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domingo, 22 de janeiro de 2012

Plataforma Inter-Bolsas: coisas simples, sementes de futuro

Há cerca dum ano atrás, o Rui Tavares teve a ideia de financiar umas bolsas de investigação científica, como modo de apoiar aqueles que precisam de amparo mínimo em tempos difíceis.

Foi uma iniciativa meritória, pela ousadia, pela carência existente e por vir de quem vinha, alguém 'de dentro', que também faz pesquisa e se disponibilizava para apoiar, seleccionar e avaliar as candidaturas. Mais ainda perante os excelentes resultados que o Rui referiu há um mês atrás, no jornal Público e também no seu blogue.

Agora prepara-se para aprofundar essa iniciativa com o projecto Plataforma Inter-Bolsas, de novo apoiado pelos comediantes dos Gato Fedorento e agora também pela eurodeputada Ana Gomes. E por quem quiser, através do patrocinato de ideias na internet. Cada vez melhor! Toda a informação estará disponível em site próprio a partir de Março próximo. Se posso dar um conselho, seria útil que o valor do apoio incluísse o pagamento da segurança social e pudesse ter um período de vigência mais extenso.

Parabéns ao Rui e seus cooperantes. Que mil ideias destas floresçam. Seria bom sinal. Não tem que ser o Estado a fazer tudo. A sociedade civil também pode (e deve) dar exemplos. Não é assim tão difícil. E a esquerda portuguesa está muito atrasada neste âmbito. Por isso, a quem diz que isto foi um golpe político, eu digo: ai é? Então façam também! Quantas mais iniciativas destas melhor!!

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Ainda a propósito das eleições europeias

Após uma análise mais panorâmica, onde realcei a persistência da direita na liderança do Parlamento europeu, a crise do PSE e a reconfiguração distinta ocorrida em Portugal, falta referir alguns detalhes relevantes.

Em 1.º lugar, há um aumento significativo da direita xenófoba (o grupo dos «não inscritos») e dos verdes, este à custa do GUE/ NGL (esquerda) e do PSE. Ou seja, a UE virou um pouco mais à direita e, à esquerda, reforçaram-se alternativas ditas «pós-materialistas», mas que serão mais do que isso, caso os partidos ecologistas representados tenham uma visão mais holística, o que a campanha de Daniel Cohn-Bendit prenuncia. A abstenção subiu ainda mais, perante a indiferença preocupante dos responsáveis da UE.

Em 2.º lugar, em Portugal, o partido vencedor (PSD) ficou aquém dum resultado fora-de-série, e, por isso, a direita coligada ainda não é maioritária (vd. resultados aqui). O PS é que deu um trambolhão histórico, averbando um dos piores resultados de sempre. É caso para muita reflexão num partido que se eclipsou para deixar brilhar a arrogância do rei-sol Sócrates. Mas as primeiras declarações pós-queda do rei-sol são mais do mesmo: manter o rumo, etc. e tal: assim foi com o Titanic. Os Jethro Tull têm um disco sobre o tema: chama-se «Thick as a brick» e recomenda-se.

Destaque-se ainda o peso dos restantes partidos (c.12%) e do voto em branco (quase 5%) e pode-se dizer que, para as próximas eleições legislativas, muito está ainda em jogo.

Outros aspectos a salientar, tomando de empréstimo a análise do João Miguel Almeida: «As eleições europeias tornam ainda mais distante a hipótese de uma nova maioria absoluta do PS e desvanecem de vez a miragem de um bloco central. Corremos o risco de ter um eleitorado à esquerda e um governo PSD/PP mais forte e mais de direita do que o de Santana Lopes e sem dar nenhuma vontade de rir». Resumindo, um mau prenúncio, contra dois bons efeitos.

Outra boa notícia foi a eleição do 3.º eurodeputado do BE, o independente Rui Tavares. É uma voz das novas gerações, com intervenção pública inovadora consolidada na blogosfera (Barnabé, 5 Dias, etc.) antes de dar o salto para a imprensa, o que deve ser elogiado num país onde os media mainstream persistem em fabricar um monopólio afunilado e enviezado para a direita, o da chamada «opinião publicada». Mas, sobretudo, pelo seu contributo para um debate de ideias mais aberto e argumentado (onde a agenda internacional sempre esteve bem presente, Europa incluída), não politiqueiro e não convencional, à margem dos humores e tiques monótonos das elites e do «Portugal sentado». Depois da polémica com o vereador independente Sá Fernandes, o BE sai por cima, mostrando que faz sentido abrir-se a independentes e novas figuras que aditem valor ao debate público, cívico e político, casos óbvios de Rui Tavares e Fernando Nobre (dirigente da AMI e mandatário dessa campanha).

