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quinta-feira, 4 de outubro de 2018

João Costa, quilombola e concludente em Medicina pela UFS

Espero que este relato sirva de incentivo para 
aqueles que desejem realizar seus sonhos, 
por mais que pareçam impossíveis

  Primeiros anos do curso, aos 17 anos.

 No Pré-Seed de Simão Dias, ele entregou o convite aos
 professores e conversou com os alunos.

João com os professores do Campus de Lagarto, da UFS. 

João Costa com os avós, Rita Maria e Luis José. 

João está com os pais, Josefa Maria e Mário César. 
Fotos: Facebook

Publicado originalmente no site Fan F1, em 04/08/2018 

“A educação me levou a vencer uma batalha”, João Costa, quilombola e concludente em Medicina pela UFS

Por Célia Silva

Este mês de agosto será especial para João Santos Costa. No dia 28, ele estará colando grau em Medicina pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) com menção de louvor aos 24 anos de idade e com uma história de superação que compartilhou em uma rede social.

João Santos Costa é quilombola, filho de pais lavradores e de uma extensa família muito pobre composta por 11 filhos. Ele nasceu no povoado Sitio Alto, município de Simão Dias (SE), foi aluno de escola pública e ingressou na UFS pelo sistema de cotas, implantado em 2010, na Federal de Sergipe. Em conversa com o Fan F1, disse que pretende se especializar em cardiologia e trabalhar na região onde nasceu e estudou.

Confira o relato na íntegra:

Eu, João Santos Costa, negro, quilombola, filho de lavradores, nascido e criado na roça, filho do meio e integrante de uma família humilde composta por 11 irmãos e rodeada pela pobreza, chego ao fim de uma enorme batalha!

Atualmente com 24 anos de idade, sou oriundo da cidade de Simão Dias-Sergipe, nascido e crescido no povoado Sítio Alto, uma comunidade autodeclarada quilombola, formada por descendentes de escravos e que desde sua criação foi assolada pela pobreza e por precárias condições de vida e moradia. Desde criança já sabia que para poder melhorar a minha condição social e a da minha família teria que sair do paradigma que era comum onde eu morava (trabalhar na roça para prover o sustento) e me aventurar no mundo da educação e do conhecimento.

Confesso que não foi fácil nascer em uma família grande, pobre, que nem conseguia manter minimamente os filhos com itens básicos como alimentação e vestimenta e ainda conseguir estudar, principalmente para meus pais, analfabetos que mal conseguem assinar o próprio nome. Chegar na faculdade então? Uma utopia. Morava em uma comunidade em que poucos haviam chegado ao ensino médio, quiçá chegar à Universidade Federal.

Lembro-me que haviam momentos em que eu não sabia o que comeria no decorrer do dia, nem o que vestiria para ir estudar, nem se teria sapatos para calçar, mas eu nem pensava em faltar às aulas e muito menos em usar tais obstáculos como empecilhos para não buscar conhecimento e mudar de vida!

Mesmo estudando ainda assim trabalhava na lavoura, principalmente no período das férias escolares. Gostava muito de estudar e de frequentar a escola, porém o que prevalecia no momento era a vontade de sair da labuta desgastante, e mesmo assim louvável, que era a vida na roça. Outro ponto importante era a necessidade de poder proporcionar uma vida melhor e menos sofrida àquelas pessoas que tanto fizeram por mim e por meus irmãos: os meus pais.

Inicialmente sofri um pouco de resistência em virtude da situação familiar e das adversidades financeiras da época, mas me destacava cada vez mais na escola, pois sabia que a única opção para uma ascensão social e financeira era por meio dos estudos. Não desmereço a vida na lavoura pois foi graças a ela e aos esforços dos meus pais que cheguei aqui. Eles foram peças fundamentais para minha vitória! Muitas vezes os presenciei abdicando de suas refeições para proporcionarem o dejejum aos inúmeros filhos, para comprarem materiais escolares e proverem vestimentas, tudo muito simples, mas de coração. Não foi fácil!

