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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Grandes atores (7): Leonardo DiCaprio



Em O Aviador, faz o excêntrico Howard Hughes

Leonardo DiCaprio, na minha opinião, divide com Matt Damon um lugar na galeria de grandes atores de sua geração. Nascido em 11 de novembro de 1974 (nativo de escorpião), com 42 anos, é quatro anos mais novo do que Damon.

Como já escrevi em outro post, DiCaprio não está sempre trabalhando com grandes diretores por acaso. Senão vejamos: atuou em filmes de Quentin Tarantino (Django Livre - 2012), Clint Eastwood (Edgar - 2011), Steven Spielberg (Prenda-me se For Capaz - 2002), Woody Allen (Celebridades - 1998) e outros. Com Martin Scorsese, diretor com o qual tem o "casamento" mais bem sucedido, o ator tem sua mais ampla parceria no cinema: foi protagonista de O Aviador (2004), Gangues de Nova York (2002), Os Infiltrados (2006), A Ilha do Medo (2010) e O Lobo de Wall Street (2013). Em Os Infiltrados, aliás, um thriller policial, faz ótimo "dueto" com Matt Damon.

O time de diretores não é pouca coisa e já quer dizer muito. Mas se você assistir a Edgar, O Aviador ou Django Livre, por exemplo, verá que DiCaprio é dos atores que, como já disse em algum lugar, fazem um  filme ser diferenciado, já que seus personagens são dotados de alma. Tire DiCaprio de O Aviador, filme com quase três horas de duração, mas que você não vê passar. Além da excelente trama  e roteiro, que conta a vida do milionário Howard Hughes (1905-1976), o filme tem cenas como  na epifânica sequência em que Hughes/DiCaprio filma (filme dentro do filme) um combate de Hell's Angels, produção de cinema que “na vida real” o empresário lançou em 1930 com estrondoso sucesso ao custo astronômico, para a época, de quase 4 milhões de dólares. A interpretação do ator no filme é magistral.

Em Prenda-me se For Capaz, de Spielberg, um genial falsário, 
Assim como no antológico Prenda-me se For Capaz, de Spielberg, em que interpreta um adolescente genial e fora da lei, perseguido pelo trapalhão policial Carl Hanratty (a cargo do excelente Tom Hanks). O f ilme é baseado na história real de Frank William Abagnale, Jr., um falsário que começou como falsificador de cheques na década de 1960 e, graças a sua genialidade, conseguiu se fazer passar por piloto da Pan Am, médico e advogado. O personagem é uma pessoa com sérios problemas psicológicos e manias, com raízes freudianas profundas. Manifesta uma obsessão – transtorno obsessivo compulsivo (TOC) – que lhe causa horror de pegar em trincos de portas (principalmente banheiros) e cumprimentar as pessoas, situações diante das quais Abagnale/DiCaprio é tomado pelo sincero pânico.

Em Django Livre, uma espécie de western em quadrinhos em forma de filme, ao estilo de Tarantino, que pode levar você à gargalhada ou às lágrimas, DiCaprio faz o vilão: o senhor de fazenda escravagista Calvin Candie. No filme, ele contracena com Jamie Foxx (que faz  Django) e o espetacular Christoph Waltz (atua no ótimo Deus da Carnificina, de Polanski, e Bastardos Inglórios, também de Tarantino).


Como o vilão Calvin Candie, em Django Livre

Escrevi no post anterior já citado (de 2014) que talvez DiCaprio, então com apenas 39 anos, precisasse de um pouco mais de estrada em sua carreira para amadurecer e se tornar realmente um dos grandes. Fazendo pequena correção, parece-me que ele já é.

Se você pesquisar sobre o ator, verá que ele é "mais conhecido" pelos papeis de Jack Dawson, em Titanic, e Romeu, em Romeu e Julieta. Dois filmes menores que não vi nem verei. Também não assisti a O Regresso (dir. de  Alejandro Iñárritu), pelo qual ganhou o Oscar. Quero ver este fime, que une DiCaprio e Iñárritu, diretor de Babel (2006) e 21 Gramas (2003).

