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sábado, 24 de janeiro de 2015

Da riqueza da língua portuguesa (sem necessidade de acordos artificiais)



Pronominais

Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido

Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro

O poema consta na obra Pau Brasil, de Oswald de Andrade (1925), marca do modernismo brasileiro, cuja primeira edição foi feita em Paris. Felizmente, a colecção "800 anos de literaturas em Português", que está a sair com o diário Público, integrou este título, que saiu na terça-feira. E é tão bom este ouvir (ou este ler), mantendo genuinidade e ultrapassando os espartilhos de um qualquer acordo, seja para a escrita, seja para a gramática, que desorienta a língua nas suas faces de registo escrito ou sonoro!

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

"Sermão do Desacordo" - a propósito do Acordo Ortográfico de 1990


Nunca fui fã do Acordo Ortográfico (AO 90) em que sou obrigado a escrever nos documentos sujeitos ao epíteto de "oficiais". Isto obriga-me, como a muitos outros, por certo, a ter de praticar a grafia anterior ao Acordo e a do Acordo, o que é jogar numa duplicidade absolutamente desnecessária e incompreensível, sobretudo porque não advieram vantagens - quaisquer vantagens - da prática do AO 90.
No Público de hoje, Rui Miguel Duarte assina o texto “Sermão do Desacordo aos Deputados”, começando por referir que está agendada para o próximo dia 20, a partir das 10 horas, a apreciação da Petição N.º 259/XII/2, pela Desvinculação de Portugal em relação ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa de 1990 (AO90) e que "a petição , que conta já com mais de 15.000 subscrições, mereceu da parte do relator, o deputado Michael Seufert (CDS), um parecer exemplar, que merece ser lido e entendido."
Subscrevo a opinião da utilidade da leitura do parecer assinado por Michael Seufert e não posso deixar de assinalar o final do artigo de Rui Miguel Duarte, num apelo aos deputados para apreciações pautadas por rigor que nem sempre é evidente nem evidenciado e que aqui reproduzo:

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Paulo Castilho, o património, a língua portuguesa, o inglês e o francês

O JL de hoje (Jornal de Letras, Artes e Ideias, nº 1101, 12.Dez.2012) , na sua habitual rubrica "Diário", deixa que Paulo Castilho, escritor e diplomata, nos revele alguns dos fragmentos dos seus dias, em registos ocorridos entre 20 de Outubro e 28 de Novembro. Desse diário se retiram as observações que seguem, retrato sentido e verdadeiro da cultura que vamos perdendo e da cultura que nos vai colonizando... Ou a questão linguístico-cultural no centro da discussão, no mesmo momento em que outros dizem que a língua portuguesa significa quase 20 por cento do PIB! Sinais dos tempos, em que tudo se substitui por valores, mais-valias, investimentos, economias, rendimentos... Eis, então, uma mostra das reflexões de Paulo Castilho:

«O património cultural do nosso país, que nasceu há quase 900 anos, está em grande medida votado ao esquecimento e ao desinteresse generalizado, sobretudo quando se trata de literatura. (...) Namora, alguém o lê? Tirando o Eça, alguém lê os escritores do passado? E o Pessoa está transformado em 'celebrity', uma espécie de Paris Hilton das letras lusas, famoso, festejado, mas pouco lido. Quanto à língua,, vivemos na regra do desleixo e do vale tudo - incluindo o acordo ortográfico, que entre muitas outras calamidades, faz tábua rasa da origem latina da nossa língua. Mais um fenómeno de aculturação. É irónico que tenhamos agora de ir a outras línguas, como por exemplo o inglês, que é essencialmente germânico, para encontrar muitas das raízes latinas que deitámos fora nas nossas palavras. (...)
É uma pena que actualmente em Portugal se despreze o francês e já quase ninguém o fale ou leia. Foi e é a língua de uma grande cultura, ainda hoje com um movimento editorial de um enorme vigor, em muitas áreas superior ao inglês. Agora corremos atrás da língua inglesa e de tudo o que tenha um ar de Inglaterra ou de América sem nos darmos conta de quanto nos encontramos longe da mente anglo-saxónica. Não os compreendemos plenamente e eles não nos compreendem a nós e, na verdade, tendem a tratar-nos com alguma condescendência. (...)»

