Mostrar mensagens com a etiqueta COVID-19. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta COVID-19. Mostrar todas as mensagens

domingo, janeiro 09, 2022

Números da pandemia, etc.

PAUL KLEE
Blick aus Rot
1937


1. De acordo com os mais recentes dados estatísticos, ao longo dos últimos (quase) dois anos, a pandemia de COVID-19 provocou em Portugal um total de 19.029 óbitos.

2. Se consultarmos alguns números também disponíveis sobre os óbitos antes da pandemia, encontramos exemplos como estes: em Portugal, no ano de 2019, faleceram 33.421 e 28.464 pessoas, respectivamente com doenças do aparelho respiratório e tumores malignos.

3. Evitemos o ruído mediático — já basta o que basta. Apesar disso (aliás, precisamente por causa da histeria quotidiana desse ruído), vale a pena colocar um serena pergunta: porque é que o relativismo destes dados não faz parte da nossa informação corrente?

4. Claro que, face à COVID-19, é fundamental não favorecer formas de futilidade e indiferença que, em última instância, contribuam para forçar o sistema hospitalar a enfrentar os seus limites humanos e técnicos. Em todo o caso, há uma parte de objectividade dos números que deveria ter algum peso nas dinâmicas da consciência colectiva.

5. Ou ainda: porque é que cada vez que um responsável político (do governo ou das oposições) tenta sublinhar a importância social da responsabilidade individual, o seu discurso acaba afogado numa histeria de números e alarmismo? Subitamente, a tragédia da pandemia (que ninguém nega) transformou-se também num drama cultural — como vivemos e como queremos viver?

quinta-feira, abril 15, 2021

Mick Jagger + Dave Grohl
— a verdade primitiva do rock'n'roll

Mick Jagger com a companhia de Dave Grohl: Eazy Sleazy aí está, uma canção nascida do interior da pandemia, sem paternalismos disfarçados de pedagogia, vogando numa energia vital sem outro destino que não seja a verdade orgânica da sua performance — rock'n'roll, sem mais, primitivo, visceralmente presente.
 
We took it on the chin
The numbers were so grim
Bossed around by pricks
Stiffen upper lips
Pacing in the yard
Youre trying to take the mick
You must think im really thick

Looking at the graphs with a magnifying glass
Cancel all the tours footballs fake applause
No more travel brochures
Virtual premieres
Ive got nothing left to wear

Looking out from these prison walls
You got to rob peter if you’re paying paul
But its easy easy everythings gonna get really freaky
Alright on the night
Soon it ll be be a memory youre trying to remember to forget

Thats a pretty mask
But never take a chance tik tok stupid dance
Took a samba class I landed on my ass
Trying to write a tune you better hook me up to zoom
See my poncey books teach myself to cook
Way too much tv its lobotomising me
Think ive put on weight
Ill have another drink then ill clean the kitchen sink

We escaped from the prison walls
Open the windows and open the doors
But its easy easy
Everything s gonna get really freaky
Alright on the night
Its gonna be a garden of earthly delights
Easy sleazy its gonna be smooth and greasy
Yeah easy believe me
Itll only be a memory youre trying to remember
To forget

Shooting the vaccine bill gates is in my bloodstream
Its mind control
The earth is flat and cold its never warming up
The arctics turned to slush
The second comings late
Theres aliens in the deep state

We’ll escape from these prison walls
Now were out of these prison walls
You gotta pay peter if you’re robbing paul
But its easy easy everything s gonna be really freaky
Alright on the night
Were all headed back to paradise
Yeah easy believe me
Itll be a memory you’re trying to remember to forget
Easy cheesy everyone sing please please me
Itll be a memory you’re tring to remember to forget

quarta-feira, abril 07, 2021

A iconografia da pandemia

Será que se pode dizer que existe uma iconografia específica da pandemia, por ela gerada e, num certo sentido, humanizada?
A foto está publicada no jornal Libération (5 abril), ilustrando uma entrevista ao sociólogo Alexis Spire sobre o novo sistema de relações dos cidadãos com os médicos — em jogo está o grau de confiança dessas relações e o seu cruzamento (ou colisão) com as relações com as figuras da cena política.

segunda-feira, janeiro 04, 2021

Mulher Maravilha repete rotinas
de super-heróis masculinos

Eis um acontecimento que ficará para a história cinematográfica do ano de 2020: apesar de todos os condicionalismos impostos pela pandemia, Mulher Maravilha 1984 acabou por estrear-se nas salas escuras. Pena é que, em termos cinematográficos, os resultados sejam tão rotineiros — este texto foi publicado no Diário de Notícias (17 dezembro). 