A biografia do ator tem uma curiosidade. Segundo consta, seu nome teria sido inspirado, de acordo com sua mãe, porque ele teria dado seu primeiro pontapé quando ela, grávida, contemplava um quadro de Leonardo da Vinci na Itália. Mas essa história precisaria ser checada talvez com o próprio Leonardo DiCaprio...


sábado, 29 de outubro de 2016

Grandes atores (6): Anthony Hopkins


Fotos: Reprodução
Como o imortal Hannibal Lecter
Já comentei sobre esse monstro da arte dramática num post em que juntei outros monstros (Gene Hackman, Marlon Brando, Rod Steiger). Mas Anthony Hopkins merece um post à parte. Claro que os outros aqui citados também. É que vi anteontem um filme totalmente descartável, que entretanto me remeteu diretamente à infância: A Máscara do Zorro (1998, dirigido pelo medíocre Martin Campbell, diretor hollywoodiano encarregado apenas de executar roteiros pré-fabricados), no qual Hopkins interpreta Don Diego de la Vega/Zorro. Na infância, o Zorro da série de TV que tinha Guy Williams no papel do herói e o eterno sargento Garcia era um de meus programas favoritos na telinha.

Mas, voltando, apesar de A Máscara do Zorro ser um filme muito ruim (uma ideia boa, mas mal aproveitada), com todo tipo de soluções comerciais e clichês made in Hollywood, ver Hopkins compensa: tudo vale a pena se a alma não é pequena. Curiosamente, algo me faz sempre associar esse ator britânico nascido em Port Talbot em 1937 ao nova yorkino Jack Nicholson, coincidentemente nascido no mesmo ano. Porém, apesar da grandeza de Nicholson, acho Hopkins superior.

Enquanto o americano, de certa maneira, é freqüentemente ator de si mesmo, na medida em que seus personagens costumam ser um pouco, sempre, o próprio Nicholson, o inglês parece ser mais capaz de ser tanto um padre, com suas expressões cândidas e santas, como um irremediável romântico ou um psicopata de inteligência sobrenatural e mente fria.

É o caso do papel do serial killer Hannibal Lecter, em O Silêncio dos Inocentes (Jonathan Demme, 1991), um dos grandes thrillers da história do cinema. No filme, Hopkins incorpora o espírito de uma criatura que passa a existir graças ao talento assombroso do ator. Nesse sentido, ele opera na arte dramática o que, na literatura, apenas grandes escritores são capazes de fazer: dar vida a um personagem. Mais do que isso, dotá-lo de alma, de tal modo que é como se fosse um ser real.


Jodie Foster, como a policial Clarice, cujo mestre (e sombra) é Lecter

Hannibal Lecter é um desses personagens do qual não se esquece jamais. Como já escrevi no post citado acima, o personagem Lecter se transforma no mestre da policial Clarice Starling exatamente como o ator Hopkins se transforma no mentor de Jodie Foster, que a interpreta. Isso, de um ator (atriz) monstro parecer conduzir aqueles com os quais contracena, é comum no cinema e no teatro. É com uma fascinação ao mesmo tempo iluminada e sombria que Clarice/Foster interage com o criminoso Hannibal/Hopkins. Isso não se daria se o ator fosse outro, ou um ator menor. Provavelmente o filme sequer teria brilho ou importância.

Como também já escrevi, esse "é um filme paradigmático de uma grande atuação, porque Hopkins opera no personagem uma transformação que vai da brutalidade à doçura, da contemplação à explosão assassina, e ele expressa essas nuances em sua face como se fossem, cada uma, a face mesma da brutalidade, da doçura, da contemplação e da selvageria". É uma das maiores atuações que já vi no cinema.


Como Don Diego de la Vega/Zorro, único motivo para ver o filme

A relação mestre-discípulo da qual falei acima, que se dá entre Hopkins e Jodie Foster em O Silêncio dos Inocentes (The Silence of the Lambs, no original em inglês), acontece também em A Máscara do Zorro, entre o mesmo Hopkins e Antonio Banderas, que é muito bom ator, mas perdeu muito de seu brilho depois de deixar a Espanha (onde atuou em vários filmes sob a direção de Almodóvar) e se transformar num ator secundário de Hollywood, apesar de eu ter lido, não lembro onde, que foi como Zorro que Banderas atingiu importância internacional. Importância em bilheteria, apenas, e decadência como ator.

