Salazar, Deus, Pátria, Maria
Peça em um acto, dividido em três cenas
Maria do Céu Ricardo
Prefácio: Fernando Rosas
Posfácio: Fernando da Costa
Capa: António Sapinho
Notícias Editorial, Lisboa, Novembro de 1997
- Sou para aqui uma coisa, Maria para isto, Maria para
aquilo…, passei a vida a servi-lo, sempre à espera, sempre na sombra, a apaparicá-lo…
(Pausa)
- Sempre a pensar que talvez um dia, quem sabe, ele
olhasse para mim para me ver… Não para me dar ordens, olhasse para mim como ele
olha outras mulheres, com outra delicadeza no olhar… Ora!
(Afasta o
pensamento com a mão.)
- A verdade é que nunca pensei que ele um dia deixasse
o governo, habituei-me a vê-lo sempre no poder. Não é o que vem nos livros?
«Quem manda? Salazar! Salazar! Salazar!». Até que apareceu aquele general a
fazer ameaças. (Imita): «Se eu for
eleito, demito-o!? (Repete para si.) – se eu for eleito demito-o!? Olha
que é preciso não ter vergonha… (Pausa.) Bem, também é preciso ter
coragem…! (Pausa) – Mas, se ele o demitisse?
(Vai preparar o
tabuleiro.)
- Falámos disso tanta vez, tanta vez, e ele, que não
me ralasse, que nada me iria faltar, que tinha umas terras, e com as minhas
economias…
(A chaleira apita.
Vai apagar o lume.)
- Quem me comeu a carne, que me roa também os ossos!
(Pausa.) – Trinta e três anos a servi-lo, trinta e três anos a fio, desde a
Casa dos Grilos (começa a partir o pão para as torradas.) Comi o pão que o
diabo amassou.
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