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22 January 2014
24 October 2013
GULAG
A 23 de Setembro passado, na colónia penal nº 14 da Mordóvia – acerca da qual, na
Rússia, se diz, com terror, que “quem nunca cumpriu ali pena, simplesmente não
cumpriu pena” –, Nadezhda Tolokonnikova entrou em greve de fome. “É um método
extremo mas é a única forma de sair da situação em que me encontro”, declarava numa
carta publicada pelo “Guardian” em que denunciava a selvajaria no tratamento infligido
às mulheres ali detidas: “O trabalho forçado ocupa dois terços das horas do dia, o
repouso é de quatro horas por noite e o dia de descanso apenas acontece uma vez em
cada mês e meio. As mulheres são espancadas por tudo e por nada, têm medo das
próprias sombras”. E explicava que os maus tratos são “um método conveniente para
forçar as prisioneiras à submissão total perante os sistemáticos abusos de direitos
humanos. As condições de vida e de higiene do campo são calculadas para se sentirem como animais imundos e sem direitos”. Para lá transferida no
cumprimento de uma pena de dois anos após o julgamento-farsa das Pussy Riot por um
tribunal de Moscovo, em Agosto de 2012, Tolokonnikova recorda o acolhimento por
parte do chefe-adjunto da cadeia, tenente-coronel Kupriyanov: “Deverá saber que, no
que diz respeito à política, sou um estalinista”. “Por isso”, concluía, “inicio esta greve
de fome e recuso participar no trabalho escravo na colónia. E assim me manterei até ao
dia em que a administração decida cumprir a lei e pare de tratar as prisioneiras como
gado”.
No dia seguinte, seria transferida para uma cela de isolamento e, uma semana depois,
internada no hospital da prisão, tendo suspendido a greve quatro dias mais tarde.
Protesto idêntico realizara, em Maio, a outra detida, Maria Alekhina, após ter sido
impedida de participar na audiência judicial que avaliava um pedido de liberdade
condicional, rejeitado devido a ela “não ter demonstrado arrependimento pelos seus
crimes”. É sobre toda a trajectória que decorreu desde a performance das Pussy Riot, a
21 de Fevereiro do ano passado numa catedral de Moscovo, suplicando à Virgem que
livrasse a Rússia de Putin – o mesmo Putin que, no início deste mês, um grupo de
personalidades russas propunha para prémio Nobel da Paz – até ao final do julgamento,
que se debruça Pussy Riot – A Punk Prayer, o documentário de Mike Lerner e Maxim
Pozdorovkin, que a 25 e 29 de Outubro, o Doclisboa’13 exibirá na Culturgest e no
cinema S. Jorge. Confessadamente fascinados pelo que qualificam como “uma das mais
controversas performances artísticas de todos os tempos que logrou tocar no nervo
sensível das relações entre Igreja e Estado e dirigir as atenções para a forma repressiva e
corrupta como funciona o sistema judicial russo”, acompanharam durante seis meses
todo o processo, entrevistaram familiares, apoiantes e opositores e, mais importante,
estiveram presentes durante as sessões do julgamento, registando o violento confronto
verbal de Nadia, Masha e Katia com as forças policiais, políticas e judiciais. Quanto a
Tolokonnikova, tudo permanece transparente: “A minha vida não vai mudar. Os
vectores da política e da arte continuarão a ser os mesmos”.
01 August 2013
A 21 de Fevereiro de 2012, o mundo tomava definitivamente conhecimento da existência de uma suposta “banda” punk feminina de Moscovo, as Pussy Riot, que, na catedral de Cristo Salvador, realizaram uma performance cénico-musical invectivando, em simultâneo, Putin, a igreja Ortodoxa e a homofobia oficial. Nessa mesma noite, o vídeo da intervenção circulava já pela Internet, na sequência do que acontecera com outras acções anteriores, nas ruas e metro da capital russa. A 3 de Março, Nadezhda Tolokonnikova e Maria Alyokhina eram presas, seguindo-se-lhes, quinze dias depois, Yekaterina Samutsevich. Acusadas de “hooliganismo e incitação ao ódio religioso”, a 17 de Agosto, seriam condenadas a dois anos de prisão em duas das mais brutais colónias penais russas. A meio do julgamento, Nadezhda declararia “Não me assusta esta vossa fraude mal disfarçada de julgamento. O que me enfurece são os métodos inquisitoriais medievais que presidem à justiça russa”. E, nas alegações finais, Alyokhina acrescentaria “Enquanto estado, a Rússia é, desde há muito, um organismo podre até à medula. E a podridão explode para o exterior quando apertamos os seus abcessos inflamados”. Mas, poucas horas após a leitura do veredicto, um novo vídeo e canção (“Sete anos de pena não bastam, dêem-nos 18, proíbam-nos de falar, caminhar e praguejar!”) aparecia na edição online do “Guardian”.
Tornava-se claro que Pussy Riot não era o nome de uma banda mas de uma entidade viva (cerca de 30 elementos) capaz da auto-regeneração imediata de cada membro amputado. Durante os 12 meses seguintes, inúmeras personalidades dos universos da política – de Obama a Angela Merkel e a diversos ministros, embaixadores e parlamentares europeus e americanos – e das artes apelaram à libertação de Tolokonnikova, Samutsevitch e Alyokhina; sob proposta do eurodeputado alemão Werner Schultz, foram nomeadas para o prémio Sakharov; a “Art Review” incluiu-as na lista de 2012 das 100 figuras mais influentes; Alyokhina entrou em greve da fome e descreveu a sua “antivida” encarcerada afirmando “Não querem personalidades, querem pessoas que se habituem”, e ela e Nadezhda apelaram à liberdade condicional que lhes seria recusada (“O Governo quer que admitamos a nossa culpa, o que obviamente não faremos”): ao conhecer a decisão, por trás das grades e virada para os juízes, Tolokonnikova repetiu o gesto que celebrizaria Manuel Pinho; o documentário Pussy Riot: A Punk Prayer, de Mike Lerner, ganhou um prémio especial do júri no Sundance Film Festival. A 16 de Julho deste ano, a videodiscografia das Pussy Riot, revelaria, entretanto, o seu último tomo: “Like a Red Prison”, vídeo já bem distante da qualidade artesanal (visual e sonora) dos anteriores, em que diversas Pussy, invadem uma estação petrolífera, lançam crude sobre imagens dos magnatas do regime aliados de Putin e qualificam este como “ayatola” corrupto e homofóbico. E, no blog do grupo, fazem questão de sublinhar que Nadezhda Tolokonnikova contribuiu para a escrita do texto. A história não termina aqui. Mas, em Portugal, nem sequer começou: da esquerda à direita, do governo à oposição, até hoje, nem uma sílaba sobre o assunto foi pronunciada.
24 January 2013
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