No concelho de Belmonte, perto da povoação, ergue-se a torre de Centum Cellas. Sobre a origem e as funções deste, edifício cuja construção original data do século I, há muitas teorias e nenhuma certeza: prisão, núcleo de um acampamento romano, villa de um negociante de estanho, etc, como se podem informar aqui. Centum Cellas foi classificada como monumento nacional em 1927, mas não ocupa um lugar na memória e no imaginário dos portugueses, talvez porque nenhum poder sabia muito bem que fazer com estas pedras antigas. Essa resistência à apropriação ideológica é uma qualidade rara. As ruínas aí estão como desafio a arqueólogos e estímulo à imaginação. Por que não ver nelas uma laborioso enigma legado aos vindouros, um templo a um deus desconhecido, um labirinto?
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domingo, 4 de outubro de 2009
A Beira revisitada - Centum Cellas
Posted by João Miguel Almeida at 19:37 0 comments
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sábado, 3 de outubro de 2009
A Beira revisitada - Belmonte
A minha ideia de Belmonte estava muito associada ao criptojudaísmo, tema que me interessa como de uma maneira geral todos os ligados a questões de identidade e resistência. Não associava a terra aos descobrimentos, o que é quase um paradoxo, dado Belmonte se situar no interior. Penso não me afastar da verdade ao imaginar que a maior parte dos seus habitantes durante a Idade Média ou a Idade Moderna nunca viu o mar. Não foi o caso de Pedro Álvares Cabral, filho do alcaide-mor de Belmonte, donde saiu aos onze anos para ir viver no Seixal e depois
Lisboa. Ao pensar segunda vez sobre o assunto não é estranha a associação de Belmonte à chegada dos portugueses ao Brasil. A povoação está perto da fronteira entre Portugal e Espanha e foi por causa de outra fronteira, a traçada pelo Tratado de Tordesilhas, que a armada de Pedro Álvares Cabral terá procurado terras a Ocidente, no hemisfério Sul.
Belmonte deve ser a terra portuguesa com mais museus por metro quadrado. São quatro: um dedicado aos Descobrimentos, o museu judaico, o Ecomuseu do Zêzere e o Museu do Azeite. Já em fim de viagem pela Beira, limitei-me a visitar o Castelo, a Igreja de Santiago, com um espaço reservado ao panteão dos Cabrais, e o museu judaico, que vi como uma espécie de verso e reverso da nossa História. Pedro Álvares Cabral é o Portugal oficial. O criptojudaísmo representa um Portugal clandestino. Entre um e outro sempre houve passagens subterrâneas que nem sempre se descobrem.
Este site é um postal em movimento de Belmonte. Resta acrescentar que o lugar não é só feito de lendas, misticismo e museus, mas também de património vivo, magníficas paisagens e o restaurante, perto do Castelo, em que almocei melhor e mais barato durante o meu périplo pela Beira.
Belmonte deve ser a terra portuguesa com mais museus por metro quadrado. São quatro: um dedicado aos Descobrimentos, o museu judaico, o Ecomuseu do Zêzere e o Museu do Azeite. Já em fim de viagem pela Beira, limitei-me a visitar o Castelo, a Igreja de Santiago, com um espaço reservado ao panteão dos Cabrais, e o museu judaico, que vi como uma espécie de verso e reverso da nossa História. Pedro Álvares Cabral é o Portugal oficial. O criptojudaísmo representa um Portugal clandestino. Entre um e outro sempre houve passagens subterrâneas que nem sempre se descobrem.
Este site é um postal em movimento de Belmonte. Resta acrescentar que o lugar não é só feito de lendas, misticismo e museus, mas também de património vivo, magníficas paisagens e o restaurante, perto do Castelo, em que almocei melhor e mais barato durante o meu périplo pela Beira.
Posted by João Miguel Almeida at 18:03 0 comments
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segunda-feira, 14 de setembro de 2009
A Beira revisitada - Guarda
Não tinha uma imagem nítida da Guarda, que conhecia de passagem, e trouxe de lá uma memória refrescada da Sé. O largo da Sé foi reabilitado e convida à frequência de um dos bares, à noite. No cume das montanhas circundantes perfilam-se, elegantes, moinhos que produzem energia eólica. Visitei o novo centro comercial de vários andares. Esperava mais da capital de um distrito onde abundam aldeias e vilas surpreendentes.
A Guarda pareceu-me uma cidade pacata, o avesso da sua imagem mais forte criada por uma cantiga de amigo atribuída a D. Sancho I, e que muitos conhecem dos compêndios de literatura, na qual a cidade surge como lugar inquietante, lugar de perigo e perdição:
A Guarda pareceu-me uma cidade pacata, o avesso da sua imagem mais forte criada por uma cantiga de amigo atribuída a D. Sancho I, e que muitos conhecem dos compêndios de literatura, na qual a cidade surge como lugar inquietante, lugar de perigo e perdição:
Ai eu coitada! Como vivo
en gran cuidado por meu amigo
que ei alongado! Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
Ai eu coitada! Como vivo
en gran desejo por meu amigo
que tarda e non vejo! Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
en gran desejo por meu amigo
que tarda e non vejo! Muito me tarda
o meu amigo na Guarda!
