Mostrar mensagens com a etiqueta D.H. Lawrence. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta D.H. Lawrence. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 16 de maio de 2024

POSTAIS SEM SELO

 

Não creio no mundo, nem no dinheiro, nem no progresso, nem no futuro de nossa civilização. Se houver um futuro para a humanidade, terá de ser algo muito diferente do que temos hoje.

D.H. Lawrence

Legenda: pintura de Pieter Bruegel, o Velho

quinta-feira, 14 de março de 2024

OLHAR AS CAPAS


 O Raposo

D. H. Lawrence

Tradução: Alexandre Pinheiro Torres

Capa: Infante do Carmo

Colecção Miniatura nº 143

Livros do Brasil, Lisboa  s/d

Por outro lado, as circunstâncias do estado de guerra eram muito desfavoráveis para a criação de aves. A comida rareava e era má. E quando se passou ao sistema da hora de Verão, as galinhas recusavam-se obstinadamente a recolher ao galinheiro, como de costume, às nove horas no novo horário. Hora realmente muito tardia, pois não havia descanso possível enquanto elas não estivessem bem fechadas e a dormir.

sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

OLHAR AS CAPAS


 As Baleias Não Choram

D.H. Lawrence

Desenho de Diogo Alcoforado

Capa: Armando Alves

Colecção: O Aprendiz de Feiticeiro nº 9

Editorial O Oiro do Dia, Porto, Outubro de 1983

Diz-se que o mar é frio, mas o mar contém
o sangue mais vivo, quente e impetuoso.

Nos grandes abismos são quentes todas as baleias,
quando se agitam
sem descanso e mergulham sob os icebergues.
As verdadeiras baleias, cheias de sémen, com as cabeças
em forma de martelo, prontas a matar,
ei-las lançando do mar os seus jactos violentos, quentes
e brancos.

E balançando-se, balançando-se ao longo das idades sem
tempo da sensualidade,
nas profundidades dos sete mares,
vacilam através das águas salgadas com um prazer
embriagador,
estremecem de amor sob os trópicos
e caminham pesadamente com um desejo maciço e
poderoso, como deuses.
Então o grande touro estende-se sobre a sua noiva
através do abismo azul do mar,
montanha sobre montanha na voluptuosidade da vida:
para além do íntimo rumor do oceano vermelho e oculto
do seu sangue
estende-se a longa ponta do desejo, forte e imensa como
um redemoinho, até repousar
na união, o suave e selvagem encontro do corpo
insondável da baleia fêmea.

E sobre a ponte fálica poderosa, unindo o prodígio das
baleias,
arcanjos em fogo submersos no mar demoram-se
a passar,
de um para o outro lado, arcanjos da felicidade
que vão dele para ela e dela para ele, grandes Querubins
que os acompanham no seio do oceano, suspensos nas
ondas do mar,
grande céu das baleias entre as águas, antigas
hierarquias.

E as enormes baleias mães sonham estendidas, ao
aleitarem as suas crias,
sonham com os seus estranhos e grandes olhos abertos
nas águas do princípio e do fim.

As baleias-touros reúnem as fêmeas e os filhos-bezerros
num círculo
quando o perigo os ameaça, à superficie das marés
incessantes,
e alinham-se como grandes Serafins ferozes, ao
defrontarem o perigo,
rodeando o rebanho dos seus montros de amor.
E toda esta felicidade no mar, entre a água salgada
onde Deus é também amor, mas sem palavras,
e é Afrodite a esposa das baleias,
feliz, plenamente feliz;
Vénus salta entre os peixes e torna-se a fêmea do delfim,
ela, a graciosa e alegre marsuína brincando com o maor
e o mar,
a fêmea do atum redonda e feliz entre os machos,
pesada com o seu sangue cheio de delícia, obscura
felicidade de um arco-íris no mar.

quarta-feira, 11 de maio de 2022

PIANO

Suavemente, na penumbra, uma mulher canta para mim;
Fazendo-me voltar e descer o panorama dos anos, até que vejo
uma criança sentada debaixo do piano, na explosão do prurido das
cordas
E pressionando os pequenos, suspensos pés de uma mãe que sorri
enquanto ela canta.

