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domingo, 1 de dezembro de 2019

ASILO POLÍTICO EM TEMPOS DE SALAZAR



LIVRO: Asilo político em tempos de Salazar. Os casos de Humberto Delgado e Henrique Galvão;
AUTOR
: Luís Bigotte Chorão;
EDIÇÃO: Edições 70, Novembro de 2019, 336 p.

LANÇAMENTO:

DIA: 5 de Dezembro (18,30 horas);
LOCAL: Livraria Almedina Rato (R. da Escola Politécnica, 225 - Lisboa);
ORADORES: António Araújo | José Pacheco Pereira.

Henrique Galvão e Humberto Delgado assinalaram os difíceis tempos de oposição e luta à ditadura salazarista, tendo deixado um rasto de esperança e de ilusão nas camadas populares. Ambos tinham sido apoiantes da ditadura militar e do Estado Novo, ornamentando as suas fileiras. Na verdade, o tenente aviador Humberto Delgado e autor Da Pulhice do Homo Sapiens (Casa Ventura Abrantes, 1933), virulento escrito antirrepublicano e antimonárquico, acompanhou desde o início a ditadura e teve cargos relevantes no regime salazarista; Henrique Galvão, apoiante sidonista e caloroso adepto do salazarismo, exerceu devotamente cargos institucionais no início do Estado Novo. Essa ainda pouco esclarecida página negra da história contemporânea, levaram-nos, mais tarde, para o campo da oposição a Salazar e à Ditadura, fosse no escolho por uma pacífica luta eleitoral ou no ardor colocado em acções de grande espetacularidade e duro enfrentamento ao regime.

Este último trabalho de Luís Bigotte Chorão, aprofundamento de uma sua intervenção sobre o pedido de asilo político de Henrique Galvão à embaixada argentina, na FLUC, apresenta o enquadramento político e alguns marcos importantes em torno do asilo de Humberto Delgado (Janeiro de 1959) e Henrique Galvão (Fevereiro de 1959), incluindo, ainda, neste no seu estimado estudo outros asilados, como Rodrigo Teixeira Mendes de Abreu, Luís Cesariny Calafate, Manuel Serra, Sebastião Ribeiro, Manuel Sertório, Horácio Augusto Fernandes Gradim, Rogério de Oliveira e Silva, Joana Francisca Fonseca Simeão, Raúl Miguel Marques, Carlos Dionísio, entre outros.

Obra estimada e copiosa, com importantes fontes e demais anotações, apresenta no seu final (pp. 285-325) uns Anexos, provenientes do Arquivo Família Mairal, correspondência epistolar entre Henrique Galvão e Ernesto Pablo Mairal.  

Henrique Galvão e Humberto Delgado foram figuras extremamente populares durante o Estado Novo, nos meios oposicionistas não afetos ao Partido Comunista Português. Adversários destemidos do regime salazarista, viram-se ambos obrigados a pedir asilo político em circunstâncias que merecem a recuperação da memória histórica que este livro lhes concede. Enquanto Humberto Delgado o fez a 12 de janeiro 1959, na embaixada do Brasil, em Lisboa, Henrique Galvão formulou um pedido semelhante a 17 de fevereiro do mesmo ano, na representação diplomática da Argentina. Os dois pedidos de asilo transformaram-se rapidamente em acontecimentos políticos de primeira linha, com uma projeção internacional surpreendente. Em causa estavam duas personalidades que exaltavam, por maus motivos, os meios diplomáticos e a opinião pública. Enquanto o general Humberto Delgado tinha acabado de sair de um confronto violento com o regime, o capitão Henrique Galvão arrastava-se por inúmeras prisões ao longo de sete anos. Luís Bigotte Chorão reflete, assim, sobre um tempo de alta tensão política na história do século [AQUI]

J.M.M.

quinta-feira, 30 de abril de 2015

RECIFE: ÚLTIMO PORTO DE HENRIQUE GALVÃO - PALESTRA

CONFERÊNCIARecife: último porto de Henrique Galvão;

DATA: 30 de Abril 2015 (19,30 horas);
LOCALMuseu do Estado de Pernambuco [Av. Rui Barbosa, 960 - Graças];

ORADOR: Ana Maria César [Academia Pernambucana de Letras]

MODERADOR: Margarida Cantarelli.