Como o professor Van Helsing, em Drácula
Em Drácula de Bram Stoker  (1992), do grande Francis Ford Coppola, Hopkins faz o bondoso e sábio professor Abraham Van Helsing, a antítese de Hannibal Lecter, já que é ele o portador do conhecimento capaz de combater o mal.

Em Drácula, é curioso notar que Hopkins não tem a importância dos filmes citados neste post ou em outros. Mas isso acontece por um motivo simples: é que não é possível, dada a força do personagem central, o vampiro, qualquer outro se sobrepor a ele. Gary Oldman, de resto, como Drácula, está excelente no papel, assim como Winona Ryder no papel da amada Mina Harker. O que, de resto, não é nenhuma novidade, já que Coppola é um dos maiores diretores de ator do cinema.

 Leia também, da série Grandes Atores:




sábado, 8 de outubro de 2016

Grandes atores (5): Johnny Depp



No mesmo filme, dois personagens: soldado e travesti

Johnny Depp é um ator que enriquece qualquer filme. Ou melhor, é um ator que pode fazer com que um filme medíocre ganhe vida por sua simples presença. No filme Antes do Anoitecer (2000, direção de Julian Schnabel), que não é medíocre, mas é um hollywoodiano cheio de clichês, Depp dá uma mostra do que pode fazer com a arte dramática.

No filme, Javier Bardem interpreta o escritor cubano Reinaldo Arenas, que era gay e viveu agruras no regime comunista de Fidel Castro. Johnny Depp, neste filme, interpreta dois personagens completamente antagônicos: o travesti Bon Bon e um militar tipicamente sul-americano, o  tenente Victor.

Depp não é um ator do tipo que interpreta sempre a si mesmo, característica de vários atores listados entre os grandes, como é o caso de Robert De Niro. Essa característica não necessariamente desqualifica um ator, mas às vezes cansa. Depp não é desse tipo, ele é um camaleão.

O filme que para mim é seu auge é Dead Man (1995, direção de Jim Jarmusch). Não apenas por sua atuação magistral na obra, em que faz uma espécie de reencarnação do poeta William Blake (são várias as interpretações que se podem fazer desse filme, construído sob densa poética), mas pelo filme em si, na minha opinião o melhor de Jarmusch, com a excepcional trilha sonora de Neil Young que é parte intrínseca ao filme.

Em Dead Man, a transformação do personagem William Blake se processa no desenvolvimento da história.

O inocente e tímido caipira que atravessa os Estados Unidos em busca de emprego na distante cidade de Machine...




... se torna o temível e frio Dead Man...




Depp adora fantasia. Sua parceria com o desenhista e diretor Tim Burton é uma das mais bem-sucedidas do cinema contemporâneo. Sob a direção de Burton, Depp atuou em Edward Mãos de Tesoura (1990), A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, (1999), A Fantástica Fábrica de Chocolate (2005) e Alice no País das Maravilhas, ou Tim Burton's Alice in Wonderland (2010).

Fora o western poético Dead Man, Depp atuou em inúmeros filmes de vários gêneros. No gênero máfia, por exemplo, fez Donnie Brasco (1997, direção de Mike Newell).

Embora não seja um gênero de filme que eu pare para assistir, na franquia Piratas do Caribe, como o capitão Jack Sparrow, Depp dá outro show de atuação, fazendo uma espécie de anti-herói cômico com trejeitos gay.

É um ator extremamente expressivo. Sua face muda de acordo com o personagem ou a cena. Para mim é uma pena que ele dedique tanto tempo a fazer os filmes de fantasia com Tim Burton ou Piratas. Poderia fazer coisas mais interessantes. Mas o ator parece que se apegou a esse gênero de cinema e a essa forma de ganhar dinheiro.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Gandes atores (4): Selton Mello




No filme O Palhaço (contracenando com Paulo José)

A gente tem uma certa tendência a considerar como grandes atores aqueles que já fizeram história, os que já são lenda, os que estão perto de morrer e os que já morreram. O que é natural, já que a carreira de um grande ator, como de qualquer artista (ou mesmo um jogador de futebol), muitas vezes é entendida ao final, depois de uma longa jornada, sob a perspectiva do conjunto da obra.

