Mostrando postagens com marcador Mike Leigh. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Mike Leigh. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Mais um ano (republicado)

Mais um ano. Mike Leigh (FestRio 2012) - Nota 9,5

Um filme de 2010 que só agora pudemos ver, onde Mike Leigh faz um trabalho de mestre, num filme belíssimo, tocante, transparente em sua leitura da solidão e da natureza humanas. 
É generosa sua forma de lidar com as carências de afeto, de calor e de amizade de alguns personagens, sobretudo quando retrata uma mulher madura que ainda não se deu conta inteiramente de quem é, e não consegue aceitar completamente o nível de suas reais necessidades afetivas.

Ela pertence àquele rol de seres muito perdidos, cujos anos vividos parecem não ter ensinado o suficiente sobre esse dado estrutural e fundante de nossa humanidade: somos e estamos sós, embora alguns de nós consigam fazer-se acompanhar durante um percurso da vida, longo ou breve, pelo ente amado, pelo amigo, pela família possível, com quem se tecem histórias, compartilham-se vivências - ao final, na velhice a que hopefully se chega, essa tessitura de afetos será uma espécie de norte, cada vez mais necessário, para melhor caminhar em direção ao que nos aguarda a todos.

O que Leigh constrói é uma narrativa fílmica de como cada um enfrenta basicamente a solidão. O casal maduro, magnificamente interpretado por Jim Broadbent e Ruth Sheen, que se mantém unido e amoroso, que tem no manuseio da terra uma fonte de alegrias e vitalização - será o ponto de convergência onde aportam os vários personagens a sua volta. Ali eles conversam, desabafam, choram, riem, bebem (bastante, aliás - lembrei de HH: a vida é líquida), contam histórias - tecem os fios de suas existências e os entrelaçam uns aos outros, como se dá com amigos, com os que cruzam nossos caminhos.

Mas ficou no ar (para mim) um certo travo e custei a encontrar a motivo: acho que é esse núcleo indestrutível que o casal idoso constrói em torno de si, de afeto e cumplicidade - penso que está mais no campo da utopia, de uma idealização que não encontra eco em minha memória. Fiquei pensando que havia um tanto de bom mocismo ali e isso, confesso, me incomodou um pouco. Mas nada que impeça o real prazer de fazer parte, por alguns instantes, daquele universo de afetos.