segunda-feira, 25 de abril de 2016
Dois filmes - Nise; O tesouro
O tesouro (Corneliu Porumboiu, 2016). Com Cuzin Toma, Adrain Purcarescu, Radu Banzaru, Iulia Chiochinã. Tendo lido a crítica feita por um jornal carioca ao filme, resolvi comentá-lo conversando com o crítico em questão, ficou assim:
Não, Janot, a cena final de ‘O tesouro' não vale o filme inteiro, como se lê no comentário feito no jornal, o máximo que se pode conceber seria o bonequinho sentado apenas observando, sem aplaudir. A não ser que se curta passar mais de metade do filme olhando três homens conversando enquanto escavam sem parar em busca do tal tesouro. A situação econômica precária do país (Romênia) e dos personagens, a semelhança com nosso atraso social, o ‘jeitinho’ maroto a que recorrem alguns que vivem certos estágios de decadência, em vários momentos bem semelhantes a nosso modo de resolver as coisas, tudo leva a plateia à empatia, e ao riso. Eu achei menos graça, e fiquei meio impaciente com aquela falta de entrecho, ou melhor de ação, e sobretudo não deu para comprar aquela cena final edificante, nem mesmo se tivesse sido inspirada nas narrativas mais delirantes do universo maravilhoso de nossa literatura de cordel. Não achei verossímil, nem uma saída adequada sequer na ficção. E de boas ações o purgatório - das artes e da vida – está lotado.
Nise - o coração da loucura (Roberto Berliner, 2016). Com Glória Pires, Fabrício Boliveira, Simone Mazzer, Flávio Bauraqui, Fernando Eiras, Julio Adrião, Felipe Rocha, Claudio Jaborandy, Zé Carlos Machado, Bernardo Marinho, Georgiana Goes, Luciana Fregolente, Charles Fricks, Roberta Rodrigues.
Filme indispensável, com muitos muitos acertos, e uma importância especial por contar uma parte fundamental de nossa história e prática manicomiais, ressaltando o desempenho dos atores, tanto da Glória Pires, que vive a psiquiatra, quanto do excelente grupo dos que fazem os doentes - esses, o coração pulsante do filme. Achei mais fraco o trabalho dos médicos, com exceção do ótimo Zé Carlos Machado, como o diretor. Como se trata, de modo especial, de um trabalho em que o grupo gera a energia-motora do filme, há elos mais ou menos fortes. O mais fraco me pareceu o crítico de arte Mario Pedrosa, vivido por Charles Fricks, que achei inconvincente, aquém de sua importância real na história que se conta. E essa história está muito bem relacionada aos acontecimentos na bela crítica que li numa noite de insônia, escrita por Fernando Pardal, no site Esquerda Diário e que, apesar de começar com um erro feio de ortografia (no lead, talvez nem seja de sua responsabilidade, não sei), vale a leitura por situar com precisão o contexto político-social dos acontecimentos narrados, que me parecem fundamentais para compreender melhor a importância de Nise para a psiquiatria brasileira. Mas o filme vale por si mesmo, em suas escolhas e acertos.
O site referido, veja aqui
quinta-feira, 14 de abril de 2016
Alguns filmes - março/abril
Rua Coverfield, 10: (Dan Trachtenberg, 2016) Com Mary Elizabeth Winstead, John Goodman, John Gallagher Jr, Maya Erskine. Dois terços do filme acontecem dentro de um bunker, onde uma mulher e dois homens supostamente se refugiam de um ataque nuclear. Ela desconfia quase sempre de que seu protetor parece mais um raptor, mas vai se adaptando, até que a coisa fica esquisita demais e ela resolve fugir. E nessa fugida é que o diretor dá uma volta no espectador, tipo - vocês pensavam que era só um filme banal sobre psicótico americano sequestrador de moças? Não, temos outros trunfos na manga. E o final fica assim, como direi? Uma outra vertente de um gênero igualmente fértil se abre, mas não tira a sensação de déjà vu.
A juventude (Paolo Sorrentino, 2016). Com Michael Caine, Harvey Keytel, Rachel Weisz, Jane Fonda. A gente percebe que se trata de uma temática semelhante à de outro filme dele, A grande beleza, ou seja, questões relativas à percepção da vida em momento de declínio, como estar na vida e na velhice, em que dois personagens se entregam aos projetos possíveis: um, dirigir seu filme- testamento; o outro, deleitar-se. Mas penso que aqui as discussões são mais complexas, as palavras nem sempre estão dizendo o que os atos realizam. Como na vida, há ao mesmo tempo a ação dos personagens, que nem sempre estão de acordo com o que eles pensam delas, ou dos outros, ou de suas próprias histórias, que a memória tinge de cores variadas, dependendo do momento, ou de quem lembra. Um filme rico, denso, interessante o tempo todo, que vale a pena ver e rever.