Ademais, o contigente parlamentar português, no conjunto, parece-me mais habilitado. O próprio Vital Moreira, que fez uma campanha desastrada, tem condições para um contributo válido, ele que é perito em questões europeias e direito constitucional.

Quem duvida do afunilamento ideológico da «opinião publicada» em Portugal basta atentar no painel de comentadores da noite eleitoral nas tv's lusas, onde os de esquerda assumida eram um resquício. Aliás, se o critério fosse restritivo, só o humorista Ricardo Araújo Pereira entrara em estúdio, e, mesmo este, deslocado num contexto de análise de resultados eleitorais. O socratismo tem-se queixado de perseguição por alguns órgãos de comunicação social (TVI, Público, Sol), mas, a avaliar pela orientação prevalecente, quem realmente poderá alegar discriminação negativa são os partidos da esquerda assumida (BE e PCP) que, com quase 1/4 dos votos, quase não têm visibilidade. O mesmo é extensivo aos movimentos de esquerda, sindicais, etc., bem como ao terceiro sector e às agendas de teor cívico e social, desvalorizadas pelos media convencionais.

Este défice evidente de tratamento proporcional também agudiza a respectiva crise de audiências, o que deveria ser motivo de reflexão por parte desses media, caso queiram contribuir para uma democracia mais pluralista, claro.

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Conferências de Lisboa começam esta tarde, com José-Augusto França


Toda a informação no blogue do Rui Tavares.
No site homónimo terão videodifusão em directo.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Quem fica ao pé do lume é que se aquece

Este provérbio popular ilustra ainda, penosamente, uma prática frequente entre quem lida com a coisa pública por cá. O recente caso das casas municipais de Lisboa atribuídas de modo discriccionário é disso exemplo. Este segredo de polichinelo tem pelo menos 20 anos, mas só agora teve honras de manchete e acompanhamento em vários media. Mais vale tarde que nunca. Aparentemente, começou como arma de arremesso contra a recandidatura de Santana Lopes a Lisboa, mas depressa se espalhou generosamente por várias vereações, atingindo deste modo a vereadora Ana Sara Brito, por ter beneficiado pessoalmente por esta prática quando era vereadora no mandato de Abecasis (parece que foi sob essa presidência que tudo começou).
Em post anterior, apoiara a decisão de se criar um regulamento para acabar com este esquema opaco e discriccionário, ignorando que a procissão ainda ia no adro. Aliás, a ex-vereadora Nogueira Pinto propusera isso mesmo em 2004 e foi ignorada!
Estão em causa c. de 4 mil fogos, que deveriam ter sido aproveitados para estancar a sangria populacional e a sua polarização crescente entre ricos e pobres (condomínios de luxo vs. bairros sociais) e para trazer mais receitas, mas que, ao invés, eram arrendados a amigos por valores irrisórios. As casas construídas pela EPUL obedeciam a regulamentos e visavam obter lucro (quanto a más gestões da empresa, isso é outra história), por isso, é ainda mais gritante esta dualidade de critérios.
Mas a elite por cá tem as costas quentes. Os jeitinhos ainda são recursos comuns e tolerados, e predomina uma concepção patrimonial da coisa pública numa parte significativa daqueles que passam pelo Estado, ou seja, o bem público é gerido de acordo com as vontades e humores de quem manda. É uma lógica de Ancien Régime, para nos relembrar como ainda são as nossas elites: conservadoras, monolíticas, contíguas e ávaras de privilégios.
Rui Tavares avançou aqui propostas interessantes (passíveis de compatibilizar com a proposta municipal, que privilegiará arrendamento para jovens e idosos), Fernanda Câncio aborda o caso no DN de hoje, de que respigo esta passagem certeira: "O que está em causa, e não será de mais repeti-lo, é o que de pior existe em qualquer administração pública - a opacidade, o favorecimento discriccionário, a assunção dos bens públicos como propriedade de «quem está» e o seu tráfico entre escolhidos".
Oxalá este caso seja sintoma de maior exigência democrática, de transparência, regulamentação e igualdade de oportunidades. E que, de caminho, se passe duma política remendista de habitação social para uma efectiva política social de habitação e de fruição da cidade, de ordenamento e planeamento urbanísticos para já, e não para daqui a 30 anos. É que é hoje e aqui que vivemos. Em 2040, não saberemos se ainda cá estamos. Deixem o amanhã e as megalomanias para os astrólogos.
PS: não percam o «Inimigo Público» de hoje e o seu dossiê "Casas camarárias já vinham com máquina de lavar cunhas". São 3 páginas de bom humor.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Grande Rui!

