Morais, Júlio Pomar e Mário Eloy. Aliás a Gulbenkian fervilha de exposições imperdíveis. A quem possa, recomendo vivamente uma deslocação até lá.





Depois há o maravilhoso jardim. A zona do grande relvado este domingo estava cheia de gente, uma alegria, Claro que há depois os mil recantos para alguma privacidade, leitura sossegada, namoro recatado. Mas na zona mais ampla, o chilreo dos pássaros misturava-se com o riso das crianças. Muito bom.

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Relembro: seguindo por aí abaixo, encontrarão, meus Caros,  mais dois posts que têm de tudo um pouco (Rilke, Pixinguinha, gatos e gaivotas, juízes num motel, o Macedo, etc).


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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela semana a começar já por esta segunda-feira.


quarta-feira, fevereiro 22, 2012

A minha amiga, a empregada dela e...pasme-se, um mail da célebre advogada...!


Há alguns dias que não vos dou conta do que se tem passado com os meus amigos colunáveis. O último dia foi este, caso queiram relembrar.

Retomo onde tinha ficado no outro dia, na sessão de fotografias da minha amiga. 

[Dado que, aparentemente alguma das fotografias da Kristin Scott Thomas - que eu estava a usar por ser pessoa do género da minha amiga - pertencia a um site não recomendado pela Google, não me arrisco a colocar aqui outra e, por isso, vou optar por colocar menos fotografias e usar apenas uma ou outra devidamente inspeccionada. Agora vou usar as da Charlotte Rampling, que também dá alguns ares]

Música, por favor

Natalie Merchant - Nursery Rhyme of Innocence and Experience



Na própria noite em que eu lá tinha estado, ligou-me a minha amiga, que eu tentasse enviar-lhe por mail algumas, que tinha tido uma ideia. Já tarde e más horas, lá seguiram algumas, as melhores. Entretanto retoquei outras,  e resolvi passar depois por lá para lhe deixar a pen. No dia seguinte, ligou-me a dizer que tinha adorado, que nunca tinha percebido que gostava tanto de ser fotografada. Com uma voz que se adivinhava maliciosa, contou-me que queria aproveitar o dia dos namorados para fazer uma surpresa. 

Depois, como se não tivesse relação com o assunto, com ar desprendido, disse-me que a filha ia passar a noite com uma amiga e que ainda tinha que preparar as coisas, que ia ter um jantar decisivo.

Eu ouvi calada, não fosse ela arrepiar caminho e deixar de falar. Quando ela me tinha falado com aquelas pressas ainda pensei que fosse para enviar por mail ao marido mas, surprise, surprise…!, parece que afinal o destinatário é outro. Quem diria?

Perguntei-lhe se o livro do Chomsky era para a mesma pessoa. Riu-se. ‘Não, pelo contrário… essa pessoa é que me sugeriu que comprasse esse livro para oferecer ao meu neo liberal marido…’ e riu, irónica.

‘Amizades de esquerda…?’, perguntei. Ela riu, ‘dessas três palavras, uma não é a mais correcta’ e voltou a rir.

Despediu-se, beijinhos, beijinhos.


Quando lá passei para deixar a pen com as fotografias só encontrei a empregada. Pedi para entrar para deixar um recado escrito e ela veio atrás de mim a dizer que já agora despedia-se, que era o último dia que lá trabalhava, que só andava a aguentar aquilo ‘derivado’ aos miúdos mas que agora até a mais nova se ia embora e que ela já não tinha razão para se sacrificar mais.

Perguntei-lhe que sacrifícios eram esses. Suspirou ‘sabe lá…!’. Que a senhora passa o tempo todo ao computador ou ao telefone, ou então sai e volta aérea, que a única pessoa que lá vai é uma amiga e conversam as duas pelos cotovelos e vêem papéis, e escrevem agarradas ao computador, que não quer saber da casa para coisa nenhuma, que não é capaz de ‘determinar’ sobre coisa nenhuma, nem o que há-de ser a comida, nem nada, que às vezes quase não há nada na despensa nem no frigorífico, que se não for ela a insistir e a ir às compras ninguém come naquela casa, que a miúda até já evita jantar em casa, que ninguém ali se interessa por nada, que esta gente rica é elegante porque não come, se for preciso é só uma sopa e é se ela a deixar feita, que a senhora durante o dia come uma salada e um iogurte e que ela se não trouxer uma bucha de casa a maior parte dos dias não teria nada para comer, que só se preocupam quando recebem pessoas; que o senhor é um vaidoso, quando a encontra é para chamar a atenção para o vinco das calças ou para o brilho dos sapatos, de resto é como se ela não existisse, e que aquilo, trabalhar assim, numa casa tão grande e sem condições e sem ninguém querer saber de nada, é uma chatice; e que a senhora de uma moradia da rua de trás anda a desafiá-la há muito tempo e que ela agora aceitou.

