Depois de um regresso algo frouxo, o Câmara Clara, de ontem, sobre a leitura infanto-juvenil resultou em aceso debate entre Isabel Alçada e Francisco José Viegas.
A representante do Plano Nacional de Leitura apresentou uma visão confusamente instrumental e burocrática da leitura, que passou tantou pela fisiologia (cientistas, médicos e enfermeiros, maravilhados com o PNL) como por somas fabulosas dos efeitos da política do Governo (1 milhão de crianças a ler e todos os dias e 1 hora por dia!).
Confesso que esta perspectiva me congela a parte do cérebro que era suposto a leitura desenvolver. Claro que ter um PNL é bom, e ninguém duvidará da urgência de aumentar os níveis de literacia, mas para ler o quê e porquê?
E foi aqui que Francisco José Viegas esteve em grande forma, quando insistiu que ler não é uma experiência uniforme (ler um jornal desportivo, não é o mesmo que ler um romance), nem uma simples competência de juntar letras para delas extrair um significado, e, sobretudo, quando reforçou a ideia de que a Escola não deve transmitir essa noção de processo em que tudo se equivale, mas antes valorizar o cânone literário.
É difícil crer que a leitura se desenvolva por degraus evolutivos, numa equação que vai do mais ligeiro para o mais complexo, e ainda mais difícil é crer no «socialismo» do Plano. No final a sua intenção niveladora, acabará por acentuar as desigualdades e se «não esticar a corda» à literatura, milhares de alunos não poderão por ela subir, aí sim, a mais elevados patamares académicos, profissionais e pessoais.
Imagem: Magritte- La lectrice soumise, 1928.