Uma interessante iniciativa sobre um episódio da luta contra a Ditadura salazarista e a afirmação dos oposicionistas no contexto internacional, sobretudo Henrique Galvão, durante os anos seguintes ao acontecimento.

Para acompanhar com toda a atenção.

A.A.B.M.

sexta-feira, 6 de junho de 2014

HENRIQUE GALVÃO - MINHA CRUZADA PRÓ-PORTUGAL. SANTA MARIA

 
 
Henrique Galvão, "A Minha Cruzada Pró-Portugal. Santa Maria" [ed. fac-similada], Livraria Martins, São Paulo, 1961, p. 201.
 
Trata-se do volume nº 9, da colecção “Livros Proibidos do Estado Novo” (do jornal PÚBLICO), em versão facsimile, que vem acompanhado do respectivo relatório oficial da censura. O livro, de imediato proibido de circular “conta a história do sequestro do luxuoso paquete Santa Maria, pelo Capitão Galvão, o próprio autor, a 23 de Janeiro de 1961. O objectivo era chamar a atenção do mundo para a longa ditadura portuguesa e denunciar o regime ditatorial franquista de Espanha" [ler AQUI]
 
Sobre a obra, publicada inicialmente no Brasil (1961) e posteriormente editada em Portugal com o título “Assalto ao Santa Maria” (Edição Delfos, 4 de Julho de 1973), transcrevemos o artigo publicado no mesmo jornal, por Álvaro de Matos, coordenador da Hemeroteca Municipal de Lisboa [onde tem desempenhado um elevado trabalho de serviço público, que todos lhe reconhecem] e Investigador Centro de Investigação Media e Jornalismo.
 
«A primeira “libertação de uma parcela do território nacional”…», jornal PÚBLICO, 4 de Junho de 2014, p. 47 – por Álvaro de Matos (sublinhados nossos)
 
“Na ressaca do assalto ao Santa Maria, e aproveitando o seu impacto mediático, Henrique Galvão (HG) publica no Brasil, em 1961, Minha Cruzada Pró-Portugal. Uns anos mais tarde, em 1973, já depois da morte do autor, o livro sai em terras lusas, com outro título, O Assalto à “Santa Maria”, com a chancela da Delfos. A obra conta a história da “Operação Dulcineia”, nome pelo qual ficou conhecido o plano de sequestro do luxuoso paquete transatlântico português Santa Maria, orquestrada pelo próprio autor. Por sua vez, “a acção deveria servir de rastilho a um levantamento popular que, no caso português, poderia ser iniciado, segundo HG, em qualquer ponto vulnerável do Império, onde começavam a surgir então os primeiros fermentos de rebelião nacionalista contra a “política colonial tirânica de Salazar” (Barreto, 1999).
 

 
Através do choque provocado na opinião pública internacional, HG, com um grupo de exilados políticos espanhóis liderados pelo Capitão Sotomayor, pretendia chamar a atenção das democracias ocidentais para a situação política ibérica. Mas O Assalto ao “Santa Maria” não se fica pelo registo dessa acção verdadeiramente quimérica que, apesar de não ter atingido os seus fins, constituiu um duro golpe na credibilidade do Estado Novo, mostrando o seu crescente isolamento internacional. O livro incorpora também um dos mais violentos ataques políticos feitos ao regime e ao carácter de Salazar.
 
Aquilo que HG classifica como “cenário político e moral” que, no seu entender, justificava a tomada do Santa Maria. Esta devia ser vista como “um propósito político e bem claro de rebelião”, e não como um acto de pirataria, como pretendeu o regime. Salazar é pois descrito como um homem “devoto, mas não genuinamente religioso”, fabricador de “uma falsa personalidade”, que lhe serviu “de disfarce para ocultar a verdadeira, que era incapaz de actos democráticos”; portanto, um “impostor habilidoso”, que centralizou “nas suas próprias mãos todos os instrumentos de poder arbitrário e irresponsável”; que chegou ao poder reduzindo a população “a uma obediência de rebanho” e perseguindo “toda a oposição”; criou, assim, um “Estado totalitário”, assente num “único partido político”, numa polícia política “copiada da Gestapo”, na “censura prévia aplicada a todas as manifestações de pensamento político ou vida intelectual”, e noutros pilares conhecidos.
 
