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29 June 2024

 
(sequência daqui) Entre ambas está "First House On The Left": "Inspirei-me na pequena casa de Birmingham onde nasci e em todas as memórias capturadas naquelas quatro paredes. Tanto as minhas como as de todos os outros habitantes que lá foram vivendo ao longo do tempo. Quando era criança e escavava no jardim, intrigava-me muito descobrir velhos soldadinhos de chumbo ou pedaços de porcelana. Era um alerta para não esquecermos que não éramos os primeiros e não seríamos os últimos a morar ali. Vistas de fora, todas as casas pareciam iguais. Mas, lá dentro, um risco na parede mudava tudo", explica Katherine aquilo que, qual Sandy Denny actual, por entre discretíssimas cordas, melhor canta: "Is this the light that shines from the shoreline? The port where we know we can rest? Or Is it just the first house on the left?" Envolvidas na memória viva do lugar (velhos relógios, o ranger de sobrados, gravações de família), há outras riscos na parede para descobrir: a assombrosa "Selah", as mais que perfeitas "A Boat On The River" e "Father Of Two". Digamos a pura verdade: todas.

20 September 2023

 

"Messenger Birds" (álbum integral aqui)

(sequência daqui) Por essa altura, na verdade, as duas meninas ainda adolescentes, já se haviam irremediavelmente extraviado do caminho da salvação e iriam travando conhecimento com diversos enviados das forças do mal: o belíssimamente discreto guitarrista David Williams, o baixo sinuosamente melódico de Frank Boylan e a inventividade rítmica do baterista Will Murray. Em conjunto, descobririam afinidades com os melhores da colheita da época: Sandy Denny/Fotheringay (em "Messenger Birds"), Steeleye Span (em "Dan The Wing"), Pentangle (em "Break Your Token"), Fairport Convention ainda seriamente contaminados pelos Jefferson Airplane (em "The Poet And The Witch" e "Lonely Man") e, de um modo geral, todas as mais cristalinas águas da corrente folk-rock convergiriam para Swaddling Songs (1972). Exemplar único - e, por isso, ainda mais precioso - de uma via que se manteria para sempre aberta.

29 August 2022

 
(sequência daqui) Final do primeiro acto. No segundo, abandonaria a banda, criaria uma empresa de jardinagem, matricular-se-ia no curso de arqueologia do University College de Londres e, quase confidencialmente, ocupar-se-ia com a escrita de canções. Estão todas em Giant Palm que o produtor e arranjador Joel Burton a convenceria a gravar com uma trupe de mais de 30 músicos. Preparem-se, então, para se cruzarem com Astrud Gilberto de braço dado com Sandy Denny, reparem na proximidade de Jim O’Rourke com Bert Jansch, o jazz e o psicadelismo tropicalista e, de um modo geral, refresquem-se neste maravilhoso e impuríssimo chuveiro.

10 August 2021


(sequência daqui) Agora que o primeiro álbum, The Eternal Rocks Beneath, se encontra, enfim, disponível, compreende-se bem o entusiasmo de Thompson: Priddy não só tem um recorte vocal que, várias vezes, faz pensar em Sandy Denny e Linda Thompson como, na escrita das canções, associa com absoluta elegância a tradição folk do "storytelling" à obra de poetas como Frank O’Hara: “Gosto do modo como ele usa nomes, lugares e momentos e nunca os explica. Sentimo-nos como se estivéssemos a observá-lo através de uma janela ou como se o seguíssemos numa rua e capturássemos fragmentos de conversa. É assim que as canções deveriam ser: apenas um breve olhar sobre algo, sem precisar de explicações”, disse Katherine à “Folk Radio”. Guitarra, acordeão e quarteto de cordas proporcionam a refinada moldura que aproxima estas dez canções do belíssimo La Vita Nuova, de Maria McKee, e lançam em voo a memória de instantes: “And first light of morning, a moment of still, a comma, a dash, a loaded ellipsis, ‘til you sink under slowly, I knew you were only a shadow behind me, I loved you blindly”.

