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sexta-feira, 3 de agosto de 2018

Helena Buescu e Inger Enkvist: duas opiniões sobre educação a ler hoje


No Público de hoje, dois bons textos sobre educação que merecem uma leitura e um olhar atentos.

   

O primeiro, de Helena Carvalhão Buescu (a ler aqui), sobre as aprendizagens essenciais, sobretudo no domínio do Português do ensino secundário. Um texto de preocupações que, mais do que serem dos professores, deviam ser dos pais, das famílias e da sociedade. Reduzir o ensino secundário ao “essencial”, seja isso o que for, é dar uma machadada no espírito crítico tão necessário, é deixar ao livre arbítrio dos níveis de exigência (não da exigência em si) a preparação e o apoio aos alunos, á ajudar a que se pense e conheça cada vez menos. Os argumentos de Buescu, que subscrevo (para que dúvidas não restem), fazem-me lembrar uma história passada com um colega, professor de Português, há uns anos: uma mãe de um seu aluno de 11º ano encontrou-o e, feliz, contou-lhe que o filho estava a estudar Os Maias. Quando o colega quis saber como era feito esse estudo (que só podia ser através da leitura da obra, obviamente), a progenitora explicou que, todos os dias, à noite, lhe lia um bocadinho do romance até ele adormecer...

O segundo texto é uma entrevista feita por Bárbara Wong à professora universitária sueca Inger Enqvist (que pode ser lido aqui), que, nos seus 71 anos de saber e com uma simplicidade impressionante, diz verdades fundamentais que variadas correntes têm andado a contestar e a alastrar essa oposição, estando a deixar marcas nos sistemas educativos. Marcas que, como sabemos, são fenómenos de moda e que deixarão resquícios de que nos viremos a arrepender, por certo. Vale a pena ler a entrevista na íntegra, independentemente de nos situarmos na sociedade como pais, como professores ou como educadores. Acho que serve para todos, sem excepção. Deixo algumas citações:
“Aprender a aprender”- O “aprender a aprender” dá a ideia de que se aprendeu alguma coisa que se pode usar noutras situações, mas a investigação diz que não. É preciso aprender os factos para se ser capaz de pensar, compreender e chegar a conclusões. É preciso ter muito conhecimento para ser capaz de pensar bem. 
“Em Portugal ou no Reino Unido, ninguém quer ser professor” -É um problema também noutros países. Em comum, têm o facto de terem introduzido a “nova pedagogia” que diz que o estudante tem direitos e não é obrigado a obedecer ao professor. Quando o aluno pode entrar ou sair da sala de aula, quando pode chegar e não trazer os trabalhos feitos, ou pode dirigir-se ao professor de forma desrespeitosa, ninguém quer ser professor.
Perfil de um bom professor- Para ter bons professores é preciso ter um Governo que imponha boas regras. Um bom professor tem de ter uma boa preparação, em termos da língua e do conhecimento, e gostar de aprender. Mas é preciso aceitar que qualquer aluno possa estar em turmas de diferentes níveis. 
Os pais nunca devem falar mal dos professores?- Nunca. Podem dizer: “Se fosse eu, não faria assim, mas aprende tudo o que puderes com essa pessoa.”
Nas férias do Verão, os alunos devem continuar a estudar?-Primeiro, é necessário ir com eles para a rua, depois pô-los a ler. Ler pelo prazer. Até podem oferecer uma recompensa: “Lê dez livros e oferecemos-te uma viagem.” Se não forem bons leitores, não serão bons alunos.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Máximas em mínimas (94) - A escola e a casa

«Eu, durante todo o meu percurso escolar, esforcei-me por manter separados o mundo da escola e o da minha casa.  Se um dos mundos começasse a verter-se no outro, o mundo da minha casa ficaria contaminado. Deixaria de ter um lugar de refúgio. Ainda hoje me sinto contrariado quando se fala em 'colaboração entre os pais e a escola'. Também entendo que esta minha separação dos dois mundos conduziu, por sua vez,  a uma diferenciação de princípio entre a esfera privada e a sociedade. (...) O que vivemos na escola projecta-se numa imagem da sociedade.»
Tomas Tranströmer, in As minhas lembranças observam-me (Porto: Sextante Editora, 2012)

terça-feira, 13 de julho de 2010

Paulo Guinote - A educação entre as grandezas e a humanização

Paulo Guinote. "A educação: uma questão de grandeza?". Diário de Notícias: 12.Julho.2010

terça-feira, 11 de maio de 2010

Só é pena ter demorado 9 anos!

