domingo, 30 de agosto de 2009

Indignação - Roth

Indignação - Philip Roth

Primeiro, as coisas de que não tenho gostado na literatura de Roth: uma certa exacerbação das pesquisas, sejam elas de natureza histórica, como se dá aqui, sejam as de caráter científico, porque acho que a ficção perde sempre, mesmo quando o texto ganha numa certa acurácia. 

No caso desse romance, o autor chega mesmo a colocar no final uma "Nota histórica", em que ele situa e explica as transformações sociais que, na década de 60, chegaram à "preconceituosa e apolítica Winesburg", bem como faz várias observações, logo depois dessa Nota (no que ele chama de "Créditos") sobre a tradução do hino nacional da China utilizada no corpo do texto; sobre o fato de que "a maior parte do diálogo atribuído a Marcus Messner nas páginas 79-81 é reproduzida praticamente ipsis litteris da palestra de Bertrand Russel" e ainda sobre a literalidade das citações de um tal livro The growth of the American Republic.

Nada disso tem muita importância para a ficção ela mesma, e esse tipo de comentário não acrescenta absolutamente nenhuma qualidade extra que o romance já não tenha, com o agravante de que fragiliza o pacto de não-verdade com o leitor que uma boa obra precisa estabelecer em bases bem sólidas (só como exemplo, para estar no espírito do pacto investigativo que tais pesquisas propõem, fui ao google para ver se realmente existia a tal Winesburg University e encontrei uma outra de nome bem semelhante, cuja frase de apresentação em sua homepage diz o seguinte: As a Christian institution, Waynesburg University believes that faith, learning and serving are interconnected parts of a greater whole. Our students lay foundations for lives of purpose and impact. Welcome to a dynamic community that proudly states, "I am Waynesburg University!").

Esse é o mesmo espírito que preside as falas do diretor da instituição ficcional, e que de algum modo provocam as reações mais exaltadas e as falas mais apaixonadas do protagonista na defesa intransigente de sua própria liberdade de pensar, de agir, agnosticismo incluído, mas existir ou não o modelo deixa de ser relevante face às cenas inventadas a respeito das querelas morais e religiosas do personagem.

Outro dado que, a meu ver, fragiliza o romance de Roth é a presença excessiva da cultura americana do Norte, suas traços estão profundamente arraigados em sua prosa, diria que o autor fincou os dois pés nessa tradição e é de lá que arma suas tramas, muito boas, é verdade, mas ainda assim com um certo ar local.

Mais um senão, esse ligado ao problema da 'pesquisa, é que para tratar da família de um açougueiro (pai, mãe, filho) - e um açougueiro kosher - Roth dá um banho de sangue na narrativa, e os cortes, as matanças de animais, o torcer de pescoço das aves, tudo remete a um excesso de sangue que não (me) interessa muito, e a impressão que dá é que ele estudou direitinho a lição, compreendeu por dentro a mecânica dos cortes para poder escrever sobre o assunto - só que deixou a marca desse domínio na narrativa, como um molde um tanto vazado.

Então, o que me fez ler Indignação até o final, e ler com vontade (mas nem tanto prazer), foi o que sempre me parece ser o melhor dele: a linguagem, a capacidade de contar histórias com domínio técnico da escrita, de modo que a gente segue os fios narrativos, engrena todas as tramas, mesmo quando o romance termina por um resumão, numa espécie de último lance - sob o título "Saindo de baixo" -, em que o autor explica em quatro páginas o fim trágico do protagonista, em sua inapelável opção pela guerra.

Trecho:

"Cresci cercado de sangue - sangue e sebo, afiadores de faca, máquinas de fatiar e dedos amputados em parte ou por inteiro nas mãos de meus três tios, assim como na de meu pai -- e jamais me acostumei com isso, jamais gostei disso. O pai de meu pai, morto antes de eu nascer, foi um açougueiro kosher (era o Marcus cujo nome herdei e que, devido a sua perigosa ocupação, não tinha metade de um polegar), como o eram os três irmãos de meu, pai, tio Muzzy, tio Shecky e tio Artie, cada qual dono de uma loja semelhante à nossa em locais diferentes de Newark. Sangue nos estrados de madeira que ficavam atrás dos mostruários refrigerados de porcelana e vidro, sangue nas balanças, nos afiadores, margeando o rolo de papel encerado, no bocal da mangueira que usávamos para lavar o chão da geladeira - o cheiro de sangue era a primeira coisa que eu sentia quando ia visitar meus tios e tias em suas lojas." (p. 35).

