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sexta-feira, 14 de janeiro de 2011

Dilma já incomoda os iranianos

José Cruz/Agência Brasil

Deu no Estadão que o governo iraniano não está nada satisfeito com a postura crítica da presidente Dilma Rousseff em relação ao tema direitos humanos no país dos aiatolás. Segundo o jornal, “diplomatas brasileiros em Teerã relatam que um assessor especial do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, telefonou para o embaixador brasileiro no Irã, Antonio Salgado, para se queixar” de Dilma.

Em entrevista ao jornal The Washington Post logo após ser eleita, em 18 de novembro, a presidente do Brasil criticou o próprio governo brasileiro, que se absteve de votar contra as violações de direitos humanos no Irã. "Não concordo com o modo como o Brasil votou. Não é a minha posição", disse Dilma, que mencionou ainda as "práticas medievais aplicadas [pelo Irã] quando se trata de mulheres", em alusão à condenação da iraniana Sakineh Ashtiani à morte por apedrejamento.
Mulher iraniana - Foto Marcello Casal Jr.

Enfim, era o que se esperava de Dilma. A muitos de nós causou grande desconforto a postura conchavista do presidente Lula com o chefete de Estado Ahmadinejad, quando disse, sobre a mesma Sakineh Ashtiani, no ano passado, que o Brasil não podia se meter nos assuntos internos do Irã, tendo depois que voltar atrás para oferecer a ela a hospitalidade brasileira.
É óbvio que a substituição de Celso Amorim por Antonio Patriota no comando do Itamaraty é um “sintoma” dessa mudança na postura brasileira. É auspicioso que, com sua enorme liderança emergente no mundo de hoje, o Brasil não se cale diante da barbárie em nome de falsos interesses diplomáticos e econômicos.

"Estamos muito satisfeitas em ver declarações vindas do Brasil de que a brutalidade contra mulheres será pelo menos questionada publicamente", disse Khadijeh Moghaddam, uma dissidente iraniana, ainda segundo o Estadão.

Nessa área, Dilma já começou dando sinais de que seu governo terá uma cara muito própria.

Leia mais sobre Sakineh Astiani clicando aqui.
Leia também: A realidade do Irã governado por fanáticos

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

TV do Irã diz que Sakineh Ashtiani continua presa

"Ao contrário da vasta campanha da mídia ocidental segundo a qual a assassina confessa Sakineh Mohammadi Ashtiani foi libertada, uma equipe de produção da emissora da emissora da Press TV conseguiu com autoridades o direito de seguir com Ashtiani até a casa dela para produzir uma reconstituição visual do crime na cena do assassinato."

Esta é parte da nota divulgada pela emissora de TV iraniana Press TV em sua página da internet, negando que Sakineh Ashtiani tenha sido libertada, como relatado neste blog e em toda a imprensa ontem.

Bom, ao postar a notícia da libertação, eu dizia esperar que "o fato que acaba de ser noticiado não seja um blefe (...). Sabe como é, na 'democracia' iraniana..."

A ativista Mina Ahadi, que ontem comemorava a libertação, disse hoje em entrevista exclusiva ao Uol que "ao torturar e expor seus prisioneiros a emissões televisivas falsas, o regime tenta mascarar seus crimes e reduzir a pressão contra ele. Dessa forma, esse caso torna explícita a natureza criminosa desse regime e de seu sistema judiciário”.

Quer dizer, não era blefe, mas um teatro canalha. A emissora afirma que são políticos os motivos pelos quais o Ocidente faz a campanha pela libertação. De modo que aparentemente nada muda na realidade do Irã governado por fanáticos e o destino de Sakineh continua tão obscuro como antes. O governo iraniano não se pronunciou oficialmente ainda, mas como a Press TV é estatal, conclui-se que a versão é a do governo.

A quem interessar, a matéria da Press TV, em inglês, está neste link.

Atualizado às 17h34

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Sakineh está livre

A iraniana Sakineh Ashtiani, de 43 anos, foi libertada da prisão no Irã, afirmou nesta quinta-feira Mina Ahadi, líder da Comissão Internacional contra a Pena de Morte e o Apedrejamento, de acordo com matéria de O Globo trazendo inclusive fotos da ex-presa com seu filho. Mina "destacou a participação" do presidente Lula e de Dilma Rousseff no processo.