quarta-feira, 13 de junho de 2012

Mia Couto - cinco excertos sobre a língua portuguesa (que nos une)


Na edição da revista Tempo Livre deste mês (Lisboa: Fundação Inatel, nº 238, Junho de 2012), é publicada entrevista de Mia Couto a Humberto Lopes em que são abordadas questões da literatura, da lusofonia, de Moçambique, do acordo ortográfico e da identidade. Aqui registo alguns excertos.
CPLP – “Qualquer organização que junta países que estão tão distantes tem que enfrentar [um] processo [que] tem que ser olhado com verdade. O que me faz aflição é que há quem pense que ela já está criada… E ainda não está, tem que nascer… Falta nascer no sentido em que essas organizações têm que nascer várias vezes… e têm que estar no lugar certo. Por exemplo, acontece qualquer coisa na Guiné ou em qualquer um desses países da comunidade e tem que se perceber como é que ela é útil e que conquistou um lugar.”
Países de língua portuguesa – “Esses países têm uma expressão diversa, são países que, sendo de língua portuguesa, têm outras línguas, têm outras maneiras de respirar e de pensar que têm de ser consideradas de forma inclusiva, que não se podem marginalizar. E isso significa pensar de todas as maneiras possíveis, económica, etc… Como fazer dicionários, como fazer trocas em que estas línguas falem realmente com o português, dialoguem com o português para que qualquer cidadão destes países possa saltitar entre as duas línguas, a materna e a língua portuguesa.”
Acordo Ortográfico – “O Acordo Ortográfico mexe com uma coisa tão pequenina, mexe com a ortografia, e a minha reinvenção não se opera exactamente aí… É um acordo que unifica tão pouco que não me parece que seja motivo para eu me preocupar… Acho que foi pena, sim, não se ter discutido coisas que eram bem mais importantes, como aquilo que são os nossos laços culturais e as distâncias das políticas culturais.”
Escrever – “As explicações que eu dou sobre as razões por que é que eu escrevo são sempre inventadas. E eu estou sempre a pensar em coisas novas porque não só uma explicação, há várias explicações disso que é a apetência de eu escrever, de criar e de fazer poesia. Mas eu acho que eu sou um escritor do território da poesia, essa é a minha casa. A prosa é uma viagem que eu faço para voltar, para sair de casa e voltar a casa.”
Linguagem – “A linguagem não serve só para descrever o mundo. A linguagem deve ter também uma função de o criar, uma vez que o mundo é sempre o resultado de um olhar, e de um olhar que é muito pessoal, que é sempre uma obra de reinvenção.”

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Acordo Ortográfico na revista "Ler"

A história do mais recente acordo ortográfico ainda está muito mal contada. E, provavelmente, continuará mal contada. Já toda a gente percebeu que a aprovação deste acordo foi uma questão política de significado duvidoso – não foi uniformizada a ortografia entre os lusófonos, são permitidas variações ortográficas diversas mesmo para os lusófonos de um país, as bases do acordo permitem a confusão da pronúncia em algumas palavras, etc., etc.
O ano lectivo vai começar, sendo as escolas o primeiro espaço em que, oficialmente, vai entrar o acordo ortográfico, mas nem todos os manuais foram revistos em conformidade, o que até se compreende. Os periódicos lá têm vindo a aderir ao acordo, num gesto que pareceu inovação – afinal, devem, também eles pugnar pela ortografia –, mas muitos colaboradores não aderem a essa nova escrita e fazem questão de o dizer numa nota em final de artigo.
Poderá não tardar muito e vir aí uma lei proibitiva da ortografia tal como a praticamos hoje… em defesa de um acordo ortográfico que não dá garantias, de um acordo ortográfico que nasceu com o propósito de uniformizar e poupar e acabou como vemos!
A revista Ler, na sua edição de Setembro, vai abordar o tema. E, a adivinhar pela apresentação, promete!