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domingo, 20 de dezembro de 2009

Falar de comeres e beberes...

... está a acontecer, no programa Câmara Clara (RTP2), graças aos convidados António Manuel Monteiro e Inês Ornellas e Castro, ambos estudiosos do tema. Da Grécia Antiga à(s) dieta(s) mediterrânica(s) e de montanha, passando por muitas revelações (existência secular do couscous transmontano, a doçaria portuguesa como a melhor do mundo, etc.) e pelos comentários às belas imagens de Os gestos dos sabores, documentário a transmitir no mesmo canal, a seguir à missa do Galo.

Para quem gosta de livros de gastronomia, viajou-se por vários: sobre a Antiguidade clássica, de Maria de Lurdes Modesto, de A. M. Monteiro (Crónicas comestíveis), de José Pedro de Lima-Reis (Algumas notas para a história da alimentação em Portugal), entre outros.

Para quem não pôde ver, ou quer rever, o episódio estará disponível no sítio de Internet do programa de Paula Moura Pinheiro.

Nb: na imagem, estufado de beldroegas (semizotu çipohorta) da cozinha turca.

domingo, 24 de maio de 2009

Nas feiras doutros tempos

«Aquando da feira [de Alcântara], o bairro ganhava outra cor, outra vida. [...] A entrada do recinto ficava reservada para as barracas consideradas pacatas e decentes (queijadarias ou cervejarias) [...]. Por estes espaços confraternizavam não só grupos de amigos, mas também famílias inteiras [...] que, por hábito, aproveitavam os domingos de feira para se reunirem [...]. Nestas tendinhas vendiam-se palitos de Oeiras, queijadas de Sintra, cavacas das Caldas, torrão de Alicante. [...]

As barracas de comidas e bebidas eram as mais concorridas e nas quais as vaidades mais se manifestavam. Importava descobrir quais as melhores sardinhas com pimentos; que pão com chouriço era mais saboroso; quais os pastéis ricos de bacalhau... e claro onde se vendia a melhor pinga... [...] na Adega do Saloio, nada melhor que o atum com batatas, a Barraca Arganilense recomendava o caldo verde à moda do Minho, o Forte sem Medo propunha a sopa à saia calção e a Saúde Engarrafada esmerava-se para ver os seus clientes saudáveis.

Comportamento habitual a que o clima de à-vontade apelava era à cantoria; cantigas ligeiras, cançonetas picantes, canções carnavalescas ou fados, todos os géneros eram cantarolados e bem-vindos».

In Mário Costa, Feiras e outros divertimentos populares de Lisboa, Lx, CML, 1950, p. 166.

Nb: imagem da Feira de Alcântara, no dia 8/V/1905 (in Ilustração Portuguesa), retirada daqui. Deixo-vos ainda duas outras imagens do mesmo espaço (situado defronte à estação ferroviária de Alcântara-Mar), c.1900 (I e II). Sobre as feiras livres vd. este estudo de Gilmar Mascarenhas e Miriam Dolzani.

domingo, 3 de agosto de 2008

Anúncio do anúncio, ou a urgência nos dias que correm

Rendo-me, não aguento mais!
As sucessivas reportagens do suplemento «Fugas» do Público dedicadas às iguarias e refrescantes tiraram-me do sério. Eu, que julgava que um jornal aristocrata como este não se debruçava sobre assuntos da arraia-miúda, comecei recentemente a ver desaparecer o meu tema de escrita numa cadência semanal. Ele foram os cogumelos (desses já tinha falado aqui), os caracóis (ó suprema baixeza sulista!), os petiscos (embora envergonhadamente associados às «tapas»), os sumos de fruta e flores 'aztecas' (uau, que exótico), eu sei lá que mais safadezas de pôr água na boca.
Não resisti mais.
Por isso, decidi, hoje mesmo, que o próximo tema já não mo roubariam. Primeira regra: não disse nada a ninguém - nunca xi xabe. Segundo: escrevi logo, e não estive preocupado com as regras do acordo ortográfico. Por isso, saiu isto, mas vale a pena. A urgência da estação merece tal naco. Nunca um post foi tão apropriado. Ora prossigam...
É assim:
(to be continued)

domingo, 4 de novembro de 2007

Arroz de Favas


Sugerido pelo post anterior do Zèd (que está em Paris) lembrei-me, para os petiscos deste Domingo, daquela magnífica passagem sobre o arroz de favas descrita por Eça de Queiroz no seu livro A Cidades e as Serras.


«E pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominara favas! ... Tentou todavia uma garfada tímida — e de novo aqueles seus olhos, que pessimismo enevoara, luziram, procurando os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado: - óptimo!... Ah, destas favas, sim! Oh que fava! Que delícia!»

Eça de Queiroz, A Cidade e as Serras.


Para mais ementas 'Queirozeanas' ver aqui.

sábado, 27 de outubro de 2007

Quem não sabe cozinhar sempre pode sonhar...