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Philip Roth. Indignação. Trad. Jairo Dauster. São Paulo: Cia das Letras, 2009.


quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Jack London

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Há anos atrás, quando lecionava teoria da literatura, costumava trabalhar em todos os cursos iniciantes com um conto de Jack London chamado "A histórica de Keesh". Essa leitura vinha acoplada à de um texto teórico de Walter Benjamin chamado "O narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov", em que se discutem noções ligadas à experiência, ao saber comunitário que passa de pai para filho, à tradição, enfim, organizadas em torno do que ele chama de representantes arcaicos, nas figuras do camponês sedentário, do marinheiro e do artífice, embriões dos futuros narradores. Há momentos muito belos no texto de Benjamin, e (quase) todo ele é muito bom de ler. Por exemplo, quando fala da natureza da verdadeira narrativa, diz que "ela tem sempre em si, às vezes de forma latente, uma dimensão utilitária.
Essa utilidade pode consistir seja num ensinamento moral, seja numa sugestão prática, seja num provérbio ou numa norma de vida - de qualquer maneira, o narrador é um homem que sabe dar conselhos. Mas, se 'dar conselhos' parece hoje algo de antiquado, é porque as experiências estão deixando de ser comunicáveis." (p. 200).


Então, o conto de Jack London, mais do que o Leskov com que Benjamin trabalha, vai palmilhar os conceitos à perfeição, numa história muito singela e bonita. Trata-se de um ritual de passagem de um menino (índio) para a vida adulta, e do que será necessário fazer para obter o respeito dos mais velhos e encontrar seu lugar na tribo. O conto é simples, a linguagem de London é de um classicismo magnético e há sempre alguma moral em suas histórias, sem que isso torne pesada a narrativa, ou menos interessante o seu final.


De todo modo, tudo isso é para chegar a A praga escarlate, uma novela curta, que comprei por curiosidade e pra ler enquanto faço fisioterapia no joelho. Já terminei (a novela, não a fisio) e gostei muito. Quem conhece a história pode supor que sou definitivamente macabra, mais do que meramente masoquista...:) pois se estamos vivendo a tal pandemia, de que tenho horrores de medo, tinha mesmo de ler uma história que fala do fim da humanidade por causa de uma peste vermelha, que mata todo mundo em questão de minutos? Pois é, mas é London quem conta, e conta tão bem que não resisti (igual ao pombo que marca encontro com a pomba, e não resiste à beleza da paisagem, em Paulo Mendes Campos) e tive de ir lendo, ir lendo, até... bom, mas há esperanças, pois ainda sobraram o narrador e mais uns três ou quatro para recomeçar toda a saga humana, olé...


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Jack London (1876 - 1916). "A história de Keesh". In Os melhores contos de Jack London. Círculo do Livro, s/d.


____. A praga escarlate (1912). Trad. Roberto DeNice. Ilustrações Gordon Grant. São Paulo: Conrad Editora do Brasil, 2003. Clássicos Conrad.


Walter Benjamin. O narrador. Considerações sobre a obra de Nikolai Leskov. In: Magia e técnica, arte e política. Trad. Sergio Paulo Rouanet. São Paulo: Brasiliense, 1987, p.197-221.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Fantasma sai de cena

Fantasma sai de cena. Philip Roth.

Muita gente já escreveu sobre o livro de Roth, que saiu aqui em meados de 2008, por isso vou apenas pontuar algumas questões que me tocaram em especial.


Primeiro, o fato de ele tratar, entre outras coisas, da velhice, da decadência física, da doença e da morte sem qualquer vestígio de complacência ou pieguice. O narrador-protagonista, um homem de 71 anos que tem incontinência urinária, fruto de um câncer de próstata, volta a Nova Iorque depois de um retiro de 10 anos vivendo e escrevendo num vilarejo, para tentar um tratamento que o libere das fraldas. Mas a vida lhe reserva surpresas inesperadas: ele se apaixona por uma jovem mulher casada e se abisma face ao desejo inesperado, que não supunha ainda possível.