Sequelas? Podemos defini-las como um cruzamento perverso do cinema contemporâneo, sobretudo da grande máquina industrial de Hollywood: a estratégia de marketing tenta associar-se à reinvenção artística para continuar a alimentar o mercado global. Simples, não é? Infelizmente, como se prova pelo novo Mulher Maravilha 1984, de uma simplicidade cada vez mais rotineira e monótona.
E, no entanto, há que dizer que Mulher Maravilha 1984 vai ficar na história deste atribulado ano de 2020 como uma referência incontornável. Entre os muitos e dramáticos problemas enfrentados pelos mercados cinematográficos — com especificidades nacionais que não podem ser dissolvidas num qualquer resumo “global” —, a ausência de “blockbusters” americanos fica como um dado fulcral. Desde logo, por uma perversa razão que, escusado será lembrá-lo, não decorre do facto de cada filme ser “melhor” ou “pior”: acontece que muitos sistemas de distribuição e exibição (nacionais, precisamente) foram em grande parte construídos de forma unívoca, comercialmente pouco ágil, dependendo por completo desse tipo de produtos. 
Mulher Maravilha 1984
fica como a excepção que confirma a regra, cerca de quatro meses passados sobre o lançamento de Tenet, de Christopher Nolan (esse, sim, um belo exercício cinematográfico). Assim, os estúdios Warner não quiseram desistir de colocar o filme nas salas escuras — em particular na grandiosidade física dos ecrãs IMAX —, fazendo valer um princípio, também simples, mas essencial, segundo o qual a verdade espectacular e emocional de um espectáculo cinematográfico não pode prescindir das singularidades dessas clássicas salas escuras. 
É pena que os resultados reflictam um aproveitamento tão banal dos imensos recursos postos à disposição de uma produção deste género. A lógica de sequela enraíza-se, aliás, num entendimento estritamente financeiro das potencialidades de tais recursos. Dito de outro modo: Mulher Maravilha 1984 nasce do sucesso de Mulher Maravilha (2017), repetindo a colaboração entre a realizadora Patty Jenkins e a actriz Gal Gadot. 
É bem verdade que o filme arranca com uma sequência sugestiva, ainda que repetindo o modelo do filme anterior. Nela reencontramos Diana Prince, futura Mulher Maravilha, ainda criança, apostada em concorrer com as proezas das outras mulheres do seu reino de amazonas. São momentos visualmente curiosos, em particular pelo modo como conciliam as paisagens naturais com os efeitos digitais. São também pistas para uma possível abordagem lendária de uma figura pertencente a um universo divino, em tudo e por tudo ligada a matrizes mitológicas
[ DC Comics ]
Infelizmente, o filme rapidamente se satisfaz com a triste imitação das produções mais medíocres que têm sido feitas em torno de figuras masculinas dotadas de super-poderes. A própria colocação da acção no ano de 1984 (tempos de Guerra Fria, como lembra alguma promoção…) acaba por ser um dado irrevelavante, a não ser para alguma utilização pitoresca do guarda-roupa. E não parece ser grande proeza feminina (ainda menos feminista) fabricar espectáculos com mulheres que se vão esgotando na cópia do pior que se vai fazendo com homens. 
As consequências de tudo isto são, também elas, “tradicionais”. Por um lado, assistimos a uma saturação de efeitos digitais mais ou menos estereotipados e previsíveis, dir-se-ia reciclados de um filme para o outro (o que, provavelmente, acontece…). Por outro lado, a concepção das personagens é de tal modo esquemática que chega a ser penoso assistir aos desastres de interpretação que isso provoca; nesta perspectiva, a composição de Pedro Pascal como Maxwell Lord (o vilão que quer tomar conta do mundo através de uma “máquina” de satisfação de desejos…) tem qualquer coisa de patético, de tal modo o actor se entrega a um delírio histriónico de equivocado amador.
Há em tudo isto um claro desentendimento do que sejam as maravilhas possíveis do cinema. Por alguma razão, há alguns anos, Steven Spielberg chamava a atenção para as ameaças de “implosão” que o cinema americano estava (e está) a enfrentar. Não por causa do gosto da aventura ou dos prazeres do espectáculo — será necessário lembrar que Spielberg pertence, de alma e coração, a esse mesmo cinema? Acontece que face a uma produção de 200 milhões de dólares como este Mulher Maravilha 1984 fica a pergunta mais básica: para quê?