Dúvido muito que exista algum leitor do Peão, um só que seja, que ainda não tenha reparado que o Rui Tavares tem um novo blogue, ainda assim aqui fica a publicidade. Melhor, fica a saudação ao Rui, é uma boa notícia para a blogosfera. E, em jeito de comemoração, fica também o cartoon que se impõe nos dias que correm (que roubei do dito blogue).

quinta-feira, 17 de maio de 2007

A ler

...no "Público" de hoje o texto do Rui Tavares sobre Lisboa, com propostas concretas e interessantes para a futura política municipal.

terça-feira, 17 de abril de 2007

Caro Rui,

Li o teu artigo no "Público" de hoje. Fico desiludido que à esquerda as pessoas tenham estas opiniões e aproveitem pequenas coisas que possam merecer discórdia legítima (quem está no cartaz, em que posição, em que sítio) para atacar o núcleo de uma medida que é absolutamente necessária para o país.

Reconhecendo apesar de tudo a "boa vontade" que subjaz à realização da campanha, escreves que "a campanha tem um fundo pernicioso que vale a pena comentar". Qual é ele?
"Poderia começar-se por considerar que ela é contaminada por uma cultura que usa a celebridade como medida de todas as coisas. Nessa cultura, os estudos aparecem como meramente instrumentais na obtenção do "sucesso", como para as crianças a sopa é apenas a provação a que são forçadas pelos pais para poder chegar à sobremesa. O pior, como sabe qualquer pai ou mãe, é que as crianças são rápidas a arranjar contra-exemplos. Então que tal o Cristiano Ronaldo que não acabou os estudos (e vai ser o jogador de futebol mais bem pago do mundo)? E o José Saramago que não acabou os estudos (e é só o Prémio Nobel da Literatura)?"

Rui, tu criticas a estratégia de comunicação mas, agora sinceramente: achas que se fosse alguém não conhecido alguém olhava para o cartaz? Imagina que era um trabalhador anónimo, e um slogan do género “Não desistas, fica na escola” (ou outro do género). Achas que a campanha tinha algum impacto? A resposta parece-me óbvia. O Pedro Abrunhosa está lá porque todos o conhecem, e é o facto de ser uma celebridade que pode emprestar força à mensagem. É só isso. Não vale a pena extrapolar e começar com moralismos do género que a celebridade é “a medida de todas as coisas”. Quanto aos contra-exemplos, eles existem claro. Mas é precisamente por isso que a campanha existe – já chega o que as crianças pensam e dizem sobre os Cristianos Ronaldo deste mundo. É preciso mostrar-lhes que esses casos são excepções. E era mais interessante e útil que as pessoas que sabem que eles não passam de excepções – como tu sabes – sublinhassem essa mensagem.

Escreves ainda que: "No nosso tempo e no nosso país o que não falta é gente que acabou os estudos e que desempenha trabalhos mal pagos e mal considerados. Há-os às dezenas em cada call-center, essa espécie de manjedouras onde são despejados depois da universidade e trabalham à comissão pela venda de cartões de crédito. Inevitavelmente, esta falsa promessa de sucesso através dos estudos é para eles uma memória amarga".

