Mostrando postagens com marcador Filmes on line. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Filmes on line. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 26 de julho de 2016

Alguns poucos filmes da MostraAí 2014

A GATINHA ESQUISITA (Das Merkwurdige Katzchen, Alemanha, 2013. Dir:Ramon Zurcher Com:Leon Alan Bewiersdorf, Lea Draeger)


Obra prima inconteste – o diretor filmou, do começo ao fim, todo o universo existencial, psicológico e filosófico das obras literárias de Clarice Lispector, a escritora brasileira que fotografa com a palavra cada milímetro das sensações que perpassam o cotidiano das relações entre as pessoas e o mundo, os objetos familiares, os pequenos acontecimentos, seja ele olhar nos olhos de um búfalo no zoológico, seja o esvoaçar de uma pena no ar, ou o cruzamento fortuito de alguém no bonde com o olhar de um cego. Todos os contos de Laços de família estão aqui; todo o clima de A paixão segundo GH está aqui, até mesmo cenas que se lêem em Clarice estão filmadas como se transpostas para a tela – e isso independe de o diretor conhecer ou não a obra da autora brasileira, porque é um modo de estar no mundo que os aproxima, flagrantes da existência cotidiana que em ambos adquirem estatuto de obra de arte – sob a palavra, uma; sob as imagens, outro.

Essa é a primeira vez que vejo na tela uma obra literária em sua perfeita forma, ou seja, um filme feito de sopros, de sensações e observações  intensas sobre o mínimo, os objetos comuns, as situações cujos significados residem nas impressões que causam, expressas por pequenas, contínuas e intensas epifanias, como  se o cotidiano fosse pleno de riquezas, de sentidos que nos oprimem e nos excitam, como se a vida fosse esse diuturno brilho do singular e do comum, do banal, de onde se extraem as pepitas, o que comove, o que existe, o que pasma simplesmente por estar vivo, e pulsar e existir para nossos olhos.

Há cenas antológicas, como a da mulher que faz a mãe e tem uma relação difícil com o gato, e coloca o pé sobre o bichano, no vão da porta, aproximando-o lentamente do animal, como se fora esmagá-lo – dura um átimo e uma eternidade, porque ali estão resumidos todos os nossos desejos ancestrais de um dia ter esmigalhado um gato, um besouro, uma mosca, um inseto, um tudo; ou quando essa mesma mulher-mãe toma o leite onde há um pelo do gato, já quase no final do filme e da refeição com os amigos – ele toma o leite, e essa cena tem o mesmo sentido de comer a barata n’A paixão – uma redenção, talvez, em meio à culpa de que não se sabe bem o motivo, mas que está lá, sempre premente, e presente.

Há quase todo o tempo, igualmente, frases brilhantes, interessantíssimas, muitas vezes emoldurando uma situação comum, como quando a menina pergunta sobre os lóbulos dos pulmões:
_ Que são lóbulos?
_ São as asas dos pulmões. Para que voem, quando necessário.
Ou quando uma das filhas está olhando pela janela, provavelmente vendo lá fora o cão da casa, e observa para o rapaz, que parece ser o marido, ou namorado:
_ Não queria ser um cão preto no verão.
_ Ainda não é verão.
_ Queria ser um no outono?
_ Aí, sim.


CRIANÇA DE DEUS (Child Of God, James Franco, 2013). Com Scott Haze, James Franco, Jim Parrack, Tim Blake Nelson

O filme é muito bom, na verdade um tour de force do ator Scott Haze, que leva o filme inteiro em sua interpretação brutal, na pele de um homem que perdeu o pai aos dez anos e, vivendo a esmo e no ermo da cidadezinha, vai-se tornando cada vez menos um homem, e cada vez mais um sujeito doente de solidão, que o leva aos poucos a uma forma de loucura, mas com um sentido agudo de sobrevivência, buscando descobrir como sair das situações difíceis que aquela sua existência comporta. A partir de um certo momento, esse estado esgarça-se, e ele se aproxima de práticas mais bestiais, e será desse lugar, em que todos os sentidos retesam-se para garantir a sobrevivência, que ele se vê um quase selvagem, matando a sangue frio para manter sua recém descoberta possibilidade amorosa: a necrofilia.