29 July 2021

 
 
(sequência daqui)  Discípulo confesso (e brilhante) de Scott Walker mas também eclético adepto de Sandy Denny, Magazine, The Pop Group, Martin Carthy, Sinatra, Jim O’Rourke, Bill Evans, Brecht e Planxty, em Song of Co-Aklan, tanto assume o registo de agitador inflamado (“Feeling affronted? Blame the unwanted!” e “There’s aliens for blaming and poor folks for defaming”) como o de niilista friamente amargo (“Time will erase us, scene by scene, gone like the fragments of a dream“), mas assegura não ter pretendido criar “um álbum didactico nem pregar coisa nenhuma: não desejo agredir ninguém com o monopólio da verdade. Vejo-me mais como um parasita do que se passa no mundo do que como um influenciador”. O que não foi, de todo, impeditivo de – na companhia de veteranos dos Mansions, Microdisney e Scritti Politti mas também do inclassificável Luke Haines – ter gravado algo como uma sinistra visão de John Cale enquadrada pela elegância cinemática de David Lynch.

26 March 2021

Anne Briggs - "Summer's In"
 
(sequência daqui) O período que abrange começa no momento em que, no número 49 da Greek Street, no Soho londrino, abria o folk club “Les Cousins” (nome inspirado pelo filme homónimo de Claude Chabrol) onde, em alternativa à ortodoxia folk de Ewan McColl e "hardliners" afins, uma fresquíssima vaga de gente – Davy Graham, Bert Jansch, John Renbourn, Sandy Denny, The Strawbs, Incredible String Band, The Young Tradition, Anne Briggs, Martin Carthy, John Martyn... – desempoeirava as “sagradas escrituras” e, sem cerimónia, expunha-as a toda a sorte de heresias, do embrionário psicadelismo aos subterrâneos esoterismos lendários da “old, weird Britannia” pagã. Vários deles reencontram-se nestas 60 faixas mas valerá a pena dizer que, com mui honrosas excepções, não é por acaso que alguns nomes (Fairports, Pentangle, Steeleye, Third Ear Band, Young Tradition, Tim Hart & Maddy Prior, Shirley Collins, Mr Fox, todos aqui presentes) mais facilmente se recordam: eles eram incomparavelmente melhores.

09 November 2020

BEAUTIFUL LOSERS

Judy Dyble, a antecessora de Sandy Denny nos Fairport Convention, durante as canções nas quais, em concerto, não intervinha, sentava-se à boca de cena, a tricotar. Celia Humphris, cantora dos Trees, aconselhada a não se movimentar de modo demasiado exuberante no decurso das longas passagens instrumentais, optava por se deitar no palco. Uma vez, adormeceu. As peculiaridades das suas divas não são o único ponto comum entre as duas bandas. De facto, não disparatando demasiado, quase poderia dizer-se que uma foi a continuação da outra que ainda não desaparecera (nem, com as mais diversas formações, até hoje, desapareceria). Em 1969, enquanto os Fairports publicavam a trilogia de ouro What We Did In Our Holidays, Unhalfbricking e Liege & Lief e, de caminho, inventavam o folk.rock britânico, os guitarristas David Costa e Barry Clarke convidavam o baixista Bias Boshell ("housemate" de Clark), o baterista Unwin Brown (amigo de escola de Boshell) e Celia Humphris (irmã de um colega de trabalho de Costa), para formarem uma banda. Uma coisa assim bastante caseirinha.

(On The Shore integral aqui)

Meio século depois, Boshell define-os, á “Uncut”, como “o grupo de pessoas menos ambicioso que alguma vez existiu”. Sonhavam com os Byrds, Jefferson Airplane, Buffalo Springfield e Quicksilver Messenger Service mas, porque Costa fora iniciado na tradição folk através da amizade com Martin Carthy, e "Meet On The Ledge", dos Fairports, era matéria de estudo obrigatória, os dois únicos álbuns dos Trees – The Garden Of Jane Delawney (1970) e On The Shore (1971), agora republicados em "boxset" de 4 CD – acabariam integralmente contagiados pelas marcas do género emergente. Clark era um Richard Thompson em embrião que urdia belíssimos contrapontos eléctricos com a guitarra de Costa – ainda algo imperfeitamente em "Glasgerion" e "The Great Silkie", do primeiro, e nas extensas e magníficas "Streets Of Derry", "Polly On The Shore" e "Sally Free And Easy", de On The Shore, conduziam o psicadelismo folk-rock a focos de incêndio nunca antes ateados – e Celia era uma candidata pronta a ocupar, em qualquer momento, o lugar de Sandy Denny. Havia aproximações aos (então nascentes) Steeleye Span ("Soldiers Three"), evocações medievais ("Adam’s Toon") e hinos luditas ("While The Iron Is Hot"). Durariam, sem qualquer sucesso, até 1973. Celia, após, durante anos, ter sido a voz que, nas estações do metro de Londres nos alertava “Mind the gap!”, em 2009, participaria como convidada no álbum Talking With Strangers. De Judy Dyble. (ver também aqui)