Não é possível saber o que vai acontecer no futuro da carreira de Selton Mello, mas não resta dúvida de que, pelo que se viu até hoje, ele é diferenciado.  

Um grande ator tem uma capacidade inexplicável de se transformar no outro, aquele que não é: o espírito que de fato passa a existir ao incorporar aquele que, por sua vez, calmamente, docemente, se deixa possuir por meio de gestos, de nuances faciais, de um olhar, de um esgar, como um m édium.

Selton Mello tem esse dom de se transfigurar com gestos, olhares, trejeitos, tons de voz. É muito diferente e muito acima de um Rodrigo Santoro, por exemplo, ator que está mais para galã do que para bom ator, embora tenha atuações marcantes em filmes como Abril Despedaçado (2001) e Não por Acaso  (2007), entre outros. Mas Santoro – que mora em Los Angeles, sempre à espera de uma boquinha para fazer uma ponta em um filmezinho qualquer de Hollywood –, costuma interpretar otimamente um personagem que, na verdade, me parece sempre ele mesmo.  

Já Selton Mello tem mais intimidade com a arte dramática. Eu citaria três interpretações dele que me parecem ilustrativas de sua fascinante capacidade de iludir – que é uma das principais características do (grande) ator:

O Cheiro do Ralo
- em O Cheiro do Ralo (direção de Heitor Dhalia, 2007), interpreta Lourenço, dono de uma loja de objetos e “raridades”. Numa atmosfera em que o bizarro, a ironia e o humor remetem a Machado de Assis, Lourenço recebe figuras desesperadas procurando se desfazer de objetos (símbolos) importantes para elas, embora nem sempre valiosos para o comprador Lourenço.

Ao mesmo tempo que literariamente nos leva a Machado de Assis, o ótimo O Cheiro do Ralo tem fumaças de Buñuel do ponto de vista fílmico, na medida em que, com o bisturi surrealista, destrói algumas das estúpidas certezas do cotidiano pequeno-burguês.

 - em Meu Nome Não é Johnny (de Mauro Lima, 2008 – foto ao lado), como João Guilherme, Selton Mello interpreta a história real de João Guilherme Estrella, um carinha de classe média alta da zona sul do Rio de Janeiro que se envolve com o tráfico de drogas e paga o preço (alto) de suas extravagâncias.

- e em O Palhaço (2011), Selton Mello é não apenas o principal personagem, o ator mambembe Benjamin (que faz o palhaço Pangaré), mas também o diretor do filme, uma das produções nacionais mais bonitas, sensíveis e esteticamente sofisticadas das que vi em muito tempo. Nesse lindo filme, em que divide o “palco” com ninguém menos que Paulo José, os gestos, olhares, trejeitos e tons de voz de Selton Mello realmente são decisivos para que a obra, na minha modesta opinião, seja de certa forma uma continuadora da tradição inaugurada por Federico Fellini, embora já incorporando algumas técnicas posteriores ao mestre italiano, que morreu em 1993.

Os Gerais, como diria Rosa, são o cenário por si só cinematográfico onde se passa a história do filme O Palhaço, permeada pela mineirice natural a Selton, que é da cidade de Passos, a cerca de 170 km de Ribeirão Preto, norte de São Paulo.

É bom que haja um Selton Mello na dramaturgia brasileira. Embora não seja ainda maduro o suficiente para se dizer que já atingiu seu máximo, é um ator diferenciado e digno de ser parte da seção Grandes atores.

Leia também:






segunda-feira, 4 de março de 2013

Grandes atores (3)


Paulo José

Paulo José, em O Palhaço, dirigido por Selton Mello


Este post é para falar de um filme e continuar a série grandes atores.

O grande ator é Paulo José; o filme, O Palhaço, de Selton Mello.

Grande talento, o Selton Mello, que deve ser saudado como uma aparição importante no cinema brasileiro recente.

