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8.12.14

Jorge Luis Borges: de "O credo de um poeta"





Tenho para mim que sou essencialmente um leitor. Como sabem, eu me aventurei na escrita, mas acho que o que li é muito mais importante que o que escrevi. Pois a pessoa lê o que gosta -- porém não escreve o que gostaria de escrever, e sim o que é capaz de escrever.



BORGES, Jorge Luis. "O credo de um poeta". In:_____. Esse ofício do verso. Organização de Calin-Andrei Mihailescu; tradução de José Marcos Macedo. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

27.9.12

Ítalo Calvino: de "Por que ler os clássicos"



Segunda proposta de definição de "clássico":


Faz alguns anos, Michel Butor, lecionando nos Estados Unidos, cansado de ouvir perguntas sobre Emile Zola, que jamais lera, decidiu ler todo o ciclo dos Rougon-Macquart. Descobriu que era totalmente diverso do que pensava: uma fabulosa genealogia mitológica e cosmogônica, que descreveu num belíssimo ensaio. Isso confirma que ler pela primeira vez um grande livro na idade madura é um prazer extraordinário: diferente (mas não se pode dizer maior ou menor) se comparado a uma leitura da juventude. A juventude comunica ao ato de ler como a qualquer outra experiência um sabor e uma importância particulares; ao passo que na maturidade apreciam-se (deveriam ser apreciados) muitos detalhes, níveis e significados a mais. Podemos tentar então esta outra fórmula de definição:


2 Dizem-se clássicos aqueles livros que constituem uma riqueza para quem os tenha lido e amado; mas constituem uma riqueza não menor para quem se reserva a sorte de lê-los pela primeira vez nas melhores condições para apreciá-los.



CALVINO, Ítalo. "Por que ler os clássicos". In:_____. Por que ler os clássicos. Trad. de Nilson Moulin. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

2.5.12

Carlos Drummond de Andrade: de "A vida passa feito um avião supersônico"




Uma pessoa que tem hábitos intelectuais ou artísticos, uma pessoa que gosta de música, uma pessoa que gosta de ler nunca está solitária, nunca está sozinha. Terá sempre uma companhia: a imensa companhia de todos os artistas, todos os escritores que ela ama, ao longo dos séculos.



ANDRADE, Carlos Drummond de. "A vida passa feito um avião supersônico". Entrevista a Geneton Moraes Neto. In: MORAES NETO, Geneton. Dossiê Drummond. São Paulo: Globo, 2007.

28.4.10

Curso "Como ler um poema", no POP, no Rio de Janeiro



Polo de Pensamento Contemporâneo: Rua Conde Afonso Celso, 103 - Jardim Botânico - CEP 22461-060 Tel. (21) 2286-3299 e 2286-3682

Curso iniciando no dia 04 de maio
Inscrições pelo tel. (21) 2286-3299 ou pelo site
www.polodepensamento.com.br


COMO LER UM POEMA
com Antonio Cicero


A leitura de um poema, mesmo quando efetuada em voz baixa ou interior, não se compara às demais experiências de leitura. Ela deve ser progressiva e regressiva, levando em conta todos os elementos semânticos e sintáticos, formais e materiais, descritivos e alusivos de que o poema é composto.Do contrário, o poema não é fruído como obra de arte: não é fruído como deve sê-lo.

O curso “Como ler um poema” pretende, através de abordagens exemplares de alguns dos maiores poemas da literatura universal e brasileira, indicar como se deve ler um poema para fruí-lo enquanto obra de arte.

Para todos os interessados em literatura

4 aulas, terças-feiras:
4, 11, 18 e 25 de maio

19h30 - 21h30

Valor: R$ 320,00
50% na inscrição, 50% em cheque pré-datado para até 30 dias

8.4.10

Curso "Como ler um poema"




COMO LER UM POEMA
com Antonio Cicero

20 a 23 de abril
terça a sexta, das 20h às 22h





A leitura de um poema, mesmo quando efetuada em voz baixa ou interior, não se compara às demais experiências de leitura. Ela deve ser progressiva e regressiva, levando em conta todos os elementos semânticos e sintáticos, formais e materiais, descritivos e alusivos de que o poema é composto.Do contrário, o poema não é fruído como obra de arte: não é fruído como deve sê-lo.

O curso “Como ler um poema” pretende, através de abordagens exemplares de alguns dos maiores poemas da literatura universal e brasileira, indicar como se deve ler um poema para fruí-lo enquanto obra de arte.