Segue-se a desconstrução veemente dos “reais feitos” de Salazar que, na realidade, para HG, traduziam-se antes na “degradação do povo português” (sujeito “à miséria moral dos povos párias dos países totalitários”), na corrupção generalizada da sua administração (“No actual Portugal de Salazar, tudo é comprado e vendido”), na transfiguração do exército numa “guarda pretoriana servil” (logo, inútil para a defesa nacional), na existência de um governo medíocre (responsável pela “miséria de mais de 80% da população portuguesa nos aspectos vitais da sua existência como seres humanos”), numa educação plasmada num “imbróglio mental e organizacional” e, por fim, numa justiça que não primava pela independência, transformada no “negócio mais monstruoso” do país.
 
O retrato era arrasador, feito por um homem que tinha desempenhado um papel importante no 28 de Maio, como militar, e no regime, como funcionário colonial e deputado por Angola, mas que rompera com o Estado Novo no final dos anos 40 devido às suas críticas às condições da colonização angolana (Março de 1949).
 
 
 
 
Sem surpresa, a circulação do livro foi proibida. O editor ainda amenizou “certas expressões mais incisivas do autor”, exercício que não influiu na apreciação do censor:
 
Na primeira parte deste livro faz-se um relato da história política do regime. A segunda parte é o relato da operação. Em ambas se insulta fortemente o governo, as instituições em geral, muitas pessoas, etc.
 
E acrescentava, antes de concluir pela apreensão provisória do livro:
 
Entre outros, há aqui ofensas à magistratura, às forças armadas e à administração em geral que é acusada de corrupção. Além disso, o livro, tal como está escrito, parece constituir um forte incitamento à violência política”.
 
A sentença é bastante expressiva do que era a censura nesta altura, muito preocupada com as críticas que mais pudessem afectar a segurança e o prestígio do regime, ou as suas principais figuras políticas, de que os temas abordados por HG eram caso sintomático. Daí a reacção repressiva, a priori, no caso da imprensa escrita, e a posteriori, no caso dos livros, mas articulada com outra vertente não raras vezes esquecida da acção da censura: a tentativa, que vinha de trás, de formação de um bloco de opinião nacional favorável ao Estado Novo, incompatível com a “Cruzada Pró Portugal” do nosso autor. Mas 6 meses depois, com o 25 de Abril de 1974, o objectivo último da aventura do rebaptizado Santa Liberdade era concretizado: “o desmoronamento do regime salazariano”.
 
[Álvaro Costa de Matosin «A primeira “libertação de uma parcela do território nacional”…», jornal PÚBLICO, 4 de Junho de 2014, p. 47
 
J.M.M.

domingo, 1 de junho de 2014

O DR. SEBASTIÃO RIBEIRO [1894-1979] PARTE III


O dr. Sebastião Ribeiro teve “muitos clientes e muitos processos disciplinares” da Ordem dos Advogados, sendo neste último teimosamente reincidente [a sanha de Sebastião Ribeiro contra a Ordem dos Advogados tinha, decerto, origem numa disputa com a Ordem em torno do caso Cunha e Costa, atrás referida). Assim, no exercício da profissão de advogado, confrontou-se por várias vezes com o Conselho Superior da Ordem dos Advogados, tendo sido suspenso por dois meses, seis meses (16 de Junho de 1952 – o Edital foi divulgado nos periódicos) por “injúrias” à Ordem e aos seus membros, sendo presidente da Ordem o dr. Adelino da Palma Carlos, três anos e depois castigado com “dez anos de suspensão” (cf.Seis Casos, p. 63) e irradiado dos quadros da Ordem (acórdão de 25 de Novembro de 1953).
 