O que atrasou o amigo na Guarda – mau tempo, percalços, outra mulher, um salteador? Nesse tempo as pessoas acreditavam na intervenção sinistra de demónios, como o da gárgula que se vê na foto. Aprendi recentemente que a imagem terrível do diabo apareceu mais tarde e em regiões mais setentrionais. Descartes é que colocou a hipótese de um génio maligno que o enganava acerca de quase tudo. O diabo que deambulava em Portugal na Idade Média tinha poucos poderes, era mesmo um pouco ridículo. O povo ria-se dele. Se foi a mão de um destes diabos que atrasou o amigo na Guarda, não o impediu de chegar ao destino.
Posted by João Miguel Almeida at 11:33 0 comments
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segunda-feira, 7 de setembro de 2009
A Beira revisitada - Castelo de Mendo
Da aldeia de Castelo de Mendo não tinha qualquer ideia prévia. Foi uma boa surpresa, uma pequena jóia paisagística e monumental. Os guias turísticos sublinham a localização num maciço granítico a 756 metros de altitude e o pelourinho mais alto da Beira, de sete metros de altura, como podem conferir aqui. Eu prefiro a igreja em ruínas. Uma frase de Raul Brandão surgiu-me como a legenda apropriada: «Sem tecto, entre ruínas.» Mas o sentido da frase seria o avesso do inscrito no livro incomparável que é Húmus. Para Raúl Brandão «sem tecto, entre ruínas» era a imagem angustiada da crise intelectual e política da I República. Num dia limpo de verão, respirávamos paz ao deambular pelas ruínas de Castelo de Mendo. Que importa não haver tecto se um azul suave tinge o céu? Que importa haver ruínas se a beleza destas não é ameaçada mas esculpida pelo tempo?
Posted by João Miguel Almeida at 22:33 2 comments
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sábado, 5 de setembro de 2009
A Beira revisitada - Almeida
A primeira vez que vi Almeida foi em fotografias a preto e branco emolduradas e colocadas na parede de um consultório de dentista. É uma memória antiga e insólita, até porque tenho bons dentes e as minhas idas ao dentista são raras. Não a consigo localizar no tempo, mas lembro-me perfeitamente das imagens das imponentes muralhas de Almeida, dos olhos esbugalhados do dentista e da minha vontade de estar noutro sítio. Almeida é um tema tão legítimo como outro qualquer para um dentista decorar o consultório. Sou tentado a pensar que aquelas muralhas largas, sólidas e protectoras são imagens poéticas e reconfortantes para dentistas e pacientes.
Apesar do nome da povoação fortificada ser o mesmo de um dos meus apelidos, não tenho qualquer origem familiar conhecida em Almeida. Soube recentemente que o nome é de origem árabe, embora as opiniões divirjam sobre que origem é esta, em concreto. Para uns vem de Al Mêda, que significa mesa e portanto não é alheia à função de trincar e moer. Para outros vem de Talmeyda, palavra designando campo ou lugar de corrida de cavalos.Quem quiser saber mais sobre Almeida, pode consultar o site oficial, aqui. A 13 de Agosto passado integrou a candidatura das Fortificações Abaluartadas da Raia Luso-Espanhola a Património Mundial da UNESCO.
Apesar do nome da povoação fortificada ser o mesmo de um dos meus apelidos, não tenho qualquer origem familiar conhecida em Almeida. Soube recentemente que o nome é de origem árabe, embora as opiniões divirjam sobre que origem é esta, em concreto. Para uns vem de Al Mêda, que significa mesa e portanto não é alheia à função de trincar e moer. Para outros vem de Talmeyda, palavra designando campo ou lugar de corrida de cavalos.Quem quiser saber mais sobre Almeida, pode consultar o site oficial, aqui. A 13 de Agosto passado integrou a candidatura das Fortificações Abaluartadas da Raia Luso-Espanhola a Património Mundial da UNESCO.
