Obsessão : Lee Daniels, 2013. Um dos melhores filmes vistos até agora, muito, muito bom, com uma Nicole Kidman perfeita no papel de uma mulher qualquer, desmazelada, além de todos os outros, ótimos - Zac Effron, sensual e belo, faz um personagem seduzido, ou melhor, abduzido pela beleza da femme fatale vivida por Nicole; John Kusac, num papel inovador para sua carreira, um matador que ela faz muitíssimo bem, e assustador em suas nuances; Matthew McConaughey, cujo personagem força a direção da história para outro caminho, perturbador e rico em suas consequências, além de trágico; David Oyelowo, cuja cor negra tem importância para aquele mundo histórico, e sobretudo social. Todos muito bons, encaminhamentos inesperados, final forte, atos extremos.
O filme tem aquele clima de desolação das pequenas cidades do interior estadunidense, além de seres à deriva, perdidos em vidas meio sem sentido, a violência à espreita e se esparramando em águas paradas, em enormes bocas de crocodilos exterminados, famintos e eviscerados - metáfora do clima geral de espreita e bote. Famintos todos de contato íntimo, de sexo - Kidman, a sensual-ingênua amante de um presidiário diz muito sobre as ânsias sexuais e a temperatura dos corpos. Mais que bom - excelente.
Ça brûle : Claire Simon, 2008. Com Camille Varenne, Gilbert Melk, Marion Maintenay. Outro filme que captura com maestria o clima de uma cidadezinha de província, no interior da França, cujos moradores vivem suas emoções mais intensas em época de verão, quando turistas a invadem à procura de - sossego. Mas para os jovens e adolescentes, sedentos por emoções, fortes ou não, a cidade tem poucos atrativos, daí ser necessário criar situações para testar não apenas se os sentimentos confusos que habitam seus corpos poderiam ser o tão esperado amor, ou apenas uma inquietação inerente ao nascimento dos afetos - todos.
E uma das jovens cisma, se entedia, perambula, sofre um certo abandono dos pais e, sobretudo, de seu cavalo, que lhe é praticamente tomado, e sofre mais. Tanto que comete um daqueles atos gratuitos, oriundos do puro não-ter-o-que-fazer, com consequências devastadoras, como sugere literalmente o título.
A partir desse ato impensado, o inesperado acontece, e não há como não achar necessário ter dado maiores limites àquela jovem, não ter sido utilizada com ela mais energia, mais conversa, mais afeto, mais presença, mais pais de verdade. Mas não houve, não foi, não deu. E ela fica malíssima na fita, nós ficamos irados com tanta irresponsabilidade, e o final do filme se resolve de um modo meio irritante também. Acho que ela deveria ter sofrido, aprendido mais, ao invés do que aconteceu. Creio que não perdoei o final, de certo modo 'fácil', do filme.
Nebraska: Alexander Payne, 2013. Com Bruce Dern, Will Forte, Bob Odenkrirk. Trata-se de um filme sobre o re-encontro de pai e filho, no momento final da vida do primeiro, quando ele sente necessidade de revisitar um pedaço de si que ficou lá atrás, em algum lugar que, no filme, será representado por um falso bilhete premiado de um milhão. O homem cisma que ganhou aquele prêmio, mas na verdade o que ele precisa é resgatar a si mesmo, sua história, os lugares por onde viveu, antes de seu fim.
Tudo se passa basicamente entre homens, e as mulheres à volta deles ou são bruxas completas, como a do protagonista, ou são coadjuvantes na vida dos outros, como as dos irmãos, tios e amigos antigos. Como pertenço a uma família basicamente matriarcal, em que as mulheres é que fincaram bandeiras no mundo do trabalho (e eventualmente do afeto), achei o filme distante de mim, embora reconheça sua força, sua grandeza, ao tratar o universo da velhice sem condescendência. Trata-se, enfim, de um filme denso e um tanto árido sobre o que se perde ao longo do caminho, sobre o que um filho herda, e estende para além o legado do bem, sobre como um gesto apenas, bem simples, pode ser como um filete de água no mundo seco, sedento e triste do desamparo.
Gravidade : Alfonso Cuarón, 2013, com Sandra Bullock e George Clooney. Achei um dos piores filmes sobre espaço já feitos - e não me refiro a tecnicalidades, porque acho que elas só servem ao filme se houver uma boa história, um bom roteiro, bons intérpretes, e o que vi foi uma excelente atriz pagando mico ao fazer um personagem perdido no espaço que geme o tempo todo, emite sons ininteligíveis, sussurra ais por quase todo o sempre, enquanto a nave é atingida por estilhaços de meteoros - cenas de patetice explícita, achei, tanto maior quanto seu parceiro de voo, o belo Clooney, é capaz durante todo o evento de dizer coisas engraçadas, formar frases com sentido, ter humor e charme - isso tudo sob o furor dessa mesma tempestade. Pena que ele morre, e ela sobrevive dizendo as mesmas poucas sílabas, até o final. Um desastre completo, nenhum dos dois precisava ter feito esse trabalho, e suas carreiras passariam perfeitamente bem sem ele.