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quarta-feira, 12 de abril de 2017

Letras ComVida - Entre outras coisas, a Grande Guerra na literatura



O mais recente número da revista Letras ComVida - Revista de Literatura, Cultura e Arte (Universidade de Lisboa - Faculdade de Letras - CLEPUL, nº 8, 2016-2017), dirigida por Annabela Rita e Miguel Real, nas suas 330 páginas, dedica cerca de um terço à Primeira Grande Guerra sob o título “A Primeira Guerra Mundial - Grande Guerra - Impactos e Modelações Culturais”.
Nesse dossiê, pode o leitor aprofundar assuntos como: “Impactos e Modelações Culturais”, por Ernesto Castro Leal; “José de Macedo - O Conflito Internacional e a Renascença Portuguesa”, por Teresa Nunes; “Memorialismo de Guerra - Os Exemplos de Carlos Selvagem e João Pina de Morais”, por Miguel Real; “História de uma Guerra Esquecida - A Tropa d’África”, por Bruno J. Navarro; “Ilusões e Desilusões de um Repórter Português na Guerra”, sobre Adelino Mendes, por Manuel M. Cardoso Leal; “Pincéis, Lápis e Baionetas - A Ilustração como Instrumento de Propaganda durante a Primeira Guerra Mundial”, por Vera Mariz; “Entre a Memória e a Recriação Literária - O Testemunho de Alexandre Malheiro”, por Rui Sousa; “Os Modernistas e a (Des)Construção do Ineludível”, por Dionísio Vila Maior, e “Nacionalismo, Darwinismo, Guerra e Paz”, por Joaquim Miguel de Morgado Patrício.
Obviamente, a revista tem muito mais (e com interesse): trabalho sobre José Blanco, de Onésimo Teotónio de Almeida; leitura de Não é Meia Noite Quem Quer, de Lobo Antunes, por Norberto do Vale Cardoso; estudos sobre Aquilino Ribeiro (de Carlos Nogueira), Eça de Queirós (de Elisabete Correia Campos Francisco); entrevista com Mário Cláudio (por Annabela Rita, Miguel Real e Carla Sofia Luís); dossiê sobre João Rui de Sousa; textos sobre Gago Coutinho e Manuel Sérgio.
Um número com muito interesse (como, aliás, se deve dizer relativamente a todos os anteriores). Para consultar, para ler!

terça-feira, 26 de novembro de 2013

Marcos de uma semana em que não disse (2) – Memória: Maria Irene Alves (1927-2013)



Conheci a Dra. Irene Alves (Maria Irene Ribeiro Gonçalves da Silva Alves) pelo final da década de 1980. Mantivemos muitos momentos de conversa, devidos a afinidades várias: a escola, o ensino do Português, a cultura portuguesa, a literatura, Sebastião da Gama. E também, sobretudo talvez, devido à amizade que fomos construindo e à admiração que fui nutrindo pela sua disponibilidade, pelo seu empenho, pela sua energia e dinâmica, sempre pronta para seguir, para agir, para participar, para fazer. Cruzámo-nos em vários eventos, alguns dos quais na Casa do Professor (da ASSP), em Setúbal, obra de que ela foi também construtora e a que deu muito da sua disponibilidade.
Inevitavelmente, nas nossas conversas saltava sempre a figura de Sebastião da Gama, que foi seu colega na Faculdade de Letras e que lhe escreveu um poema para o seu livro de curso (Finalistas de Letras – Curso de 1946-1950), de quem sempre falou com carinho e desvelo, relembrando momentos, versos e sorrisos.
A Dra. Irene Alves trocava impressões, opinava, aconselhava, comentava, sempre num respeito por ouvir também e por saber o que podia ser dito pelos outros e o que podia ser feito. Já fora da sua carreira profissional, muitas vezes a ouvi a sugerir práticas – as “boas práticas” agora descobertas para todas as áreas! –, a querer saber como reagiam os alunos a determinadas situações, a import(un)ar-se com a necessidade da leitura, não só de clássicos, mas sobretudo de clássicos. Senhora de vasto saber, ciente de ter marcado o tempo e de para ele ter contribuído de maneira intensa, a Dra. Irene Alves deixou saudades. Há uma semana, partiu. E a memória ficou mais viva!
[Foto: reprodução do livro de curso da Dra. Irene Alves]

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Urbano Tavares Rodrigues homenageado

No final da tarde de hoje, houve uma homenagem a Urbano Tavares Rodrigues promovida pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Não estive lá, mas, ao saber a notícia, lembrei-me do professor e recordei uma homenagem que, em Setúbal, lhe foi feita na livraria Culsete, em Janeiro de 2003. O Manuel Medeiros fez questão que eu testemunhasse sobre Urbano Tavares Rodrigues, uma vez que tinha sido seu aluno. E fi-lo com muito gosto. É uma versão abreviada do meu testemunho lido nessa altura que aqui apresento. Em jeito de participação na homenagem que em Lisboa hoje lhe foi prestada.