31 July 2020

 SEM BÚSSOLA NEM CALENDÁRIO

  
Brigid Mae Power esteve doente com Covid-19 e agora, já aparentemente recuperada, conta que teve “imensos sonhos estranhíssimos que ainda persistem. Aparecem-me pessoas conhecidas mas em versões tremendamente horríveis delas próprias. Não as reconheço e tento fazê-las desaparecer. São sonhos verdadeiramente loucos...” Head Above The Water, o terceiro álbum da "singer-songwriter" de Galway, foi gravado antes de adoecer mas quase se diria que a matéria-prima para os pesadelos já se encontrava latente, não exactamente nos temas das canções mas na atmosfera febril de sonoridades desencarnadas que parecem navegar, sem bússola nem calendário, num oceano enganadoramente sereno. 


A bordo de The Green Door – um minúsculo estúdio analógico de Glasgow com lotação máxima para 4 pessoas de cada vez –, às ordens dos produtores e músicos Alasdair Roberts e Peter Broderick (ex-Efterklang e Mr. Power), esteve, durante três dias, uma tripulação de executantes de guitarra, piano, violino, bouzouki, flauta, contrabaixo, mellotron, pedal steel guitar, harmonium indiano e percussão, a dar espessura e densidade a dez canções localizadas entre a raiz tradicional de "The Blacksmith" e aquelas que se manifestam através do encontro imprevisível de textos esquecidos rabiscados em blocos de notas e novas melodias (ou vice-versa): ”Na verdade, não penso demasiado sobre como escrever ou acerca do que escrever. Trabalho sem pensar demasiado nisso, de uma forma muito pouco consciente, não sou pessoa para partir de ideias concretas”, disse â “Fractured Air”. É uma atitude recomendável. Afinal, a miúda que sonhava com Aretha Franklin, Etta James e Tim Buckley e se imaginava pianista de blues, escutada hoje, tanto faz pensar em Sandy Denny e Shirley Collins ("Wearing Red That Eve", "On A City Night", "Head Above The Water"), como em Liz Frazer ("We Weren’t Sure") e Hope Sandoval ("Wedding Of A Friend"). Ou em nenhuma delas, apenas nesta particular decantação de inquieta folk sideral e assombrado psicadelismo de câmara.

31 March 2020

POEMA PARA BEATRIZ
 

Maria McKee? Não deve ser exactamente uma multidão o número daqueles a quem, por esta altura, esse nome fará tocar uma ou duas campainhas. Por motivos bastante concretos: da valquíria "cowpunk" que, desde 1982, aos 18 anos, à frente dos Lone Justice (e integrando o mesmo destacamento a que pertenciam Jason & The Scorchers, Beat Farmers, Long Ryders, Rank & File ou Meat Puppets), assinou o óptimo Lone Justice (1985) e o menos notável Shelter (1986) e, posteriormente, a solo, nos seduziu o ouvido com Maria McKee (1989), You Gotta Sin To Get Saved (1993), Life Is Sweet (1995) e High Dive (2003), não havia notícias há 13 anos. Pelo caminho, deixara o único tema original – "If Love Is A Red Dress (Hang Me In Rags)" – da banda sonora de Pulp Fiction e trepara até pelas tabelas de vendas com "Show Me Heaven", do trambolho cinematográfico Days of Thunder