Há vários aspectos interessantes no livro, e um dos traços de sua literatura - a metaficção - aqui aparece não apenas como técnica utilizada em determinados momentos, mas como tema, pois uma das tramas do romance diz respeito à feitura da biografia de um escritor amigo do protagonista, e este se opõe ferozmente ao projeto do jovem carreirista, batendo de frente com ele ao longo de todo o romance, até porque esse rapaz seria, em princípio, amante da mulher por quem ele se apaixonara.


De todo modo, será uma longa carta de protesto escrita então pela ex-amante (Amy Bellette) do escritor morto, para uma revista, que trará para o leitor uma posição muito clara e argumentos convincentes a respeito dos malefícios que os estudos culturais e, por extensão, a prevalência da biografia, de episódios da vida do escritor sobre o escrito, trouxeram para os estudos literários. Um trecho dela:


Antigamente as pessoas inteligentes usavam a literatura para pensar. Esse tempo passou. Durante o período da guerra fria, na União Soviética e nos seus satélites na Europa Oriental, eram os escritores sérios que eram expulsos da literatura; agora, nos Estados Unidos, é a literatura que foi expulsa como influência séria sobre a percepção da vida. Hoje em dia, a maneira mais comum de utilizar a literatura, tal como se vê nas páginas de cultura dos jornais mais esclarecidos e nos departamentos de letras das universidades, é tão avessa aos objetivos da literatura criativa e às compensações que ela proporciona ao leitor de mente aberta, que seria melhor se a literatura não tivesse mais nenhuma utilidade pública.

O jornalismo cultural do seu jornal - quanto mais abundante ele se torna, pior fica. Assim que assumimos as simplificações ideológicas e o reducionismo biográfico do jornalismo cultural, a essência do artefato se perde. O seu jornalismo cultural não passa de fofocas de tablóides disfarçadas de interesse pelas 'artes', e tudo aquilo que ele toca se reduz ao que não é. Quem é a celebridade, qual é o preço, qual é o escândalo? Quais as transgressões que foram cometidas pelo escritor, e não contra as exigências da estética literária, mas contra a filha, o filho, a mãe, o pai, o cônjuge, a amante, o amigo, o editor ou o animal de estimação? (p.177).



Vejo aqui muito das diatribes vociferadas por Harold Bloom contra os estudos culturais e a crítica feminista nos departamentos universitários norte-americanos, há alguns anos atrás. Acredito que Roth inspirou-se nas idéias dele para escrever essa carta por sua personagem, e ela só não se transforma em libelo, ou prejudica o romance por seu caráter excessivamente "de tese" porque está dentro do contexto temático do romance, não se trata de cena meramente periférica.


A crença nos malefícios da 'pesquisa biográfica' em detrimento do valor literário da obra é um dos pilares da estrutura do romance, e ela se amalgama naturalmente ao projeto do protagonista, que se propõe metas bastante difíceis em sua volta à cidade grande: ele busca a cura para sua doença, mesmo conhecendo sua intangibilidade; ele se apaixona perdidamente por uma jovem (casada), mesmo sabendo da impossibilidade de um desfecho satisfatório para sua paixão; ele luta contra os modos e as modas (culturais) do tempo, sabendo de antemão ser uma briga inútil.


E porque há esse caráter quase épico em sua jornada,queremos acreditar também em suas causas, torcemos para que nem tudo desmorone a sua volta, embora saibamos que dificilmente isso deixará de ocorrer.


Quando nada mais dá certo para ele, saímos também da leitura com o mesmo sentimento melancólico que nos domina à leitura de "A máquina do mundo", de Drummond:


"E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco


se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e as aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas


lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e meu próprio ser desenganado,


[...]


A treva mais estrita já pousara,
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,


se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas".


[CDA. A máquina do mundo. In: Poesia e prosa completa. Rio de Janeiro: José Aguilar Editora, 1973, p. 271].



Philip Roth. Fantasma sai de cena. Trad. Paulo Henriques Britto. São Paulo: Cia das Letras, 2008.

sábado, 15 de agosto de 2009

A onda do livro - Escrever, Duras

Um amigo me perguntou outro dia se eu tinha Escrever, da Marguerite Duras, eu disse sim, e fiquei de mandar para ele uma cópia, pois em princípio a obra está esgotada há algum tempo.

