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quinta-feira, 8 de maio de 2014

Os vampiros de Jarmusch


Reprodução


Only Lovers Left Alive é o título do mais recente filme do cineasta norte-americano Jim Jarmusch. Diretor de filmes como Dead Man, Noite sobre a Terra, Estranhos no Paraíso, Daunbailó, Flores Partidas, Ghost Dog e outros, ele deu recentemente uma entrevista publicada no site IndieWire em que fala sobre seu filme, um "filme de vampiro". 

São vários os diretores mais cultuados que dedicaram um filme a essa criatura que se alimenta da energia ou sangue e cujo maior sofrimento é a imortalidade. F. W. Murnau (Nosferatu, 1922), Werner Herzog (Nosferatu - O Vampiro da Noite, 1979), Roman Polanski (A Dança dos Vampiros, 1967), Francis Ford Copolla (Drácula de Bram Stoker, 1992) são alguns deles. 

De maneira que me causa expectativas assistir ao novo filme de Jarmusch, que ainda não vi e, ao que parece, deve chegar ao Brasil em outubro. Não há cineasta contemporâneo que fale melhor do tédio da civilização contemporânea do que Jarmusch. Por isso, ele focar sua lente no vampiro, essa figura mitológica, deve ser, como diria minha avó Emiliana, unir "a fome com a vontade de comer". No filme, há um casal de vampiros cultos que estão há séculos juntos, cujos nomes são significativos: Adam e Eve, interpretados respectivamente por Tom Hiddleston e Tilda Swinton.

Sobre o porquê de ter escolhido o tema vampiros para seu novo filme, disse Jarmusch: “Há centenas de filmes de vampiros, mas nosso filme não é um filme de terror. É um tipo diferente de filme de vampiro. Há muitos filmes diferentes de vampiro que não são de terror”.

Ou seja, não espere do vampiro de Jarmusch algo místico, mas uma criatura poética e entediada que, como um dead man, vagueia pelas sombras da civilização ocidental.

Na entrevista, no início de abril de 2014, Jarmusch falou do filme Only Lovers Left Alive e outros temas, como música, cinema contemporâneo, seu status de cineasta underground e sua opinião sobre o cinema atual. "O cinema precisa ser reduzido à sua poesia essencial”, disse o diretor.

Falou na entrevista sobre o fato de que fazer cinema, na sua opinião, é uma atividade cada vez mais difícil. A saída, disse, pode ser o esquema de orçamentos baratos como o do cinema que vem sendo feito na Grécia na atualidade, ou o que já foi realizado no Irã. “Cinema é uma forma tão bonita, mas está ficando muito difícil – é muito diferente do que era há cinco anos – financiar filmes. Não sei o que dizer sobre isso, a não ser que continuo fazendo.”

“Sempre achei as coisas mais interessantes do lado de fora do mainstream. Ao longo da história, sempre houve uma cultura dominante e uma cultura marginal, e as coisas mais inovadoras estão às margens. Nem sempre, mas na maioria das vezes. Estou definitivamente em algum lugar nas margens. Eu não me vejo no mainstream”, afirmou Jarmusch.

Tilda Swinton e Tom Hiddleston, vampiros de Jarmusch
Sobre o chamado cinema independente: “depende de como você define cinema independente. Ele se tornou uma espécie de ferramenta de marketing, especialmente na América, então eu realmente não sei o que significa. As coisas mudaram, e a crise econômica mundial, e as novas maneiras como os filmes são distribuídos, mudaram a forma como eles podem ser financiados. Eu não sei qual é o futuro, mas sei que a nova onda de filmes gregos usando pequenos orçamentos, isso é realmente o futuro, e talvez o melhor caminho. Se você olhar para a história de qualquer forma de arte, digamos o rock 'n ' roll , por exemplo (...) estávamos cansados ​​deste grande rock 'n ' roll de estádio, de gravadora, o rock 'n ' roll comercial que foi impingido, de uma forma convencional. Portanto, é muito importante que, a partir , talvez, de The Stooges, ou Sex Pistols ou Ramones... a idéia é reduzir ao essencial”.

Ainda sobre cultura dominante x underground: “Estou muito mais interessado em ver o cinema de um diretor grego que fez um  filme com 200 mil dólares do que ver O Grande Gatsby, de Baz Luhrmann. (...) na Grécia, Romênia, há anos no Irã, há esses belos jardins do novo cinema que vem de lugares sobre os quais você pensaria: ‘Como é que eles podem fazer filmes em lugares onde a crise é tão grave?’ Mas isso está acontecendo. Eu não sou um profeta, mas apoio as pessoas encontrarem sua própria maneira de se expressar”.