Paulo José, que foi casado com a grande (e morta tão precocemente) Dina Sfat, é um ator capaz de fazer qualquer coisa. Em Macunaíma (1969), de Joaquim Pedro de Andrade, por exemplo, ele interpreta o próprio “herói de nossa gente” e também a mãe de Macunaíma. O herói criado por Mario de Andrade é vivido no mesmo filme pelo gigante Grande Otelo (Macunaíma criança) e pelo próprio Paulo José (Macunaíma adulto). Precisa dizer que o filme não seria o que é se não fosse Paulo José e Grande Otelo? Precisa, porque é muito forte dizer as coisas quando elas são verdade.

Paulo José dispensa apresentações. Trabalhou em incontáveis filmes, novelas e séries de TV. Em Quincas Berro D'Água (2010), dirigido por Sérgio Machado, por exemplo, um entre muitos, ele interpreta o mítico personagem Quincas Berro D’Água, criado por Jorge Amado. Interpreta um morto. Imaginem, interpretar Quincas Berro D’Água.

Em O Palhaço, ele faz o palhaço mais velho de uma trupe de circo mambembe que viaja pelas Minas Gerais em busca de trabalhos, encantando cidades e pessoas. Ele é pai de Benjamin, o palhaço Pangaré (Selton Mello, que dá seu show particular como o filho do palhaço velho), que vive uma angústia existencial: não quer mais ser palhaço, não quer seguir o caminho do pai, mas não sabe ser outra coisa.

É bonito, e ao mesmo tempo inquietante, como a arte transforma obras que amamos em coisas ultrapassadas. Ao ver O Palhaço, pensei muito em Bye Bye Brasil (1979) de Cacá Diegues, aquele da trilha de Chico Buarque, uma das mais lindas canções da MPB que existem (parceria de Chico com Roberto Menescal). Selton Mello com certeza tem Bye Bye Brasil como uma referência. Mas quão mais longe vai com seu filme! As referências do diretor de O Palhaço remontam a Fellini. E não é exagero dizer que emociona como Fellini.


Selton Mello, como o palhaço Pangaré, no filme que dirige

As referências do filme de Selton Mello, é bom dizer, incluem não apenas o grande cinema, mas também a parte chamada brega da cultura brasileira: a trilha sonora tem peças que causariam arrepios a setores cult da sociedade tupiniquim, mas que fazem parte do imaginário nostálgico que o rádio ajudou a disseminar ao longos das décadas a partir dos anos 1970. “Tudo Passará”, de Nelson Ned, por exemplo. Perfeito. Selton Mello está mais para Fellini do que para Godard. Há quem não goste do estilo blasé de Selton Mello, que se pode ver também, como ator, no ótimo filme O Cheiro do Ralo (2007), dirigido por Heitor Dhalia. Mas eu acho muito bom.

O roteiro de O Palhaço, aliás (do próprio Selton Mello e Marcelo Vindicatto), é brilhante. Não é um roteiro explicativo, daqueles que procuram encadear as coisas de maneira didática. As cenas e sequências (e portanto a história) são truncadas como a vida. Mas o fio da meada não se perde. O fio da meada é o circo. A fotografia (sob a direção de Adrian Teijido), que enquadra os planos fundos quase infinitos dos Gerais (o diretor nasceu na cidade de Passos), é ampla como Minas, e ao mesmo tempo intimista em algumas cenas em que a poeira domina o quadro.

Bem, saúdo e recomendo a quem lê este post o precioso filme O Palhaço, que além de tudo emociona, embora não provoque aquela emoção vulgar que Buñuel considerava perniciosa.

E saúdo Paulo José. Um ator universal nem sempre atua em Hollywood.

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Gandes atores (2): Henry Fonda

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Grandes atores (2)


Henry Fonda (1905–1982)


Como Frank, no filme do diretor italiano Sergio Leone

Na cena do duelo final do épico Era uma Vez no Oeste (Sergio Leone, 1968), os dois contendores, Frank (Henry Fonda) e Harmonica (Charles Bronson), estão se preparando para o último embate da vida de um ou outro. Bronson, que talvez tenha feito nesse filme sua única interpretação digna de nota na carreira, olha fixo ao homem com quem tem contas a acertar. Enquanto caminha, na cena impressionante, Bronson fixa o oponente com um olhar penetrante e parado, enquanto Frank/Fonda demonstra apenas com a expressão facial, e principalmente o olhar, que a dúvida assalta seu espírito. A certeza contra a dúvida precede o duelo de fato.