Procurando nos vários lugares em que ele poderia estar, acabei achando-o numa prateleira do quarto de empregada e fui reler alguns textos para tentar descobrir qual o interesse do meu amigo, já que ele não quis me contar por telefone (eu mais ou menos entendi por quê, mas quero muito ler o que vai sair daquela mente privilegiada...).

Eu já havia feito menção a esse livro num post de novembro de 2007, mas não havia lido todos os cinco pequenos textos, apenas o primeiro está com algumas anotações e fui ler os outros. No conjunto, trata-se de um tipo de reflexão muito pessoal de Duras sobre o ato de escrever e sobre a criação, com algumas ótimas percepções a respeito dessas atividades, muitas frases belas, tocantes, imagens fortes - e uma irmandade com Clarice nisso tudo, até mesmo na descrição minuciosa da morte de uma mosca, prima-irmã da barata sartreana de Clarice.

Ao fim e ao cabo, é um livro para se ler abrindo em qualquer página, encontrando alguns pensamentos luminosos, outros que são expressão daquela sensibilidade dos à beira de, de que fazem parte Duras, Clarice, V. Woolf, H. Hilst, mulheres-escritoras extremamente angustiadas e talentosas, para quem escrever era um ofício, muitas vezes, penoso - e indispensável como respirar.

Assim, abrindo ao acaso a página 112, leio:

Que existam também animais sem identidade, bolsões inchados e ocos, a doçura de uma pintura muito antiga, que lhes teria dado identidade. Signos com o aspecto de serem coisas. Troncos de árvore que vão embora, disparam. Trechos de serpentes marinhas na umidade das fontes, dos musgos. Jorros, errupções, possíveis aproximações entre a idéia, a coisa, a permanência da coisa, sua inanidade, a matéria dela, da cor, da luz, e Deus sabe o que mais.

Nesse livro, os cinco textos tratam mais ou menos disso: frases intensas sobre sentimentos extremos ligados ao ato de criar, de viver, e também de morrer.

Em alguns momentos, sentimos a peso do tempo nessa escrita, nem tudo flui como há anos, quando escrever como se respira era não apenas uma forma nova de se estar na escrita, mas quase uma postura política daquela que escrevia. Acho que alguma coisa ficou vincada, marcada e já pertence ao passado, mas sempre se encontram momentos de beleza, pequenas intensidades.

Um pouco diverso é o diapasão de romances como O deslumbramento de Lol V. Stein, por exemplo, um dos mais extraordinários livros que já li, ou O vice-cônsul, também deslumbrante.

No fim, Duras me leva para um certo tipo de literatura feita por mulheres com o qual trabalhei durante muitos anos, e me dou conta de que quase não escrevi sobre elas aqui. Quem sabe qualquer dia.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

erva-doce contra gripe

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Eu estou para comentar Fantasma sai de cena há algum tempo, mas faltam forças nesse momento, e por enquanto vai esse texto que recebi por email sobre prevenção caseira da gripe, que eu não sei se funciona, mas erva-doce nunca fez mal a ninguém, não é mesmo?

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Prevenção caseira p/o H1N1

O anis estrelado, amplamente cultivado na China, é o extrato-base (75%), da produção do comprimido Tamiflu, da Roche (empresa do antigo Secretário de Defesa dos EUA Donald Runsfield).
Mas, como é um pouco difícil encontrar o anis estrelado aqui no Brasil, podemos usar o nosso anis mesmo – a erva-doce – pois esta erva possui as mesmas substâncias, ou seja, o mesmo princípio ativo do anis estrelado, e age como anti-inflamatório, sedativo da tosse, expectorante, digestivo, contra asma, diarréia, gases, cólicas, cãibras, náuseas, doenças da bexiga, gastrointestinais, etc...
Seu efeito é rápido no organismo e baixa um pouco a pressão, devendo ser feito o chá com apenas uma colher de café das sementes para cada 200ml de água, administrado uma a duas vezes dia, de preferência após uma refeição em que se tenha ingerido sal.
Ajude a divulgar o uso da erva-doce como preventivo do H1N1, ou mesmo como remédio a ser tomado imediatamente após os primeiros sintomas de gripe, pois seu princípio ativo poderá bloquear a reprodução do vírus e mesmo evitar seu maior contágio.
Porém, pouco ou nada adiantará utilizar a erva-doce após 36 horas do possível contágio pelo H1N1, pois a erva não terá mais força substancial para bloquear a propagação do vírus no sistema respiratório.
Efeitos colaterais: pequena sonolência nas 2 primeiras horas - evitar dirigir e/ou operar máquinas.