Talvez seja verdade para alguns, mas então o que fazer? Teria sido melhor que eles tivessem abandonado a escola antes para trabalhar em empregos porventura mais exigentes fisicamente (eu sou daqueles que considera um avanço "civilizacional" ter que pegar num telefone num call center em vez de carregar pedregulhos de 40 quilos na construção civil)? Ou, mesmo que fosse para fazer o mesmo emprego, para ficar toda a vida sem um nível de escolaridade que lhes permitisse ter outros horizontes, concretizáveis se calhar não no par de anos a seguir a terminar o 12.º, mas no futuro próximo? Atenção: tu dás o exemplo relativo às pessoas que acabaram a universidade e trabalham num call-center, mas o público desta medida não é esse (admito que te tenhas enganado, mas esse lapso pode mostrar o teu preconceito subliminar quanto à relativa irrelevância da melhoria das qualificações em geral, falemos de que nível de ensino for). Como já escrevi várias vezes neste blogue, as nossas elites (da qual eu e tu fazemos parte) preocupam-se com o desemprego (ou sub-emprego) qualificado como se fosse uma tragédia nacional - quando a verdadeira tragédia nacional é o abandono escolar em vários momentos precoces do ensino secundário. A modernização progressiva da economia será capaz de absorver muitos que hoje trabalham em call-centers, porque as suas qualificações permitem-lhes ter outros horizontes. Não hoje, não amanhã, mas num futuro próximo. E falo da maioria, não de todos (e tu sabes como é fácil fazer reportagens sobre esta questão a partir de um grupo de pessoas que não representa a maioria). Isto não é wishful thinking; é o que se passa, com um grau elevado de probabilidade, em qualquer economia moderna. Se olhares mais para as estatísticas e menos para os casos que conhecerás pessoalmente, verás que tenho razão. Inversamente, a modernização progressiva da economia deixará para trás os que não têm o 9.º ou o 12.º. Eles ficarão muito mais expostos ao desemprego, e os seus salários sofrerão uma pressão enorme. A precariedade, que eu sei que te preocupa, encontrará neles os primeiros alvos. A mensagem que passas, apoiando-se em alguns factos reais hoje (e todas as teses erradas têm um elemento de verdade, precisamos é de saber avaliar a sua relevância, empírica e normativamente), é a errada para o futuro. Era isso que era preciso que as pessoas percebessem e interiozassem. Dizer ou passar a imagem implícita que estudar não compensa é dar o sinal errado, porque é contribuir para que as pessoas não valorizem o elemento mais valioso na construção do seu percurso profissional. Eu gostava que reflectisses sobre isso.

Terminas escrevendo que: "Ao apresentar o estudo como mero instrumento da profissão, a profissão como mero instrumento do sucesso, e o sucesso medido pela cultura de celebridade, acabamos a degradar tanto o conhecimento como o trabalho e a realização pessoal".
Mas, Rui, essas pessoas não são o público dessa campanha. As que gostam de estudar e se realizam pelo brio e pelo drive intelectual-profissional não precisam dela. Ainda bem que eles existem. Mas o público desta campanha é aquele que acha que não vale a pena estar na escola porque, acham eles, estudar não vale a pena, porque aconteça o que acontecer, eles vão acabar como serralheiros, mecânicos, seguranças, ou empregados da construção civil. A campanha pretende mostrar que eles podem fugir a esse quase-destino sociológico se souberem valorizar aquilo que deve ser valorizado. E se o fizerem, se tiverem qualificações que lhes permitam ter outros horizontes e oportunidades profissionais, mais probabilidades têm de fazer algo que gostam - ou que possam vir a gostar.

Que esses jovens, a partir das fronteiras do seu "mundo-da-vida", não compreendam isso, eu percebo. Que pessoas inteligentes que passaram a vida a estudar e que devem em larguíssima medida o que são hoje a esse capital acumulado não percebam, isso já me deixa deveras espantado.

Por fim, o que prova ainda esta polémica em torno da iniciativa (e da campanha) "Novas Oportunidades"? A minha hipótese é que as elites não percebem que quando se fala para jovens que estão a ponderar sair da escola no fim do segundo período e a acabar o 9.º ano sequer, os códigos e o conteúdo da mensagem tem de ser diferente. Que tu ou muitas outras pessoas que escrevem nos jornais, altamente qualificadas e habituadas a pensar, escrever, e manipular símbolos e livros todos os dias, achem a campanha ridícula, acaba por ser (infelizmente) natural. É que ela não foi feita para ti nem para os outros intelectuais do nosso país.

Seu ;),
Hugo

P.S. - "Até pode ser que o governo tenha uma imbatível estratégia de comunicação. Mas se assim for, fica por explicar como é que o próprio governo põe nas ruas uma campanha sobre a importância de acabar os estudos no auge de uma polémica sobre os estudos do Primeiro-Ministro". As campanhas, com todos os prazos e custos humanos e financeiros, demoram tempo a planear, e não podem ser suspensas assim de um dia para o outro sem razão de maior. Era o que faltava suspendê-la pelo caso em questão.

quarta-feira, 11 de abril de 2007

Sobre a universidade, as "ideias", e os diplomas etc.

