Já todos os suplementos literários recentes analisaram o actual papel das mulheres indianas na literatura. Arundathi Roy, nascida em Shillong, Meghalaya e a viver em Nova Deli, foi, de alguma forma, a percursora deste movimento, ao ganhar o Booker Prize de 1997 com o seu livro
The god of small things (
O Deus das pequenas coisas.
Asa), fábula familiar de contornos políticos de denúncia do sistema de castas. Aliás, a autora, não tem escrito ficção para se dedicar ao activismo político.
Nove anos depois, em 2006, outra indiana ganha o Booker, Kiran Desai, nascida em Nova Deli, residente nos Estados Unidos, filha de Anita Desai, três vezes nomeada para o mesmo prémio. O livro chama-se
The inheritance of loss e foi já traduzido para português (
A herança do vazio.
Porto Editora), história intimista, também com uma incursão política que ofendeu o Nepal.
O destaque, agora, vai para Abha Dawesar de Nova Deli, a viver em Nova Iorque que causou sensação no Salão do Livro de Paris, com o título
Babyji, já lançado no nosso país pela
Asa, cujo enredo segue as descobertas (homo)sexuais de uma adolescente indiana e já foi classificado como muito
à la Philip Roth.
E toda esta introdução para falar da até agora minha favorita, Jumpa Lahiri, nascida em Londres e criada nos Estados Unidos. Tem um belíssimo livro de contos
The interpreter of maladies (
O intérprete de enfermidades.
D. Quixote), Prémio Pulitzer em 2000 e um romance
The Namesake (
O Bom Nome.
D. Quixote), adaptado ao cinema, já este ano, pela também indiana Mira Nair (em exibição, mas eu ainda não vi). Talvez por ser a «menos» indiana de todas, a escritora tem procurado nestes livros reflectir sobre a identidade daqueles que vivem num país que funciona em simultâneo como país de origem e de acolhimento. As personagens debatem-se com o que os pais indianos neles projectam: a perpetuação da cultura de origem a milhares de quilómetros de distância, e a sua própria vivência num país onde nasceram. Esse conflito é, sobretudo, realçado no que diz respeito aos hábitos alimentares e à escolha de uma noiva/o, como se o corte, ou pelo contrário, o prolongamento com as raízes passasse pelos sabores originais e pela formação de um novo núcleo familiar. Acho as questões muito interessantes: quantos serão precisos a comer o quê e a apaixonar-se por quem para que se mantenha uma identidade? E será mesmo aí que reside o nosso sentimento de pertença a um lugar?