"O primeiro vacinado"
— Portugalex

António Machado + Manuel Marques

Quando há política a mais e pensamento político a menos, onde encontrar alguma visão realmente crítica do nosso presente, isto é, atenta aos sinais contraditórios da vida que vivemos ou somos levados a viver?
Uma resposta possível continua a ser o Portugalex (Antena 1) — textos de  Patrícia Castanheira, com Fábio Benídio, interpretados por António Machado e Manuel Marques.
Entre outras oportunas derivações filosóficas, filológicas e virológicas, o episódio de hoje esclarece-nos sobre duas questões transversais: primeiro, qual a ordem de vacinação que está a ser seguida; segundo, quem toma conta das vacinas. Em jogo está a preservação dos valores seculares da identidade lusitana.
Maravilha!

domingo, janeiro 03, 2021

Alguns sobressaltos políticos
— memória de "Safe", de Todd Haynes

Julianne Moore, Safe (1995)

Na longa metragem Safe/Seguro, de Todd Haynes, Julianne Moore interpreta uma dona de casa dos subúrbios de Los Angeles especialmente sensível a todos os produtos químicos; de grande actualidade simbólica, o filme tem data de 1995 — este texto foi publicado no Diário de Notícias (12 dezembro). 

Não será necessário possuir um conhecimento especializado, ainda menos enciclopédico, da história do cinema para reconhecer que, em todas as épocas, encontramos filmes que nos confrontam, por vezes de forma premonitória, com as mais diversas convulsões sociais, ideológicas e morais. Esta semana, por exemplo, chegaram às salas portuguesas dois títulos exemplares dessa dimensão visceralmente política, em tudo e por tudo alheia ao cliché do “filme político” (segundo o qual o cinema só faz política quando filma algum “militante” de uma “causa” a proferir um exaltado discurso de “propaganda”…). 
American Utopia
, objecto político, por excelência, é mesmo um filme musical. Entenda-se: uma celebração da música e dos seus poderes de encantamento e pensamento (uma coisa pressupõe e envolve a outra). Trata-se do sofisticado registo de um concerto de David Byrne, tendo por base as canções do seu álbum homónimo, maravilhosa reflexão sobre o ser (ou não ser) americano. A realização é de Spike Lee, cineasta em nada estranho aos poderes narrativos da música, com colaborações regulares com o compositor Terence Blanchard e até com um belo filme, Mo’ Better Blues (1990), sobre um trompetista de jazz, interpretado por Denzel Washington. 
O caso de O Mal Não Existe é bem diferente, quanto mais não seja porque se apresenta enquadrado por factos políticos muito concretos: o seu autor, o iraniano Mohammad Rasoulof, foi condenado por “propaganda contra o sistema” e proibido de filmar pelas autoridades do seu país. O certo é que tem conseguido continuar a trabalhar, sendo O Mal Não Existe um admirável libelo contra a pena de morte no Irão — foi também o grande vencedor (Urso de Ouro) do Festival de Berlim realizado em fevereiro. 
O menosprezo corrente, mediaticamente muito poderoso, pela vocação social do cinema sugere que “tais” filmes não passam de divagações inconsequentes de, e para, “intelectuais”. Tal sugestão é apenas um pormenor no interior de um aparato de comunicação que tende a reduzir o cinema a um “entretenimento” pueril, alheio a qualquer forma de entendimento do mundo — como se os filmes dos estúdios Marvel (incluindo os mais brilhantes) fossem placebos ideológicos… 
No recentíssimo A Pandemia que Abalou o Mundo (ed. Relógio D’Água, 2020), livro com tanto de discutível como de fascinante, Slavoj Zizek chama a atenção para o carácter orgânico das vidas humanas — dos vírus à forma de organização da economia —, sublinhando o valor primordial da solidariedade: “Um lugar-comum agora em circulação é que, uma vez que estamos todos nesta crise, devemos esquecer a política e limitar-nos a trabalhar em uníssono para nos salvarmos. Esta ideia é falsa: é agora que precisamos de verdadeira política — as decisões sobre solidariedade são eminentemente políticas.” 
Quem sou face ao outro? Como é que os gestos pessoais determinam o funcionamento do colectivo? Se recuarmos um quarto de século, podemos encontrar estas perguntas no filme Safe (1995), de Todd Haynes, subtil retrato do medo face às possibilidades de contaminação do corpo (entre nós lançado como Seguro). 
A sua actualidade é perturbante. A segurança a que o título alude decorre da crescente vulnerabilidade de Carol White (notável Julianne Moore), dona de casa dos subúrbios de Los Angeles, sempre ameaçada pelos mais diversos produtos químicos. De tal modo que um qualquer sobressalto — por exemplo, nessa cena incrível, num cabeleireiro, em que Carol começa a deitar sangue pelo nariz — adquire a energia de um pesadelo vivido em tom realista. 
A entrada de Carol numa espécie de retiro para pessoas com o mesmo tipo de sintomas ou alergias surge, assim, marcada por uma inquietante ambivalência: por um lado, a clausura parece garantir a adequada distância (segura, precisamente) em relação aos perigos da vida em sociedade; por outro lado, a lógica de “purificação” da sua nova existência, para mais num ambiente que tem qualquer coisa de seita religiosa, põe em causa a própria viabilidade do conceito de sociedade. Enfim, vale a pena não esquecer que o cinema é uma nobre arte humana, não uma colecção descartável de monstros ruidosos fabricados por meios digitais.

