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14 July 2024

"Raat Ki Rani"
 
(sequência daqui) Na companhia de Maeve Gilchrist (harpa), Gyan Riley (guitarrista, filho de Terry Riley), Petros Klampanis (contrabaixista), da poetisa Moor Mother, dos inevitáveis Vijay Iyer e Shahzad Ismaily e de uma lista de outros contribuidores para a soberba arte final, o plano de desfecho sempre aberto passou pela descoberta dos fios intangíveis que estabelecem a comunicação entre géneros e correntes (jazz, música clássica paquistanesa e do Norte da ìndia, os minimalistas e pós-minimalistas - Morton Feldman, Terry Riley, Julius Eastman e John Cage) e, usando-os como trampolim, participar do processo de invisível criação comum: "Há um entendimento de que a música foi tomada de empréstimo, herdada, reciclada, e reutilizada durante imenso tempo e, quanto mais recuamos, mais enevoada se torna. O meu objectivo não é escrever um ensaio etnográfico mas, através da minha música, chamar a atenção para essa rede de ligações. Suponho que, subconscientemente, as pessoas as reconhecem e sentem que é algo simultaneamente novo e familiar. Para mim, trata-se de uma coisa autenticamente mágica" (segue para aqui)

26 September 2023

 "Heat!"
 
(sequência daqui) Se RPG não quebrar esse reflexo condicionado, nada o fará: de manobras de corte e costura sobre "field recordings" a "samples" de farrapos de diálogos, "loops" vocais, alusões a jogos de vídeo, exercícios de "cadavre exquis" e ressuscitações corais de relíquias em Middle English do século XIII, o autoconfessado "mish-mash of sounds and influences, from folk to electronic, ambient, jazz and art-pop", na companhia dos sopros de Faye MacCalman e do contrabaixo de John Pope, conduziu-a a lugares que Meredith Monk, Julia Holter, Modern Nature ou This Is The Kit não tiveram ainda oportunidade de desbravar. Um maravilhoso delírio partilhado que tanto pode emergir do contacto com outras formas de arte como da "leitura da História, da visão de uma paisagem ou de um ruído fortuito, de passagem".

19 July 2023

Remember what the dormouse said: feed your head (XXXI)

"O racismo nas páginas de 'A Esfera' atinge uma maior virulência no campo artístico. Aí é que os nossos germanófilos perdem as estribeiras e, de caneta em riste, alongam-se em artigos contra a 'degenerada música negra': o jazz. Para um germanófilo, o que era o jazz quando comparado com a alta estética da música alemã? Poderíamos dar vários exemplos mas este artigo, que surge na edição de 20 de Março de 1945 (...), é paradigmático. Satiriza essa 'música espiritual dos negros', cujo batuque o articulista escutou depois de 'esfregar os olhos de espanto' e depois de constatar que 'se aquilo é arte, então a missão civilizadora dos portugueses em África de nada valeu'. O jazz não ia ao encontro do gosto germanófilo de 'A Esfera' (...). Como garantia Eduardo Frias (...), o jazz era um conjunto de 'sonoridades roucas, bacanais e rugidos, dissonâncias loucas, monstruosidades grotescas como esgares acústicos, [sendo evidente a] origem satânica desta irrupção do primitivismo selvagem'" (Sérgio Luís de Carvalho - Lisboa Nazi: A cidade secreta dos portugueses que lutaram pelo Terceiro Reich

(ver também aqui e aqui)

17 March 2023

LIMPAR O PÓ AOS ARQUIVOS (LXXXII)
 
(com a indispensável colaboração do R & R)


(clicar na imagem para ampliar)


"Soul Train" (de Compañeros - álbum integral aqui)

29 August 2022

 
(sequência daqui) Final do primeiro acto. No segundo, abandonaria a banda, criaria uma empresa de jardinagem, matricular-se-ia no curso de arqueologia do University College de Londres e, quase confidencialmente, ocupar-se-ia com a escrita de canções. Estão todas em Giant Palm que o produtor e arranjador Joel Burton a convenceria a gravar com uma trupe de mais de 30 músicos. Preparem-se, então, para se cruzarem com Astrud Gilberto de braço dado com Sandy Denny, reparem na proximidade de Jim O’Rourke com Bert Jansch, o jazz e o psicadelismo tropicalista e, de um modo geral, refresquem-se neste maravilhoso e impuríssimo chuveiro.

19 May 2022

(You Belong There - álbum integral aqui
 
(sequência daqui) E, referindo-se ao facto de grande parte do disco ter sido concebido nas atmosferas rurais do Norte do estado de Nova Iorque e de Santa Fe, no Novo México, acrescentava; “Não sou uma pessoa particularmente espiritual. Não sou religioso. Mas, definitivamente, sinto uma espécie de relação misteriosa com certos lugares. É o mais próximo que chego de uma experiência espiritual”. É, então, num registo de art/rock/folk – de Van Dyke Parks a Baden Powell, Robert Wyatt, Jim O’Rourke, Nick Drake, a clássica de câmara e o jazz – que estas 10 matrioscas sonoras meticulosamente orquestradas circulam, entre espirais de guitarra, arrebatamentos orquestrais e oceânicas massas corais, à esquina de um quase aforismo Zen: “Our work for work’s sake, we’re useless in our way, clear the brush and push the paint, nothing’s lost when there’s nothing there, whatever was and whatever will”.