Não sei de quando vem o meu contacto com Urbano Tavares Rodrigues, mas sei que vem de muito longe, desde quando ainda nem pensava que viria a licenciar-me em Letras, muito menos imaginando que o iria ter como professor. Também não sei qual foi o primeiro livro que dele li – talvez A Noite Roxa, que me lembro de me ter sido emprestado por um amigo e que, mais tarde, adquiri para nele reler uma interessantíssima narrativa como “Escombros”, quase retrato de uma geração, e para nele fazer uns sublinhados que me tinham impressionado nessa leitura sobre a vida e a arte... Talvez o primeiro livro que li de Urbano não tenha sido este, mas tenha sido uma recolha literária sobre Estremadura, nessa quase indispensável colecção que é a “Antologia da Terra Portuguesa”, testemunho da indispensabilidade que a literatura se torna para dizer a terra, para dizer o homem, antologia, aliás, onde creio que tive um dos primeiros contactos com Sebastião da Gama, que topou e mostrou a alma arrábida em toda a sua maravilha... Ou talvez a minha primeira leitura de Urbano Tavares Rodrigues tenha sido outra. Recordo, no entanto, estas duas como as mais antigas que dele conheço.
Em 1979, entrei para uma licenciatura na Faculdade de Letras, ingresso já tardio porque me era necessário trabalhar, mas atempado porque pôde ser no curso que queria e na Faculdade que me ficava mais à mão, em horário cumprido depois das 17 horas. Lembro-me de várias pessoas que tive como professores e pelas quais senti uma admiração grande desde logo.
Uma das coisas que me fascinou na minha licenciatura foi o facto de ter conhecido escritores enquanto professores, podendo assim usufruir da sua experiência enquanto artistas e criadores e do seu estatuto enquanto professores, intelectuais e cidadãos intervenientes, que eram vários. O professor Urbano Tavares Rodrigues não fugiu a este quadro. E, se foi apaixonante a forma como nos fez ouvir a solidariedade e o social presentes em Germinal, se foi suave a maneira como nos fez entrar nos domínios do erotismo de La Motocyclette, se foi a tocar o fascínio que nos falou de uma obra como Le Ravissement de Lol V. Stein, certo é que todos estes predicados se construíram como metáforas dele próprio, isto é, a delicadeza do discurso, a singeleza das práticas, a simpatia da disponibilidade, o aprofundar permanente no cruzamento da literatura estudada com as múltiplas e incansáveis referências advindas da sua experiência de escritor, o sorriso disponível numa atitude de quem parecia tudo oferecer fazendo passar o universo literário numa relação constante de tu-cá-tu-lá para um degrau de contínua admiração pela arte... enfim, tudo isto nos foi transmitindo, tudo isto foi partilhando, porque o todo das suas aulas se nos afigurava também como uma partilha de reflexões e de angústias da estética e do sentir.
A permanente abertura do professor Urbano Tavares Rodrigues nunca lhe deixou escorregar um “não”. Recordo que, mesmo perante trabalhos ou observações de qualidade menos desejada, a sua atitude era de tentar dar a volta de forma subtil, não negando a pouca pertinência do resultado (ou, muitas vezes, a sua impertinência) e incluindo no seu comentário as pistas de orientação que o estudante deveria aproveitar ou explorar.
Habituei-me, assim, a olhar o professor Urbano Tavares Rodrigues como uma personagem dedicada, disponível e atenta, como uma personagem participante (frequentemente trocando opinião connosco sobre posições públicas a propósito de questões culturais e de ensino), como alguém sempre pronto a incentivar os voos de quem quisesse ir mais longe ou de quem precisasse da sua ajuda. Recordo que, no último ano da licenciatura, estudei a autobiografia em José Gomes Ferreira, a propósito do seu livro A Memória das Palavras, para a cadeira de Teoria da Literatura, leccionada por Lucília Gonçalves Pires. Ser-me-ia útil falar com Gomes Ferreira, mas