sexta-feira, outubro 02, 2020

A IMAGEM: Tom Brenner, 2020

TOM BRENNER
1 de Outubro de 2020

Trump + COVID-19


A. Um pouco por todo o mundo — entenda-se: no universo da Net, interligado através da alucinação de não existirem fronteiras —, multiplicam-se as vozes que, entre a boçalidade e a pura estupidez, celebram o facto de Donald Trump ter contraído o vírus COVID-19.

B. As celebrações podem ser interpretadas, antes do mais, como expressão de uma pulsão de vingança que se confunde com o infantilismo mais irresponsável. Mas o fenómeno é ainda mais inquietante, já que reflecte um menosprezo total pelo mais simples dos factos políticos: qualquer perturbação na existência de qualquer Presidente dos EUA envolve, automaticamente, todo o planeta.

C. Ignoram tais vozes que estamos "perante o momento mais perigoso jamais enfrentado pelo governo dos EUA" [CNN]; na verdade, "ninguém sabe o que vai acontecer agora" [Time]. Nas suas festividades obscenas, ilustram um pobre "pensamento" colectivo, ou melhor, de um colectivo gerado pela promiscuidade virtual e a futilidade mediática que nos dominam. A saber: bastaria lidar com Trump como anedota política para elaborar um ponto de vista político. Como se contrair o COVID-19 o impedisse de ganhar eleições. Como se, entre a frieza de alguns e a inconsciência de quase todos, o COVID-19 não estivesse a ser vivido, desde o primeiro momento, como a maior convulsão política do nosso século XXI.

domingo, setembro 27, 2020

Melbourne, Austrália

19 de Agosto de 2020, uma mulher atravessa uma rua deserta no centro de negócios de Melbourne, Austrália — da austeridade do cenário às sensações cruzadas de solidão e sobrevivência, a imagem condensa muito do que andamos a fazer, nem sempre encontrando palavras para o dizer [Libération]. Não que uma imagem valha "mais" do que mil palavras (ou "menos", se for caso disso). Acontece que talvez nunca como agora tenhamos sentido de modo tão intenso essa dissociação discursiva de que somos feitos. A chuva conforta-nos na nunca vencida promessa de romanesco.

quarta-feira, setembro 23, 2020

COVID-20
— um blog sobre o COVID-19

Para além das especificidades e, como é óbvio, da continuidade do SOUND+VISION, permito-me apresentar uma derivação pessoal, também em forma de blog — chama-se COVID-20.

segunda-feira, agosto 31, 2020

Ariana Grande & Justin Bieber
— "Stuck with U" premiado pela MTV

Tempo de pandemia: os prémios MTV tiveram como insólita, mas muito realista, categoria o "melhor video feito em casa". Ganhou Stuck with U, canção de Ariana Grande e Justin Bieber, lançada em Maio, cujas receitas se destinam à First Responders Children's Foundation (organização de apoio às crianças de trabalhadores envolvidos no combate ao COVID-19).
Eis um caso exemplar de fusão do ecumenismo social com a energia pop — lista de premiados nos MTV Awards no USA Today.

sábado, agosto 29, 2020

Que cultura cinematográfica?