A notícia que transcrevo tem a assinatura da LUSA e está divulgada em vários sítios da net. Os únicos comentários merecidos têm a ver com o tempo que se demorou a ser feita justiça e com o teor das desculpabilizações apresentadas e feitas para constar. Bem podem argumentar com cumprimentos de prazos e com voltas e reviravoltas, mas não está certo que se espere tanto tempo, não é justo que se espere tanto tempo; quanto aos argumentos utilizados para explicar as reacções havidas, só provam que tudo vale para justificar o injustificável e que a sociedade é assim porque se pensa que pode ser assim, sem respeito. Ainda bem que a justiça foi no sentido em que foi, apesar de ter tardado!

Almada - Pai de aluna condenado a pagar 10 mil euros a professora por injúrias

O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) confirmou a condenação do pai de uma aluna da Escola Secundária Anselmo de Andrade, em Almada, a pagar uma indemnização de 10 mil euros a uma professora, por injúrias.

Os factos remontam a 7 de Março de 2001, quando, numa reunião naquela escola, o encarregado de educação apelidou a professora de História da Arte e Oficina de Artes de "mentirosa", "bandalho", "aberração para o ensino" e "incompetente".

A reunião fora solicitada pelo encarregado de educação, alegadamente para obter esclarecimentos acerca das muitas faltas da professora. Num trimestre, a docente faltara onze vezes por ter fracturado uma perna.

Além daqueles insultos, o pai acusou ainda a professora de falta de profissionalismo, de "mandar bocas" à filha, de terminar as aulas "10 minutos antes do toque e pedir aos alunos para dizerem aos funcionários que estavam a sair de um teste" e de na véspera dos testes dizer aos alunos "ipsis verbis" a matéria que iria sair. Aconselhou ainda a professora a procurar tratamento psiquiátrico "urgente".

A professora, com 20 anos de profissão, pôs uma queixa-crime em tribunal, acabando o encarregado de educação por ser condenado pelo crime de injúria agravada. A docente avançou também com uma acção cível, pedindo uma indemnização de quase 19 mil euros por danos patrimoniais e de 15 mil por danos não patrimoniais.

O tribunal decidiu fixar a indemnização em 10 mil euros, mas o arguido recorreu, alegando que as expressões foram proferidas por "um pai preocupado e protector", num contexto de "nervosismo e tensão". Alegou ainda que "não era previsível que as suas palavras desencadeassem um processo contínuo de sofrimento, stress e tristeza além do sentimento de desvalorização pessoal e da dignidade e reputação" da professora. Defendeu igualmente que as consequências das suas palavras para a professora "devem mais ser consideradas como incómodos ou contrariedades do que verdadeiros danos".

Mas o tribunal manteve a condenação ao pagamento de 10 mil euros, considerando que a professora, face às "graves ofensas" de que foi alvo, ficou afectada na sua dignidade e reputação, o que lhe veio a causar um "rol de enfermidades", dele resultando "um quadro clínico de acidente vascular cerebral, acompanhado de síndrome depressivo grave, com oclusão da vista esquerda, com risco de cegueira". O STJ considera mesmo que a indemnização de 10 mil euros "é um nada", já que "a dor de alma é, sem receios de exageros, incomensurável". 11.05.2010 - 15:48 Por Lusa

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Sociedade de violência: a globalização no seu pior