Na entrevista, Jarmusch também fala da relação entre música e cinema. Perguntado sobre o que vem antes quando concebe um filme (a imagem ou o som), responde: “Nenhum dos dois. O que geralmente vem em primeiro lugar são alguns personagens e alguns lugares (...) A imagem e o som são a mesma coisa para mim no sentido de criar uma atmosfera”. Se você viu Estranhos no Paraíso (tradução incorreta do original Stranger than Paradise, 1984) e lembra do diálogo da música de John Lurie com as cenas do filme entenderá como a música é intrínseca aos filmes de Jarmusch. O que acontece também, de forma marcante, no filme Dead Man (1995), no qual a história de Johnny Depp como William Blake é como que narrada pela guitarra de Neil Young.

A entrevista de Jarmusch ao IndieWire na íntegra, em inglês, está aqui: Jim Jarmusch on the Future of Independent Film: 'Cinema needs to be reduced to its essential poetry'

Leia também:



quarta-feira, 17 de julho de 2013

O vampiro do Polanski


Ainda não é desta vez que vou escrever um post da série Favoritos do Cinema sobre Roman Polanski, embora este seja um dos cineastas mais abordados neste blog, porque, afinal, é não apenas um grande diretor como também uma persona cuja trajetória é em si mesma o roteiro de um grande e misterioso filme.

Não, este post é apenas para falar de um filme que revi dias atrás e que, como havia assistido há muitos anos, provavelmente em circunstâncias desfavoráveis (já que ele se apagara de minha memória), não me lembrava de nada.


Polanski e Sharon Tate em A Dança dos Vampiros (1967)

Trata-se de A Dança dos Vampiros, uma das muitas versões disponíveis no cinema sobre a mitológica criatura cujo maior sofrimento é não poder morrer e que, saindo do túmulo durante a noite, suga a vida das pessoas que encontra pela caminho.

O escritor irlandês Bram Stoker, com o clássico Drácula, foi quem deu forma ao vampiro eternizado nas telas de cinema nos três mais badalados filmes sobre o personagem que se basearam no livro de Stoker, e tirando os antigos e inesquecíveis filmes meio trash, meio cult, mas sem dúvida clássicos, interpretados por Bela Lugosi, deliciosos de ver, mas que mereceriam um post à parte.

Com “três mais badalados” me refiro a Nosferatu (de F.W. Murnau, 1922), com Max Schreck no papel do bebedor de sangue; Nosferatu - O Vampiro da Noite (de Werner Herzog, 1979), com a extraordinária interpretação de Klaus Kinski; e Drácula de Bram Stoker (de Francis Ford Coppola, 1992), a grande e caríssima produção de um diretor que dispensa comentários, cuja grandiosidade faz do intérprete do vampiro, Gary Oldman, o menos brilhante dos três atores, na minha opinião. Em A Dança dos Vampiros, Polanski faz um vampiro quase insignificante, que tem menos importância do que os outros personagens e do que os outros vampiros. Por quê?

O filme de Murnau, forjado no clima expressionista alemão que vicejava na Alemanha pós-Primeira Guerra que prenunciava com suas sombras o terrível porvir nazista, é naturalmente pessimista, e trágico; o de Herzog, igualmente erótico e pessimista (um arquétipo alemão?), entretanto substitui a tragédia pela ironia, que Klaus Kinski incorpora como um mestre; e o filme de Coppola, que privilegia a visão hollywoodiana (emblematizada pelo idiota beijo final do vampiro moribundo e a amada – a espetacular Wynona Rider), mas que tem soluções gráficas e de roteiro que só Coppola poderia fazer, como a sequência inicial, que dá ao filme uma carga histórica que os outros não têm: Coppola interpreta o Drácula de Bram Stoker como uma tragédia shakespeariana que atravessa os séculos, incorpora o ódio ao catolicismo medieval e admite o espiritismo, na medida em que deixa claro que a paixão do vampiro (Gary Oldman) pela amada (Wynona Rider) começara séculos antes.

No filme de Polanksi, de 1967 (feito portanto 45 anos depois do de Murnau e antes que os de Herzog e Coppola 12 e 25 anos, respectivamente), as referências à matriz (Bram Stoker) se diluem. Murnau, Herzog e Coppola seguiram de maneira mais ou menos fiel (mas sempre fiel) o roteiro traçado pelo escritor. Em Polanski, o roteiro é bem diverso. No entanto, é o que melhor preserva as origens nas quais todos beberam, qual seja, a cultura romena e do leste europeu, seus mitos e folclores, o figurino e o cenário a caracterizar o enredo.