Cartaz italiano de Blow-up (1966):
os clássicos também fazem parte das leis da oferta e da procura
As salas de cinema estão a enfrentar uma dramática crise de frequência. De qualquer modo, a pandemia não explica tudo: há factores de fragilização do mercado que têm várias décadas — este texto, anterior ao lançamento de Tenet, foi publicado no Diário de Notícias (22 Agosto).

Através dos números oficiais do Instituto do Cinema e do Audiovisual, sabemos que, com a pandemia, a frequência das salas de cinema baixou de forma drástica. E sabemos também que, ironicamente, alguns dos clássicos que têm sido repostos estão a conseguir performances muito acima da média.
Eis um exemplo, dos dados referentes ao fim de semana de 13/16 Agosto: Sonic - o Filme, adaptação de um conhecido jogo de video, com Jim Carrey, foi projectado em 13 sessões, tendo sido visto por 63 espectadores; Blow-up, o clássico de 1966 que o italiano Michelangelo Antonioni rodou em Londres, teve apenas uma sessão para a qual foram vendidos 68 bilhetes.
Escusado será dizer que tais números não legitimam nenhuma generalização sobre o carácter mais ou menos “popular” de um filme ou outro (aliás, importa lembrar que Sonic se estreou ainda antes da situação de pandemia, tendo acumulado quase 150 mil espectadores). Vale a pena, isso sim, atentar no valor sintomático da situação global do mercado.
Assim, mesmo com naturais dificuldades, as chamadas salas independentes, directa ou indirectamente ligadas a distribuidores que trabalham com produtos que não provêm dos grandes estúdios dos EUA, têm conseguido manter uma frequência interessante. Ao mesmo tempo, em termos proporcionais, as outras salas (genericamente, as que existem em multiplexes de grandes superfícies comerciais) têm tido frequências muito menores.
Como é óbvio, o problema está longe de ser exclusivamente português. Sabemos, aliás, que o novo filme de Christopher Nolan, Tenet, tem servido de ponto de fuga de todos estes dramas, sendo apontado como um lançamento que poderá impulsionar o regresso de muitos espectadores às salas (a estreia em vários países da Ásia e Europa, incluindo Portugal, ocorrerá na quinta-feira, dia 26). Sem esquecer que esse lançamento tem estado a ser preparado através da reposição de outro filme de Nolan, Inception/A Origem (2010), que entre nós, também no último fim de semana, apenas conseguiu 2413 espectadores em 304 sessões (contas redondas: oito espectadores por sessão).
Espero que o leitor não leia de modo precipitado estas notas: sou também dos espectadores ansiosos por descobrir Tenet e, para lá dos resultados concretos de cada um dos seus filmes, considero Nolan um dos mais ousados experimentadores do cinema contemporâneo (americano ou não). Creio, aliás, que chegou a altura de reconhecermos que nenhuma destas questões se pode descrever — ainda menos compreender — através dos “gostos” seja de quem for. Importa perguntar, isso sim, que cultura cinematográfica dominante se consolidou no mercado das salas ao longo dos últimos anos. Na certeza de que tal pergunta é também (é mesmo sobretudo) comercial: não são os críticos de cinema que definem os parâmetros do consumo cinematográfico, mas sim os distribuidores e exibidores, aplicando os seus legítimos poderes de programação, fazendo as suas escolhas, definindo destaques e omissões.
Digamo-lo, por isso, com todas as letras: ao longo das últimas décadas — repito: não anos, mas décadas —, o mercado tem sido comandado por uma lógica de distribuição/exibição que, no essencial, depende dos chamados “blockbusters”, directa ou indirectamente ligados aos grandes estúdios americanos (alguns absolutamente prodigiosos, não é isso que está em causa).
Acontece que, mesmo com grandes sucessos pelo meio, o comércio, isto é, a cultura dos “blockbusters” não criou uma relação estável com os espectadores. Gerou, isso sim, um laço frágil que decorre apenas das práticas dominantes do “marketing”: investir muito (cada vez mais) nas campanhas para lançar um pequeno número de filmes por ano, secundarizando a promoção de quase todos os outros.
Esperemos que Tenet possa ser um grande sucesso — além do mais, estão em jogo os empregos de muitas pessoas. Em todo o caso, o mais rudimentar bom senso justifica que lembremos que, por mais esmagador que seja esse sucesso, não resolverá, por si só, os desequilíbrios de um mercado que nem sempre tem sabido favorecer a pluralidade de oferta, rentabilizando a diversidade da procura.