[sobre a questão esgrimida com a Ordem dos Advogados e as sanções disciplinares a que teve sujeito, S. Ribeiro publica o panfleto, “Os Coriscos da Ordem”, o que lhe valeu um processo-crime pela Ordem, a que se seguiu nova resposta de S. Ribeiro com novo opúsculo, “No Panteão dos Insignes”, uma diatribe contra Adelino da Palma Carlos, e, nessa querela, outros mais folhetos se lhe seguiram. Imparável! Curioso é a análise que faz sobre o pedido pelo Ministério Público das assinaturas das listas do MUD, então nas mãos do dr. Mário de Castro e dos factos que se lhe sucederam – ver pp. 96-102, de “Os Coriscos da Ordem”; pp. 105-117, e do “No Panteão dos Insignes”. Diga-se, ainda, que o dr. Eduardo Ralha (que era, então, membro do Conselho Superior da Ordem e relator do processo que expulsara S. Ribeiro da OA), despeitado publicamente por S. Ribeiro (ver “Os Coriscos da Ordem”, “Sá, Ralha & C.ª”, “Lobos e Cordeiros”, etc.) replica com um opúsculo ao seu detractor, “Desfazendo calúnias do Dr. Sebastião Ribeiro”, Porto, 1956]



Foi preso pela PIDE, em Vila Nova de Gaia, a 24 de Abril de 1963, juntamente com o dr. Leite Faria e enviado para o Aljube (esteve preso 15 dias). Os motivos, com base em escutas telefónicas, prendiam-se com uma suposta cumplicidade com Henrique Galvão (sobre Galvão e a sua prisão pela PIDE, ver o opúsculo de S. Ribeiro, “Seis Casos” e, também, “A Confusão”. Refira-se que Sebastião Ribeiro foi advogado de Henrique Galvão, em substituição de Vasco da Gama Fernandes) e Humberto Delgado (cf. Sebastião Ribeiro, in "Anotações ao Presente", I vol, s.d. Foi “conselheiro jurídico” do general Delgado). É de novo preso no dia 28 de Maio de 1963, acusado de “intervir nos acontecimentos de Beja”, ou “golpe de Beja”, dado terem-lhe apreendido uma carta supostamente comprometedora do general Humberto Delgado e terem em seu poder cartas de Henrique Galvão, para si dirigidas, que a PIDE tinha confiscado. Como companheiro de prisão tem o dr. Maldonado de Freitas, o dr. Vieira de Almeida (filho). Assinou as Listas do MUD e apoiou a candidatura de Humberto Delgado (1958) à Presidência da República.
 

Colaborou em diversas revistas e jornais, como o “Diário Liberal” (colaborava na secção dos “Ecos” e publicou uma serie de artigos sobre as reformas de justiça pós-28 de Maio, que sofreu o corte da censura), no “Emancipador” (de Lourenço Marques, Moçambique) e na “Vida Contemporânea” [revista cujo proprietário e director era Cunha Leal; a revista existiu de Maio de 1934 a Abril de 1936].
 
Publicou os seguintes livros e opúsculos (muitos deles foram, de imediato, apreendidos, e motivo de processo crime, “por virtude de injúrias a autoridades”): “Resposta Pronta” (1929); “A Opipara Inquisição do Maculusso”; “O Conselho Superior Judiciário das Colónias”; “Palavras Claras sobre Jurisprudência Escura” (1936); “A Minha Razão” (1939); “A Razão Deles” (1940); “No Seio da Ordem” (1943); “A Miragem da Ordem” (1943); “Os Coriscos da Ordem” (1952); “No Panteão dos Insignes” (1953); “Sá, Ralha & C.ª” (1955); “Lobos e Carneiros” (1956); “Os Fariseus” (1956); “Só Ralha” (1956); “Seis Casos” (1957); “A Confusão” (1958); “Equidade e Iniquidade” (1963); “O Rescaldo”; “Recordações do Passado” (1967); “Anotações do Presente”, vol. I e II.

Morre em Lisboa, a 14 de Dezembro de 1979.

J.M.M.