E depois contou que a senhora tem coisas que só visto. Que no outro dia estava toda arranjada como se fosse sair mas que foi para lhe pedir para ela a fotografar, que ainda tirou umas quantas mas que ela não gostou de nenhuma. Falava como se a minha amiga não fosse boa da cabeça.

E lá vi o livro do Chomsky em cima da mesa ao lado do sofá.

Despedi-me, desejei-lhe felicidades e vim-me embora. 

Tudo sorrisos e felicidades e, afinal, como de costume, tudo uma história mal contada. 

Uma anónima, uma máscara em Veneza

Entretanto, o resto da semana passada foi complicado, nem me lembrei deles, não soube de mais nada. 

Eis senão quando hoje de manhã dou com um mail de um endereço esquisito. Abro e fico passada. Dá para acreditar num disparate destes?

Transcrevo para que possam perceber o meu espanto:

Um amigo comum falou-me do que tem escrito no seu blogue. In dubio pro reo - este é um princípio básico no direito. Em caso de dúvida, decida-se a favor do réu. Portanto, nada de fazer julgamentos precipitados sem provas concretas.

Com base numa conversa que não ouviu e nuns papéis que voaram, pressupõe e dá a entender que estamos perante uma situação em que alguém está a enganar não se sabe quem ou, melhor ainda, que estamos perante um escaldante caso amoroso que acaba imprevistamente numa cena digna de um filme de terceira categoria: papéis a voarem, carros a partirem em alta velocidade e o pobre do protagonista sozinho e abandonado.

Sugiro-lhe que não se precipite, que não tire conclusões apressadas. Sabe, num escritório de advogados tratamos de tantos assuntos, opinamos em tantas matérias e litigamos, quando necessário, sobre coisas tão diversas que bem podia aquilo que testemunhou ter também, ou apenas, um cariz profissional.

Será que era um encontro privado ou profissional, que era uma situação de litígio ou apenas diferenças de opinião, seria o fim de um relacionamento ou um desentendimento pontual no início de uma relação, quem sabe se de negócios? Quem sabe? Eu sei, mas não conte comigo para saber.

E não se esqueça, in dubio pro reo."

Assim, tal e qual. Li e reli. Depreendo que a anónima que tão 'simpaticamente' se me dirigiu é, nem mais nem menos, a advogada. Vejam bem.

Como não sei de quem se trata, aproveito a quadra carnavalesca para
a apresentar assim, veneziana - a misteriosa advogada


Acho este mail uma coisa inacreditável.

Primeiro: o mundo é assustadoramente pequeno. Pensa-se que se está numa sala quase às escuras a escrever para absolutos desconhecidos e, para grande surpresa, descobre-se que afinal estamos cercados por gente que nos conhece e que adivinha do que estamos a falar. 

Segundo: os homens tendem muito facilmente para a mais incrível patetice. Quando era suposto e prudente que, ao ver que aqui relatei um facto passado com ele mas onde não dava pistas objectivas, o meu amigo ficasse sossegadinho a ver se eu me esquecia do assunto, não, fez o contrário: desatou a telefonar, a escrever mails e, pior, muito pior, a avisar outras pessoas que agora se arrogam o direito de me enviar mails cheios de misteriozinhos. Absurdo.

A um e a outra e a quaisquer outros que se sintam tocados pelo que escrevo, volto a esclarecer: isto é um conto da carochinha, ficção, tudo inventadinho. Nem o meu amigo da história existe, nem a mulher, nem a advogada, nem sequer eu. Eu sou uma ficção. Sou apenas um braço que nada num aquário cheio de medusas. Read my lips: tudo inventado.

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Tenham, meus Caros, uma rica quarta-feira. E divirtam-se, meus Amigos, apesar do Carnaval já lá ir.

E, se estiverem para isso, vão lá espreitar a minha outra casa, o Ginjal e Lisboa. Hoje temos Regina Guimarães, umas palavras minhas sobre as palavras, uma fotografia que fiz no sábado, Schumann e ... uma redecoração total com Uma Mulher à Janela (de Picasso). Este tempo ensolarado já me está a fazer lembrar o verão, é o que é.