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Nebulosa da Águia, também conhecida como M16,
uma das mais famosas imagens do Hubble |
“Em 1584, em seu livro De l’infinito universo e mondi, o
monge e filósofo italiano Giordano Bruno propôs a existência de ‘inumeráveis
sóis’ e ‘inumeráveis Terras (que) giram em torno desses sóis’. Além disso, ele
afirmava, baseando-se na premissa de um criador glorioso e onipotente, que cada
uma dessas Terras tem habitantes vivos. Por esses e outros delitos blasfemos,
Bruno foi queimado na fogueira por ordem da Igreja Católica.”
Esse é um pequeno trecho do capítulo 7 do belíssimo livro
Morte no buraco negro e outros dilemas cósmicos, de Neil deGrasse Tyson (editora Planeta), que
estou lendo, uma verdadeira viagem pelo conhecimento e o cosmos, e seus infinitos
mistérios e maravilhas.
Por exemplo, você sabe o que é aerogel? Está lá na página
103 do livro: “substância estranha e maravilhosa” usada pela NASA na
missão Stardust. A meta da Stardust era “descobrir que tipos de poeira espacial
existem lá fora e coletar essas partículas sem estragá-las”. O autor então
explica o que é o aerogel: “a coisa mais semelhante a um fantasma que já
foi inventada. É um emaranhado seco e esponjoso de silício que consiste em
99,8% de nada. Quando uma partícula bate nesse emaranhado a velocidades hipersônicas,
ela perfura seu caminho e aos poucos vem a parar, intacta”.
Vamos para um dado científico no capítulo 14, que trata da
densidade das coisas: “Quando você sai da galáxia, deixa para trás quase todo o
gás, poeira, estrelas, planetas e entulho. Você entra num vazio cósmico
inimaginável. Vamos falar do vazio: um cubo de espaço intergaláctico de 200
mil quilômetros contém aproximadamente o mesmo número de átomos que o ar que
preenche o volume utilizável de seu refrigerador. O cosmos não só ama o vácuo,
ele é esculpido a partir dele”.
Mais à frente, num capítulo que fala sobre espectros de luz:
“Uma coisa é saber que de vez em quando estrelas de alta massa explodem. As
fotografias podem mostrar esse fenômeno. Mas os espectros de raio X e da luz
visível dessas estrelas moribundas revelam um esconderijo de elementos pesados
que enriquecem a galáxia e podem ser diretamente ligados aos elementos constituintes
da vida sobre a Terra. Não só vivemos entre as estrelas, as estrelas vivem
dentro de nós”. Isso é astrofísica, mas também poesia.
Outra passagem me remete diretamente a uma cena do filme
Interestelar. DeGrasse Tyson afirma nas páginas 166/167 de Morte no Buraco Negro,
sobre as sondas enviadas pelo homem ao espaço: “A história da descoberta humana
é caracterizada pelo desejo ilimitado de estender os sentidos além de nossos
limites inatos. É por meio desse desejo que abrimos novas janelas para o
universo (...) as sondas espaciais controladas por computador, que podemos
chamar corretamente de robôs, tornaram-se a ferramenta-padrão para a exploração
espacial. Os robôs no espaço têm várias vantagens claras sobre os astronautas:
são mais baratos de lançar; (...) e não são vivos em nenhum sentido tradicional
da palavra, por isso não podem ser mortos
num acidente espacial”.
Eu ia discordar dessa passagem, baseando minha discordância na magnífica cena em
que dr. Mann (Matt Damon), em Interestelar, percorre o planeta gelado e sem superfície e
diz a Cooper: "Máquinas não funcionam bem (numa missão a outro mundo)
porque não se programa o medo da morte".
Mas, no livro, logo após falar das supostas vantagens dos robôs
sobre o homem, na exploração espacial, Tyson diz: “...Mas até que os
computadores possam simular a curiosidade e as centelhas de insight humanas
(...) os robôs continuarão sendo ferramentas projetadas para descobrir o que
já esperamos encontrar”. Ao contrário do que parecia, isso acaba aproximando
sua visão da abordagem do filme dirigido por Chris Nolan, cuja visão sobre o cosmos é
claramente antropocêntrica, já que, em Interestelar, o homem é destinado a
explorar e talvez conquistar um universo cujo único habitante civilizado e
inteligente é (aparentemente) ele mesmo.
Aqui poderíamos voltar a Giordano Bruno (1548-1600) e fazer
a analogia com nós mesmos (conosco, para usar um português mais culto, mas
obsoleto), para dizer que, em nossa ignorância, talvez façamos hoje o papel que
a Igreja Católica fazia no século XVI: acusamos de “hereges” (mas hereges científicos),
hoje, os que acreditam em civilizações inteligentes extraterrestres, como os
católicos acusavam Giordano Bruno de herege há quatro séculos. Assim é.
Finalizo citando o belíssimo capítulo 22 do livro Morte no Buraco Negro, no qual
DeGrasse Tyson discorre sobre... É até difícil falar, porque é uma das coisas
mais bonitas que já li. Trata da evolução das reações nucleares das estrelas
primordiais: do hidrogênio, que se se funde em hélio, depois em carbono
(fundamental à vida), depois em nitrogênio, oxigênio, sódio, magnésio,
silício... até o ferro. “À exceção do hélio, que é quimicamente inerte, esses
elementos são os principais elementos da vida assim como a conhecemos. Dada a
variedade espantosa de moléculas que esses átomos podem formar, com eles
próprios e com outros, é provável que eles sejam também os ingredientes da vida
assim com não a conhecemos.”
Neil DeGrasse Tyson é um astrofísico conhecido por sua
inserção na mídia. Ele apresentou a série de documentário Cosmos, um remake da
série original criada por Carl Sagan nos anos 1980.
Carl Sagan, além de tudo o que é, é um personagem
intimamente ligado à chamada mensagem de Arecibo. Pesquisem na internet, e
vocês acharão informações interessantes.