A segunda esposa: (Umut Dag, 2016), Com Begum Akkaya, Vedat Erincin, Nihal Koldas. Uma das experiências mais intensas sobre a delicadeza, o que nós, mulheres ocidentais, chamamos 'sororidade', mesmo que não seja esse o projeto do filme. Ele quer apenas tematizar o devotamento de uma esposa e mãe por sua família, mas o destino prega-lhe uma peça e tudo vai em direção oposta ao planejado. Salvo a delicadeza extrema dessas duas personagens, e seu encontro único. Um filme para se ver com prazer.
Mais forte que bombas (Joachim Trier, 2016). Com Isabelle Huppert, Gabriel Byrne, Jesse Eisenberg, Devin Druid. Um filme que a princípio não diz bem a que veio, mas à medida que avança vamos percebendo os nós e as tramas que envolvem os homens daquela família (o marido, os dois filhos), em torno da mulher, de seu trabalho como fotógrafa de guerra, e de sua morte. Tudo vai-se revelando quando o mais velho começa a fazer a arrumação das fotos e descobre novos ângulos da vida de sua mãe, anos depois do acidente de carro que a matou, e tudo se embaralha com seu momento atual, o filho recém nascido, as dúvidas; também começamos a ver melhor o irmão mais jovem, imerso em um mundo cheio de asperezas, próprias da idade, mas igualmente cindido pelas rupturas - com a mãe, com o pai com quem não consegue dialogar, com o mundo dos afetos, dos amigos. Tudo no filme soa como um flash estourado, em que estilhaços reverberam em cada vida, em cada fotograma, em cada um de nós. Um dos melhores filmes que vi no mês.
Diplomacia (Volker Schlöndorff, 2016). Com André Dussollier, Niels Arestrup, Burghart Klaubner. Um filme em que o espectador gruda na tela apenas com a atuação de dois atores, em conversas dentro de um quarto, a respeito de destruir ou não Paris na saída final dos alemães da segunda guerra. Magnífico trabalho de atores, embora tudo pareça simples, leve e sério ao mesmo tempo. Um jogo de conversas e argumentos, que nos cativa até o fim.
A senhora da van (Nicholas Hytner, 2016). Com Maggie Smith, Alex Jennings, Jim Broadbent. Achei uma história meio bobinha, um filme que quase nunca engrena em interesse, uma personagem meio caricata, mas onde aparece a radiância de sempre da Maggie Smith. Só vale por ela.
quinta-feira, 7 de abril de 2016
São Miguel dos Milagres
Seis dias em São Miguel dos Milagres, Maceió (AL) deixam qualquer pessoa em estado de graça total.
Esse povoado, com um mar bem morninho, quase quente em certas horas, faz parte da chamada Rota Ecológica, que engloba outros semelhantes em paisagem, na direção sul/norte do litoral - Paripueira, Barra de Sto. Antonio, São Miguel dos Milagres, Porto de Pedras, Japaratinga, Maragogi.
Uma das maneiras de chegar ao povoado é contratando o traslado com a própria pousada onde se vai ficar. No meu caso, optei pela que me pareceu oferecer o melhor custo/benefício, a Pousada do Sonho, que conheci primeiro pelo site do Ricardo Freire , na aba Rota Ecológica, onde se pode ter todo tipo de informação sobre as inúmeras pousadas da região. Depois, a partir de um comentário no próprio site do Freire, cheguei ao post da Cristina Leonhardt, este aqui, que me convenceu do acerto de minha escolha. Também no site ótimo da Silvinha, o Matraqueando, se pode ler sobre o lugar, e pousada. A pousada distribui seus quartos à volta de um espaço verde belíssimo, e fica de frente para o mar, onde se pode mergulhar bem de tardinha, quando o sol a pino esmorece, ou bem cedinho, quando a maré começa a subir.
Uma brisa constante me fez errar a percepção sobre a quentura do sol, e no primeiro dia fui caminhar para conhecer a praia e voltei com as costas muito, muito ardidas. Sorte que uma senhora francesa bem solícita me ofereceu e passou em minhas costas um creme hidratante adequado à situação, e pude dormir à noite. Depois, descobri que eu tinha levado Bepantol creme, e isso realmente foi o que me salvou.