Nota: O uso da erva-doce é alternativo e poderá ser até eficaz, mas não substitui a assistência médica necessária.


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domingo, 9 de agosto de 2009

por um fio

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Convidada por uma grande amiga, fomos ver Por um fio, peça baseada em livro de Dráuzio Varela sobre alguns de seus pacientes com câncer terminal, e ao longo da peça me deu muita vontade de ler o livro, porque os esquetes parecem mais textos do que dramaturgia, embora alguns casos contados - como o do irmão do autor, sobretudo - emocionem e façam pensar sobre essa coisa louca que é estar vivo e poder morrer a qualquer instante, uma consciência que um paciente de câncer agudiza, por várias razões, entre elas o inesperado de tudo.


Acho que os melhores momentos da dupla de atores se dá quando entra em cena o ator - Rodolfo Vaz - porque ele encena mais suas falas, muda inclusive o tom da voz, imprime humor ao que diz, enquanto ela - Regina Braga - tem menos êxito em suas dramatizações, embora demonstre um notável domínio da voz e das nuanças de tom ao falar.

De todo modo, algumas histórias realmente tocam, outras passam como se alguém nos contasse sobre esses casos - cada de um de nós já ouviu (ou viveu) algo parecido e se identifica, claro.

Achei muito bom o cenário, mesmo que uma certa platitude se perceba ao sugerir o outono das vidas que se narram com as folhas secas e os bancos vazios da praça - mas é bonito, e serve com louvor aos fins de pontuar o que se desenrola no palco.

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esses dias

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Por medo da gripe suína não fui a Fortaleza, cancelei até mesmo um dia de hospedagem já paga, que ficará de crédito para quando eu puder ir; também não vou ficar na Pousada do Caju, em Alagoas, por cujas fotos me apaixonei, durante mais uma semana de férias escolares, dessa vez não apenas por medo da gripe (sobretudo ter de passar pelo Galeão), mas porque parece que a rótula do meu joelho direito derreteu, e dói que dói.

Estou, ao invés dessas viagens, fazendo um percurso diário até a fisioterapia mais próxima, usando gelo e aguardando que possa andar de novo, ao menos nos arredores. Pelo visto, já é coisa à beça.



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quarta-feira, 5 de agosto de 2009

à deriva


Primeira sessão do Arteplex, poucas pessoas e as que aguardam no saguão não parecem preocupadas com gripe, seja A, B ou C, salvo um senhor de cabelos brancos sentado numa das mesinhas, que segura e abre esse pequeno objeto de plástico que está em todos os aposentos aqui em casa: o potinho de álcool em gel. Uma pessoa apenas, o que me dá um certo reconforto, parece que estou num paraíso infenso a doenças ou a rumores catastróficos.


Quase não tenho o que dizer a respeito de À deriva. Trata-se de um filme sobre valores e esses valores são discutidos dentro de uma família de classe média e de nível intelectual mais ou menos alto (o pai é escritor), com filhos adolescentes e crise aguda entre o pai e a mãe.


Não é um mundo que eu reconheça, ou pelo qual me interesse, e no aspecto técnico nada me chamou a atenção em especial, embora a paisagem de Arraial do Cabo (ou Búzios, não sei), seja muito bonita.


De todo modo, achei sofrível a atuação do casal de adolescentes, e a menina é fraquíssima. A única personagem para quem meus olhos acenaram alguma atenção foi o de Déborah Bloch, que faz uma bêbada e mulher mal amada muito bem: convincente, madura, bonita, boa atriz, a única com alguma existência para mim.