A cena em que culmina o maior western de todos os tempos é simbólica da grandeza de Henry Fonda. O personagem de Bronson evidentemente tinha de ter a certeza, mas não seria qualquer um que poderia interpretar a dúvida. Coube a Fonda, no filme do diretor italiano. A dúvida exige muito de um ator.

Era uma Vez no Oeste, que traz ainda Claudia Cardinale, Jason Robards e outros, vale a pena ser visto se você gosta de assistir a filmes motivado por atuações de grandes atores. Se não fosse suficiente o elenco estelar e a música maravilhosa de Ennio Morricone, Henry Fonda sozinho já bastaria como motivo para assistir a essa obra-prima que é o filme de Leone (post neste link: Favoritos do cinema (3): Era uma vez no Oeste).

Vi recentemente um filme que reúne nada menos do que Henry Fonda com Alfred Hitchcock: O Homem Errado (1956). O protagonista Manny Balestrero (Fonda), um homem pacato de classe média, é envolvido num crime que aparentemente não cometeu, e uma sucessão de acontecimentos kafkianos o vai enredando na trama. Curiosamente (porque é uma película pouco falada) é um dos melhores filmes que vi do mestre Hitchcock. Comparando o icônico Janela Indiscreta, por exemplo, com O Homem Errado, dois filmes do mesmo genial diretor inglês, é possível entender por que um ator pode ser a alma de um filme, enquanto outro apenas “lê” o roteiro.

Demorou muito tempo pra eu entender por que não gostei tanto assim de Janela Indiscreta (um filme intocável para a crítica), e enfim entendi que a atuação limitada e inexpressiva de James Stewart contribui decisivamente para isso, além, talvez, do esquematismo formal e frio que enfraquece a trama e o suspense. Enquanto este filme é prejudicado por esses fatores, em O Homem Errado Hitchcock acerta no ator (Fonda), enquanto no outro erra (Stweart). Assim é com Henry Fonda. Seus personagens ganham vida, enquanto os de outros atores não saem do papel (do roteiro).

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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Grandes atores (1)


Estava eu zapeando quando parei em um filme que passava na televisão. Palavras ao Vento (direção de Douglas Sirk, 1956). Um melodrama hollywoodiano desinteressante, mas que traz em seu elenco o ator Robert Stack. Um ator medíocre, mas que minha mãe adorava, sobretudo por seu papel na antiga série Os Intocáveis, em que interpretava o agente Eliot Ness. Se fosse viva, dona Leila ficaria brava comigo por chamar de medíocre o galã Stack/Ness, mas, infelizmente, essa bronca ela não vai me dar.

Seja como for, o acaso (“o senhor de todas as coisas” – Buñuel) me levou a ver um trecho do filme e aqui estou para falar de atores. Grandes atores não são uma espécie muito comum, apesar dos zilhões de filmes que existem no mundo e de muitas vezes as pessoas confundirem beleza e glamour com arte dramática. O que é ser um grande ator?

Brando, grande dos grandes
Um grande ator é uma criatura que deixa de existir para dar lugar a um outro espírito, como um médium. Nesse sentido (e a subjetividade é inevitável ao se elencar nomes de qualquer gênero de arte), para mim, o grande dos grandes é Marlon Brando (1924-2004). Esse ator monstruoso que interpretou Don Vito Corleone em O Poderoso Chefão (Coppola, 1972), Emiliano Zapata em Viva Zapata! (Elia Kazan, 1952), Terry Malloy em Sindicato dos Ladrões (Elia Kazan, 1954), Walter E. Kurtz em Apocalypse Now (Coppola, 1979), entre tantos outros. Há uma sequência em O Poderoso Chefão que é impossível ver sem se emocionar: quando Don Corleone fica sabendo da morte de seu primogênito Sonny e em seguida dá as ordens para o dono da funerária fazer o “serviço” para que a mãe não veja o corpo do filho “massacrado”. A emoção aqui não se dá por artifícios de cena, por influência musical, por melodramatização de roteiro, mas unicamente pela interpretação de Brando.