Em Espanha, tem andado em discussão a violência cometida por alguns encarregados de educação sobre professores, sobretudo agora que foi conhecida a decisão da justiça relativamente a uma mãe que, em 2008, em Barcelona, agrediu física e verbalmente a professora da sua filha. Conclusão: dois anos de prisão (que não vai cumprir por não ter antecedentes criminais), uma indemnização à vítima de 8840 euros, uma multa e a proibição de se aproximar a menos de 1000 metros da ofendida. Esta decisão surgiu porque as agressões praticadas foram consideradas atentado à autoridade, coisa que por cá também se tem discutido.
Esta história das agressões a professores e a pessoal da saúde têm razões sociológicas, é certo, baseadas nos direitos do indivíduo que, levados ao limite, questionam as especializações, logo a autoridade. Mas há também o pormenor de cada um reagir às situações das maneiras mais diversas, sendo a violência uma delas. E aí, como escrevia José R. Ubieto, na crónica “Autoridad perdida”, publicada na edição do jornal La Vanguardia (Barcelona: 10.Abril.2010), cabe pensar que se cada um pode reagir como quiser também deve saber que cada um é responsável por essa decisão “y por lo tanto debe responder ante la sociedad y la justicia, si es preciso”.
Já no mesmo jornal, no dia anterior, Francesc-Marc Álvaro assinava o artigo “Pegar al profe sale caro”, título que funciona como advertência e como reflexão. Se, num dado momento, o articulista considera que esta condenação pode significar um avanço positivo “por lo que tiene de serio aviso a los energúmenos que consideran que el maestro o el médico es una suerte de esclavo al que pueden tratar a patadas”, a sua conclusão é mais pessimista, uma vez que a ocorrência destas situações se deve a um “tremendo fracaso social, de una gravedad comparable a los casos de corrupción política que dominan las portadas”. Isto é: para Álvaro, o recurso ao estatuto de “autoridade pública” é também “la certificación de una impotencia y de un naufragio colectivo cuyos efectos sobre el correcto funcionamiento de instituciones clave de la sociedad son devastadores”. E aqui o autor não esconde que, se a escola tem problemas, também é vítima de outros problemas pelos quais não é responsável, remetendo muitas das questões para a família, para aqueles que são “los primeros agentes educativos: los padres”. Álvaro chega mesmo a propor uma catarse, que poderia chegar através de um livro a escrever-se, intitulado La família contra la escuela, verdadeiro confronto para que se percebam muitas atitudes. E este desafio leva o autor a justificar o título da crónica: “Pegar al profe sale caro y es bueno que se sepa. Pero así no curamos la enfermedad social, solo mitigamos uno de sus síntomas molestos.”

domingo, 28 de junho de 2009

Olhar a adolescência

Daniel Sampaio. "Os jovens e os valores". Público ("Pública"): 28.Junho.2009.
(para ler, clicar sobre a imagem)

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Hoje, no "Correio de Setúbal"

Diário da Auto-Estima – 98
Perdidos – Na recepção de um parque de diversões destinado a famílias, surge uma inscrição sobre fundo metálico a dizer: “Pais perdidos, perguntem aqui pelas vossas crianças.” Assim, de repente, parece que o mundo se inverte: pais perdidos? Exactamente. A frase envia os leitores em várias direcções: num tal parque, todos os utilizadores se confrontam com a criança que há dentro de si e vão atrás dos apelos da fantasia; a infância define a sua orientação no parque; aquele que não se envolver com uma dose de infância qb sentir-se-á perdido; os pais devem andar atentos aos filhos e por isso ser responsabilizados. Assim, não serão as crianças que se perdem, mas os progenitores. Pelo menos, do ponto de vista emocional e da responsabilização. O mundo, numa tal situação, ficará, de facto, ao contrário. Mais vale não experimentar!
Estacionamento – Em Setúbal, no troço da Avenida Luísa Todi entre o mercado e o quartel do 11, em ambos os sentidos, o automóvel perdeu lugares de estacionamento, seja pela configuração atribuída ao novo estacionamento e ao arruamento, seja pela quantidade de lugares privados atribuídos. Neste tipo de decisões, se era pretendido que lá não houvesse carros, que se assumisse isso, transformando a Avenida em lugar de passagem apenas. Ir à “baixa” da cidade e frequentar o seu comércio tornou-se mais complicado. Não admira, pois, que a movimentação das pessoas se faça noutras direcções…
Dicionário – O leitor já imaginou as implicações sociais e culturais de um dicionário? Já pensou que o próprio conceito de definição sofre os efeitos dos tempos? O que diria de um dicionário que lhe definisse “acordar” como “tornar a cogitar acabando o sono”, “bigode” como “duas torcidas da barba”, “bilha” como “vaso que faz o som bil bil no vasar”, “cabra” como “animal de pêlo”, “carneiro” como “ovelha macha”, “cuecas” como “panos do cu”, “gaiola” como “vaso furado para ter pássaros”, “macaco” como “animal de trejeitos delirantes”, “vértebra” como “dobradiças das costelas” ou “vertigens” como “rodadura do cérebro”? Pois esse dicionário existe. Deixo a sua história para a próxima crónica, porque espaço é coisa que não sobra por estes lados…