Dum romance histórico de Joaquim Mestre (esse mesmo, director da Biblioteca Municipal de Beja), retiro esta passagem saborosa sobre os sonhos dum homem que, à falta de destreza culinária, vai sonhando com a boa comida alentejana:
"Já é noite cerrada e Manuel Gasparim não sabe de Maria Galariana nem da mãe, que foram para a serra de manhã cedo. Está esfomeado pois desde o almoço que não come nada e a fome nunca foi boa conselheira. Dorme e sonha com iguarias especiais, como sopa de beldroegas com ovos escalfados; tengarrinhas com feijão-manteiga; açorda de espargos com carne de porco frita; açorda de coentros com carapaus fritos de véspera; migas gatas com poejos; caldo de peixe com poejos e hortelã da ribeira; cogumelos assados com sal, túberas com feijão branco, acelgas e chícharos com grão; gaspacho com sardinhas fritas; jantar de azeite com sopas migadas; esparregado de cunetas e de alabaças; salada de pimpalhos e agriões; bolos de amassadura com banha de porco; merendeiros com linguiça; tibornas; cavacas. Sonhou com todas estas comidas, dispostas numa mesa enorme, com uma toalha branca de linho toda bordada, cadeiras forradas a veludo e brocados orientais, jarras de alpaca com flores, talheres de prata, copos de cristal, pratos de porcelana, vinhos raros e perfumados, doces conventuais, licores esquisitos, criados de libré e casaca, música de Wagner ou corais alentejanos, que ele não conseguiu distinguir porque os sonhos são mesmo assim".
Joaquim Mestre
(O perfumista, Lisboa, Oficina do Livro, 2006, p.135/6)

Nb: imagem de ensopado de borrego alentejano no blogue Beja, onde tb. vem a respectiva receita, bem como da açorda & etc.

domingo, 21 de outubro de 2007

Vinho com pêro em terras algarvias


Volto à rua principal, pelo caminho para o lado de onde vim. Ao passar pela Praça da República, os rapazinhos que jogavam o berlinde continuam ainda o mesmo jogo. O velho tal e qual: cabeça caída, olhos no chão. Quanto aos homens da porta do café na mesma: dois de cotovelos contra a capota do automóvel, os outros dois sentados nas cadeiras, de espaldares para a frente, e ambos de pernas abertas como quem vai a cavalo. Quando passo, a cena repete-se: todos me olham de través. E o Bar da Tia Anica continua fechado!
Passo o Cinema Topázio, entro numa taberna. Reparo, então, que se trata de uma loja onde se vende de tudo. Mas a área principal, ocupada por mesas e bancos, é a da taberna.
Numa das mesas, copos sobre o tampo redondo de folha, dois homens acompanham o vinho com pedaços de pêras, que cortam e descascam à navalha. Desconfiados, param a manobra e olham-me. Dou a saudação, a que nenhum responde. Continuo até ao balcão e aguardo que alguém me atenda. Demorado, um dos homens levanta-se. Alto e delgado, chapéu preto de pala para os olhos, avia-me um copo de vinho.
- São servidos? - convido.
Agradecem. Teimo, ganho e falamos disto e daquilo. Ambos ainda reticentes, lá me vão respondendo.
- Quando falta a estrangeirada, que é que se espera? - diz-me o sujeito que me veio servir e parece ser o dono da loja. - O ano passado? O ano passado também foi fraco.
- Pouco dinheiro - intervenho eu para animar um pouco mais a conversa.
- Muito pouco - acrescenta o outro, também de chapéu preto puxado para os olhos. - Se a época de banhos é boa, alugam-se muitas casas, os que lá moram vão dormir onde calha, mas lá lhes fica o dinheiro para irem tapando os buracos o resto do ano. Que isto do peixe anda muito aviltado. A maior parte do tempo não há. Se há, que é que ganha um pescador?
Mando vir outra rodada. Que não, que era a vez deles. Pago eu, pagas tu, opondo-lhes razões fortes: estou de passagem, nunca mais poderei retribuir o obséquio.
- Tenho de ser eu a convidá-los.
- Só se me aceitar um pêro! - opõe como condição o taberneiro.
Aceito. Vai a um cesto buscar um pêro. Dá-mo:
- Traz navalha?
- Esqueci-me ao mudar de fato - respondo eu, para manter-me ao nível da situação.
- Corte com a minha. Não é nada má. Tem-me servido.
- É sempre bom uma navalha - acrescenta o outro.
Pelo tom, as frases dos dois homens parecem-me cheias de insinuações. O pedaço de silêncio demora-se. Pensariam que era fiscal dos géneros, polícia e assim por diante?
Apesar das circunstâncias ou talvez por isso mesmo, dou por mim a beber de gosto. O vinho é aberto e claro, leve. Acabo por concordar que é agradável misturar vinho com o pêro. Deixa na boca um odor saboroso, acre. Sorrio para os dois homens, louvando a receita.

*Imagem: Praça da República, Fuzeta.

sábado, 13 de outubro de 2007

Um cheirinho pró caminho

"Outro dia - era sábado - jantei em Colares (em Colares, repare, aqui mesmo à mão) no restaurante do senhor Gil. [...] E a açorda de sável em Salvaterra? E o frango na púcara em Vila Franca? E as enguias na Outra Banda? E as caldeiradas em Sesimbra?
- Você está a fazer-me um destes apetites!"


