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2.6.15

Adriano Nunes: "A música e Israel"




A música e Israel


Certamente os raivosos de plantão e os que levantam bandeiras para tudo (sem nem saber por que as levantam!) devem estar-se questionando: qual das atitudes seria a pequena e mais mesquinha: cantar ou não cantar em Israel. Aqui, pelos ditames da razão, derrubo as bandeiras e dou vez à arte, respondendo: pequeno e mesquinho é deixar de cantar em qualquer lugar! Levar a música onde quer que se possa não é ato de compactuar com formas e sistemas de governo. Ou ações governamentais. A arte é uma finalidade sem fim. E, por ser sem fim, é que pode atender a todas as expectativas humanas, pois através da sua amplidão e beleza é capaz de mudar o mundo, tornando-o civilizado e melhor. Assim, a música, não só atinge os ouvidos, mas o coração. Arte panfletária impregnada de política não é arte. É manifesto. A arte é livre e sempre será. Agrada gregos, troianos, palestinos, israelitas, árabes, russos, todos, de algum modo. Canta-se em momentos de alegria ou de dor. Evitar cantar em qualquer lugar é tomar o lugar como inexistente. É negar a um povo a dignidade humana. Logo, pedir a plenos pulmões que Caetano Veloso e Gilberto Gil não cantem em Israel é alimentar a discórdia e tomar partido, numa situação que não pode ser medida sob o simples olhar da retaliação. Só os israelitas e palestinos sabem bem quem eles são. E porque agem dessa maneira uns com os outros. Se a paz ainda não veio, é porque ainda há muito que se fazer por ela. E uma das formas da paz surgir é evitar esses bloqueios e campanhas mesquinhos, tanto pra um lado como para o outro. O artista é um ser livre. Sua liberdade consiste justamente em conseguir amar as diferenças. Respeitá-las. Bálsamo será o canto dos baianos em Israel. Talvez, alcance até os palestinos. Ambos não estarão, ali, a dizer que apoiam guerra alguma, pois como diz belamente Gil em "A paz": "a paz invadiu o meu coração/ de repente me encheu de paz/como se o vento de um tufão/arrancasse os meus pés do chão/onde já não me enterro mais". Esse "não me enterro mais" denota que nós, seres humanos, somos de todos os lugares. E, por não pertencermos a um só lugar, não temos que levantar bandeira contra um lugar específico. Que Gil e Caetano cantem. E que seus cantos ecoem cosmo afora e anulem os pensamentos mesquinhos e repletos de ódio e retaliações. A arte é uma mistura humana inclassificável.


Adriano Nunes