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Francisco Queirós, director de escola, entre as dúvidas e as esperanças

No Público de hoje, duas páginas são dedicadas ao novo modelo de gestão das escolas públicas, assente na figura do director, numa gestão unipessoal. As duas páginas lêem-se e percebe-se que nem tudo vai bem - há escolas em que o processo tendente à condução para o novo modelo está parado, há sítios em que surgem discordâncias entre as autarquias e o Ministério da Educação, há alheamentos, há esperanças, há reservas. Francisco Queirós é, desde meados de Janeiro, o director da Escola Secundária de Paredes e, como tal, foi entrevistado pelo jornal, que, depois de contar a história da sua candidatura, lhe deu a palavra para falar das dúvidas e das esperanças no modelo. Tudo dependerá, afinal, das pessoas. E daquilo que elas queiram fazer no lugar ou pela comunidade ou pela escola. Se essa é uma promessa, é também um risco. Fica, pois, a explicação de Francisco Queirós.
«(...) Questionado sobre se a criação da figura do director não ameaça precisamente beliscar a democraticidade nas escolas, Francisco Queirós responde que depende. "Se é possível que o director de uma escola se transforme num pequeno ditador, é. Se vai haver politização, em muitos casos vai. Mas também vai haver exemplos bons e temos que acreditar que são estes que vão fazer a diferença, porque a alternativa é continuarmos a ter um poder central que, a partir de Lisboa, decide o que é que as pessoas numa aldeia de Trás-os-Montes vão poder fazer."
Nesse sentido, este responsável diz que o novo regime de autonomia, administração e gestão das escolas - que, além da figura do director, cria os Conselhos Gerais, onde professores, autarquias, pais e representantes locais são chamados a pronunciar-se sobre a escola - se aproxima "vagamente desta ideia de comunidade educativa local". Para que tal aconteça, porém, seria preciso que o Estado abdicasse de algum do seu poder.
"O Estado não pode tomar conta de tudo", acusa, considerando que "as escolas estão reféns da legislação que diariamente é lançada" para regulamentar desde os planos de estudos ao mobiliário das bibliotecas.
Do mesmo modo, Francisco Queirós critica a regulação ao minuto do tempo dos professores. "O Governo olha para os professores como funcionários e, pior do que isso, como funcionários de quem se desconfia." Um sintoma disso é a obrigatoriedade de os professores explicarem os critérios de avaliação, mesmo a alunos com sete anos de idade. "A imagem que passa é que eles podem fiscalizar as decisões dos professores. E isso abala a relação de respeito que tem que haver." Apesar disso, continua a acreditar. Sustentado na sua ideia de escola. E porque acredita que o movimento de Conselhos Executivos que começou em Santarém vai conseguir alterar o modo de funcionamento das escolas. "Há uma má imagem dos Conselhos Executivos porque as pessoas decentes que estão nestes órgãos compõem uma maioria silenciosa que está agora a começar a falar. Aliás, ficou claro nos encontros que existe uma vontade grande de agregar os Conselhos Executivos numa associação nacional de escolas, à semelhança do que acontece com os municípios. No quadro legislativo actual, o meu espaço de manobra é reduzido, mas eu estou convencido de que esta associação nacional pode dar o mote para alterar este estado de coisas", confia.
(...)»

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Marcelo Rebelo de Sousa explica aos jovens o conflito na educação