Ao contrário de grande parte dos colegas de curso, estudei todo o meu ensino fundamental e médio em escola pública, com suas deficiências estruturais e de corpo docente. Porém, o importante é que nessa caminhada tive a sorte de encontrar pessoas compromissadas e que honraram a profissão. Agradeço de coração a cada um dos professores que conheci, que além de compartilharem seus conhecimentos científicos e materiais didáticos, compartilharam lições de cidadania, comportamento e empatia, e não menos importante, me prepararam para vida! Sem o apoio de cada um de vocês eu não poderia ter alçado meu voo e não teria chegado onde cheguei!

Estudei, estudei, estudei e os resultados chegaram! Aprovado com louvor no ensino fundamental e no médio! Até hoje tenho um amor enorme pelos professores e funcionários das escolas por onde passei.

Consegui meu primeiro emprego no último ano do ensino médio, uma época maravilhosa em minha vida. Vivia a dicotomia entre estudar para o ensino médio e trabalhar meio turno na Promotoria de Justiça de Simão Dias, estágio remunerado conseguido por méritos e fruto do meu desempenho acadêmico na escola estadual Dr. Milton Dortas, lugar onde eu estudava na ocasião. Percebi neste momento que se quisesse realizar o que tanto almejava teria que me esforçar cada vez mais e mais.

Apesar das dificuldades enfrentadas, como a falta de professores, matérias não dadas, calendário acadêmico atrasado e o estágio na promotoria, me aventurei no vestibular na tentativa de realizar meu sonho, que era entrar na universidade. Muitas vezes me questionava se seria possível, se eu era capaz. Recebi muitos comentários desencorajadores, de pessoas próximas inclusive, pelo fato de ser uma pessoa pobre, vindo da roça, negro e proveniente de escola pública. Conseguir cursar medicina? Muitos consideraram improvável! Mas Deus e o destino foram maravilhosos comigo, proveram pessoas que me apoiaram e me incentivaram, que acreditaram no meu potencial e que me instigaram a provar para mim e para os incrédulos que eu conseguiria, e eu consegui!

O ápice foi a aprovação aos 17 anos de idade, em terceiro lugar, no curso de medicina da Universidade Federal de Sergipe, campus de Lagarto; curso que estou terminando com louvor e colhendo os frutos da minha dedicação e empenho. A aprovação no vestibular foi “O marco” em minha vida! Muita coisa estava em jogo, não só o meu futuro, mas também o da minha família.

Hoje em dia as coisas estão um pouco melhores, mas a minha família ainda passa por dificuldades, já que o sustento ainda é provido pelo trabalho na roça e por benefícios sociais de distribuição de renda. Sabia que cursar medicina teria seus custos, mas não me deixei abalar, corri atrás dos meus direitos sociais e me inscrevi no programa de residência universitária disponibilizado pela UFS e na bolsa permanência disponibilizada pelo MEC. Tenho o orgulho de dizer que não estressei meus pais com despesas nesses anos longe de casa, pois sabia que eles não teriam condições de arcar e que eu estaria tirando recursos que poderiam ser utilizados na criação dos meus irmãos.

Foram seis longos anos cheios de experiências agradáveis e desagradáveis, além de quatro greves, pois nada na vida é fácil. Conheci pessoas fantásticas, professores maravilhosos e assimilei lições importantes. Apanhei muito, não fisicamente, mas mentalmente. Horas de sono perdidas, matérias infinitas, tutoriais complexos. Mas tentei sempre extrair o que de bom existia nas adversidades, pois sabia que o mais difícil era conseguir passar no vestibular.

No pouco que vivi aprendi que quando as dificuldades baterem na sua porta deixe-as entrar! Nada melhor que os desafios para instigar a evolução humana. Acredito que se eu não tivesse tantas dificuldades não estaria me graduando em medicina, curso ainda elitizado e estereotipado em nossa sociedade. Mas a vida apenas está começando, o aprendizado sempre continua e nada é como antes.