O modo como o diretor James Franco apresenta sua história não permite ao espectador julgar as ações desse (quase) homem de um ponto de vista das normas sociais – ele é acompanhado pela câmera, pulando e caçando, evacuando e matando um bicho aqui e ali para alimentar-se, de modo que quando ele mata um homem quase sem pensar, e depois a mulher, não há aparentemente nenhuma mudança brusca – o pássaro morto mata sua fome de comida; a mulher morta mata sua fome de sexo e de amor. Assim, acompanhamos sua descida na escala humana, em direção ao seu estado mais duro e mais brutal, ao mesmo tempo em que vai descendo para o mais fundo da caverna, achando os buracos onde se abrigar e guardar o que ama - a mulher, os bichos de pelúcia. Mas perder é de sua natureza de ser híbrido - entre bicho e gente, então ele perde o braço. Mas não a vida. Essa segue a trilha dentro das pedras, por um caminho que só os íntimos da natureza conhecem, e ergue-se por fim em meio a uma campina vasta – essa cena final, em que ele corre e grunhe de alegria, mostra um ser que caminha para um lugar indecidível na escala humana.

Um grande filme, em que se percebe como Franco foi certeiro ao deixar seu ator agir, e filmá-lo quase como o documentário de uma loucura anunciada. E sem esse ator, sem essa entrega absurda e visceral do ator ao personagem, não haveria o filme sobre a gestação de uma insanidade, passo a passo.  Muito bom, e muito terrível.

A SALVAÇÃO (Kristian Levring, 2014). Com: Mads Mikkelsen, Eva Green, Jeffey Dean Morgan, Eric Cantona.

É um ótimo faroeste, clássico, dos bons, com o talento de Mads Mikkelsen, com aquela expressão dura e concentrada, e a incrível interpretação de Eva Green no papel de uma mulher muda (porque lhe cortaram a língua), mas que fala pelos olhos mais do que elenco todo, fiquei impressionada com a força dela, mesmo já a conhecendo de alguns episódios em Penny Dreadful. Ela está soberba, sem falar, e quase sem piscar, puro ódio concentrado - muito bom.

ACEITA CARTÃO? (Julian Gilbey, 2014). Ed Speleer, Will Poulter.

Achei mediano, dá pra ver se não houver grandes expectativas - filme de trambiqueiros, como já vimos tantos produzidos pela matriz norte americana, e só o sotaque britânico não o diferencia deles, mas soa bem aos ouvidos, porque gosto do sotaque

PASSO EM FALSO (Starred Up, Reino Unido, 2013. Dir:David Mackenzie Com:Jack O’Connel, Rupert Friend)

Embora pertença a um gênero em que a violência comanda, e eu quase nunca me encontre num filme onde a testosterona dita quase tudo, gostei desse porque os dois personagens, pai e filho, se estraçalham ao mesmo tempo por ser o que são, e por desejarem ser diferentes, ou seja, a violência que os constitui é uma parede, por onde passam, a fórceps, a memória de um desejo de afeto, de amor, de família. Achei bruto tudo, mas muito emocionante o esforço desses homens para se encontrarem em algum lugar no mundo dos afetos. Muito intenso.


A MOÇA DA BICICLETA (Girl On A Bicycle. EUA/Alemanha, 2013. Dir:Jeremy Leven Com:Louise Manot, Vincenzo Amato)

Vi esse filme e amei. Uma comédia romântica super agradável, com cenas simples, às vezes engraçadas, tudo correto e fácil e bom. Num final de domingo, é um presente.

SOBRE AQUELE NOSSO VERÃO (Very Good Girls, EUA, 2013. Dir:Naomi Forner Com: Elisabeth Olsen, Dakota Fanning) NOTA 6,5

Dakota com a mesma expressão trágica excessivamente dura, por querelas de amor juvenil, nada a acrescentar, a não ser as cenas de rebelião das jovens que agora acontecem quando tiram a roupa toda e nadam nuas, ou tiram a blusa e ficam de sutiã e calcinhas quando fazem as pazes. Uau! 


COERÊNCIA (Coherence, EUA, 2013. Dir:James Ward Byrkit Com:Emily Baldoni, Maury Sterling, Nicholas Brendon)  

Filme em que se pode ficar até o fim dos tempos tentando entender as teorias da física que lhe dão suporte; outro tanto para entender os acontecimentos do próprio filme. Mas nada disso tira o interesse dessa ficção científica, que nos deixa grudados na cadeira até sua última cena – quando concluímos a compreensão por um: como?

ENCONTROS, DESENCONTROS, REENCONTROS (Une Rencontre, França, 2014. Dir:Lisa Azuelos Com: Sophie Marceau, François Cluzet, Lisa Azuelos)

Uma história de amor clássica, com todos os ingredientes para fazer o espectador feliz: um casal de protagonistas belíssimo, ótimos atores, uma história de amor impossível e atração irresistível por outra mulher, e a decisão final dele de não trair o casamento, a despeito da paixão e fascínio intensos. Muito bom, e bem feito.