Três jovens, leitores da Forum Estudante em idade de ensino secundário, entrevistaram Marcelo Rebelo de Sousa, trabalho que teve publicação na revista de Fevereiro. A conversa abordou temas como a juventude, o estudo, a política, as Associações de Estudantes, os professores e também facetas do entrevistado. No final, os jovens entrevistadores testemunharam sobre o seu interlocutor nos seus dotes de comunicação, humor e clareza, vertentes que alunos da minha escola puderam testemunhar há cerca de um ano, quando Marcelo Rebelo de Sousa aqui esteve para falar da Europa, numa sessão que acabou por ser também sobre a vida, sobre a política, sobre o futuro, com muita pedagogia, ensinamentos e recomendações para o público. E os jovens estudantes da minha escola, população do ensino secundário, encantaram-se também com o discurso e com as recomendações feitas.
A revista está por aí disponível. A entrevista apela à responsabilidade social que os jovens também têm. E, como não podia deixar de ser, a educação foi também tema, mesmo pela origem dos entrevistadores... Quando Maria da Cunha, estudante do 12º ano do Colégio São João de Brito, perguntou qual a avaliação do papel da Ministra da Educação relativamente aos professores e aos alunos, a resposta de Marcelo Rebelo de Sousa foi: «O caso da Ministra da Educação foi um pouco surpreendente. Era uma pessoa desconhecida, não vinha do universo político, portanto uma pessoa com competência técnica interessada em resolver problemas urgentes do ensino em Portugal. A Ministra prometeu muito, avançou com algumas boas ideias. O pior é que ao lado dessas boas ideias se instalou, desde o início, uma ideia muito errada de tentar conquistar a opinião pública à custa do ataque aos professores, o que é uma coisa muito sedutora, mas muito perigosa. As pessoas aderiram, porque andavam sempre à procura de um bode expiatório e o 'bode expiatório' dos professores foi boa ideia, porque não podiam ser os pais (apesar de, em muitos casos, cada vez menos ligarem aos filhos), nem podiam ser os alunos (apesar de, nalguns casos, eles estudarem cada vez menos). A ideia de serem os professores repetida à saciedade, dramatizada e exagerada com manifesta injustiça teve várias consequências, sendo a primeira delas afastar os professores, colocando-os praticamente desde o início contra a Ministra. Os próprios pais começaram a cair em si e a achar a explicação de que a culpa era dos professores uma explicação muito simplista e que às tantas deixou de justificar tudo o que se faz e o que se deixa de fazer. O que é facto é que os alunos também se sentiram muito desmotivados pelo clima de guerrilha que se instalou nas escolas, porque a partir de certa altura o confronto não foi apenas com os professores, foi com os alunos e com uma parte dos encarregados de educação.»
Estas consequências de que fala Marcelo Rebelo de Sousa não passaram ainda, como se sabe. E teria sido importante, desde sempre, um pensamento como o que, hoje, a propósito de negociações com os enfermeiros e com os médicos, a Ministra da Saúde expressou: é que o ambiente de guerrilha não é bom para o exercício de uma profissão. Nem para o progresso do país, claro.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

OUTROS DIZERES - Daniel Sampaio e a escola a tempo inteiro

Contra a escola-armazém
«Merece toda a atenção a proposta de escola a tempo inteiro (das 7h30 às 19h30?), formulada pela Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap). Percebe-se o ponto de vista dos proponentes: como ambos os progenitores trabalham o dia inteiro, será melhor deixar as crianças na escola do que sozinhas em casa ou sem controlo na rua, porque a escola ainda é um território com relativa segurança. Compreende-se também a dificuldade de muitos pais em assegurarem um transporte dos filhos a horas convenientes, sobretudo nas zonas urbanas: com o trânsito caótico e o patrão a pressionar para que não saiam cedo, será melhor trabalhar um pouco mais e ir buscar os filhos mais tarde. (...)
Não estaremos a remediar à pressa um mal-estar civilizacional, pedindo aos professores (mais uma vez...) que substituam a família? Se os pais têm maus horários, não deveriam reivindicar melhores condições de trabalho, que passassem, por exemplo, pelo encurtamento da hora do almoço, de modo a poderem chegar mais cedo, a tempo de estar com os filhos? Não deveria ser esse um projecto de luta das associações de pais?
Importa também reflectir sobre as funções da escola. Temos na cabeça um modelo escolar muito virado para a transmissão concreta de conhecimentos, mas a escola actual é uma segunda casa e os professores, na sua grande maioria, não fazem só a instrução dos alunos, são agentes decisivos para o seu bem-estar: perante a indisponibilidade de muitos pais e face a famílias sem coesão onde não é rara a doença mental, são os promotores (tantas vezes únicos!) das regras de relacionamento interpessoal e dos valores éticos fundamentais para a sobrevivência dos mais novos. Perante o caos ou o vazio de muitas casas, os docentes, tantas vezes sem condições e submersos pela burocracia ministerial, acabam por conseguir guiar os estudantes na compreensão do mundo. A escola já não é, portanto, apenas um local onde se dá instrução, é um território crucial para a socialização e educação (no sentido amplo) dos nossos jovens. Daqui decorre que, como já se pediu muito à escola e aos professores, não se pode pedir mais: é tempo de reflectirmos sobre o que de facto lá se passa, em vez de ampliarmos as funções dos estabelecimentos de ensino, numa direcção desconhecida. Por isso entendo que a proposta de alargar o tempo passado na escola não está no caminho certo, porque arriscamos transformá-la num armazém de crianças, com os pais a pensar cada vez mais na sua vida profissional.
A nível da família, constato muitas vezes uma diminuição do prazer dos adultos no convívio com as crianças: vejo pais exaustos, desejosos de que os filhos se deitem depressa, ou pelo menos com esperança de que as diversas amas electrónicas os mantenham em sossego durante muito tempo.
Também aqui se impõe uma reflexão sobre o significado actual da vida em família: para mim, ensinado pela Psicologia e Psiquiatria de que é fundamental a vinculação de uma criança a um adulto seguro e disponível, não faz sentido aceitar que esse desígnio possa alguma vez ser bem substituído por uma instituição como a escola, por melhor que ela seja. Gostaria, pois, que os pais se unissem para reivindicar mais tempo junto dos filhos depois do seu nascimento, que fizessem pressão nas autarquias para a organização de uma rede eficiente de transportes escolares, ou que sensibilizassem o mundo empresarial para horários com a necessária rentabilidade, mas mais compatíveis com a educação dos filhos e com a vida em família.
Aos professores, depois de um ano de grande desgaste emocional, conviria que não aceitassem mais esta "proletarização" do seu desempenho: é que passar filmes para os meninos depois de tantas aulas dadas - como foi sugerido pelos autores da proposta que agora comento - não parece muito gratificante e contribuirá, mais uma vez, para a sua sobrecarga e para a desresponsabilização dos pais.»
Daniel Sampaio. "Contra a escola-armazém". Público ("Pública"): 15.Fev.2009