Truman Capote, no belíssimo ensaio "O duque em seu domínio" (no livro Ensaios), descreve Brando, a quem conheceu ao fazer com ele uma entrevista em 1956, e fala da “facilidade de camaleão com que Brando adquiria as cores cruéis e duras do personagem, com que soberba, como uma salamandra sinuosa, ele se vestia com o papel, como sua persona evaporava”. Conta também Capote que Elia Kazan disse: – Marlon é simplesmente o melhor ator do mundo.

Bem, quem sou eu para discordar de Elia Kazan?

Hackman, durão e genial
Há atores que muitas vezes são coadjuvantes, mas, como coadjuvantes ou protagonistas, fazem invariavelmente de sua atuação a própria alma de um filme. Esse é o caso do genial Gene Hackman. Ele mostra por que é um dos melhores atores do mundo em filmes como A conversação (Coppola, 1974), Mississipi em Chamas (Alan Parker, 1988), Os Imperdoáveis (Clint Eastwood, 1992). Cito apenas três grandes filmes (porque do contrário este post seria uma enfadonha listagem de filmes), mas Hackman é daqueles atores que fazem com que você veja uma película só por vê-lo atuar, mesmo que o filme seja meia-boca. É outro monstro, com o perdão da repetição.

Hopkins, mestre
Anthony Hopkins é mais um que incorpora o espírito de criaturas que passam a existir graças a um talento assombroso. Em O Silêncio dos Inocentes (Jonathan Demme, 1991), a impressão que se tem é que o impiedoso personagem, o assassino Hannibal Lecter, se torna o mestre da policial Clarice Starling exatamente como o ator Hopkins se transforma no mentor de Jodie Foster. É com uma fascinação ao mesmo tempo iluminada e sombria que Starling/Foster interage com o criminoso Hannibal/Hopkins. Isso não se daria se o ator fosse outro que não Anthony Hopkins. O filme seria outro, indefinidamente inferior.

Esse é um filme paradigmático de uma grande atuação, porque Hopkins opera no personagem uma transformação que vai da brutalidade à doçura, da contemplação à explosão assassina, e essas nuances ele expressa em sua face como se fossem, cada uma, a face mesma da brutalidade, da doçura, da contemplação e da selvageria. É uma das maiores atuações que já vi.

Quem viu Quando Explode a Vingança (Sergio Leone, 1971) sabe por que outro que deve figurar em uma lista dessas é Rod Steiger (1925-2002). No papel do bandido Juan Miranda, contracenando com o ótimo James Coburn (que faz o terrorista John H. Mallory), ele emociona com o simples talento de interpretar.
Rod Steiger como bandido Juan Miranda
Rod Steiger atuou também em Al Capone (Richard Wilson, 1959), interpretando o personagem-título, e Doutor Jivago (David Lean, 1965), como Komarovsky, entre muitos outros, claro.

A responsabilidade do diretor certamente tem muito a ver com o fato de um ator conseguir uma grande interpretação. Isso é mais ou menos óbvio, pois os grandes se procuram. Não é mero acaso, por exemplo, que Elia Kazan e Marlon Brando trabalhavam juntos; ou que Coppola tenha procurado Brando, Al Pacino, James Caan, Robert Duvall ( esses quatro fazem parte da constelação impressionante de O Poderoso Chefão), ou Gene Hackman e outros. Essa simbiose entre grandes diretores e grandes atores é natural, como é em qualquer profissão.

O que é interessante é quando um ator que se tem como medíocre um dia tenha atuação que faz você pensar: "nossa, mas esse cara é bom pra cacete!" E você fica com uma sensação de que é um ignorante que nunca entendeu, nem intuitivamente, do que seja uma interpretação. É o caso de John Travolta, que, como ator, sempre foi um ótimo dançarino. Mas aí você assiste a Pulp Fiction (Quentin Tarantino, 1995) e fica admirado, e pensa: “meu deus, mas o John Travolta é muito bom!” Nesse caso, penso eu, trata-se apenas de um milagre de que um grande diretor como Tarantino é capaz. De fato, Travolta estraçalha nesse filme. Mas cite outro!