 
Só por essa lomga ausência, a publicação de La Vita Nuova seria já um acontecimento assinalável. Mas é-o muito mais ainda na medida em que se trata, verdadeiramente, de uma segunda vida para Maria Luisa McKee: anunciando-se renascida como “a pansexual, polyamorous, gender-fluid dyke” e activista dos direitos LGBT, "a queer leftist witch” iniciada numa loja da Hermetic Order of the Golden Dawn de Yeats e Crowley, e – jura – em comunicação espiritual com Bryan MacLean (o irmão mais velho já falecido, fundador dos lendários Love), mudou-se dos EUA para Inglaterra e aí mergulhou na música de Scott Walker, Vaughan Williams, Bowie, John Cale e Sandy Denny, e nas obras de Keats, Swinburne, Dickens, Blake e Dante. Foi a este que tomou de empréstimo o título do álbum acerca do qual teríamos bastas justificações para recear o pior. Nada de mais errado: La Vita Nuova, gravado com uma orquestra de 19 elementos, é uma avassaladora obra-prima com aquela patine “antiga” que evoca a Sandy Denny mal-amada de Like an Old Fashioned Waltz e Rendez Vous, mas também, aqui e ali, Joni Mitchell, e toda a constelação de divindades tutelares que a si quis chamar para este imenso poema à sua Beatriz.

21 December 2018

VINTAGE (CDXL)

The Bunch c/ Sandy Denny - "That'll Be The Day"
(Buddy Holly)

(álbum integral aqui)

11 December 2018

DYLAN BY FAIRPORT


As raízes da árvore do folk-rock são emaranhadas mas não demasiado difíceis de identificar. Cinco dias antes de, a 20 de Janeiro de 1965, os Byrds entrarem nos estúdios da Columbia, em Hollywood, para gravarem a versão electrificada de "Mr Tambourine Man", de Bob Dylan (que chegaria ao topo da tabela da “Billboard”), este concluía as sessões de estúdio para o quinto álbum, Bringing It All Back Home. Das 11 faixas, as 7 primeiras do lado A eram acompanhadas por uma banda rock competente mas razoavelmente anónima – exceptue-se o baixista William E. Lee apenas por ser o pai de Spike Lee – e as do lado B, em registo acústico. O tremendo alarme dos integristas folk perante a “traição” concretizada em "Subterranean Homesick Blues" ou "Maggie’s Farm" ficaria, para toda a eternidade, arquivado na gaveta "silly" da História. Mas o que importa é que, algures na segunda metade do mês em que morria Alan Freed - o inventor do termo “rock’n’roll” -, o folk-rock tinha surgido. 


A descendência seria numerosa mas, do lado de cá do Atlântico, apenas conheceria o seu "big bang" em 1969, ano em que os Fairport Convention publicariam What We Did In Our Holidays, Unhalfbricking e Liege & Lief. Não é fácil nem habitual parir três clássicos absolutos num periodo de 12 meses. Para além disso, contudo, a banda que, no início, se imaginava como uns Jefferson Airplane britânicos, não se satisfez em ser a prodigiosa incubadora de talentos da grandeza de Richard Thompson, Sandy Denny, Fotheringay, Steeleye Span, The Bunch, Morris On/Dancing Master e as diversas Albion Band, mas também, transversalmente ao seu percurso – especialmente desde Liege & Lief –, se dedicaria a redescobrir a música tradicional em matrimónio eléctrico com o ar do tempo. Paralelamente, porém, não abdicaria de ir recolhendo alimento estético na origem do seu mundo: em álbuns de estúdio, emissões de rádio, actuações ao vivo e "outtakes" várias, chamaria suas a 17 canções de Bob Dylan, agora, recolhidas em A Tree With Roots, assinado por Fairport Convention & Friends (isto é, eles mesmos mais Sandy Denny a solo e os Fotheringay). Embora já quase todas dispersamente disponíveis em edições oficiais e "bootlegs", um valioso programa de “Dylan by Fairport” no qual se podem re(escutar) o saboroso "mock cajun" de "Si Tu Dois Partir"/"If You Gotta Go, Go Now", o belíssimo crescendo vocal/instrumental de "Percy’s Song" ou a assombrosa "I’ll Keep It With Mine", não é convite que se despreze.