O DR. SEBASTIÃO RIBEIRO [1894-1979] PARTE II


Sebastião José Ribeiro concorre para Inhambane (Moçambique), onde chega, acompanhado pela esposa, em Abril de 1920. Após alguns conflitos com os poderes públicos (o alto comissário era, então, Brito Camacho), é colocado em Quelimane e, depois, a seu pedido, parte para Goa (Outubro de 1922), comarca de Salsete, Índia. Era governador-geral, o seu patrício, o dr. Jaime de Morais, tendo encontrado ainda por Goa, o tenente-coronel Craveiro Lopes, o procurador Acúrcio da Rocha Dinis, o dr. Euclides de Meneses (juiz da comarca), o goês dr. Wolfango da Silva, o dr. Basílio de Oliveira. Não tendo gostado da Índia, e querendo conhecer Angola, pede a transferência para Luanda, para onde segue (Dezembro de 1923), depois de breve passagem por Lisboa (e Torres Vedras, na casa do seu pai, juiz Salvador Ribeiro, e onde a sua família se encontrava). Toma posse a 8 de Janeiro de 1924, em Luanda. Era governador-geral (em substituição do alto-comissário Norton de Matos) o coronel Almeida Santos. Por lá encontrou o presidente da relação, dr. Avelino Leite, o dr. Pimentel Furtado, o procurador da República dr. Júlio Armando, o dr. Fausto de Quadros (ajudante, e mais tarde, Procurador da República. Diga-se que Fausto de Quadros, doente, pede mais tarde a sua exoneração), o dr. Mário Ferreira, o dr. Dario Calisto (juiz de Novo Redondo), o engenheiro Francisco da Cunha Rego Chaves (alto-comissário de Angola, e do qual Sebastião Ribeiro refere, em pormenor, algumas peripécias de foro jurídico).  
O golpe de 28 de Maio de 1926 apanha-o em Lisboa, de “licença graciosa”, “arredado” que estava de Luanda pelo ministro das colónias, João Belo, que lhe “extinguiu o lugar de juiz auditor” [refira-se aqui a amizade de Sebastião Ribeiro com o dr. Da Cunha Dias, e os planos que ambos tinham para trabalharem em Angola, assunto que não se concretizou por abandono de Da Cunha Dias da colónia, por não se ter adaptado a ali viver].

Foi Sebastião Ribeiro, depois, colocado na comarca de Huíla, para onde seguiu em Novembro de 1926. Acontece que, a partir da revolta de Fevereiro de 1927 [e da tentativa de golpe dos Fifis, em Agosto de 1927, que levou à deportação de Henrique Galvão), muitos revoltosos contra a ditadura são deportados para Angola. Sebastião Ribeiro refere, assim, alguns dos deportados que chegaram a Sá da Bandeira, entre os quais, Henrique Galvão [Aditamento: esteve no 28 de Maio, defendeu a ditadura no 7 de Fevereiro e, envolvido no golpe dos Fifis, foi deportado para Angola], o tenente de artilharia Luciano Augusto Dias (de Viana de Castelo), o tenente de metralhadoras Gervásio Campos de Carvalho, o comandante Agatão Lança. Curiosamente, é solicitado (pelo comissário da colónia, coronel Vicente Ferreira, sob convite de Cunha Leal) para ser procurador da República, junto da relação de Luanda, mas “não aceita o lugar” [ibidem, p. 218] por entender que o governo “considera os agentes superiores do ministério público como funcionários da sua confiança”, o que repudia de todo.   
Posteriormente é transferido para exercer a magistratura em S. Tomé e Príncipe (“castigado em consequência de uma sentença desagradável para o governo da ditadura”, ibidem, p. 267), partindo de Luanda (teve como companheiro de viagem o deportado político o dr. Alfredo Nordeste, que ia ali exercer a função de advogado), onde chega no fim de Abril de 1929. Durante a sua permanência deu-se a revolta de Angola, em 1930 (revolta do comando militar, pelo chefe de estado maior coronel Genipro de Almeida, contra o tenente Morais Sarmento, com a morte deste último), que aliás tinha antes conhecimento. Sucedeu um caso curioso: as autoridades políticas pretendiam um juiz auditor para julgar os revoltosos de Angola (que se encontravam a bordo do navio de guerra Vasco da Gama), pelo que pensaram que o juiz de S. Tomé poderia ser útil, dado não confiarem nos juízes da colónia. Assim, por ordem do ministério da marinha a ordem foi dada, porém não só a autorização carecia de legalidade, como se lembraram que o juiz de S. Tomé era considerado “desafecto da situação” e, como tal, não cumpria a confiança política esperada. 