Alexandre O'Neill
(«O da minha mulher é ímpar...», in A Capital, 6/XII/1973, rep. em Coração Acordeão, Lisboa, O Independente, 2004, p.54/5)
Nb: taberna de Lisboa c.1930, imagem de Ferreira da Cunha (AFML)

sábado, 6 de outubro de 2007

As cherovias, prodígio da gastronomia beirã

Aproveitando o fim-de-semana, venho falar-vos deste acepipe único que dá pelo nome de cherovia. Cherovia?! Pois é, o nome parece marciano, mas os petiscos que se fazem com este vegetal são de chorar por mais...
A cherovia é uma raiz usada como hortaliça, tem a forma da cenoura, a cor do nabo e o sabor de ambos, mas um pouco mais forte. O nome latim é pastinaca sativa e há quem também lhe chame cherivia, cheruvia ou pastinaga. Com origem remota na Eurásia, em tempos fez a vez da batata (vd. aqui). Em Portugal, apenas se cultivam entre a Serra da Estrela e a Cova da Beira. É agora a altura ideal para serem compradas. Dá-se apenas em regiões de clima húmido e com geada. Sei que existem, pelo menos, na Holanda e no Reino Unido. Neste, são vendidas em pacotes do estilo das batatas fritas, a sós ou juntamente com cenoura e beterraba fritas. Recomendo as parsnips da marca Tyrrells, à venda na mercearia fina DeliDelux (St.ª Apolónia, Lx.), quando não esgotam.
No Fundão costuma fazer-se frita e passada por polme, após prévia cozedura e após serem fatiadas. Também se pode fazê-las só cozidas, indo muito bem num refugado de azeite e cebola.
Eis a receita base para a versão em fritada:
Cherovias Fritas
(ingredientes: cherovias; 1 ovo; 1 chávena de farinha; sal; água; azeite para a fritura)
Após a cozedura (com sal), cortam-se as cherovias em talhadas finas.
Com o ovo, a farinha, um pouco de água e sal, prepara-se um polme vulgar. Escorrem-se e enxugam-se as cherovias num pano e passam-se os bocados já fatiados pelo polme. Fritam-se em azeite.
Acompanham-se com outros peixinhos da horta, com cogumelos (no Fundão usa-se muito fazer com criadilhas, que são uns cogumelos com um sabor fantástico) ou um qualquer cozinhado. Vão muito bem com vinho, eu prefiro com vinho branco ou verde.
Para outras receitas com parsnips vd. aqui. Então, bom apetite!
Designações noutras línguas: chirivia (castelhano), pastinaca (italiano), panais (francês), pastinak (alemão).

domingo, 22 de julho de 2007

Revisitações retemperadoras

Os degraus estão uma lástima, há mesmo um troço algo perigoso, mas os momentos lá em baixo compensam tudo. Então, com um mar calmo como nunca, um sol gostoso, uma brisa suave, e umas redondas ameijôas à Bulhão Pato, com um molhinho bem no ponto, a finalizar o dia, que mais se pode querer?
Qual é a praia, qual é?

segunda-feira, 9 de julho de 2007

O cosmopolitismo começa no estômago (em jeito de adenda)

Em jeito de adenda ao meu post anterior:
O que dizer de uma Tapenada de Anchovas (receita vagamente italiana) comprada no mercado de domingo (na banca do vendedor aparentemente magrebino) à qual se junta um pouco de piment das Antilhas e se barra numa faita de Pão Saloio?

Adenda à adenda:
E o que dizer daquela Crèperie da rue Mouffetard que de bretã tem muito pouco? O patrão é sul-americano, os empregados falam todos espanhol excepto uma senegalesa. Os recheios dos crepes variam entre a Ratatouille (que sendo francesa é mediterrânica), o Salmão fumado do Mar do Norte, e o Chilecito (que do pouco que sei parece ser um guisado da Argentina). Para que o desrespeito pela tradição bretã não seja total, pode sempre beber-se uma cidra.

domingo, 8 de julho de 2007

Entre o Atlântico e o Mediterrâneo



Devo confessar que não sou grande apreciador de vinho verde, normalmente prefiro um bom branco seco bem fresquinho. Mas quando se trata de Alvarinho a coisa pia mais fino. Para além das iguarias recomendadas pelo Daniel aconselho este belíssimo petisco para acompanhar o 'vinhito': carapaus alimados. Manjar tipicamente algarvio e confeccionado com uma simplicidade divinal. Este é o mistério da cozinha tradicional mediterrânea, com sal, cebola e azeite se inventam pequenas delícias que nem sequer pesam muito no estômago (ver aqui a receita). Entre um néctar produzido em terras atlânticas e um pescado bem prateado içado em mares mais quentes, se servem os sabores para este início de Verão. A seguir só um belo mergulho nas ondas de uma destas águas marítimas para retemperar as energias.