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quarta-feira, 12 de março de 2008

A própria América Latina ganhou (e muito)!

Depois de ler esta notícia, e vendo as coisas de longe parece-me que há ainda ganhadores e perdedores na crise da semana passada na América Latina, que vale a pena referir (para além dos que já referiu o Manolo). De facto Chávez ficou mais uma vez mal na fotografia com a sua extemporânea escalada militar. O presidente colombiano Uribe, obviamente, ficou pior ainda porque violou o território, logo a soberania, de um país vizinho com o qual não está em guerra. Mais ainda porque impediu que os reféns das FARC sejam libertados nos tempos mais próximos - o que era talvez o seu real objectivo -, e não apenas porque as FARC se entrincheiram ainda mais ao serem atacadas, mas porque Reyes, o n°2 das FARC abatido estava a estabelecer contactos com vários países, nomeadamente a França, para negociar a libertação dos reféns. Há m pormenor importante nesta crise: a operação militar colombiana foi desencadeada por informações fornecidas pelos Estados Unidos (segundo o próprio ministério da defesa colmbiano), o que é bem revelador do quanto a administração Bush está interessada num clima de estabilidade na região. Sendo que a solução diplomática acabou por vingar a administração Bush é quem sai a perder da situação. Não deixa de ser muito significativo que a Colômbia, o hoje em dia o único real aliado dos E.U.A. numa região em que estes tinham por hábito pôr e depor ditadores a seu bel prazer, vendo-se encurralada e tendo que escolher entre a estrtégia de Bush e os seus vizinhos, tenha preferido estes. E não acredito que tenha sido um súbito acesso de boa-vontade de Uribe, que já demonstrou ter muito poucos escrúpulos, mas é tão mais significativo quanto Uribe tenha sido obrigado contra-vontade a optar pelos seus vizinhos em detrimento de Bush. Quer dizer que os vizinhos tem influência e poder suficientes para contrariar a política de Bush (e já agora a de Chávez também, já que este estava tão desejoso de uma escalada quanto o presidente gringo). Quem sai a vencer é afinal a América Latina, que conseguiu encontrar dentro de portas a solução para o imbróglio, demonstrando maturidade política e diplomática, e autonomia em relação aos E.U.A. Pelo que li parece que foram vários os líderes políticos locais que se envolveram decisivamente para procurar a solução diplomática, os presidentes da Argentina (Cristina Kirchner), do México (Felipe Calderon), da Niquerágua (Daniel Ortega) e da República Dominicana (Leonel Fernandez). É toda a América Latina quem sai a ganhar.

terça-feira, 11 de março de 2008

Quem perdeu e quem ganhou na AL (se é que alguém ganhou)

Ao procurar um inimigo externo para mascarar graves problemas internos e, assim, tentar reaglutinar sua base política na Venezuela, Hugo Chávez praticamente declarou guerra à Colômbia e pôs a estabilidade de toda a América Latina em xeque. Ao contrário do que ele imaginou, sua popularidade, que vem despencando dia-a-dia, caiu mais ainda. A sua manobra intempestiva de levar o continente à guerra não foi bem recebida, principalmente entre os venezuelanos, que se mostram aterrorizados com as atitudes cínicas e espalhafatosas de seu líder parlapatão. Pior, a sua resposta à crise estabelecida entre Colômbia e Equador foi muito mal-vista e condenada por todos as pessoas (estadistas ou não) de bom senso. Mais uma vez o tiro saiu pela culatra e a sua obsessão de se tornar um líder regional fica cada vez mais distante. Aliás, uma alternativa que se já foi possível num passado recente, torna-se hoje improvável e descabida. Prova disso, foi o seu total isolamento na reunião extraordinária da OEA (Organização dos Estados Americanos), que decidiu por unanimidade dar uma solução diplomática ao conflito, mas sem deixar de condenar a atitude colombiana.

Se o cenário não está às mil maravilhas pra Chávez, o mesmo não se pode dizer do presidente colombiano, Álvaro Uribe. Sua ação foi condenada por todos os países (exceto, é claro, pelos EUA de Bush). E não poderia ser diferente, pois nada justifica a violação de um direito internacional. Entretanto, internamente ele se fortaleceu ainda mais. Segundo sondagens divulgadas logo após a incursão militar realizada no Equador contra as Farc, a avaliação positiva de Uribe passou de 70% para quase 90%, o que o torna o presidente mais popular da América do Sul, dando condições políticas que lhe permita realizar uma reforma constitucional para ir em busca de seu ambicionado terceiro mandato. Parece-me que a moda de se perpetuar no poder voltou à América Latina. É como blue jeans que serve pra todas as ocasiões: um verdadeiro (ul)traje a rigor pra todas as estações do ano.

Neste imbróglio todo, quem demonstrou maturidade de chefe de Estado foi o presidente equatoriano, Rafael Correa, que buscou na via diplomática a solução da crise. Foi contundente nas palavras ao defender a soberania territorial de seu país (e não poderia ser diferente), mas não se fechou à intransigência de quem queria ver o circo armado por Chávez pegar fogo. Pecou no início ao ter dado ouvidos aos bufões peçonhentos do presidente venezuelano. Este foi este seu único erro. E se persistir futuramente nele terá muito a perder. Denunciou com muita propriedade e lucidez que usar o argumento da incursão preventiva, como fez Álvaro Uribe, é condenável sob qualquer aspecto e um péssimo precedente que poderá colocar em risco a estabilidade de toda a região. Ganhou respeito internacional ( que tem a sua popularidade interna bem alta) e se tornou uma alternativa viável para liderar as negociações que envolvam a libertação de reféns pelas Farc.

Nb: Foto-montagem da Reuters