Acontece também o contrário. Atores que parecem enormemente talentosos e de repente decaem para um limbo de mediocridade inexplicável. Esse é o caso de Johnny Depp. Quem viu Dead Man (Jim Jarmusch,1994) e Antes do Anoitecer (Julian Schnabel, 2000), no qual Depp interpreta magistralmente dois papéis, um policial e um travesti, e hoje vê a lista de lixo industrial-cultural a que Depp se submete para rechear sua conta bancária fica espantado.

Cabe lembrar que nem sempre um grande ator é uma estrela, e já escrevi sobre isso aqui, a propósito de Vincent D’Onofrio.

Mas, enfim, esse post para por aqui. O assunto vai longe. Voltarei para continuar a falar do tema e de outros atores (e também de atrizes, claro), alguns dos quais já citados de passagem neste post, e outros não.

Leia também:

Vincent D'Onofrio: um grande ator nem sempre é um superstar

Gandes atores (2): Henry Fonda

Gandes atores (3): Paulo José: Macunaíma, Quincas Berro D'Água e O Palhaço

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Vincent D'Onofrio: um grande ator nem sempre é um superstar


Como o detetive Robert "Bobby" Goren, em Criminal Intent

Muitas vezes se fala de grandes atores como se um grande ator tivesse de ser necessariamente um superstar. Marlon Brando, Al Pacino, Robert De Niro, Jack Nicholson, Russell Crowe, Anthony Hopkins, Gene Hackman etc.

Vincent D’Onofrio – nascido no Brooklyn, em 30 de junho de 1959 – não é um superstar, mas é um excelente ator. Ele é bastante conhecido como o detetive Robert "Bobby" Goren da série policial Law & Order: Criminal Intent, uma das poucas séries de que eu gosto, ou gostava, de ver, já que ela infelizmente acabou.

Na ótima série com locações em Nova York, o policial Robert Goren faz dupla com a detetive Alexandra Eames, interpretada pela atriz Kathryn Erbe.

A maneira como D’0nofrio encarna o culto policial que penetra nas mentes dos criminosos com um raciocínio lógico apurado aliado à intuição é dessas coisas que fazem a arte dramática valer a pena. Extremamente irônico, Bobby Goren/D’Onofrio está anos-luz à frente de personagens policiais insípidos que não convencem nem a própria mãe, seja de longas-metragens, seja de séries. Prova disso é que uma temporada da série que contou com o ator Jeff Goldblum substituindo D'Onofrio (mas não no mesmo papel) foi um fracasso. É como se Criminal Intent tivesse perdido sua alma.

Como disse o The New York Times em uma matéria, “os espectadores de Criminal Intent geralmente sabiam quem era o culpado (pelo crime). A recompensa de assistir à série, porém, era ver Goren agonizar – em cada caso, um Getsêmani pessoal – para resolver o mistério”.

Li em algum lugar, acho que no NYT mesmo, que Goren/D’Onofrio é um “detetive brilhante e atormentado que canaliza a mente criminosa enquanto a parceira mais prosaica, Alex Eames (Kathryn Erbe), cuida das provas”.

A série Law and Order: Criminal Intent completou 195 episódios ao longo de dez temporadas.

Nascido para matar, de Kubrick

Ator engordou 30 quilos para fazer o papel
Muitos devem se lembrar do perturbador filme Nascido para matar (1987) de Stanley Kubrick. Vincent D’Onofrio – que estudou no Actors Studio – era aquele gordinho psicopata (foto ao lado), o personagem Private Pyle. D’Onofrio engordou 30 quilos para fazer o papel (o que é uma prova de abnegação incrível).

Sobre a chance que lhe foi dada por Kubrick, D’Onofrio uma vez declarou: “Antes de Nascido para Matar, eu era um simples ator de teatro. Honrado, mas que nunca imaginei uma carreira no cinema. Kubrick ofereceu-me esta carreira. Devo agradecer a ele, e somente a ele, o que sou hoje".


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