Apesar de mim, a insidiosa mestria da canção
Atraiçoa-me fazendo-me voltar, até que o meu coração chora para
pertencer
Ao antigo entardecer dos domingos em casa, com o inverno lá fora
E hinos na aconchegada sala de visitas, o tinido do piano o nosso guia.

Por isso agora é em vão que a cantora irrompe em clamor
Com o appassionato do grandioso piano negro. A magia
Dos dias infantis está em mim, a minha masculinidade
É desencorajada no fluxo da lembrança, choro como uma criança
pelo passado.

D.H. Lawrence

sábado, 3 de abril de 2021

SIM, É UMA BOA PERGUNTA


- Sabe, quando eu era mais nova, quando era mesmo nove, a certa altura a situação tornou-se ridícula. Um dia fui apanhada, e foi tão embaraçoso que tive de parar. Costumava pegar nos livros e escondê-los dentro da revista Seventeen para ninguém saber o que eu estava a ler. Mas ultrapassei isso. O embaraço, no caso de ser apanhada, era muito maior do que me limitasse a ler o livro, e por isso deixei de os esconder.

- Que livros escondia dentro da Seventeen?

- Quando fui apanhada tinha treze anos e estava a ler O Amante de Lady Chatterley escondido dentro da Seventeen. Gozaram comigo, mas se o tivessem lido teriam percebido que era muito mais interessante que a Seventeen.

- Gostou do Amante de Lady Chatterley?

- Gosto muito do Lawrence. O Amante de Lady Chaterley não era o meu preferido. Lamento desiludi-lo, mas não o percebi bem naquela idade. Li Anna Kerenina quando tinha quinze anos. Felizmente voltei a lê-lo mais tarde. Fartei-me de ler livros para os quais não estava preparada. Mas não me fez mal nenhum. Sim, é uma boa pergunta, o que lia quando tinha catorze anos. Hardy. Lia Hardy

- Que livros?

- Lembro-me de Tess dos Ubervilles. Lembro-me… qual é o outro? É engraçado. Não é Judas o Obscuro. Qual é o outro?

 

Philip Roth em O Fantasma Sai de Cena

segunda-feira, 19 de agosto de 2019

RELACIONADOS


No tempo da morte de Peter Fonda, uma lembrança, escrita por um tal de Gin-Tonic, e encontrada no blogue Ié-Ié:

EMI RECORDS - SSL 5018

Lado 1

The Pusher (Stepenwolf) – Born To Be Wild (Steppenwolf) – The Weight (Smith) – Wasn’t Born To Follow (The Byrds) – If You Want To Be a Bird (The Holy Modal Rounders)

Lado 2

Don’t Bogart Me (The Fraternity Of Man) – If Six Was Nine (The Jimi Hendrix Experience) – Kyrie Eleison Mardi Gras (The Electric Prunes) – It’s Alright Ma (Roger McGuinn) – Ballad Of Easy Rider (Byrds)

Há cenas de filmes que nos perseguem pela vida.
Como por exemplo aquela de um ainda desconhecido Jack Nicholson a sair da prisão em “Easy Rider". Era um cliente habitual da casa pelas suas costumadas bebedeiras.

Wyatt e Billy são presos por desfilarem de mota, sem terem licença para tal, no meio de uma parada do Carnaval de New Orleans. Batem com os costados na mesma cela onde está o Dr. Hausen.

Hausen é um advogado, filho de boas famílias e a quem, pela manhã, os policias levam uma aspirina para aliviar a ressaca.

Billy - Achas que consegues tirar-nos daqui sem problemas?

Hausen: Se não mataram ninguém, não há problema. Desde que não tenha sido um branco.

Por 25 dólares são postos em liberdade. Já na rua, Hausen saca do bolso do casaquinho branco uma garrafa de whisky.

Isto é para começar o dia, amigos.

Ergue a garrafa aos céus e grita: Ao velho D.H. Lawrence.