De S. Tomé, por motivos vários, regressa a Moçambique, para a comarca de Quelimane, onde permanece de Março de 1931 a Julho de 1932. Nesse período morre a sua primeira mulher, e, depois de passar por Lisboa, vai tomar posse, como juiz, da comarca de Moçambique (Maio/Junho de 1933). As orientações políticas que resultaram da constituição da União Nacional e da reformulação da ditadura (Estado Novo), com mudanças expressivas no conselho superior judiciário, nas pastas coloniais (o ministro era, então, Armindo Monteiro), com constantes “ataques” da imprensa do regime a Sebastião Ribeiro, e várias queixas contra ele, deram lugar a uma verdadeira “caça às bruxas”, que aliás teve lugar em todo o país.
Como resultado da perseguição movida pela “União Nacionalde Moçambique [formada com a ida para Moçambique do dr. Carlos Moreira, com a ajuda do monárquico dr. Luiz de Vasconcelos e do dr. José Dias – ver “A Minha Razão"], Sebastião Ribeiro é transferido, por decreto, para Moçâmedes (Angola), onde tomou posse em Maio de 1936. Data desse período o opúsculo que escreveu, “Palavras Claras sobre Jurisprudência Escura”, acórdão a propósito da sua análise sobre o caso do desfalque no cofre dos imigrantes de Moçambique, que obteve um êxito retumbante. Também, desse período, surgiu o pronunciamento (crime de burla, no processo referente à sociedade comercial Figueiredo & Almeida, Lda, onde era advogado) e respectivo mandato de captura contra o dr. Elmano da Cunha e Costa (curiosamente, amigo de Sebastião Ribeiro, deste os tempos da Universidade – sobre Elmano de Morais da Cunha e Costa há referências várias por S. Ribeiro, no seu livro, “No Seio da Ordem”, 1943; S. Ribeiro foi seu advogado na reclamação feita à Ordem dos Advogados, perante a suspensão da sua inscrição na AO, por considerarem carecer Cunha e Costamanifestamente de idoneidade moral”, ibidem, p. 61-62). Entretanto adoece Sebastião Ribeiro, pelo que regressa a Lisboa, ao mesmo tempo que corre contra ele uma sindicância (com parte disciplinar e parte política – relatada no seu livro “A Minha Razão”, 1939. Refira-se que o seu inquiridor foi o dr. Abílio Augusto de Brito Nascimento, aliás Ruy Sant’Elmo, quando “nos braços das musas embalado” – cf. “Minha Razão”, p. 70) em Moçambique e Moçâmedes (ibidem, p. 324 e ss).

Já em Lisboa, no processo que lhe foi movido, foi “sugerido ao ministro” a aplicação da pena de três meses de suspensão. Recorreu do despacho (fundamentando-se da ilegalidade da portaria e do despacho), tendo o supremo tribunal dado provimento ao seu recurso. Como consequência, a parte disciplinar foi devidamente arquivada. No que respeita á parte política da sindicância, foi-lhe aplicada a pena de aposentação por Despacho do Ministro das Colónias, de 8 de Maio de 1939, e publicado no DG de 31 de Maio [diga-se que o processo disciplinar, enviado pelo dr. Francisco Machado ao presidente do conselho, Oliveira Salazar, teve a seguinte redacção pela pena do ditador:”aposentado ou demitido, que bem o merece” – ibidem, p. 335].
Sebastião Ribeiro recorreu para o conselho de ministros (era ministro da justiça, Manuel Rodrigues), que funcionava como tribunal de recurso, o qual lhe negou provimento (18 de Setembro de 1939) [o processo contra Sebastião José Ribeiro e o seu recurso são bem curiosos. Repare-se nalgumas das infracções de que foi acusado: relações com deportados políticos, inimigos do Estado Novo; negligência por falta de envio da relação dos funcionários de justiça para serem inscritos no recenseamento eleitoral; o ter “posto nome a criado seu aleijado de “Estado Novo” e “Portugal Maior”]. Aposentado compulsivamente, por motivos políticos, dedicou-se à advocacia.

[A CONTINUAR]

J.M.M.

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

HENRIQUE GALVÃO - "CRÓNICA DE HORAS VAZIAS"


LIVRO: Crónica das Horas Vazias [Contém uma carta do autor a Marcello Caetano, então Ministro das Colónias];
AUTOR: Henrique Galvão [capa de Ribeiro];
EDITORA: Livraria Popular Francisco Franco, Lisboa, s.d. [1975], 148 p.