Posted by João Miguel Almeida at 20:22 1 comments
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quinta-feira, 3 de setembro de 2009
A Beira revisitada - Trancoso
Trancoso na minha memória era uma vila no cume de uma montanha. Agora é uma bela «cidade amuralhada», cintilando na internet, como se pode ver aqui. Durante os meus primeiros verões, os meus pais, ou o meu tio iam, depois de almoçar na aldeia, beber «uma bica» a Trancoso. Era preciso atravessar um vale verdejante e vencer uma subida penosa e tortuosa, que sempre recordo no primeiro carro do meu pai – um diane – ou no Toyota do meu tio, num modelo que hoje nos parece primitivo. Voltar a Trancoso foi uma oportunidade de revisitar as muralhas, que cercam o «núcleo duro» da povoação, a igreja (na foto), a capela erguida em memória do casamento de D. Dinis, o majestoso jardim público feito não de flores, mas de frondosas árvores. E também de me surpreender com as inovações: a estátua ao Bandarra (como diria José Hermano Saraiva, foi aqui que nasceu o sonho do regresso de D. Sebastião), o novo e luxuoso hotel, o cinema, o «pavilhão multiusos».
Ao observar a feira de S. Bartolomeu senti o choque de uma evidência: não podemos viajar no espaço sem viajar no tempo. A feira de que me lembrava da minha infância na década de 70 era uma balbúrdia multiforme, repleta de cores, cheiros e ruídos que impregnava toda a povoação. Pessoas e animais circulavam por todo o lado e em toda a parte se vendiam cintos e sacholas, chocalhos e enxadas, botas e ancinhos, regadores e cartuxos, cabritos e queijos, capotes e t-shirts, além de um imenso etc. Agora a feira de S. Bartolomeu decorre num recinto fechado, no qual se paga para entrar a partir das 19 horas. À porta vêem-se seguranças com músculos que só podem ter sido treinados em ginásios. Lá dentro, numas tendas brancas com o tecto em cone, que também se podem encontrar em Monte Gordo, vendem-se artefactos africanos e outras coisas giras. Nos stands que expõem diversos produtos, os jovens vendedores a quem escasseiam os clientes no início da tarde, matam o tédio a pesquisar a internet usando computadores portáteis wireless. Os equipamentos agrícolas mais em destaque são pequenos tractores e outra maquinaria reluzente. No recanto que faz parede com o jardim estava montado um palco onde ensaiavam os «santos e pecadores», que iam actuar nessa noite.
Foi pena o castelo estar vedado ao público para obras. Será um monumento a redescobrir noutra ocasião.
Ao observar a feira de S. Bartolomeu senti o choque de uma evidência: não podemos viajar no espaço sem viajar no tempo. A feira de que me lembrava da minha infância na década de 70 era uma balbúrdia multiforme, repleta de cores, cheiros e ruídos que impregnava toda a povoação. Pessoas e animais circulavam por todo o lado e em toda a parte se vendiam cintos e sacholas, chocalhos e enxadas, botas e ancinhos, regadores e cartuxos, cabritos e queijos, capotes e t-shirts, além de um imenso etc. Agora a feira de S. Bartolomeu decorre num recinto fechado, no qual se paga para entrar a partir das 19 horas. À porta vêem-se seguranças com músculos que só podem ter sido treinados em ginásios. Lá dentro, numas tendas brancas com o tecto em cone, que também se podem encontrar em Monte Gordo, vendem-se artefactos africanos e outras coisas giras. Nos stands que expõem diversos produtos, os jovens vendedores a quem escasseiam os clientes no início da tarde, matam o tédio a pesquisar a internet usando computadores portáteis wireless. Os equipamentos agrícolas mais em destaque são pequenos tractores e outra maquinaria reluzente. No recanto que faz parede com o jardim estava montado um palco onde ensaiavam os «santos e pecadores», que iam actuar nessa noite.
Foi pena o castelo estar vedado ao público para obras. Será um monumento a redescobrir noutra ocasião.
Posted by João Miguel Almeida at 19:00 2 comments
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terça-feira, 1 de setembro de 2009
A Beira revisitada - Barroco da Pena
A parte mais interessante das minhas férias foi uma incursão pela Beira Alta, onde passei grande parte dos verões da minha infância e adolescência. É verdade que o mundo é composto de mudança e nunca voltamos iguais ou a sítios iguais, mas este regresso foi uma surpreendente redescoberta. Quem diria que a aldeiazinha de nome abstruso – Sobral Pichorro – à qual os meus avós maternos voltaram para gozar os últimos anos de vida é agora um ponto assinalado nos roteiros turísticos e uma escala nas viagens dos internautas? Se alguém tiver dúvidas pode consultar este texto sobre o património arqueológico da aldeia ou ler este poste e este.
Quem diria que o «barroco da pena», um amontoado de blocos graníticos que eu escalei, «por aventura», aos 13 anos, tem vestígios de povoamento que remontam ao calcolítico? Só tenho pena que o popular «barroco» tenha sido substituído na placa metálica das direcções por «fraga». Fragas há muitas e uma pesquisa rápida no Google levou-me logo a outra «fraga da Pena», com cascata. Prefiro a expressão «barroco da pena», que equilibra uma palavra com uma conotação de peso, de grandiosidade, excesso, e outra que soa a leveza, pequenez, simplicidade.
Posted by João Miguel Almeida at 14:57 2 comments
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