15 September 2021

Marc Ribot's Ceramic Dog (live on KEXP 2016)
 
(sequência daqui) Agora, com os Ceramic Dog (Ribot, Shahzad Ismaily e Ches Smith), Hope – gravado durante os confinamentos do ano passado como “uma mensagem na garrafa dirigida aos nossos (imaginários) ouvintes igualmente naufragados” – busca um outro território onde os alvos são as frívolas e impotentes personagens do lado supostamente certo da barricada: os “fabulosos” aspirantes a estrelas rock, os guitarristas mais rápidos que a própria sombra, os poetas “iluminados”, os filósofos “pós-modernos”, os “activistas” de todas e nenhuma causa, que, sob o sarcástico fogo eléctrico cerrado dos “Stooges e Sex Pistols da vanguarda novairquina”, um a um, tombam no cenário de canções “muito, muitíssimo mais deprimentes do que as Canções das Crianças Mortas, de Mahler” (Ribot dixit), adequadamente projectadas em registo punk de descarnada costela jazz.

11 May 2021

 
(sequência daqui) Após três álbuns em edição de autor, seria em 2013, com Pushin' Against a Stone (“Sinto que durante toda a minha vida, tenho andado a empurrar uma pedra. E todos os empregos que tive – em cafés, limpezas, como cozinheira, passeadora de cães, a ajudar o meu pai – contribuiram para compreender como se sentiam os artistas que admirava e que, ao fim de um dia de trabalho pesado, voltavam a casa e se sentavam no alpendre a tocar até serem horas de se deitarem”), que o mundo começaria a reparar nela. Mas as portas apenas lhe seriam verdadeiramente escancaradas quando, em 2017, publicou The Order Of Time, um dos álbuns desse ano para a “Rolling Stone” e, mais importante do que todo o resto, para Bob Dylan, que, numa entrevista, a mencionaria enquanto alguém que admirava e respeitava. “A minha maior qualidade, penso, é escrever canções. Ter a divindade do 'songwriting' a confessar que ouvia a minha música foi incrível. Não frequentei a universidade mas ouvi-lo, naquele dia, a referir o meu nome foi como concluir uma licenciatura”. Uma das suas várias actividades anteriores – como empregada da ervanária de Memphis, “Maggie’s Pharm” – talvez fosse já um prenúncio, mas quando a essa medalha de honra se somaram outras como as comparações com o Van Morrison de Astral Weeks – ele que canibalizara blues, jazz, soul e folk era, agora, devorado com proveito e elevação –, adivinhava-se que feitos maiores haveriam ainda de acontecer. (segue para aqui)

22 January 2021

(sequência daqui) Penny Rimbaud tinha pouco mais que uma intuição: "Fascinava-me a ideia de descobrir de que modo o maior dos poetas franceses lidaria com as enormidades da guerra e o que, hoje, num mundo tão obcecado pelo conflito, a dor e o sofrimento, isso poderia valer. Tomei de empréstimo os ouvidos de John Coltrane e os olhos de Jackson Pollock e aventurei-me num inferno em vida com Arthur ao meu lado. Não me surpreendeu que fosse necessária tão pouca persuasão para o convencer. Era da sua natureza estar pronto a morrer para melhor viver. Mas interrogava-me acerca do que buscaria ele nisto. Quando lho perguntei, a resposta foi imediata: ‘Mais’”. Em 10 intermezzos instrumentais e 11 peças de "spoken word", três saxofonistas – o lendário Evan Parker, Louise Elliott e Ingrid Laubrock – incorporam simultânea e estridentemente Coltrane e Pollock enquanto Penny vocifera os passos da travessia do horror (“I have a strange feeling that neither of us survived the terror of Verdun. Yes, we were detritus, and in that we found ourselves and each other, the void was complete, and another dawn broke above the carnage”) que se conclui em fúria como deve: “The smug satisfaction of the bourgeoisie, fuck you, fuck you and your hollow whimsy!”. (ver também aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui)

03 January 2021

A TRAVESSIA DO HORROR
A batalha de Verdun, travada em 1916 entre França e Alemanha durante a primeira Guerra Mundial, durou 302 dias e teve um custo de 714 231 vidas humanas. Num cenário aterrador de lama, cadáveres e destroços, um oficial francês escreveria no seu diário: “A humanidade enlouqueceu. Só por loucura poderá isto estar a acontecer. Que massacre! Que cenas de horror e carnificina! O inferno não pode ser tão terrível”. O infame título da mais longa e uma das mais sangrentas batalhas da História pertence-lhe. Teve lugar 25 anos após a morte de Arthur Rimbaud. O que não impediu Jeremy John Ratter – aliás, Penny Rimbaud, "elder statesman" do anarco-punk britânico com currículo lavrado à frente dos Crass – de, em Arthur Rimbaud In Verdun, se ficcionar ao lado do iluminado poeta francês nos campos da morte da Frente Ocidental. (daqui; segue aqui; ver também aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui)