anunciam o outono, que se apressa.
O vento assobia e as folhas, em desalinho,
dançam num vaivém frenético a melodia
do verão, que se despede.
O seu olhar segue o movimento das folhas
e o dourado da tarde ofusca-lhe os sentidos,
«As palavras pesam. Um texto nunca diz a dor das pequenas coisas» Graça Pires in Poemas escolhidos
Desato as sandálias e caminho descalça pelas dunas;
os meus pés pisam areias secas e por momentos
recuo e torno a calçar-me. O chão escalda.
O deserto é penoso, mas desafiante.
Nele me reencontro, sempre que durmo ao relento
nas noites infindáveis, quando mergulho em sono profundo.
Pela manhã o sol acorda-me e uma flor sorri.
É o recomeço da travessia; por instantes, sonho.
Por caminhos sinuosos
tão distantes e tão próximos
das árvores, com ninhos de pássaros,
ouço o chilrear dos melros.
Nos galhos, as folhas estremecem.
O vento voraz espalha-as no chão
antes e depois da passagem
os meus pés apressam-se.
O dia entardece.
Apenas o brilho do crepúsculo
me faz lembrar o silêncio
escondido numa flor
que trepa pelas escarpas
que serpenteiam a costa,
duma praia invisível.
O mundo aquieta-se.
Só o murmúrio do mar
me responde.
O silêncio abre os meus olhos
e nele me reencontro
quando na brisa das manhãs
o sol rompe uma nuvem
e os pássaros
em revoada, entoam a alvorada
no desabrochar de uma flor.
O silêncio abre os meus olhos
num recôndito vale sombrio
onde a quietude se faz presente
nas curvas sinuosas dum rio.
O silêncio abre os meus olhos
quando o sol se esconde no horizonte
e a terra respira paz.
É quase outono nas dunas,
os oásis têm sede e as plantas mirram.
Nada é igual como dantes
quando os caminhos floriam de paz
nos teus pés descalços pelo vento
deambulando como plumas.
Ainda estamos a tempo
de colher flores amarelas
nos dias em que as névoas
orvalharem os desertos.
Percorri contigo os caminhos do vento
agarraste-me pela mão e levaste-me
pela charneca em flor, na primavera
das memórias.
As fragâncias inebriavam-me os sentidos
e era como se fosse a primeira vez
que me deleitava com todas as cores
que faziam círculos em meu redor.
Amarelas, roxas, brancas, verdes
todas as cores do meu universo
estavam ali.
Perdi-me no meio delas e redopiei
qual bailarina em pontas
no mais belo palco do mundo.
O meu e o teu mundo.