Não há o que dizer. Mais um dia sem história.
O círculo foi mais alargado. Parecia que estávamos no campo. Antes de chegarmos a essa periferia cruzámo-nos com um casal de ciclistas e com um casal de caminhantes. Dir-se-ia que andamos por um lugar desolado, de onde as pessoas se evadiram. As janelas estão abertas mas nem vivalma, nem um som. Mesmo os cães andam calados.
Depois estive a ver estas ruas por cima, incluindo a minha casa. Este mundo é cheio de devassa. A tecnologia tudo permite e continuo a achar que os poderes políticos do mundo, ou a consciência dos cidadãos, não sei, deveriam estar mais despertos para os perigos que daqui podem advir.
Mas eu dizer isto é chover no molhado e, debaixo da crise pandémica que atravessamos, quem é que quer lá saber de temas tão intangíveis? Nem eu sei se ainda quero saber disso...
Durante o passeio, apanhei uns ramos de mimosas, lindas, macias, perfumadas. Apanhei também umas plumas de uns arbustos espontâneos que encontrei lá pelo meio. Ao apanhar as plumas, como aquilo parece um caniço, cortei-me em dois sítios da mão. Tenho a pele das mãos muito sensível ou, então, deveria ter mais cuidado.
Outra coisa que posso contar é que tinha arroz branco no frigorífico, tinha sobrado. Então tirei costeletas do congelador para acompanharem o dito arroz. Pensei fritá-las em azeite com alho e louro. Descongelei-as. Quando o alho estava louro, fui colocar as costeletas. Afinal era entrecosto. Fiz, então, o transbordo da frigideira para um tacho, juntei cebola pois pensei: vou mas é fazer entrecosto com favas. Quando a cebola estava macia e juntei o entrecosto, reparei que era, de facto, entrecosto mas também umas duas ou três costeletas. Lembrei-me: quando congelei costeletas e entrecosto, como cada um deles era demais, retirei um pouco de cada e fiz um terceiro saco onde juntei o resto de entrecosto e o resto de costeletas, talvez para fazer um arroz de carne. Seja como for, tudo para o tacho. Juntei um alho francês (a parte branca), juntei coentros, juntei um restinho de Bacalhoa tinto que já não dava para um copo, juntei um pouco de sal. E tapei. Fui vigiando. Juntei um pouco de água para evitar que se queimasse. Quando estava quase no ponto, fui buscar as favas congeladas. Não havia. Afinal os dois sacos, que eu pensava ser um de favas e outro de ervilhas, eram os dois de ervilhas. Juntei, pois, ervilhas.
Há pouco passei pelo MasterChef Brasil, aquele arremedo de MasterChef que não tem ponta por onde se pegue, dá ideia que apanharam na rua pessoas que não fazem a mínima do que é cozinhar e os puseram ali a fazer disparates. Mas vi uma panela de pressão. Em tempos tive uma panela de pressão. Não sei o que lhe aconteceu. Era bem mais antiga do que estas. Fico sempre na dúvida. Será que se justificaria ter uma? Ainda não cheguei a uma conclusão.
As minhas dúvidas também se resumem a este tipo de questões. Não quero saber de onde vim, para onde vou. Quero lá saber disso. Agora se conseguir ter a certeza sobre a vantagem de uma panela de pressão, aí, sim, já ficaria mais esclarecida e apta a tomar uma decisão.
Tento lembrar-me do que foi o meu dia e pouco mais me ocorre. Aconteceu uma coisa mas foi a nível profissional mas foi cena chata de que tive conhecimento à noite. Terei que esclarecer melhor. Seja como for, nada aqui poderei comentar. Se pudesse, seria tema com o qual conseguiria produzir uma série altamente condimentada, cheia de suspense e acção. Como não posso, terei que me ficar pelas cenas da minha vidinha, coisas domésticas, rasinhas.
Tenho enviado à minha mãe, por mail, vídeos que acho bonitos ou que me deixam a rir a bom rir. E ela tem gostado de ver. Quando falamos ao telefone, de vez em quando desatamos a rir à gargalhada, quase a sufocarmos de tanto riso.
Há bocado estive a ver se descobria outros para lhe enviar. Como ela gosta de costura, de rendas, de coisas assim, procurei aqueles dos ateliers Chanel ou Dior dedicados à haute couture. Fico sempre encantada, rendida à perfeição, à habilidade daquelas mãos delicadas. E apareceu-me um costureiro de que nunca tinha ouvido falar, o libanês Ziad Nakad. Vestidos lindos, de uma leveza, de uma feminilidade encantadora. Mas, de repente, ocorreu-me que deve ser outro sector que está a levar uma pancada daquelas. Quem, neste tempo de peste, vai vestir vestidos lindos desta boa maneira? Onde é que há festas, eventos, casamentos para se poder usar roupas tão laboriosamente imaginadas, costuradas, bordadas? Tudo isto me dá pena. Mais até do que pena: perplexidade. Que fragilidade a nossa para termos ficado assim, tão frágeis, tão derrubados, tão à mercê de uma vírus tão invisível e traiçoeiro...?
Enfim. É para esquecer. E estou mas é no ir.