Foto: Cássia Santana
Publicado originalmente no site Alô News, em 14 de abril de 2018
Exclusiva do Alô com Dr. Almir Santana: uma das maiores
autoridades médicas de Sergipe
Médico formado pela Universidade Federal de Sergipe desde
1981, tem especialização em Saúde Pública, Coordena o Programa Estadual de
DST/Aids desde 1987 e leciona Biologia desde 1982.
José Almir Santana, natural de Aracaju é médico formado pela
Universidade Federal de Sergipe desde 1981, tem especialização em Saúde
Pública, Coordena o Programa Estadual de DST/Aids desde 1987 e leciona Biologia
desde 1982. Foi o primeiro médico a aceitar atender pacientes com Hiv/Aids em
Sergipe, numa época em que o preconceito era muito forte. E até hoje milita em
prol do respeito pelos direitos humanos das pessoas que vivem com HIV/AIDS e
pela prevenção.
Alô – Dr. Almir, conte-nos a sua trajetória de vida até se
tornar médico
Almir Santana (A.S)* - Estudei em escola pública, no Atheneu
e sempre sonhei em ser médico, com um objetivo principal, um objetivo diferente
de muitos colegas... Eu optei por medicina não foi visando o financeiro, é
evidente que sem dinheiro ninguém vive, mas a minha opção, já que sempre fui
professor era passar informação, ajudar.
Quando eu trabalhei no bairro Santos Dumont, no Centro de
Saúde Dr. José Machado de Souza, eu adorava! Foi por opção que fui para o
bairro, comecei um trabalho educativo lá, eu não era só médico, eu atendia e
também ia pra rua, fazia visita domiciliar, mesmo antes de se falar em equipe
de saúde da família, e gostava muito de fazer esse trabalho. E nessa caminhada
pelo bairro comecei a identificar as casas de prostituição e comecei a visitar
essas casas e chamar as garotas profissionais do sexo para ir pro posto, porque
eu prometia a elas atendimento, foi daí que comecei a me envolver na atenção as
Doenças Sexualmente Transmissíveis – DST's, meu consultório era cheio, atendia
também pacientes portadores de doenças crônicas como diabetes, hipertensão,
etc.
Ainda nessa época quando eu fazia um trabalho sobre sífilis,
surgiu a Aids, num momento em que ninguém queria atender esses pacientes. O primeiro
caso de Aids que chegou aqui ninguém queria, todo mundo se negava, que era uma
doença nova... Achava que podia contagiar no atendimento, e eu, na época um
secretário me localizou no Santos Dumont e me perguntou se eu poderia atender
esse paciente, eu topei... Não sabia nada sobre Aids, ninguém sabia por se
tratar de uma doença nova, mas aí comecei a me envolver, mas infelizmente o
paciente faleceu sem eu conseguir internar, e a partir daí topei o desafio que
era de no próximo paciente internar... E foi o que aconteceu, surgiu um
paciente de Itabaiana e o internamos no Hospital de Urgência em 1987.
Os casos foram crescendo junto com o trabalho e fui até ao
secretário de saúde e disse: “Temos que criar um programa só pra Aids e as
outras infecções”. O secretário formou uma comissão e criou o programa, e até
hoje estou nessa luta. São mais de trinta anos esse programa, é o segundo do
Brasil, o primeiro é o de São Paulo e o Segundo é de Sergipe. Criamos muitas
campanhas educativas, criamos o “Camisildo”, criamos um ônibus... E foi uma
luta. Hoje não me arrependo de nada.
Alô – Por quê razão o senhor decidiu combater as DST's de
forma humorada, como a criação do Camisildo por exemplo?
A.S – Veja, a AIDS é uma doença que mata, uma doença que
envolvia tristeza, e eu procurava meios, usando a criatividade, de levar
informação. O Camisildo surgiu por causa do Pré-Caju, então criamos um bloco,
então ficava pensando de como levar informação no bloco de uma forma que
participasse da própria festa. Sergipe foi o primeiro estado a fazer um bloco
da prevenção pra divulgar informação na folia, e aí surgiu a ideia do
Camisildo, um carro em forma de camisinha, o primeiro do mundo, e ainda é.
Atualmente ele está sucateado porque é uma combi antiga e eu pretendo dar uma
roupagem nova, com uma funcionalidade maior. Depois vocês vão ver como vai
ficar o carro, um projeto pra este ano ainda, um novo Camisildo, não com aquela
forma da camisinha, vai ser bem interessante.