Bebido o gole de whisky faz um esgar trágico de sentir o mundo a desabar em cima dele e bate com o braço no corpo gritando “nique, nique, nique” fornecendo o informe que se trata de um grito índio.

Tem um cartão no bolso da “Casa das Luzes Azuis” de Madame Tinkertoy, “o bordel mais chique de toda a região do sul”.

Seria bom irem até lá. Partem os três estrada fora, nas suas lindíssimas motas, enquanto, em fundo, se ouve os Holy Modal Rounders a cantar “If You Want To Be a Bird” e as paisagens da América profunda vão desfilando, as estradas de que Luís Mira fala nas suas “Crónicas da América”.

“Easy Rider” é um filme realizado, em 1969, por Dennis Hopper que, juntamente com Peter Fonda o interpreta. É o filme de uma geração.

Eles não têm medo de ti, têm medo do que tu representas – a liberdade!

Dennis Hopper morreu sábado vítima de cancro. Tinha 72 anos. Um tipo com mau feitio, dizem, mas um artista de gabarito: escritor, pintor, fotógrafo e coleccionador de Arte.

Há uns tempos dele aqui falámos a propósito de “Blue Velvet”, do David Lynch. Uma das suas últimas aparições em público deu-se em Março deste ano, para receber uma estrela com o seu nome no passeio da fama de Hollywood, a número 2.403.

Confessou: diz-me muito, acreditem!

Por ele, fica aqui a capa da banda sonora de “Easy Rider” e também o disco dos Byrds, “Ballad of Easy Rider".

Chega um tempo em que os degraus são só de descida. Também não sabe por que carga de água, pelo meio da prosa, se foi lembrar do Guy Debord.

É quase um rapaz da mesma geração, quando nasceu tinha o Guy 14 anos. O seu livro “A Sociedade do Espectáculo” foi assim como que uma bíblia para os que, em Maio de 68, andaram pelas ruas de Paris para que os tempos mudassem.

Algures deixou escrito algo que Dennis Hopper teria gostado de ouvir: embora tenha lido muito, bebi mais. Escrevi muito menos do que a maior parte das pessoas que escrevem; mas bebi muito mais do que a maioria das pessoas que bebem.



terça-feira, 21 de março de 2017

POSTAIS SEM SELO


A vida é só uma, e se se perde o autocarro fica-se sozinho no passeio com a carga de todos os fracassos.

D.H. Lawrence em O Amante de Lady Chatterley

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2017

OLHAR AS CAPAS


O Amante de Lady Chatterley

D. H. Lawrence
Prefácios: Harry T. Moore e D. H. Lawrence
Tradução do inglês: António R. Salvador
Ilustrações: Cipriano Dourado
Edições Delfos, Lisboa, Agosto de 1975

Aos quinze anos tinham sido mandadas para Dresden, para estudar música, entre outras coisas, e aí passaram uns tempos muito agradáveis. Viviam livremente entre estudantes, discutiam com os homens filosofia, sociologia e arte, e eram tão boas como eles, iu melhores ainda, pelo facto de serem mulheres.

domingo, 29 de janeiro de 2017

SEM PERDER A BASE POPULAR



25-2-63

Preciso de ler, um dia, Lawrence e Flaubert - «O Amante de Lady Chatterley» e «Madame Bovary».
Estive a pensar que preciso de melhorar a m/linguagem, elevando-a de modo a poder descrever situações, ambientes e personagens mais ricos e complexos, mas sem a tornar ininteligível ou menos concreta e sem perder a base popular... (para isso era preciso trabalhar muito... e a preguiça!)

José Luandino Vieira em Papéis da Prisão


terça-feira, 28 de agosto de 2012

FRAGMENTOS


Possivelmente, Marilyn Monroe fez mais esforços para ler o Ulisses de James Joyce do que muita gente que diz que o leu e nunca acabou, ou sequer começou.

Por mim falo e digo que nunca o acabei e poucos esforços tenho feito para que lhe conheça o meio quanto mais o fim.