Não tenho elementos para dizer quais foram as locações das filmagens de A Dança dos Vampiros, mas de fato ele filma a atmosfera meio fabulosa (na acepção do termo) de um povo camponês, não industrial, e suas crendices.

Polanski filmou a cultura anterior àquela que os outros ignoraram em seus filmes. O vampiro de Murnau é o alemão das sombras expressionistas. O de Herzog é também o alemão, de outra época, pós-Segunda Guerra. O de Coppola, embora incorpore até mesmo a questão da reencarnação, é norte-americano.

O de Polanski não. Ele admite a cultura originária, a romena. E, apesar disso, incorpora também algo que lembra (embora não explicitamente) a época do ácido lisérgico e o espírito dos anos 1960.

O próprio Polanski interpreta o segundo principal personagem do filme, o assistente do professor Abronsius. E dá a ele um caráter cômico, irônico, mas nunca trágico.

E dá ainda, sem querer, um caráter profético e macabro ao filme. A heroína, que no fim se transforma em vampira, é interpretada pela belíssima Sharon Tate, então esposa de Polanski, que foi brutalmente assassinada em 1969 por um louco chamado Charles Manson, líder de uma seita satânica, condenado à prisão perpétua, que continua até hoje preso na Penitenciária Estadual de Corcoran, na Califórnia.

A título de curiosidade, Polanski dirigiu também um dos maiores clássicos do terror, O Bebê de Rosemary, de 1968, um ano antes do crime que vitimou Sharon Tate, filme que conta a história de um jovem casal (interpretado por Mia Farrow e John Cassavetes) que se muda para um prédio habitado por estranhas pessoas que vão se revelando adoradoras do demônio. A jovem (Mia Farrow) é drogada, concebida e dá à luz uma criança: o filho das trevas.

Detalhe: o filme teve como locação o edifício Dakota, onde moraram Judy Garland e Boris Karloff. O Dakota foi cenário da ficção O Bebê de Rosemary e do real assassinato de John Lennon, que morava ali em um apartamento com Yoko Ono. Lennon foi assassinado por Mark David Chapman em 8 de dezembro de 1980 em frente ao edifício Dakota.



quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

Livros (e filmes) à mancheia!


Neste fim de ano dei alguns livros de presente. É legal dar livros de presente, é lúdico. Seguem alguns interessantes:


Carpinteiros, levantem bem alto a cumeeira e Seymour, uma apresentação, de J. D. Salinger (1919-2010), escritor norte-americano mais conhecido pelo best-seller O Apanhador no campo de centeio, que não li. No volume da L&PM, as duas novelas do título, que se passam na primeira metade do século XX, são narradas por um professor universitário recluso relatando reminiscências de sua relação com os seis irmãos, filhos de um casal de artistas. O foco de ambas as histórias é o irmão mais velho e predileto do narrador e de toda a família: Seymour, o irmão-poeta, uma espécie de anjo rilkiano (ver As elegias de Duíno, de Rainer Maria Rilke).

Mas a vida e morte de Seymour não faz da história de Salinger um relato depressivo, ou repleto de comiserações, ou mesmo dramático. Pelo contrário, Salinger não fala da morte, mas da poesia, valendo-se de uma ironia permanente que chega por vezes a tangenciar o sarcasmo (não é por acaso que cita Kierkegaard no segundo relato). “Como é que eu posso registrar o que registrei e ainda sentir-me feliz? Mas me sinto. Alegre, não, nem de leve, porém meu entusiasmo parece ser à prova de qualquer choque”, diz o narrador.

A seta venenosa de Salinger, cuja ponta traz o veneno da ironia, é dirigida a todos, leitor inclusive, críticos literários principalmente. “Você nem pode imaginar os planos grandiosos que eu tinha para estas páginas. Acho que estavam fadados a fenecer no fundo de minha cesta de papéis”, escreve o professor enquanto tenta traçar o perfil do irmão morto (vale observar que o narrador também não esquece, como um de seus múltiplos alvos, da então hegemônica psicanálise, que causou frisson entre intelectuais de todos os segmentos na primeira metade do século passado).