domingo, agosto 16, 2020

Drive-in — nostalgia & actualidade

Los Angeles
9 Setembro 1934
Eis uma imagem que, vista agora, cruza nostalgia e actualidade. De facto, a situação de pandemia conferiu nova pertinência — cultural & económica — ao consumo do cinema em drive-in, revalorizado agora como modelo premonitório de "distanciamento social". Publicada por The Hollywood Reporter, a fotografia testemunha a abertura do "Drive-in Theatre", em Los Angeles, no dia 9 de Setembro de 1934 — em qualquer caso, a cidade pioneira destes espaços foi Camden, New Jersey, com o primeiro drive-in do mundo inaugurado a 6 de Junho de 1933.

quarta-feira, agosto 12, 2020

COVID-20
— um blog sobre o COVID-19

Para além das especificidades e, como é óbvio, da continuidade do SOUND+VISION, permito-me apresentar uma derivação pessoal, também em forma de blog — chama-se COVID-20.

sexta-feira, agosto 07, 2020

Elise LeGrow
— uma sala vazia, cheia com uma canção

Tempos de pandemia. Ou seja: imaginem esta sala vazia. Aliás, não é necessário: Elise LeGrow encheu o Roy Thomson Hall, em Toronto, com a sua mais recente canção, Evan, talvez o prelúdio para um segundo álbum — não havia um único espectador e, no entanto, não faltou o esplendor da música, o requinte da voz e a sofisticação da pose.

terça-feira, agosto 04, 2020

Roger Waters
— uma memória de "The Final Cut"

Memória recuperada em tempos de pandemia: do mais maldito álbum dos Pink Floyd — The Final Cut, o último com Roger Waters —, eis Two Suns in the Sunset. A gravação é do próprio Waters, em tempos de reclusão, austero e didáctico, muito bem acompanhado por Dave Kilminster (guitarra), Joey Waronker (bateria), Lucius-Jess Wolfe e Holly Laessig (vozes), Gus Seyffert (baixo), Jonathan Wilson (guitarra), Jon Carin (piano e teclas), Bo Koster (Hammond) e Ian Ritchie (saxofone).

In my rear view mirror the sun is going down
Sinking behind bridges in the road
And I think of all the good things
That we have left undone
And I suffer premonitions
Confirm suspicions
Of the holocaust to come.

The wire that holds the cork
That keeps the anger in
Gives way
And suddenly it's day again.
The sun is in the east
Even though the day is done.
Two suns in the sunset
Could be the human race is run.

Like the moment when the brakes lock
And you slide towards the big truck
"Oh no!"
"Daddy, Daddy!"
You stretch the frozen moments with your fear.
And you'll never hear their voices
And you'll never see their faces
You have no recourse to the law anymore.

And as the windshield melts
My tears evaporate
Leaving only charcoal to defend.
Finally I understand the feelings of the few.
Ashes and diamonds
Foe and friend
We were all equal in the end.

terça-feira, julho 07, 2020

segunda-feira, junho 29, 2020

Miley Cyrus canta "Help!"

A comunidade Global Citizen organizou um grande evento, realmente global — 'Global Goal: Unite for Our Future — The Concert' —, em que a chamada de atenção para alguns dos temas fracturantes do presente & futuro do planeta foi pontuada por várias performances musicais. Para a história, fica a espectacular versão de um clássico dos Beatles, Help!, por Miley Cyrus, especialmente dedicado aos investigadores do COVID-19. Foi em Pasadena, California, no Rose Bowl Stadium — vazio.

sexta-feira, junho 26, 2020

Novo livro de Bernard-Henry Lévy
editado pela Guerra e Paz

A primeira tradução do novo livro de Bernard-Henri Lévy, Ce virus qui rend fou, será portuguesa, com chancela da editora Guerra e Paz: Este Vírus Que Nos Enloquece estará disponível em todas as livrarias, físicas e online, no dia 7 de Julho. Em discussão: "o COVID-19, a política, os media e o esquecimento do resto do mundo...", temas abordados pelo autor numa conversa na Radio Notre Dame. Eis uma mensagem de Lévy para os leitores portugueses e o registo dessa conversa.