Consegui suplantar os entraves proporcionados pela pobreza e pelo preconceito e hoje tenho orgulho de dizer que graças aos meus esforços e ao apoio de pessoas maravilhosas o negro saiu da “senzala”, o pobre saiu da roça e o aluno de escola pública está se formando em medicina em uma Universidade Federal.

Espero que este relato sirva de incentivo para aqueles que desejem realizar seus sonhos, por mais que pareçam impossíveis. Muito obrigado a todos que fizeram parte deste caminho até aqui, sem vocês e sem Deus eu não conseguiria.

Texto e imagens reproduzidos do site: fanf1.com.br

terça-feira, 7 de agosto de 2018

Filho de lavradores e quilombola, o médico sergipano João Costa


Filho de lavradores e quilombola, João será médico do seu povoado

Quilombola, filho de lavradores, nascido e criado na roça... Médico.

Por Redação RPA

Quilombola, filho de lavradores, nascido e criado na roça… Médico. João Costa é uma razão para acreditar que as adversidades são passageiras quando não falta empenho e dedicação para superá-las.

Ele acaba de concluir a faculdade de Medicina e será o novo médico do Povoado Sítio Alto, em Simão Dias, no Sergipe. A formatura acontece no próximo dia 28 de agosto, na primeira turma de Medicina do campus de Lagarto da Universidade Federal do Sergipe (UFS), informou o site Lagartense.

“Negro, quilombola, filho de lavradores, nascido e criado na roça, filho do meio e integrante de uma família humilde composta por 11 irmãos e rodeada pela pobreza, chego ao fim de uma enorme batalha!”, declarou João.

Desde muito novo, ele sabia que a única forma de melhorar a condição de vida dele e de sua família era através dos estudos. João provou que é possível realizar sonhos que não cabem no “paradigma que era comum onde eu morava (trabalhar na roça para prover o sustento) e me aventurar no mundo da educação e do conhecimento”.

Filho de pais analfabetos, ele teve uma infância difícil, pois faltavam itens básicos, como roupas e alimentos. Entrar para uma universidade federal, então, era quase uma utopia. No melhor dos cenários, ele chegaria ao ensino médio.

João dividia seu tempo entre o trabalho na lavoura e os estudos. Com as notas boas que tirava na escola, o sonho de proporcionar uma vida melhor à família ganhava força.

“Me destacava cada vez mais na escola, porque sabia que a única opção para uma ascensão social e financeira era por meio dos estudos”, lembra ele.

Aprovado com louvor no ensino fundamental e médio, ele conseguiu o primeiro emprego no 3º ano do ensino médio – antes ele só tinha trabalhado com pais na roça. Era um trabalho de meio período na Promotoria de Justiça de Simão Dias.

Mas, João não queria parar por ali. O sonho dele era entrar na universidade, e para isso teve que lutar contra a inveja e o preconceito.

“Muitas vezes me questionava se seria possível, se eu era capaz. Recebi muitos comentários desencorajadores, de pessoas próximas inclusive, pelo fato de ser uma pessoa pobre, vindo da roça, negro e proveniente de escola pública. Conseguir curar Medicina? Muitos consideraram improvável! Mas, Deus e o destino foram maravilhosos comigo.”

Aos 17 anos, João passou em terceiro lugar no curso de Medicina da Universidade Federal do Sergipe, campus Lagarto. Foram seis longos anos de estudo, superando uma dificuldade atrás da outra, “já que o sustento [da família] ainda é provido pelo trabalho na roça e por benefícios sociais de distribuição de renda”.

Nesse período, o estudante recebeu o benefício do programa de residência universitária disponibilizado pela UFS e uma bolsa permanência disponibilizada pelo MEC.

Às vésperas da colação de grau, o novo médico de Sítio Alto tem um conselho para dar:

“No pouco que vivi aprendi que quando as dificuldades baterem na sua porta deixe-as entrar! Nada melhor que os desafios para instigar a evolução humana. Acredito que se eu não tivesse tantas dificuldades não estaria me graduando em Medicina, curso ainda elitizado e estereotipado em nossa sociedade.”

Texto e imagens reproduzidos do site: razoesparaacreditar.com