"Textos escritos na prisão (política), nos anos 50 do século XX, anteriores à fuga que levará Galvão a actos militarmente subversivos, entre os quais o sequestro do Santa Maria, navio da marinha mercante posto ao serviço de tropas para as colónias. Livro que reflecte o ódio do ex-servidor do Estado Novo a uma ditadura que ele próprio havia promovido. Uma azeda passagem menos “histórica”, mas nem por isso menos importante para a caracterização, hoje à distância, dos anos negros:

'[...] Ainda não podemos ler jornais mas já nos permitem a leitura de alguns livros: só aqueles que a Censura da cadeia tiver como inofensivos para o nosso espírito.

Quem exercerá as funções de Censor? O director da Cadeia nas horas livres dos seus cuidados de hortelão e criador de galinhas? O director da P.I.D.E. ou algum dos seus inspectores? Seja quem for, da casa, estamos sossegados. Os mais cultos pertencem àquela classe de analfabetos que sabem ler e escrever.

Nenhum livro dos que me enviaram me foi interdito. Tratava-se evidentemente de simples formalidade. A Censura não podia deixar de ser um dos órgãos da P.I.D.E. Tinha de assinalar a sua existência. O Estado Novo é um sistema de bolas chinesas: uma grande bola dentro da qual se contém e gira outra bola mais pequena, que por sua vez contém bolas, sempre menores e também cheias de bolas, até à insignificante e última que é maciça. No Estado Novo há um ditador e muitos ditadorzinhos concêntricos, uma Censura e muitas censurazinhas, uma Propaganda e muitas propagandazinhas, etc. Em Caxias gira uma das bolas interiores do sistema com o seu ditador, a sua censura, a sua polícia e a sua propaganda. [...]"

via FRENESI.

J.M.M.

domingo, 23 de janeiro de 2011

O INIMIGO Nº 1 DE SALAZAR, DE PEDRO JORGE CASTRO


Vai ser apresentado amanhã, 24 de Janeiro, pelas 18:30h, na Fundação Mário Soares, o livro de Pedro Jorge Castro intitulado O Inimigo nº 1 de Salazar, editado pela Esfera dos Livros.

A apresentação da obra estará a cargo do Dr. Mário Soares.

Esta obra aborda a figura de Henrique Galvão e o protagonismo que passou a dispor depois do assalto ao paquete Santa Maria e do desvio do avião da TAP.

Pode ler-se na sinopse da obra:
Naquela manhã de 22 de Janeiro de 1961, os passageiros do paquete de luxo Santa Maria Aperceberam-se de que algo estava errado. Havia marcas de sangue no chão. Um homem armado impedia-lhes o acesso ao convés superior. Na sala do pequeno-almoço, não havia o habitual menu para a escolha dos pratos. Os empregados, com ar tenso, fazem correr a notícia, em voz baixa: «Uns rebeldes tomaram conta do navio.» A liderá-los está o capitão Henrique Galvão, o inimigo número um de António de Oliveira Salazar. Fervoroso salazarista, Henrique Galvão começa a desiludir-se e a afastar-se dos ideais defendidos pelo Estado Novo em 1949 quando afronta o regime na Assembleia Nacional, onde denuncia a escravatura e vários negócios promíscuos que envolvem a Administração de Angola. Estava aberta a porta para o confronto entre os dois homens que se conheciam bem. Seguiu-se uma tentativa falhada de atentar contra a vida do presidente do Conselho, em 1951, a prisão, uma espectacular fuga do Hospital de Santa Maria e o exílio. Salazar terá desabafado na altura: «Vamos arrepender-nos mil vezes. É muito mais perigoso que (Humberto) Delgado.» Salazar não estava enganado. Galvão escreve uma violenta carta aberta a Salazar, prepara a «Operação Dulcineia», que durante largos dias ocupa páginas e páginas da imprensa internacional. O regime ficava exposto. O exílio no Brasil não trava o seu ímpeto de lutador anti-fascista. Segue-se o sequestro de um avião da TAP e o depoimento contra Portugal na sede das Nações Unidas, arriscando-se a ser preso e extraditado para Portugal.

Uma iniciativa que recomendamos.

