Still Alice (Richard Glatzer, Wash Westmoreland, 2015) tem na atuação de Julianne Moore uma forte candidata ao Oscar deste ano, mas a cena do filme que mais me comoveu foi aquela em que sua filha mais nova, vivida por uma madura Kristen Stewart, recita a fala de uma peça para a qual fará teste em Nova York, e ao final pergunta à mãe, já em processo acelerado de um Alzheimer precoce, de que trata o texto que ela acabara de ouvir. Com alguma dificuldade para articular as palavras, ela praticamente sussurra: amor - o texto trata de amor.
Se esse foi um momento particularmente tocante, embora com seu tanto de pieguice, a emoção não me acompanhou ao longo do filme, ao contrário, a sensação foi de que a indústria do cinema norte-americano resolveu investir em dramas que exploram a morte de uma forma meio glamourizada.
Os elementos que compõem o quadro são absolutamente adequados: mulher de classe média alta, professora conceituada de Linguística em Universidade de prestígio, mãe de uma família de filhos amorosos, marido parceiro e cúmplice, começa a ratear as frases durante as aulas, a fazer suas corridas sem saber onde foi parar, a esquecer nomes, palavras. Nesse horizonte de pessoas bem de vida, e de bem com a vida, o drama que se desenha não chega em nenhum momento a incomodar verdadeiramente - até a tentativa de suicídio, programada por computador, resolve-se de outro modo, meio por acaso, e Alice continua seu processo, sem nenhum estardalhaço, rumo a um declínio mental discretamente percebido, menos ainda vivenciado - um Alzheimer limpo, em que um xixi nas calças é o máximo de degradação a que se chega.
Parece inevitável a comparação com outro momento, em que o cinema francês encena um processo de declínio semelhante, também de um personagem feminino, em ano relativamente recente. Trata-se do filme Amor (2013), de Michael Haneke, em que ele coloca em cena o casal vivido por Jean Louis Trintignant e Emmanuelle Riva, numa experiência excruciante face à perda de movimentos da mulher, que sofre um abrupto derrame, a partir do qual a vida de ambos será solapada, sem misericórdia, dia a dia.
Ambos ligados à arte da música, já aposentados e vivendo sozinhos, ela vai perdendo os movimentos, a expressão dos olhos torna-se embaçada, e nós vemos surgir na tela a presença da morte, que praticamente se presentifica, e se petrifica, através da atuação magistral de Riva. Tal atuação mereceu a indicação ao Oscar daquele ano, perdido injustamente, segundo penso, para outra jovem e esfuziante atriz.
Diferentemente de Riva, a doença e a decrepitude vividas com toda a dignidade, e talento, por Julianne Moore, talvez sejam reconhecidas com mais uma estatueta. Hollywood sabe honrar suas estrelas.