sábado, 20 de setembro de 2008

Alice Vieira - As opiniões dos 13 anos

O que pode levar a que surja um diário de uma adolescente? Esta pergunta não tinha passado pela mente de Inês Tavares, que pensava receber um i-pod como prenda de aniversário, mas a avó trocou-lhe as voltas ao oferecer-lhe um “diário” e justificando: “Isto é para escreveres e guardares os teus segredos”. E Inês começou a escrever um diário, ainda que sem data, mas em 19 capítulos, que abrangeram o período de um ano, entre Janeiro, mês do seu aniversário, e o Natal, época de família, altura em que o volume do “diário” acabou.
É o que se passa em A vida nas palavras de Inês Tavares (Alfragide: Caminho, 2008), obra que tem o subtítulo de “Diário de quem só quer a paz no mundo e o Brad Pitt”, último livro de Alice Vieira. Por lá passa a vida encarada do alto dos 13 anos, com muitas opiniões resultantes da procura e afirmação da identidade, das preocupações juvenis, do ritmo da escola e das vivências com os amigos, da família, da sociedade e das suas convenções, das referências contemporâneas, da alucinação consumista. É uma história próxima no tempo, nossa contemporânea, que vai tendo marcas de acontecimentos recentes, seja pelos concertos, seja pelas opiniões, seja pelos heróis, seja pelos hábitos, seja pelos pequenos eventos que têm sido notícia… A título de exemplo, quase no final, em tempo de Outono e de castanhas, escreve Inês: “E depois há as castanhas. O cheiro das castanhas. O sabor das castanhas. O calor que passa para as nossas mãos quando as agarramos. Mas desde este ano que as castanhas estão diferentes. Por causa de uma lei qualquer, passou a ser proibido embrulhá-las em papel de jornal ou nas folhas das Páginas Amarelas. Agora tem que ser tudo muito limpo, muito sem micróbios, tal como manda a Europa. E, como todos sabemos, a Europa é que manda em nós. Mas ainda me lembro do que eu aprendia num pacote de castanhas.”
Escrita rápida, com humor bastante e um olhar para o mundo de forma descomplexada, o livro cativa pela simplicidade, num oscilar entre o conhecimento do passado e o confronto com o presente cheio de reticências e de desafios, à velocidade de uma forma de ver o mundo e a vida, justificando, aliás, o título. Pelo meio, vai havendo uma ou outra mensagem de apaziguamento e, no final… aquilo que a avó Gi (que foi a ofertante do caderno) nem sonharia: o “diário” acaba também por guardar um segredo que pertenceu ao passado da avó, que explica, por outro lado, o azedume que as duas avós de Inês amorosamente mantinham quando se encontravam.
Frases vivas
1. “Quando o nosso coração está completamente cheio de amor por alguém, nada o pode desviar para outros lugares, por mais próximos de nós que estejam.”
2. “O que a gente faz pela felicidade dos nossos pais não tem explicação.”
3. “O Natal devia ser um tempo tranquilo, um tempo em que devíamos ter mais paciência uns para os outros, um tempo de (…) forrarmos de amor o nosso coração. Pois devia. Mas infelizmente não é. O Natal tornou-se um tempo de correrias desenfreadas, de compras desenfreadas (e às vezes vai-se a ver e compramos tudo trocado) e quando finalmente ele termina estamos todos mais cansados do que se tivéssemos andado horas na montanha russa.”

