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domingo, 8 de junho de 2008

A cultura imaterial como recurso para o desenvolvimento local

Está em preparação uma rede de conteúdos em 9 concelhos alentejanos visando a salvaguarda do património cultural imaterial da região. A iniciativa é da Direcção Regional de Cultura do Alentejo, terá uma entidade central de concentração das memórias sociais e prevê a criação dos seguintes espaços:
>Casa da décima e do verso improvisado (Alcácer do Sal, dedicado à poesia popular/tradicional e ao improviso);
>centro do tapete (Arraiolos, vocacionado para o estudo dos têxteis do Alentejo);
>núcleo museológico dos modos de construir e da arquitectura tradicional (Avis);
>Casa da Fala (Barrancos, para preservar o dialecto barranquenho e à dialectologia);
>arquivo de história oral (Baleizão, dedicado à memória social);
>Casa do Teatro Tradicional (Borba);
>Casa da Viola Campaniça e do Baldão (Ourique, dedicada ao tradicional canto de improviso local e ao único instrumento de cordas alentejano);
>Casa do Cante (Serpa/Cuba, dedicado a este canto coral tradicional);
>Jardim do Mundo (Portel, que permitirá o conhecimento do território, das paisagens e das identidades do Alentejo).
A ideia é que cada uma daquelas unidades possa depois criar uma rede sectorial, para dinamizar e potenciar outras tradições, técnicas e produtos da região, como no caso da Casa do Tapete, que deverá articular uma rede que inclua os bordados de Nisa, as tapeçarias de Portalegre, as rendas de nós da Trindade e as mantas de Reguengos de Monsaraz e Mértola.
O coordenador deste projecto é Paulo Lima, que publicou recentemente o livro O fado operário no Alentejo - séculos XIX e XX. Esta rede primária estará conectada a um Centro de Articulação de Conteúdos (o Centro Michel Giacometti, a instalar em local a definir do Alentejo Central), o qual terá como funções a articulação de conteúdos, a gestão do Centro de Documentação Digital e a sensibilização para uma boa prática de conservação de arquivos do património imaterial.
Ainda segundo Paulo Lima, está previsto o desenvolvimento duma rede de encontros científicos, a articular com um conjunto de festivais temáticos (Monsaraz, Marvão, etc.) ou pequenos projectos emergentes, como é o caso dos cantos iberoamericanos de improviso em Alcácer do Sal, que "podem ter relevância para o turismo cultural". Outros projectos almejados são a construção de conteúdos multimédia para sítios e monumentos de interesse patrimonial (caso dos castelos de Amieira do Tejo e Campo Maior, da Torre do Salvador e do Castro da Cola), para a culinária do Alentejo, para os produtos agro-florestais e a paisagem.
Esta iniciativa baseia-se na Convenção para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, adoptada em X/2003 (32.ª Sessão da Conferência Geral da UNESCO), que foi aprovada pelo Estado português em I/2008. Nela ficou consagrado a promoção do Património Cultural Imaterial, entendido como "um conhecimento que é recreado constantemente pelas comunidades e grupos em função do contexto em que vivem, da sua interacção com a natureza e com a sua historia" e que inclui os usos, representações, expressões, conhecimentos e técnicas, instrumentos, objectos, artefactos e espaços culturais colectivos. Tal convenção teve como finalidade incutir um sentimento de identidade e continuidade pelo respeito da diversidade cultural e da criatividade humana.
Este é um projecto exemplar de como o desenvolvimento local e regional pode e deve contar com a consolidação duma política cultural, entendida numa perspectiva transversal, que abranja a economia, a formação, etc.
Fonte:
*ZACARIAS, Maria Antónia, "Alentejo vai cartografar e preservar o seu vasto património cultural imaterial", Público, 8/VI/2008, p.29.
Nb: imagem do Grupo Coral e Etnográfico do Ateneu Mourense retirada daqui.

sábado, 27 de outubro de 2007

Quem não sabe cozinhar sempre pode sonhar...

Dum romance histórico de Joaquim Mestre (esse mesmo, director da Biblioteca Municipal de Beja), retiro esta passagem saborosa sobre os sonhos dum homem que, à falta de destreza culinária, vai sonhando com a boa comida alentejana:
"Já é noite cerrada e Manuel Gasparim não sabe de Maria Galariana nem da mãe, que foram para a serra de manhã cedo. Está esfomeado pois desde o almoço que não come nada e a fome nunca foi boa conselheira. Dorme e sonha com iguarias especiais, como sopa de beldroegas com ovos escalfados; tengarrinhas com feijão-manteiga; açorda de espargos com carne de porco frita; açorda de coentros com carapaus fritos de véspera; migas gatas com poejos; caldo de peixe com poejos e hortelã da ribeira; cogumelos assados com sal, túberas com feijão branco, acelgas e chícharos com grão; gaspacho com sardinhas fritas; jantar de azeite com sopas migadas; esparregado de cunetas e de alabaças; salada de pimpalhos e agriões; bolos de amassadura com banha de porco; merendeiros com linguiça; tibornas; cavacas. Sonhou com todas estas comidas, dispostas numa mesa enorme, com uma toalha branca de linho toda bordada, cadeiras forradas a veludo e brocados orientais, jarras de alpaca com flores, talheres de prata, copos de cristal, pratos de porcelana, vinhos raros e perfumados, doces conventuais, licores esquisitos, criados de libré e casaca, música de Wagner ou corais alentejanos, que ele não conseguiu distinguir porque os sonhos são mesmo assim".
Joaquim Mestre
(O perfumista, Lisboa, Oficina do Livro, 2006, p.135/6)

Nb: imagem de ensopado de borrego alentejano no blogue Beja, onde tb. vem a respectiva receita, bem como da açorda & etc.

sexta-feira, 7 de setembro de 2007

As utopias a Sul do peão

No último n.º do Diplô, acabadinho de sair, destaca-se a colaboração do excelso peão Renato, com um texto de fôlego sobre «A aldeia urbana: uma pequena utopia para o Alentejo».
É verdade que a viagem por terras do Sul é de carrinpana (e não pedonal), mas nem por isso perde o seu encanto, pois é muito cinematográfica, intimista e luminosa. No fim, avança com uma ideia forte: "O desenvolvimento do Alentejo não se concretiza somente nas grandes obras públicas ou na rentabilização da paisagem. A boa relação gerada entre as cidades e as aldeias é um pilar essencial e incontornável para o futuro da região e das suas populações, que não pode ser ignorado". Tudo isto a propósito das suas revisitações à aldeia de Albernoa.
O n.º tem ainda um forte dossiê português sobre as «Novas precariedades em Portugal». E uma recensão deste vosso peão sobre o livro Miguel Torga e a PIDE, de Renato Nunes. Mais informações aqui. Então, boas leituras!

terça-feira, 4 de setembro de 2007

Um mundo sem centro

Antigamente, o Largo era o centro do mundo. Hoje, é apenas um cruzamento de estradas, com casas em volta e uma rua que sobe para a Vila. O vento dá nas faias e a ramaria farfalha num suave gemido, o pó redemoinha e cai sobre o chão deserto. Ninguém. A vida mudou-se para o outro lado da Vila.

Manuel da Fonseca, O Fogo e as Cinzas.

*Foto: João Espinho (Albernoa).