LUA DE MEL (Honeymoon, EUA, 2014. Dir:Leigh Janiak Com:Rose Leslie, Harry Treadaway)


Filme B de terror, quase todo tempo psicológico, e meio bobo, sobretudo o rapaz, que chega a constranger pela falta de entendimento do que está acontecendo. Fiquei olhando até o fim, mas até os sessenta minutos somos cozinhados em banho maria naquela situação, que pressentimos qual seja, menos o rapaz, claro, até que nos minutos finais a mulher finalmente... Bem, a gente vê, mas achei muito sem graça. Pode ser que a exibição ruim do online tenha prejudicado o filme, já que o escuro de várias cenas (para contrapor à tal luz etc) ficou quase invisível algumas vezes. De todo modo, achei muito distante de Coherence.

Alguns filmes da 'MostraAí' 2013

Esses comentários estão guardados há tempos, esperando que eu os desenvolva mais, o que não ocorreu, e resolvi expor assim mesmo.

Não lembro se eles foram vistos no Mostra Aí de 2013 ou 2014, um festival on line organizado por um querido cinéfilo, muito bamba, e fica aqui como registro de tê-los assistido.

Os garotos - drama vivido por dois jovens: um, cuja família é estruturada com pai, mãe e irmã pequena; o outro, cuja mãe morreu e vive com o pai e o irmão. Ambas as famílias são amorosas com seus filhos, mas a segunda tem mais conflitos em razão da falta da mãe. Os dois garotos têm em torno de   16 anos, correm por suas escolas e se apaixonam. O filme é o drama que eles vivem para se entender e se encontrar. Encontram-se no final. nota 8

Metro Manilla: drama que envolve uma família de agricultores paupérrimos (marido, mulher,uma criança de 9 anos e um bebê) que resolvem largar a miséria do campo e migrar para a capital filipina, Manila, onde ele acaba encontrando um emprego de guarda de carro forte, protegido pelo colega que o ajuda a ser contratado, que tem planos de roubar uma das caixas com dinheiro e vai precisar da ajuda do agricultor para pegar a chave que a abre, sem estourar o dinheiro. O filme tem um final totalmente inesperado e, de certo modo, redentor e altruísta. Além de dar uma volta no sistema social que o condenava à miséria sem apelação, a diretora do filme também faz seu personagem romper com o estereótipo do homem simples do campo como sinônimo de ignorância, ao atribuir-lhe um plano elaboradíssimo e bastante complexo que deixará sua família para sempre em boa situação financeira, e tudo sai exatamente como ele planejou. Paga um preço altíssimo, mas sai vencedor de acordo com seus desígnios. Nota 9

Joséphine: moça de classe média que não tem nada na cabeça cisma de entrar em competição com a irmã sobre namoros e casamento, e acaba criando uma mentira tão cabeluda que se vê na contingência de ir ao encontro do 'noivo inventado no Brasil, já que ele é médico naquele país e sambalelê. Ela não vai, claro, sua mala se extravia e ela se esconde em seu próprio ótimo apartamento, em seu próprio quarto, onde passa a conviver às escondidas com um colega de trabalho que subloca seu apartamento, agora que,em tese, ela se mandou pra outro país. Depois de muitos quiproquós, ela acaba se apaixonando pelo cara simplório do trabalho (onde ela não faz quase coisa nenhuma), que se revela bem legalzinho no convívio escondido diário. Nota 6

Kill your darlings: jovens estudantes numa universidade de alto padrão se envolvem em discussões filosóficas e literárias e também em intensas relações amorosas. O assassinato de David Kammerer faz com que três dos poetas mais famosos da geração beat se aproximem: Allen Ginsberg (Daniel Radcliff), Jack Kerouac e Wiliam Borroughs. 

