quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

A vida secreta de Walter Mitty

Não sei se por estar vivendo uma experiência nova em minha vida, numa fase não tão nova; ou se porque estou, nesse momento, meio em trânsito existencialmente, com as coisas que nos constituem em suspensão, em estado de espera, o fato é que achei A vida secreta de Walter Mitty  (Ben Stiller, 2013) um filme sensacional - uma ode à  imaginação, às transformações, à ousadia, ao cinema, sobretudo ao cinemão norte-americano, em seu melhor nível, aquele dos efeitos especiais, dos super poderes, mas  também o cinema de invenção, de bons intérpretes e ótimas atuações; de mocinhos e causas nobres, valores altos e trabalhos dignamente realizados.

Além disso tudo, tem os atores perfeitos em seus papéis, do protagonista-diretor-produtor Ben Stiller, comovente em seu intento de fazer uma mega produção com alma, coragem e competência; à mãe, interessantíssima em sua cumplicidade com os filhos e seu bolo poderoso, vivida por Shirley MacLaine, uma lenda que se oferece ao espectador com generosidade e grandeza; à amada, eleita por Mitty, vivida com meiguice por Kristen Wiig.

E à homenagem ao cinema, ao grande cinemão de ação e sonhos, soma-se a homenagem à fotografia, ao jornalismo feito por gente grande, ética e profissional, representado pelo fotógrafo vivido - eu tenho que usar o adjetivo: magistralmente - por Sean Penn. Ele demora a aparecer, mas quando aparece (brevemente) sintetiza muito do que o filme pode significar, uma luz grande se abre em torno de tudo, ele mesmo está tão poderosamente belo, com suas rugas e sua sabedoria de intérprete, fazendo um personagem afeito a extremos, e a belezas extremas, que ficamos meio sem ar, com os dois lá no alto da montanha, tocaiando a beleza breve que passa em forma de tigre raro (e uma frase-anátema, algo como 'a beleza não tem pressa em mostrar-se'), e deixando-se viver o instante-aquele, no momento em que acontece: achei uma das cenas mais poderosas do filme, que condensa uma de suas fortes vertentes: a vida é aqui, e agora.

Um filme que nos faz querer mudar - o mundo, a vida, o destino, as vontades. Muito bom, e um prazer enorme de ver.

PS. Durante todo o filme, desejei ter feito parte da história do cinema deles, de ter estudado a sério o métier, de ter realizado alguma obra de peso e ter passado uma temporada aprendendo com os bons em boa Academia. Pensava em Sundance, talvez pela presença de MacLaine, ou seja, da própria história do cinema norte-americano, junto com seu irmão Warren Beatty. E em Robert Redford. Enfim, divagava.


sábado, 21 de dezembro de 2013

It's raining cats and dogs

Em Vila Velha, desde que aqui pus os pés, e as mãos, e todo o corpo e a mente, chove, chove muito, chove insistentemente água de temporal, que alaga as ruas e impede o trânsito de carros, e táxis são carros que desaparecem tão logo a chuva aperta seu passo, de modo que meus passos estão restritos, e se consigo um táxi para o que quer que seja preciso pedir que ele me espere, ou não terei outro para voltar para onde quer que seja.

De qualquer modo, estou sentindo como se Iemanjá estivesse exageradamente me saudando, e me abençoando, e agradeço. Sei que as pessoas humildes e simples, que moram em áreas de risco, estão absolutamente desamparadas, perderam suas coisas e casas, precisam de ajuda, e o prefeito da cidade, o homem que deveria estar aqui para dar suporte e apoio e cumprir o dever para o qual foi eleito e ganha salário, viajou na quinta feira para Nova Iorque, para ver de perto a neve dos ricos.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Tá certo

Eu fico muito impressionada com o seguinte: sessenta e oito pessoas, até hoje, ou camundongos, ou dogs, ou frestas de janela ou porta entraram para ler ou passar os olhos ou sem querer esbarraram aqui na postagem sobre Azul é a cor mais quente. Nenhum ou nenhuma quis ou teve vontade ou se animou a dizer um simples: oi.

Tá certo.

Atualizando: cento e um fantasmas mudos em 28/12 - que coisa esquisita.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Indo e vindo



Indo para Vila Velha. Indo e vindo, parece que assim será. Outras plagas também estão nos planos. Planos andando.

sábado, 7 de dezembro de 2013

Azul é a cor mais quente (com spoilers)

Sem sombra de dúvida é um filme corajoso, e longo - e excessivo, esse de Abdellatif Kechiche (2013), com a dupla Léa Seydoux e Adèle Exarchopoulos, ambas fortemente empenhadas no projeto, como se verá nas telas. Uma história de amor, por um lado clássica, com direito a todos os capítulos que tais histórias comportam: paixão arrebatadora, sexo selvagem, enjoo momentâneo de uma das partes, traição por bobeira, abandono sem querer, abandono por escolha, choros e ranger de dentes. E, claro, cenas de sexo lésbico fortes, intensas, interessantes. Mas...

Primeiro, a personagem Adèle, a mais jovem, chora demais, e tem uma boca estranha, e um olhar excessivamente pedinte, e carente e... não dá, esse mundo dos excessos e intensidades das paixões, assim eviscerado ao olhar do espectador, não me pertence, minha sensibilidade enjoa daquele festim de intensidades desenfreadas, mesmo reconhecendo que está tudo certo, é assim mesmo, não se ama nesse tempo em tom menor. Já a personagem de Léa Seydoux, Emma, aparece mais contida, não apenas porque mais madura, mas porque é a parte que lhe toca na relação, e isso rende um personagem mais interessante a meu olhar - mais rico, mais bonito, mais forte, mais sabendo o que quer. Mas, não impede que - segundo -, algumas conversas soem datadas, figurando uma cultura tipicamente francesa no sentido mais artificial - citar Sartre, os papos sobre pintura, Klimt, Picasso etc, tudo meio solto, meio vago mas querendo engatar uma imagem ao mesmo tempo de palco um tanto ilustrado e de conversa-que-quer-impressionar-em-seus-começos, que meu olho captou como 'ai, que cansaço'.

De resto, achei mesmo cansativo todo o processo, e algumas falhas como o sumiço da família da jovem a partir da comemoração dos dezoito anos; ou a vocação irreprochável para o magistério que a atuação nega, no ar blasé com que a professora administra (mal) a aula e o ditado. Mas há cenas bonitas, claro, algumas excelentes mesmo - as de sexo, por exemplo, são, como direi - didáticas?; as de dança da moça que chora, mas que dança muito belamente; a cena no bar, ótima tentativa de retomada frustrada, embora o escorrido do nariz da jovem tenha me incomodado terrivelmente (aliás, o modo dela mastigar também); e a cena final, quando afinal ela sai da relação e engata outra marcha no passo de sua vida. Gostei muito que o rapaz não a tenha visto, que ela tenha seguido sozinha sem a companhia dele - de outro modo teria sido uma traição ao filme, acho.

****

E o texto me pareceu melhor.