A.A.B.M.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

CARTA ABERTA A SALAZAR de HENRIQUE GALVÃO


Carta Aberta a Salazar de Henrique Galvão, seguida de "Cântico do País Emerso", de Natália Correia

Editora: Esfera do Caos - reimpressão, 2010

"Ninguém conhece melhor o amo que o seu criado de quarto"

Henrique Galvão recorria frequentemente a esta ideia para, de forma alegórica -considerando ter sido «criado de quarto de Salazar» -, significar que, por ter servido intimamente o ditador e o regime, ninguém os conhecia melhor do que ele.

E de facto, esta Carta Aberta a Salazar é uma das mais brilhantes análises, a que podemos ter acesso, da ideologia salazarista e da personalidade do ditador, por um lado, e, por outro, dos resultados obtidos pelo Estado Novo - a sua «verdadeira obra» - nos planos social e económico.

As três primeiras edições deste livro, de 1959, foram apreendidas pela PIDE quase à saída da máquina. Uma nova edição surgiu na Venezuela, em 1960, e entrou clandestinamente em Portugal - também desta, poucos foram os exemplares que escaparam às garras da polícia política.


ler AQUI

J.M.M.

HENRIQUE GALVÃO - CARTA ABERTA A SALAZAR



HENRIQUE GALVÃO [1895-1970] nasceu no Barreiro, concluiu estudos na Escola Politécnica, seguiu a carreira militar. Foi apoiante de Sidónio Pais, participou como cadete no golpe de 28 de Maio de 1926, venerou Oliveira Salazar ("Ninguém conhece melhor o amo que o seu criado de quarto", disse um dia], teve cargos públicos (direcção da Emissora Nacional, foi responsável pela secção colonial da Exposição do Mundo Português em 1940) participa e organiza a Administração das Colónias [foi em 1934 deputado por Angola, depois governador de Huíla e Inspector da Adm. Colonial] - foi escritor com uma vasta bibliografia, tendo deixado alguns dos mais belos livros sobre a vida colonial, a fauna, a zoologia e a caça africana [veja-se, p. ex. o incontornável "Ronda de África, Outras Terras, Outras Gentes, Viagens em Moçambique", II vols; e o "Da Vida e da Morte dos Bichos", V vols].

Afasta-se da ditadura salazarista (a questão em torno dos Estatuto dos Indígenas é crucial), aparece apoiando a candidatura presidencial de Quintão Meireles, conspira nos anos 50 contra o Salazar [surge relacionado com uma presumida insurreição ou intentona contra a ditadura, denominada Intentona da Rua da Assunção, em 1952 – cf. A História da PIDE, Irene Pimentel, pp. 224-227] e é por isso preso pela PIDE e, consequentemente, expulso do exército. Por várias vezes detido nas cadeias Salazaristas, em 1959 consegue uma fuga espectacular do Hospital de Santa Maria (onde se encontrava hospitalizado e vigiado pela PIDE, por transferência da cadeia de Peniche), tendo-se refugiado, posteriormente, na embaixada da Argentina (12 de Maio), seguindo depois para a Venezuela.

É então (1959) que publica uma "Carta Aberta a Salazar", que é, de facto, uma apreciação brilhante, invulgarmente sarcástica e poderosa sobre o ditador e o Estado Novo, edição essa rapidamente apreendida pela PIDE, mesmo após várias tentativas de circulação. Ao que parece saiu uma edição via Venezuela (1960), mas os exemplares da edição coeva são hoje muito raros.

Henrique Galvão continua a sua luta, radicaliza-se, aparece em 1961 como principal instigador do assalto conseguido [levado a cabo pela DRIL, de que fazia parte, tb, Jorge Sottomayor] ao paquete Santa Maria [denominado logo por “Santa Liberdade” - ver AQUI], combate que fazia parte da "Operação Dulcineia" contra o regime (via tomada de Luanda), depois é co-organizador da "Operação Vagô”, de que fez parte o desvio do avião da TAP que vinha de Casablanca. Torna-se, portanto, uma figura de destaque na luta anti-fascista em Portugal, marcando novos caminhos e acções de luta contra a ditadura. Morre em 1970, em São Paulo (Brasil), só e muito desamparado de Portugal e pelos portugueses.

J.M.M