Em 1999, o exemplar de Ulisses que pertenceu a Marilyn Monroe, foi vendido por 7100 euros num leilão da Christie's.

A sua biblioteca era constituída por perto de quinhentos livros.

O já citado Ulisses estava por lá, e tinha por companhia obras de Dostoievesky, Jack Kerouac, Yeats, Samuel Beckett, Tolstoi, Walt Whitman, Rainer Maria Rilke, Bernard Shaw, Ernest Hemingway, Tennessee Williams, D.H. Lawrence, F. Scott Fitzgerald, John Steinbeck.

Marilyn Monroe deixou um inventário que inclui fotografias, recortes de jornais, poemas, frases, cartas, notas várias.

Os papeis e fotografias datam de 1943, e vão até aos dias que antecederam a sua morte.

Parte de todo este material foi publicado em livro, no final do ano passado, nos Estados Unidos. Os editores chamaram-lhe Fragments: Poems, Intimate Notes, Letters.

Do mundo de lendas que sempre envolveram, e envolvem, Marilyn, conta-se que um dia, em conversa com um amigo, terá tirado do bolso, um pequeno diário de capa vermelha a que chamava o seu livro de segredos.

Nesse livrinho, entre muitas outras coisas, falava dos planos de Kennedy para matar Fidel de Castro, de testes atómicos, das relações de Frank Sinatra com a Máfia, do movimento dos negros pelos direitos de igualdade, conversas que Marilyn ouviu enquanto conviveu com os Kennedys.

Naturalmente este livro de segredos não consta de Fragments: Poems, Intimate Notes Letters.

Diz, quem já o leu, que Fragments, não é a essência da literatura,  mas permite concluir que Marilyn não foi, exclusivamente, a loura burra que que a indústria de Hollywood construiu e impingiu à opinião pública de todo o mundo.

Um símbolo sexual torna-se um objecto. Eu detesto ser um objecto disse a actriz.
O escritor António Tabucchi  (1943-2012), escreveu o prefácio para a edição francesa do livro,  e observa:

No interior deste corpo vivia a alma de uma intelectual e poeta de que ninguém tinha um pingo de suspeita.

Nos filmes que Billy Wilder realizou com Marilyn, opinião minha, os melhores dos seus filmes, a actriz fez a cabeça em água a Wilder, mas este sabia o diamante que tinha entre mãos:

Penso que ela é a melhor actriz cómica ligeira que temos no cinema hoje em dia, e qualquer pessoa sabe que a comédia ligeira é o mais difícil dos estilos de representação.

Deus deu-lhe tudo.

Obviamente que Billy Wilder, sabia do que falava.

No diário das filmagens do Let’s Make Love , Marilyn confessava:

De que é que eu tenho medo? Porque é que tenho tanto medo? Porque penso que não sei representar? Sei que sei representar, mas tenho medo. Tenho medo e sei que não devo ter, e não quero ter. Mas tenho.

Em 1948, Tom Kelley fotografou-a nua sobre veludo vermelho, que daria lugar ao celebérrimo calendário das paredes de todas as garagens do mundo.

Quando muitos anos mais tarde, um jornalista perguntou-lhe se ela não se envergonhara da ousadia de ter posado para Tom Kelley, Marilyn respondeu:

Tinha fome!

E, sarcasticamente, não deixou de acrescentar:

Porquê? Não gosta do vermelho?

Sabe-se, ou pensa-se que se sabe, que todos morremos a cada dia que passa.

Mas os dias de Marilyn foram tecendo o suicídio organizado em que a sua morte se transformou.

O tal seu livro dos segredos, o livro de capa vermelha, constituía material demasiado perigoso para que, impavidamente, o clã kennedyano assistisse à possibilidade de se tornar público.

Tenho a certeza de que acabarei louca se continuar a viver neste pesadelo, terá dito a actriz naqueles seus tempos de depressão, que irão culminar na noite em que tomou todos os tubos de comprimidos que tinha e não tinha, tal como sugere Ruy Belo no poema que dedicou à sua morte.

Poderá perguntar-se:

Tomou?