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quinta-feira, 20 de novembro de 2008

sobre um ensaio


Outro texto interessante da coletânea Do jeito delas é o longo 'The fish', da Elizabeth Bishop, um poema narrativo quase épico sobre um peixe que é pescado e tinha várias linhas e anzóis pendurados no lábio inferior, como condecorações por sua bravura, tudo muito intenso e forte. Ao final ela (ou o sujeito lírico, se preferirem) deixa o peixe ir embora, um gesto nobre e politicamente correto - só que não tira os anzóis da boca do bicho, como pode!? Fiquei chateadíssima com esse final, mas reconheço que é poema dos bons.

De todo modo, o que quero ressaltar é a qualidade do ensaio Uma estranha cumplicidade, de Márcia Cavendish Wanderley, sobre alguns traços da vida e obra de cinco das poetas elencadas - Sylvia Plath, Anne Sexton, Emily Dickinson, Hilda Doolittle, Marianne Mooore.

Há algum tempo não leio crítica feminista, estou de férias por tempo indeterminado desse assunto, mas Márcia me trouxe de volta a essa trilha com uma escrita enxuta, clara, objetiva, informações indispensáveis sobre os traços fundamentais do estilo, dos temas e do modo poético dessas autoras, assim como traz à tona e sublinha aspectos das vidas que se relacionam às obras.

O suicídio, por exemplo, que irmanou Plath e Sexton no fascínio de ambas pela morte, a ponto de a segunda carregar na bolsa "para o caso de um ataque de infortúnio absolutamente intransponível, suas kills pills. Levava-as como outras moças levam a maquiagem a ser retocada. Como batom para lábios descorados." (p. 85). Ainda sobre Sexton, diz Cavendish que "Era uma mulher bela e espirituosa que deixava eletrizados os auditórios universitários quando, descalça e fumando um cigarro atrás do outro, às vezes acompanhada por grupos de jazz, dizia seus poemas." (p. 86).

Sobre Sylvia Plath: "a poesia de SP tem em 'Daddy' seu momento mais contundente, pois ali destila sobre seu pai alemão (visto como nazista) o mais assombroso rancor e maldade humanos através de uma, às vezes, aparentemente cândida linguagem. Maldade de ninfeta, Lolita às avessas, pois sua pulsão mais que sexual é letal, a autora vai tecendo lentamente seu algoz e sua vítima." (p.74). E talvez minha única discordância, quando a autora afirma que a partir dos anos 70 "a poesia de Sylvia Plath passa a desfrutar de foros de cânon dentro da história da poesia ocidental. Cânon talvez ainda construído apenas por essa corrente crítica [feminista], interessada na busca de parâmetros femininos que se equiparassem àqueles tradicionalmente instituídos, mas que a reverencia como uma das primeiras e talvez como a mais forte voz feminista da literatura de língua inglesa da contemporaneidade." (p. 80). Minha dúvida e questão: não pertenceria à Virginia Woolf de Um quarto todo seu esse título? De todo modo, nada tira o brilho desse texto, em tudo para mim exemplar.


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Do jeito delas - vozes femininas de língua inglesa. Tradução Jorge Wanderley. Organização e ensaios de Márcia Cavendish Wanderley, Carlos Eduardo Fialho, Sueli Cavendish. Rio de Janeiro: 7Letras, 2008.