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Sobre A proposta, que vi no mesmo dia aproveitando a bonança, é o mesmo filme que a gente já viu muitas vezes, inclusive com a Bullock, e que essa indústria produz há milênios, portanto o modelo e a forma já foram testados à exaustão, inclusive por aqui, de modo que o resultado é também o que se espera: algumas risadas e um tempo de pura distração, que passa rápido.

sábado, 1 de agosto de 2009

Saltando e pousando

A exposição 'Virada Russa' foca sua atenção na produção artística criada na Rússia desde o começo do século XX até a década de 1930, importante não apenas para a cultura russa, mas para toda a arte internacional daquele período.
O conjunto de obras selecionadas inclui a produção de importantes artistas do período, como Kandinsky, Maliévitch, Chagall, Rodchenko, Tátlin, Goncharova, entre outros. Ao todo, são 123 obras, todas pertencentes ao acervo do Museu Estatal de São Petersburgo. A mostra tem curadoria de Yevgenia Petrova, Joseph Kiblitsky, Rodolfo de Athaydee Ania Rodríguez Alonso.

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Às quatro da tarde, cansada de estar cansada e um tantinho down, saí de casa e fui ao CCBB ver as várias exposições que ali pousam. Sem dúvida, a Virada Russa é uma mega exposição, com trabalhos importantíssimos de artistas idem do começo do século passado.

Se eu disser que gostei de tudo, estarei mentindo. Algumas obras não me disseram muita coisa, outras têm um certo ar de libelo próprio da conjuntura política do país (e do mundo) à época. Mas o quadro "Composição 224", do Kandinsky, emociona ver de perto - cores fortes, intensas, traço inquieto e ardente, me levaram a procurar outras obras dele que não estão na exposição e realmente o homem é fera, muito bom.
(Se eu disser que a sensação é próxima àquela de ver os quadros de Van Gogh ali na sua frente, no Rijksmuseum, em Amsterdam, nos idos da década de 80, vai parecer pedantismo? Então não digo, mas é...:).

Não vou me meter a falar de Construtivismo e Suprematismo porque quem quiser pesquisa na rede sobre tais movimentos, mas havia lá jovens com instrutores explicando os quadros, as épocas, os valores, as circunstâncias em que surgiram os artistas e os estilos. Eu parei e ouvi um pouco, mas adorei não estar "a serviço", seja conduzindo alunos, seja tendo de fazer algum tipo de trabalho sério sobre.

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Outras exposições interessantes: a de fotografias sobre a fome, embora eu tenha muitas restrições a algumas fotos, por demais apelativas; a Rebobine, por favor, cheia de jovens animados com seus filmes, ou querendo fazer um; a das moedas, me senti um dinossauro porque vi notas de cruzeiro que eu peguei na mão, há séculos atrás... são notas e moedas de todos os cantos do mundo, e quando entramos pisamos num mar de moedas, meio aflitivo, não sei por quê... De todo modo, ótima exposição, bem feitíssima. Enfim, o CCBB é festa para a cultura.

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E para aproveitar o embalo, pousei atambém no Oi, futuro para ver mais trabalhos sobre fotografia. Não gostei de uma sala com flashes intensos espocando das quatro paredes, nem de um outro em que a imagem de alguém se choca na parede (muito barulho e flashes intensos, rápidos, não se vê quase nada e a gente quase fica cega), mas gostei de um trabalho em que vários homens estão postados em uma parede e se movem imperceptivelmente quando a gente olha bem. Achei que eles se moviam com o movimento do espectador e fiquei acenando, mas não, eles se movem um tiquinho por si mesmos.

Gostei também de uma exposição de fotos na tela, com depoimentos sobre por que cada um fotografa. Eu também fotografo porque há uns momentos da/na vida que não se repetem, como uma espécie de graça da existência. Quando se consegue captar numa foto um momento desse é muito bom.

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E por fim, o carioca é mesmo muito sem noção: ao final das várias salas da grande exposição do CCBB, já quase na quarta ou quinta seção, gente pra caramba, e uma moça jovem começa a assoar o nariz com força, dava para ver que ela estava bastante gripada... eu só olhei em sua direção e me retirei imediatamente, mas acho o fim alguém ir a um lugar público e em espaço fechado naquele estado, e isso eu acharia mesmo sem o advento da infuenza A. Tá gripado? Fica em casa de repouso, ou então faz programa ao ar livre, mas não leva seus vírus para tantas outras pessoas, é uma questão de civilidade e de boa educação. Enfim, é isso.
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