4. “É a sorrir que nos devemos lembrar daqueles que amamos e que já não estão connosco.”

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Francisco Lucas Pires - o pai que Jacinto Lucas Pires escreve

Há dez anos, o país vivia a festa do início da "Expo 98" (acontecida no dia de anteontem) e a tristeza da brutalidade da notícia da morte de Francisco Lucas Pires (sucedida ontem). Na edição do Público de hoje, Jacinto Lucas Pires escreve um lindo texto sobre o pai (clicar sobre a imagem), que vale bem a pena ser lido, quer pela homenagem, quer por uma elegante escrita, quer porque pode ser um contributo para uma antologia sobre o que é e o que fica de um pai.

domingo, 13 de abril de 2008

Máximas em mínimas (22)

Quando os pais falam
"(...) Há vozes dos pais boas e más, os leitores que perdoem esta linguagem simplista. São vozes más as que fomentam a intriga (por exemplo, quando os pais recolhem informações nos amigos às escondidas dos filhos), a inveja, a culpa ou a acusação. Quando os pais projectam nos filhos os sentimentos negativos que estão a sentir em relação a outras pessoas e os acusam de coisas que só na aparência dizem respeito aos mais novos. Ou quando os pais, dominados pelos seus próprios sentimentos de insegurança, deitam a sua própria fraqueza para cima dos filhos inquietos. São vozes boas: deves fazer o melhor possível, mas não te inquietes se não fores o melhor; ou põe-te no lugar do outro (a perda deste sentimento do outro é característica de muitas crianças e adolescentes actuais, habituadas a uma gratificação imediata e incapazes de sair da sua posição de autocontemplação). Outra voz boa poderá ser: vais conseguir, se te esforçares com persistência, porque o incentivo ao esforço continuado é um dos êxitos seguros na educação. E também é uma voz boa pensa antes de agir: sobretudo os adolescentes agem muitas vezes sem reflectir, nesta sociedade sensorial que fomenta o constante sentir em vez de pensar. A frase dos nossos avós vê lá até onde podes ir mantém toda a actualidade!"
Daniel Sampaio. "As vozes dos pais". Público ("Pública"), 13.Abr.2008