Na diária está incluído o café da manhã, que não fica exposto em balcão, como costuma ocorrer em hotéis, mas se pede a cada dia a partir das opções disponíveis. Em geral, tem frutas (mamão, melancia, melão, manga), ovos mexidos, tapioca com recheio a escolher, sanduíche com pão normal e integral, queijos, sucos etc. Gostei todos os dias do café da manhã.
Já no quesito refeições, ou se usa o restaurante da pousada, ou se procura o que há no entorno. Fui conhecer o restaurante do Enildo,mas no dia em que fui havia muita mosca, e todos tivemos que comer com aquele fumacê nas mesas, para espantar as famigeradas. Achei que ia comer peixe fresco, mas era meio sem gosto tudo, e caro também, não curti.
Já na pousada, o que achei interessante foi um creme de legumes feito pela ajudante do chef, mas não o que ele faz - são dois pratos inteiramente diferentes, se feito por um, ou pela outra. Acabou rolando um certo stress com esse chef, e eu perdi uma chance de ouro de ser delicada. Por essa cena: depois de um certo clima tenso por conta de modos diferentes de trabalhar, me indispus com ele nem me lembro exatamente por quê. Uma noite, cheguei no restaurante para comer uma pizza, que já havia pedido, e havia uma mesa com uma flor, das inúmeras que ele me vira fotografar ao longo de minha estadia. Achei que era uma mesa reservada para o casal de franceses, e a flor era para Micheline, a linda senhora de cabelos brancos como os meus, e mega gentil. Olhei a flor, senti ciúmes, e me peguei pensando - quem manda ser irascível, e sentei-me uma mesa à frente. Jantei, agradeci e elogiei o que ele havia feito, e fiquei mais um pouco ao final da refeição - a tempo de ver que ninguém havia sentado na mesa com a flor, e quando me retirei, ele também retirou a flor (quando entendi, quase chorei. De todo modo, sempre haverá aquela flor em minha memória, seu gesto, e minha dúvida).
Outra opção interessante para quem vai sozinho, e não tem com quem dividir as refeições, acabei descobrindo no restaurante que fica ao lado da Pousada, o Angá Beach Hotel, que tem um espaço imenso com mesas que atendem também a não hóspedes. O cardápio oferece opções interessantes para crianças, a um preço realmente em conta - o prato é bem pra criança mesmo, mas se não for comer muito,achei ótimo.
Dos passeios, não fui ver o tal peixe-boi marinho, porque achei muito caro, e porque amei ver os peixinhos nos arrecifes de coral. Ia sozinha no barco, com o barqueiro indicado pela pousada, e ele foi gentil de colocar no segundo dia um guarda-sol grande para me proteger, e usei protetor solar forte. Lá, ele me emprestava o snorkel e eu podia ficar embaixo d'água, olhando aqueles lindinhos. Fui duas vezes, e gostei das duas, a despeito do excesso de selfies das pessoas dentro do mar, junto com os peixinhos - as moças quase pediam aos peixinhos pra dar um sorriso para a câmera.
Andei por perto, para conhecer outras pousadas, e as há de todo tipo e preço, desde as mais caras e sofisticadas, até a mais simples e com preço acessível. Nesse segundo time, gostei muito dos Chalés Maresia, que visitei, e achei simpático o dono, interessantes os quartos, e bons os preços.
Voltaria a ficar na Pousada do Sonho, claro, mas há inúmeras outras ao longo da Rota, espalhadas pelos povoados, e creio que a grande escolha aqui é mesmo estar imerso
na natureza, em contato com a tepidez e a imensidão de um mar morno, manso e belíssimo.
Quarto com chão de cimento, muito bom
Espaço de convivência coletiva, bem no meio da pousada, e onde o wi-fi pega melhor.
Frutas do café da manhã.
Vista de dentro do restaurante, durante as refeições.
Varandinha na entrada do quarto.
Vista de dentro do restaurante do Enildo.
Olhando de dentro do espaço de convivência, um lugar fresco e agradável de se estar, e onde se conversa com os outros hóspedes.
Mapa da Rota Ecológica, com seus vários povoados, e algumas pousadas. Clique para ver melhor.
Pousada do Sonho: cada diária saiu, em março de 2016, por R$ 180,00. Do total, metade deve ser paga por depósito bancário no dia da reserva.
Transfer do aeroporto até a pousada, em torno de uma hora e meia, feito pelo jovem e simpático João Carlos, com quem a gente conversa e não vê o tempo passar, ficou por R$ 180,00, mas o preço regular é 200,00.
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