Foto: Reuters (detalhe)
Sakineh Ashtiani

Sakineh era condenada, por adultério, a morrer apedrejada no Irã. Antes de mais nada, a informação é motivo de comemoração e alegria, não só pelo fato em si como porque as pressões de governos, instituições, ONGs e blogs no mundo todo contra essa barbárie medieval e revoltante surtiram efeito.

Espero que o fato que acaba de ser noticiado não seja um blefe, espero que nada aconteça à mulher agora que está livre. Sabe como é, na "democracia" iraniana...

A matéria de O Globo está aqui.

Leia também: A realidade no Irã governado por fanáticos

terça-feira, 3 de agosto de 2010

A realidade no Irã governado por fanáticos

Meses atrás, a revista CartaCapital deu uma foto que me fez lembrar da velha máxima “uma imagem vale mais do que mil palavras”. A fotografia – de uma mulher iraniana condenada por adultério e enterrada até o peito para ser executada por apedrejamento – teve também o poder de me tirar o humor naquele domingo.

O tema está em pauta nas últimas semanas, devido aos apelos de pessoas e entidades do mundo todo pela vida de outra mulher, Sakineh Ashtiani (foto acima), de 43 anos, presa em Tabriz, noroeste do Irã, condenada à morte pela mesma maneira cruel, medieval e bárbara. Pelo que li, como foi condenada em primeira instância, ela ainda vai ter um segundo julgamento, do qual pode se livrar do apedrejamento... para ser executada na forca. Essa é a clemência dos iranianos dos aiatolás.

Segundo a Anistia Internacional, Sakineh obteve o voto por sua absolvição de dois de cinco juízes no julgamento, mas “os outros três, incluindo o presidente do tribunal, a consideraram culpada com base em ‘conhecimento do juiz’, uma cláusula na lei iraniana que permite aos juízes determinarem subjetivamente, e possivelmente arbitrariamente, se o acusado é culpado”. Leia mais aqui, no site da Anistia Internacional, onde você pode obter endereços de autoridades iranianas e participar da campanha pela vida da mulher.

Diante dos clamores, o presidente Lula ofereceu asilo a Sakineh, e ainda não obteve resposta oficial (*). Se é que vai receber. Rejeitando a oferta brasileira, o governo iraniano de Mahmoud Ahmadinejad, acusado pelos Estados Unidos e aliados de enriquecer urânio para fins militares, dirá “não” a um dos poucos países importantes hoje no mundo com quem pode dialogar. Se é que é possível dialogar com esse regime de bárbaros.

Diante da visão maniqueísta antiamericana, às vezes corremos o risco de achar que tudo o que é contra os Estados Unidos é bom. Eu sempre procuro evitar maniqueísmos (para mim sempre equivocados) e suas conseqüências deturpadoras. Por exemplo, não concordo de modo algum com a política dos EUA sobre o Irã, mas tampouco acho que os aiatolás e seu regime merecem clemência. Fanáticos, radicais, doentes, mantêm um status quo de obscurantismo medieval injustificável e macabro. Tudo bem, dizem, é problema deles.

Não é só deles, não. Hoje, no último ano da primeira década do século XXI, as coisas que acontecem do outro lado do mundo são cada vez mais próximas. O que provoca duas sensações: a de que os acontecimentos em qualquer parte do mundo nos dizem respeito; e a sensação de impotência diante de casos como o de Sakineh.

Não é só a rica história persa que é fascinante no Irã. Há, no presente, coisas preciosas, como o belo e importante cinema feito por diretores como, entre outros, Majid Majidi (diretor de Filhos do Paraíso), Abbas Kiarostami (Gosto de Cereja), Ebrahim Foruzesh (O Jarro) e Mohsen Makhmalbaf (que dirigiu Gabbeh e o belíssimo A Caminho de Kandahar, cujo tema é a condição da mulher não no Irã, mas no Afeganistão). Nesse cinema, impera a poesia e a delicadeza, antíteses da brutalidade do regime dos aiatolás.

E é isso.

* PS: escrevi acima que ainda não houve "resposta oficial" à oferta de Lula de receber Sakineh Ashtiani no Brasil. E continuo afirmando. As declarações do porta-voz do Ministério do Exterior iraniano, Ramin Mehmanparast, divulgadas e repetidas durante todo o dia de hoje na internet, não me parecem suficientes para ser aceitas como uma resposta "oficial". Considerando o regime centralizador e autocrata (ou teocrata) do Irã, um mero porta-voz não tem a palavra final sobre nada, muito menos uma resposta oficial.

Atualizado às 21h21.