«Há qualquer coisa no ideal universitário que o torna difícil de explicar, apesar de ser tão simples. O ideal universitário são as ideias. Ideias sobre como são as coisas, sobre como funcionam, sobre como deveriam funcionar, ideias sobre ideias. Algumas dessas ideias são conhecimento, outra são comentário, outras criatividade, a maior parte delas um pouco disso tudo. Mas é difícil explicar aos alunos, ou até ao resto da sociedade, que dentro daquelas paredes (metafóricas: pode ser cá fora, na esplanada, no trabalho de campo, na visita de estudo) essas ideias devem ter precedência sobre tudo o resto. Se os alunos querem um diploma e os pais pagam por um bom emprego, não é fácil dizer-lhes que por agora a única coisa importante é o que escreveram alguns mortos de há mais de cem anos, ou como se comporta a partícula x, ou que interpretação dar à arte de y. Só depois de ganhar verdadeiro interesse ou paixão por tais coisas chega a altura de se poder começar a tratar de notas, de diplomas e de empregos (...)»

Estas são palavras do Rui Tavares, escritas num artigo do "Público" ontem. O Miguel Vale de Almeida transcreveu-as e adicionou: "Nunca esquecer isto quando se é bombardeado pelo actual ar do tempo em relação à universidade. Nem que se tenha que tapar os ouvidos, dizer a alta voz "lá-lá-lá-lá" e ouvir interiormente este mantra".

Esta é uma discussão muito importante nos tempos que correm. Idealmente, eu não discordo do Rui, mas porque entre as ideias e os contrangimentos da realidade vai sempre um fosso sempre excessivamente grande, discordo do implícito desprezo - que não deixa de ser o que está realmente dito nas entrelinhas - pelas notas, pelos diplomas e pelos empregos. É que, inversamente, parece não ser fácil para a grande maioria dos pais e dos alunos explicar aos professores universitários que, primeiro, está a perspectiva de terem um futuro onde o diploma que passaram anos a tirar conte efectivamente para a realização de um percurso profissional decente e minimamente adequado às suas expectativas. E, infelizmente, para a maioria estas não passam pelo conhecimento do que "escreveram alguns mortos de há mais de cem anos, ou como se comporta a partícula x, ou que interpretação dar à arte de y" - doa o que doer aos professores unversitários. Tapar os ouvidos, como aconselha Vale de Almeida, não resulta em absolutamente nada - a não ser a dar razão àqueles que acham que os professores universitários, self-professed autistas, "não vivem neste mundo".

Não que o desemprego de licenciados seja a catástrofe nacional que por vezes se pinta, ou que universidade seja a única responsável pelos potenciais desajustes entre o titre e o post. Não é, e não é disso que se trata. O problema é que o que o discurso do Rui tem aquele travo amargo da intemporalidade, como se o pudéssemos manter independentemente do contexto, e como se fosse indiferente estarmos no século XIII, no XVIII ou no XXI. Mas ter as "ideias" como a única ou a grande prioridade da universidade é esquecer que, entretanto, o mundo, e sobretudo a economia, mudou - e que a universidade ocupa, e vai ocupar cada vez mais, uma posição de formação de profissionais nas mais variadas áreas. O problema é confundir esta função crescente da universidade - o que para mim representa uma grande vantagem do nosso presente e futuro em relação ao passado - com a ideia de que esta vai ser a única função da universidade. Isto é falso, e é fácil ver porquê. Nunca, no futuro, teremos tanta gente a fazer investigação, tanta gente entregue o mais possível às "ideias" e ao conhecimento desinteressado. Simplesmente, isso não vai acontecer ao mesmo nível de ensino que no passado.
E se isto representa um déclassement relativo dos professores universitários, convém não esquecer o outro lado: o do upgrade cognitivo e social de uma larga fatia da população que dantes não passava do ensino primário ou secundário (que era, obviamente, and please don't sweep it under the carpet, o que permitia à universidade e os seus profissionais dedicarem-se às "ideias" e desprezar a função social e profissional dos diplomas: quando apenas ensinamos as elites, podemos dar-nos ao luxo de esquecer o mundo lá fora e de considerarmos a mera questão "para que é que 'isso' - a nota, o diploma, etc. - serve?" verdadeiramente secundária). E este upgrade é, parece-me, muito, mas muito mais importante que qualquer "corporativismo do universal" (para citar essa expressao particularmente feliz de Bourdieu: ou direi infeliz, dado que ele considerava-o um ideal merecedor de defesa a todo o custo).

Eu admito que não seja deliberado, mas este tipo de platonismos tem sempre o risco de resvalar para um elitismo, à esquerda, particularmente desnecessário e perverso.