anunciam o outono, que se apressa.
O vento assobia e as folhas, em desalinho,
dançam num vaivém frenético a melodia
do verão, que se despede.
O seu olhar segue o movimento das folhas
e o dourado da tarde ofusca-lhe os sentidos,
«As palavras pesam. Um texto nunca diz a dor das pequenas coisas» Graça Pires in Poemas escolhidos
Quem escreve, lê e ouve os poemas?
O mundo anda muito distraído.
Os ruídos são ensurdecedores.
Mas o mar esboça na areia com a sua maresia
rendilhados de espuma branca.
As gaivotas leem nas migalhas, ao final da tarde,
o sabor do seu sustento.
Nas escarpas homens e mulheres sós
com o sal a escorrer pelas faces
estão atentos aos sons do mar,
sob o efeito das marés.
Talvez um poeta que tenha passado por ali
tentasse passar a sua mensagem
no purpúreo entardecer.
__Mas, ninguém o escutou__
Sentada na escarpa
vagueio o olhar pelo horizonte
que perscruta o entardecer,
de uma tarde de outono.
Recordo-me da varanda
de onde ao acordar
vislumbrava o amanhecer.
Os dias tão longos,
hoje tão curtos.
A alma imperturbável
recolhe nos recônditos da memória
as cores, que hoje tão distantes,
estão aprisionadas
no pensamento.
Quando a noite murmurar
o frio e a geada do inverno,
a primavera florescerá
nas pontas dos meus dedos.
Dizia-lhe que tinha os sinais à flor da pele
como quem colhe cerejas e as trinca
deixando escorrer pelo canto dos lábios
o néctar vermelho doce como o mel.
Via-se nas sombras dos pomares
poisando aqui e ali qual borboleta
escutando o silêncio da tarde
entre os cantos dos pássaros
e os zumbidos dos insetos.
O relento era o seu reino onde
se sentia aconchegada longe do mundo
e apenas as flores lhe entoavam baixinho
o prelúdio do entardecer.
Numa pétala de rosa esboço um barco
onde me sento segurando a vela
e deixo que o vento o impele
sobre as águas de um lago imaginário,
em que no silêncio da tarde
os ecos crepitam
rumores de um entardecer.
Do sonho acordo e espanto-me
com a claridade do dia
sem vestígios do barco
que ousei tecer com os sentidos.
Rasgava o horizonte com o olhar
e com os dedos agarrava o luar
que se misturava com as cores
purpúreas do entardecer.
Na sua voz embargada
acolhia todos os pássaros,
que voejavam em seu redor
numa discreta contemplação
do esplendor das sombras
que o luar acendia.
Corria-lhe nas veias um rio
onde, como em chão lavrado,
as margens repousavam
e o luar se recolhia.
Tão longa a noite...
Tão breve o dia...
Havia um oceano dentro dela
de águas calmas, sem ondulação,
que mergulhava no silêncio das madrugadas
e na paz do entardecer.
Os barcos navegavam à tona
rodeados de corais verdes e azuis
que a cerceavam nas noites
em que as marés fitavam a Lua
e o luar a cingia meio tímido.
Nestes momentos a presença de Deus
tomava-lhe as emoções e o silêncio
era apenas brisa refrescante
numa praia invisível.
Tenho saudades do meu rio.
O meu rio não é um rio como os outros,
porque me corre nas veias,
o que o torna único.
É um rio que me viu nascer.
Um rio com águas bordadas a prata
e com margens tingidas de azul.
A lezíria beija-lhe as margens
numa doce primavera verde
e os pássaros voejam em redor
debicando aqui e ali,
como se entendessem
as maresias e os pores do sol
que sobrevoam os barcos
que trago dentro de mim.
O meu rio é único e belo.
Tão belo,
que cabe na luz do entardecer.
O verão é feito de sol, areia e água salgada.
(por vezes a chuva cai impiedosa)
As ondas beijam as praias e os barcos
navegam na costa os teus cabelos ao vento.
Na esplanada corpos tisnados pelo sol
brilham como a luz do crepúsculo
e saboreiam um coquetel gelado
para mitigarem a sede.
No regresso à praia
envolvem-se na brisa marinha
como nuvens de espuma
a reter as marés.
O verão é também o pôr do sol
quando o céu incendiado
derrama sobre os corpos nus
a luz do entardecer.
Salvador Dali |