Após assistir ao filme na edição de 2013 do Sundance Film Festival, Damon Wise, crítico do jornal estadunidense The Guardian, disse que o filme era “bastante verossímil e mostrou de fato como foi o começo do movimento da contracultura estadunidense na literatura do século XX [...] O filme passa uma paixão e energia incríveis ao mostrar artistas não escrevendo e criando, mas em suas ações cotidianas, conversando,desenvolvendo suas idéias e incentivando uns aos outros para sempre tentarem inovar em sua arte.” “Embora ele comece com o mistério de um assassinato”, continua Damon,” Kill Your Darlings está mais para um daqueles filmes que nos fazem refletir, é uma descrição perfeita de seu tempo e que ainda assim soa incrivelmente atual.” Em sua resenha sobre o filme, Damon Wise congratulou-o com quatro de cinco estrelas. 
O barato do filme é a pegada da paixão-obsessão de um personagem, David Cammerer, por outro, Lucien Carr, por quem também Allen Guinsberg se apaixona. No final, há o drama do assassinato - Carr mata Cammerer, e as dúvidas sobre as várias versões do episódio. Todos os atores dão show de talento. Nota 8

Hawaii: lentíssima história de dois amigos de infância que se reencontram quando um vai pedir para fazer pequenos serviços durante um certo tempo, ao fim do qual ele deverá ter um trabalho em Buenos Aires. O barato do filme é exatamente o ritmo lento e a perspectiva dos pequeníssimos detalhes que compõem uma história de afetos entre os dois que vai muito lentamente emergindo na consciência do personagem escritor. Há muitos detalhes interessantes, o filme é rico em sutilezas e a pegada de incerteza e dúvidas quanto aos dois se reconhecerem amorosamente é constante, além de haver um clima de erotismo muito velado mas, por isso mesmo, intenso ao longo de todo o filme. Muito bem feito, um bordado muito delicado sobre afetividade homo. Nota 8,5

Expresso do amanhã: mais do mesmo, ou seja, filmão sobre o fim dos tempos, agora através do gelo, quando todo o planeta se resfria salvando-se apenas aqueles que viajam num trem bala que nunca para, criado por um sujeito que mantém grande parte da população no final do trem, em regime de escravidão - o filme então será a tentativa de tomada do trem, quando muitas mortes acontecem e um acidente trágico põe fim à rota infinita do trem e à vida de seus passageiros, salvo uma mulher e uma criança que, em tese, começarão uma nova humanidade. Isso se o urso bem à frente deles dois deixar. Ponto positivo: paisagens brancas lindíssimas. Negativo: déjà vu demais. Nota 6,5

Barefoot: comédia dramática sobre uma moça que foi mantida em isolamento pela mãe esquizofrênica até a idade adulta, quando morreu e ela pensa que matou a mãe, e um rapaz da família rica metido em encrencas. Os dois se conhecem num hospital psiquiátrico e ficam juntos num road trip ao fim da qual se apaixonam, têm seus problemas resolvidos, ficam juntos e provavelmente serão felizes para sempre. A esquecer em alguns dias, uma bobagem só.

Nota 5

O homem duplicado: estranhíssimo filme, em que um homem, professor de História, descobre um sósia vendo um filme, e o procura para conferir se são mesmo idênticos. São, e acompanhamos a tensão de uma pressentida luta entre um e outro para ver quem sobrevive. Mas há também um aspecto de terror, numas cenas meio incompreensíveis que abrem o filme e mostram homens reunidos num lugar que parece proibido e se extasiam com mulheres que pisam em tarântulas. Se há alguma simbologia nelas, desconheço. No final, a tarântula se apresenta ela mesma no corpo da mulher grávida da mulher do ator. Muito estranho, e só vale pela tensão que instala. nota 7


O jardim dos esquecidos - flores do sótão: sinistro, mas datado no ritmo e na verossimilhança das ações dos filhos, não há como aceitar tanta passividade com relação à crueldade reinante. Jovens bobinhos demais. nota 6


Antes sexo do que nunca: história de amor entediado, em que uma das partes decide resolver seu problema de falta de sexo com a mulher e ainda ganhar uma grana, transando com as carentes ricas. A história é comum, mas a atriz é bem interessante, e o filme se vê no modo fácil. O título é nota 10, e o filme nota 7


Mandariinid: ótimo filme sobre a inutilidade da guerra, e  o valor da convivência para mostrar que todas as facções são irmãs sob a chancela da generosidade, da fraternidade e da solidariedade. As diferenças se aplainam face à proximidade da morte, não há lados quando ela escolhe qualquer um, basta que alguém não diga a palavra certa. E a morte escolhe aleatoriamente na guerra, ela não faz qualquer distinção e só tem uma finalidade - matar.

Nota 9

Hateship Loveship: bem legal a história dessa mulher simples, que acaba descobrindo o que quer a partir das falsas cartas que lhe enviam duas adolescentes maldosas. O que elas escrevem fingindo ser o pai de uma delas acaba se tornando objeto do desejo da mulher, que vai à luta e conquista tudo que lhe foi mentido, e sem qualquer perder o jeito sereno de ser. Muito bom de ver. Nota 8,5