quarta-feira, 19 de março de 2008

Poemas para os pais

O livro termina com uma “inverdade” que pretende ser simpática: “aos dezanove de março de dois mil e oito imprimiu-se na EGRAFE, SA esta primeira edição portuguesa de poesia da Prisa Innova para comemorar o dia do pai e a chegada da primavera”. Ora, acontece que o livro foi impresso para assinalar esses dois acontecimentos mas não nesse dia; na verdade, o livro foi posto à venda ontem, dia em que saiu para a rua a acompanhar o diário Público. Fala-se de Em nome do Pai – Pequena antologia do Pai na poesia portuguesa, volume com cerca de 120 páginas por onde perpassam textos de meia centena de poetas que trouxeram o pai para motivo da sua poesia, organizado por José da Cruz Santos e prefaciado por Vasco Graça Moura, que, além desta função, é também um dos antologiados. A direcção gráfica é de Armando Alves.
O texto introdutório de Graça Moura chama a atenção para a raridade que foi a entrada da figura do pai na poesia portuguesa anterior ao século XX, altura em que surgiu esplendorosa no poema de Jorge de Sena “Carta a meus filhos sobre os fuzilamentos de Goya” (em Metamorfoses, de 1963). Por outro lado, é acentuada a ausência que envolve o tratamento da figura paterna na poesia – “embora alguns [poetas] façam a sua referência ao momento da morte, poder-se-á dizer que predominam as recordações da figura do pai na infância do autor e de um convívio determinante com ela.” A explicação de Graça Moura termina, aliás, com uma conclusão inevitável: “como se vê dos poemas aqui compendiados, todos os pais desaparecidos se tornaram fantasmas melancólicos”. Pelo caminho, ficou ainda uma explicação para o facto de a figura da mãe, essa sim, ter intensa presença na literatura poética portuguesa, fenómeno a que não está alheia a promoção da imagem materna “ao longo dos séculos pela devoção religiosa que veio mais tarde a encontrar a sua transposição laica para o plano da maternidade comum”.
O leque de autores reunidos começa com três nomes do século XIX – Camilo, António Nobre e Cesário Verde. Seguem-se nomes que entraram pelo século XX, logo a partir do quarto autor escolhido, Ângelo de Lima. Para falarmos de nomes relacionados com a região de Setúbal (um critério que justifica que não se liste a meia centena de autores seleccionados), citem-se António Osório (com fortes ligações à Arrábida e a Azeitão), Ruy Belo (que prefaciou o livro Pelo sonho é que vamos, de Sebastião da Gama, em 1970), Jorge Reis-Sá (o poeta que quase “fecha” a antologia e foi vencedor da 6ª edição do Prémio Literário Bocage, organizado pela LASA em 2004) e Amadeu Baptista (que foi o vencedor do Prémio Nacional de Poesia Sebastião da Gama, organizado pelas Juntas de Freguesia de Azeitão em 2007).
Se o livro, enquanto objecto, é bonito, pena é que a antologia não contenha indicações sobre os autores (pelo menos as datas dos períodos de vida) e sobre os livros de onde os textos saltaram!
E, porque se está em Dia do Pai, dou a palavra a José Tolentino de Mendonça, aqui antologiado com o poema “A casa onde às vezes regresso” (reunido em A noite abre meus olhos, de 2006):
A casa onde às vezes regresso é tão distante
da que deixei pela manhã
no mundo
a água tomou o lugar de tudo
reúno baldes, estes vasos guardados
mas chove sem parar há muitos anos

durmo no mar, durmo ao lado de meu pai
uma viagem se deu
entre as mãos e o furor
uma viagem se deu: a noite abate-se fechada
sobre o corpo

tivesse ainda tempo e entregava-te
o coração

terça-feira, 4 de março de 2008

O que os pais (não) devem querer

O texto que segue, sob o título acima, é de José Matias Alves e fui buscá-lo ao terrear. É de leitura obrigatória: pela mensagem, contra o espírito trauliteiro e demagógico que tem imperado em muitas considerações, porque sinto que é assim.

O que os pais devem querer, em primeiro lugar, é uma educação recta, justa, e digna para os seus filhos. Que atenda e respeite a sua singularidade. Que lhes transmita o património da humanidade. Que lhes ensine a capacidade de ver, de escutar, de ler o mundo e os outros. Que lhes ensine a respeitar os outros. Que lhes ensine a respeitar a autoridade e a exercer responsavelmente o direito à crítica e à divergência. Que lhes incuta o gosto de aprender, de ultrapassar obstáculos, de celebrar as vitórias sobre si mesmos.
O que os pais devem querer é que as escolas sejam casas de humanidade. Que sempre têm as portas abertas para os receber e acolher. Que trabalham 15 ou 16 horas por dia para atender uma grande diversidade de públicos. O que o pais devem querer é professores prestigiados e respeitados, competentes, dedicados, rigorosos. E que gostam de fazer o que fazem. E que gostam das crianças. E que sentem orgulho da sua profissão.
O que os pais não devem querer é que as escolas sejam depósitos de crianças. E os professores os tomadores de conta. O que os pais não devem querer são ambientes destrutivos e de cortar à faca. O que os pais não devem querer é que os professores passem grande parte do tempo a preencher papéis que nada melhoram os processos e os resultados do ensino. O que os pais não devem querer é que se transformem meios em fins. O que os pais não devem querer é ver professores desautorizados e esgotados.
Os pais (a maioria dos pais, não tenho dúvida) querem um futuro para os seus filhos. E isso passa obrigatoriamente por apoiar os professores no cumprimento da sua missão.