Mostrar mensagens com a etiqueta adiafa. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta adiafa. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 15 de julho de 2008

"+Museu", de Palmela

Já está em distribuição o nono número do boletim semestral +Museu, do Museu Municipal de Palmela, publicação simpática, coerente, útil, bem apresentada, em meu entender um dos melhores produtos culturais (em publicações) da Câmara Municipal de Palmela.
Preocupada com a história e a memória local, esta publicação apresenta dois trabalhos de fundo: por um lado, dá continuidade ao estudo e apresentação do espólio do Ferreiro Faria (a propósito da oficina de António Teixeira de Faria) iniciado no número anterior, elaborado por Maria Teresa Rosendo, que não se limita a uma síntese descritiva dos utensílios, mas historia e problematiza a profissão; por outro, em “Bandeiras de Adiafa”, Cristina Prata escreve sobre a prática festiva que marca o fim das vindimas, socorrendo-se de vários testemunhos orais, numa história reconstruída de memórias. Como separata, o boletim contém ainda o trabalho “Pinhal Novo em imagens pela máquina de Manuel Giraldes da Silva” (1898-1974), a pretexto do 80º aniversário da criação da freguesia de Pinhal Novo, com registo biográfico do autor por Maria Teresa Rosendo e reprodução de um dezena de fotografias dos anos 20 do século passado alusivas a Rio Frio e ao Pinhal Novo, por onde passam gentes, trabalhos e momentos festivos (recorde-se que foi a partir de fotografias de Giraldes da Silva, falecido no Montijo, que foram criados alguns dos painéis de azulejo que decoram a estação ferroviária de Pinhal Novo e o palácio de Rio Frio).
O conteúdo do boletim é, pois, aliciante para a história local, abre uma imensidão de propostas para a acção pedagógica e enriquece a memória.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Adiafa – A Festa das Vindimas

Na última canastra o capataz dizia: vai lá buscar a bandeira. Iam as pessoas que a tinham feito e lá vinha a bandeira. No último cesto de uvas a subir para o carro era apresentada a bandeira e rebentados os morteiros. E toda a minha gente nesta zona sabia que se tinha acabado a vindima do sr. Álvaro Cardoso.” Quem assim relembra é Marina Roque, feitora no Monte do Lau, uma das quatro herdades que integravam a Casa Agrícola palmelense de Humberto Cardoso (os outros montes eram os da Agualva, da Fonte Barreira e de Pegões, totalizando os quatro uma área de cerca de 650 hectares).
O testemunho da feitora é um dos vários que surge recolhido na exposição “Adiafa – A Festa das Vindimas”, patente na Biblioteca Municipal de Palmela até meados de Outubro. Tal como os outros testemunhos, este evoca um tempo que era o do final das vindimas porque final de um ciclo. Aí por meados de Outubro, acontecia o dia diferente, com a festa, havendo almoço (antigamente, resultando da partilha do contributo de cada trabalhador e, mais recentemente, oferecido pelos patrões) e baile, em que participavam todos os trabalhadores da vindima e os patrões.
Gesto simbólico mas de muito empenho era o da oferta da bandeira da adiafa aos patrões – uma bandeira em tecido sedoso, enfeitada com desenhos bordados, com flores e até fixando postais ilustrados emoldurados em bordado a propósito. Mais tarde, seriam os patrões a fornecer os materiais e a pagar o tempo de trabalho para a confecção da bandeira, coisa não pouca se pensarmos que três semanas era o tempo necessário para duas pessoas congeminarem a bandeira, período que começava a contar quando faltava esse prazo para o final da colheita.
A festa da adiafa era a alegria do fim de um ciclo, pois. E em muitas bandeiras havia registos de quadras simples, numa métrica por vezes irregular, associadas a desenhos naïfs, a assinalarem a alegria do fim da colheita, em que todos eram louvados, como se pode ler na bandeira do Monte de Fonte Barreira de 1984: “Acabamos a Vindima / Tudo fez o que foi capaz / Vivam os tractoristas / E o nosso capataz.”
Depois, havia ainda a adiafa das adegas, mais lá para o fim do mesmo Outubro, quando o tratamento das uvas era dado como concluído pelo adegueiro, festa mais reservada aos homens, com uma caldeirada e a exposição das bandeiras consideradas mais bonitas na adega.
As pessoas falam da adiafa já com saudade, como se pode verificar nos testemunhos que a exposição colecciona. Outros tempos, elevados custos, diferentes viveres. Fica a lembrança trazida para esta exposição, com bandeiras de adiafa da Casa Agrícola Humberto Cardoso, actual Carpal, feitas entre 1978 e 2004. A adiafa (palavra de origem árabe, com entrada bem antiga na língua portuguesa, a sugerir banquete) celebrava o fim do ciclo, mas, na verdade, não era mais do que um intervalo. É que, à porta, estava já a preparação do vinho, as podas e… um novo ciclo para a uva e para a vida agrícola.