A narrativa da primeira história, Carpinteiros, levantem bem alto a cumeeira, é feita com uma linguagem mais linear – mais fácil de ler – do que Seymour, uma apresentação. Este último relato é daqueles de perturbar editores que amam períodos curtos e parágrafos sucintos, de enervar os resenhistas sem tempo de realmente ler um livro – para uns e outros, é mais prático que o raciocínio obedeça a regras simples de redação e proporcione um entendimento tão imediato quanto raso.


Drácula, de Bram Stoker (1847-1912). Bem, este livro não precisa de muitas apresentações, a não ser que é preciso tomar cuidado com a edição. Recomendo duas: da Nova Cultural (a boa e velha de capa dura) ou a de bolso da L&PM. É a história clássica do vampiro da Transilvânia na qual se basearam depois incontáveis outros autores e os diretores de inúmeros filmes do gênero terror, do qual os melhores filmes são Nosferatu, de Murnau (1922), Nosferatu, de Herzog (1979), e Drácula de Bram Stoker, de Coppola (1992).

O livro Drácula foi publicado em 1897, escrito a partir de pesquisas sobre um nobre do século XV que viveu na região da Transilvânia, na Romênia. Diz a lenda que Vlad empalava seus inimigos e por isso era conhecido como O Empalador. Ele, de fato, existiu, e combateu ferozmente os turcos no século XV. Numa época em que o mercado é inundado de lixos do tipo Crepúsculo, protagonizados por vampirinhos bonitinhos e ordinários, ler o original do autor irlandês Bram Stoker é recomendado. Eu, que na infância adorava assistir a filmes de terror com minha avó Emiliana (só eu e ela na sala), acho imprescindível que os jovens conheçam algo mais denso do que a idiotice dos vampirinhos de crepúsculo, e por isso dei esse livro de presente para uma sobrinha de 15 anos que é uma rara menina que adora ler.


Caninos Brancos, de Jack London (1876-1916). Sobre essa pequena obra-prima, já escrevi neste blog: A natureza selvagem segundo Jack London. As edições recomendadas são: a mais do que esgotada edição do Círculo do Livro (ainda vou escrever um post sobre o saudoso CL), que achei em “ótimo estado” num sebo virtual, e a da L&PM, também em loja virtual. London é um dos escritores mais importantes da essencial literatura norte-americana que se consolida durante o século XX. Ele é precursor de uma linhagem que depois vai passar por Hemingway, Jack Kerouac e Bukowski, por exemplo.

Caninos Brancos é a história de um lobo que tem de conviver com um predador mais poderoso do que ele, o homem. Pode ser lido por adultos e jovens, qualquer um dotado de sensibilidade.

As pessoas que gostam de animais, sobretudo cachorros, vão se envolver muito com a história, sobretudo porque sua narrativa não é a narrativa de qualquer um, é a de Jack London.



Audrey Hepburn é a capa da Cia. das Letras
Bonequinha de Luxo. Eis um pequeno romance, ou uma novela, adorável. É de 1958 e de outro notável escritor norte-americano, Truman Capote (1924-1984), o mais jovem dos citados neste post sobre livros que dei de presente de Natal. Só há um problema no caso desta obra: é que a única edição confiável fácil de achar é da Companhia das Letras: o livro é caro até em sebo, como é normal com as edições desta editora.

É a história de uma “caipira” dos Estados Unidos que vai para Nova York em busca de ambições. Seu “sonho de consumo”, mais do que ser uma atriz de Hollywood, é a famosa joalheria Tiffany's (daí o título do original em inglês, tanto do livro de Capote como do filme dirigido por Blake Edwards: Breakfast at Tiffany's).

A versão hollywoodiana (o filme) acrescenta soluções menos dramáticas do que a história contada por Capote. O conto mostra um cotidiano em que não existe um happy end como quer Hollywood, porque Capote vê a vida em Breakfast at Tiffany's apenas como a vida que flui e se transforma e acaba. Capote era implacável, e não foi à toa que escreveu talvez a obra mais importante da chamada literatura de não ficção, A sangue frio.

Porém, depois de ler o livro de Capote, veja o filme Bonequinha de luxo! Tirando o hollywoodianismo, a película de Blake Edwards conta com uma atuação ma-ra-vi-lho-sa de Audrey Hepburn. Poucas vezes vi uma atriz encarnar uma personagem tão bem como Audrey incorporou a Holly Golightly criada por Capote. Mas se você viu o filme e ainda não leu o livro, leia-o. Comigo aconteceu nessa ordem, e não foi menos encantador.

Por hoje, fico por aqui.