ele estava a passar um mau momento de saúde, pela sua debilidade de 80 anos. Foi, aliás, o professor Urbano que me pôs ao corrente do estado de saúde de Gomes Ferreira, mas, logo que soube das suas melhoras temporárias, falou-lhe e pôs-nos em contacto, assim me tendo sido proporcionado um encontro de cerca de três horas com esse “poeta militante”, na sua casa da rua Rio de Janeiro, em que quase me limitei a ouvi-lo e em que grande parte da sua conversa não foi sobre poesia, mas foi poesia. Passadas cerca de duas semanas, o professor Urbano encontrou-me na Faculdade, perguntou-me pelo andamento do trabalho, tendo-lhe eu dito que o mesmo já tinha sido apresentado e avaliado. Quis vê-lo, porque, argumentou, “acho que tenho alguma responsabilidade nesse trabalho”. Dei-lhe uma cópia e, volvidos uns dias, propôs-me que o texto fosse publicado no “Suplemento Cultural” do Diário. Respondi que sim, meio sem jeito. Soube depois que era sua prática corrente incentivar os alunos à publicação de trabalhos e mesmo à edição.
Concluída a licenciatura, abandonei também o trabalho que tinha e passei para o ensino. Em 1985, estando em Beja – onde confesso que aprendi a gostar do Alentejo –, ao rebuscar numas prateleiras já esquecidas e poeirentas de uma livraria da cidade, encontrei um livro sobre Urbano Tavares Rodrigues, intitulado Escritor da Fraternidade, da autoria de Pires Campaniço. Já não contactava o professor havia cerca de dois anos, depois que saíra da Faculdade. Comprei o exemplar por uma bagatela e li as suas 130 páginas – fortemente ideologizadas – nesse mesmo dia, mais no sentido de ter um ponto de contacto com alguém que me impressionara fortemente. O livro lembrou-me o professor, sobretudo, e pareceu-me que o título escolhido, ao eleger a fraternidade para caracterizar o escritor, tinha acertado no ponto. Fraternidade, como quem diz solidariedade, como quem afirma disponibilidade... são lógicas de atributos que resultam bem se aplicados a Urbano Tavares Rodrigues.
Fui, entretanto, descobrindo também a sua faceta de ensaísta na área da literatura e de escritor de viagens, sempre encostando as obras abordadas a referentes culturais importantes ou as viagens a itinerários não menos sentidos (talvez sentimentais), como descobri num relato seu sobre Santiago de Compostela, publicado em 1949, verdadeira peregrinação no espaço e no eu, na busca de outras artes e do conhecimento do mundo.
Encontrámo-nos depois em diversas situações mais ligadas à literatura (por exemplo, na sua defesa da tese de doutoramento sobre Teixeira-Gomes, ou na apresentação de Violeta e a Noite aqui neste mesmo espaço da Culsete), sempre relembrando tempos da vida de estudante.
E o que nos tem unido? Para lá de tudo, o professor Urbano Tavares Rodrigues sempre me falou, de imediato, do tempo da Faculdade e da lembrança das suas aulas. Ao fim e ao cabo, um tempo marcante, de aprendizagem e também de conhecimento, lados ambos de uma mesma estrada. Mantenho o gosto por Urbano Tavares Rodrigues enquanto escritor múltiplo e multifacetado, mas quero preservar também esta recordação feliz de um Urbano Tavares Rodrigues professor e mestre, dedicado, sabedor, atento, delicado e prestável, fazendo da literatura uma forma de criação e do ensino uma via de reflexão... ou talvez, e sobretudo, conjugando os dois percursos no rumo da disponibilidade para uma vivência de transformar a arte em cidadania. Não resisto sem ler quatro linhas de um seu escrito de cunho autobiográfico, publicado sob o título de “Apontamentos e Confissões”, no livro de ensaios sobre O Tema da Morte: “Já na minha adolescência desejava ser escritor, embora outras profissões me seduzissem, tais a de médico e a de professor: no fundo, aquelas que me permitissem ancorar e sentir-me útil.” É uma justificação simples, claro. Mas testemunho que, na sua simplicidade, a senti. E vivo bem com essa lembrança e exemplo.