Uso de brincadeiras, paródias, etc, porque isso chama
atenção, principalmente da juventude.
Alô – O que as pessoas dizem hoje sobre seu trabalho após
esses anos?
A.S – Isso me preocupa, quando eu saio na rua é fantástico o
reconhecimento popular, isso me preocupa porque algum dia vou parar (morrer), e
a minha preocupação é deixar uma semente e torço para que surjam novas pessoas
com espírito de compromisso. Eu tenho procurado mostrar aos meus alunos,
estimular a solidariedade... Eu tenho o olhar da prevenção, o olhar da
assistência e o olhar de ajudar, e não é comum esses olhares, infelizmente...
Então eu procuro estar no lugar do povo, como eu gostaria de ser atendido, e as
pessoas vêm de uma maneira muito positiva, as pessoas tem um carinho enorme,
maior até do que algumas autoridades. Minha função é para o povo...
É até difícil, às vezes, andar nas ruas porque as pessoas me
param e me pedem para examiná-las. Eu ando em todo lugar, então as pessoas me
vêem e querem falar comigo... Um dia desses uma senhora me parou no Calçadão e
disse: “Doutor eu queria que você me examinasse, olhe eu tenho um caroço na
barriga, pegue aqui no meu caroço”. E ela levantou a blusa no meio do Calçadão.
Alô – O senhor já ganhou alguns prêmios ao longo de sua
carreira, quais foram?
A.S – São muitos, estou sem lugar pra guardar, tem prêmios
em minha casa, na casa de minha irmã, tinha aqui na Secretaria da Saúde. Graças
a Deus há esse reconhecimento. O prêmio maior, que jamais pensei em ganhar, foi
o ter sido contemplado, em dezembro de 2017, com a Medalha Zilda Arnes de
medicina social pelo Conselho Federal de Medicina, que é o maior prêmio que um
médico poderia receber. Eu fiquei surpreso, não tinha nem ideia da
responsabilidade... Quando vi médicos famosos nessa galeria como: Adib Jatene
(Cirurgião torácico), Ivo Pitanguy (Cirurgião Plástico), e vários outros... Foi
o prêmio que mais me tocou.
Alô – Em Sergipe, há tratamento eficiente das doenças
sexualmente transmissíveis? Onde os pacientes devem procurar ajuda?
A.S – Temos deficiências. No caso da Aids nós temos um
ambulatório do SEMAR Siqueira Campos que já está lotado, com poucos médicos e
muita gente, temos cerca de 4 mil pessoas sendo atendidas. Não conseguimos
ainda descentralizar esse serviço para que possa aliviar o SEMAR.
Temos algumas deficiências na rede no geral, porque as
execuções das ações de assistência são de responsabilidade do município e nem
todos estão exercendo esse papel. Mas apesar das dificuldades todos os
pacientes são atendidos.
E os pacientes portadores de DST devem procurar a Unidade
Básica de Saúde onde moram, quando é HIV agente encaminha para o SEMAR Siqueira
Campos.
Alô – Existem algumas pesquisas científicas que apontam para
uma possível cura do câncer, da AIDS e outras doenças, na sua opinião isso é
possível?
A.S – Agente espera, mas é muito difícil, por causa do
vírus... Espero que algum dia haja cura, mas o vírus usa de estratégias em que
o organismo não consegue eliminá-lo... Hoje nós temos bons tratamentos, temos
uma melhora na qualidade de vida, mas a cura é um sonho mas está distante, eu
acho.
Alô – Qual o recado que deixa aos nossos leitores?
A.S – Infelizmente a população está cochilando com relação a
prevenção, está relaxando. Muita gente por decisão própria não quer usar a
camisinha. E hoje eu tenho que dizer: Sexo sem camisinha é uma escolha
perigosa. Agente sabe que usar ou não a camisinha é uma opção das pessoas, um
direito... Mas toda vez que uma pessoa opta por não usá-la essa escolha pode
marcar a vida. E digo aos leitores que procurem informações sobre a AIDS, que
procurem acompanhar o crescimento da epidemia, pois é preocupante. E as pessoas
precisam incorporar que a camisinha tem que fazer parte da vida delas,
camisinha hoje é sinônimo de vida.
Texto e imagem reproduzidos do site: alonews.com.br