Para todos os interessados em literatura


Inscrições abertas
pelo site, telefone ou no local
seg. a sex. das 9h às 22h. sáb. das 10h às 17h
t. (11) 3081-6986

www.obarco.com.br

Centro Cultural b_arco - Rua Dr. Virgilio de Carvalho Pinto, 426
Pinheiros - São Paulo - SP
contato@obarco.com.br

31.5.09

O desejo do contemporâneo

O seguinte artigo foi publicado na minha coluna da "Ilustrada", da Folha de São Paulo, sábado, 30 de maio:


O desejo do contemporâneo


O FILÓSOFO Gilles Deleuze diz que "uma boa maneira de ler, hoje em dia, seria tratar um livro assim como se escuta um disco, assim como se vê um filme ou um programa de televisão, assim como se acolhe uma canção: qualquer tratamento do livro que exija para ele um respeito, uma atenção especial, corresponde a outra época e condena definitivamente o livro".

Por mim, cada qual que leia o que quiser da maneira que lhe aprouver. Contudo, quando leio, por exemplo, as bobagens ou trivialidades que são cotidianamente escritas sobre Nietzsche por alguns dos seus fãs, tenho a impressão de que hoje praticamente todo o mundo já adotou a maneira de ler recomendada pelo autor de "Diferença e Repetição". E então tendo a achar que Heidegger é que estava certo, quando recomendava aos seus alunos que adiassem a leitura de Nietzsche para depois que estudassem Aristóteles durante uns dez ou 15 anos.

Deleuze jamais concordaria com isso, pois considerava repressiva a história da filosofia. Segundo ele, as pessoas não se sentem no direito de pensar antes de terem lido Platão, Descartes, Kant e Heidegger. Talvez. Mas eu diria antes que quem não quer pensar sempre acha uma desculpa para tal. Se, na França, é a história da filosofia, no Brasil é a filosofia contemporânea que tem esse papel. Tradicionalmente o brasileiro, tendendo a considerar-se atrasado em relação ao que se discute no Primeiro Mundo, não se dá o direito a pensar antes de estar a par do "dernier cri" europeu ou norte-americano. Ora, mal se conhece o "dernier cri" e ele já deixou de o ser, de modo que, correndo-se atrás do próximo, deixa-se para pensar por conta própria mais tarde.

Além disso, quem só deseja estar "up to date" acaba por jamais ler os clássicos. A leitura dos contemporâneos toma-lhe todo o tempo. Tal pessoa espera que os autores da moda lhe indiquem quais dos autores do passado ainda devem ser respeitados (por exemplo, Spinoza e Nietzsche) e quais devem ser desprezados (por exemplo, Descartes e Hegel). E, no mais das vezes, como aquilo que os contemporâneos escrevem sobre os autores que recomendam é considerado justamente o supra-sumo destes, torna-se supérflua a leitura dos originais.

Pensemos no significado desse desejo de ser contemporâneo. "Contemporâneo" quer dizer "do mesmo tempo" ou "do mesmo tempo que". Quando dizemos, por exemplo, "Mário e Oswald foram contemporâneos", queremos dizer: "Mário e Oswald foram do mesmo tempo"; e quando dizemos "Leonardo foi contemporâneo de Michelangelo", queremos dizer: "Leonardo foi do mesmo tempo que Michelangelo".

Quando, por outro lado, digo que uma coisa ou pessoa é contemporânea, sem explicitar de quê ou de quem, fica sempre implícito que essa coisa ou pessoa é contemporânea de mim, que estou a dizê-lo. Se digo, por exemplo, "Giorgio Agamben é um filósofo contemporâneo", quero dizer que ele é meu contemporâneo: o que poderia ser dito pelas palavras "Giorgio Agamben é um filósofo do mesmo tempo que eu". Ou seja, o que quer que seja contemporâneo, sem mais, é contemporâneo de mim (seja quem eu for). É claro que, como a contemporaneidade consiste em uma relação comutativa, não posso deixar de, reflexivamente, me reconhecer contemporâneo das coisas ou pessoas que me são contemporâneas.

Isso significa que não tem sentido que eu – seja quem eu for – me diga contemporâneo, sem mais. "Eu sou contemporâneo" significa apenas: "Eu sou do mesmo tempo que eu". Assim também, não tem sentido desejar ser contemporâneo, sem mais, pois "desejo ser contemporâneo" significa apenas: "Desejo ser do mesmo tempo que eu". Finalmente, não tem sentido desejar ser contemporâneo de alguma coisa ou pessoa contemporânea, uma vez que eu já sou, evidentemente, contemporâneo de quem me é contemporâneo.

Assim, o desejo do contemporâneo não passa de sintoma de um agudo provincianismo temporal. Quando se manifesta no campo da filosofia, talvez o melhor antídoto para ele seja exatamente a leitura cuidadosa dos clássicos.

E, de volta a Deleuze, devo dizer que, no lugar de tratar um livro como normalmente se escuta uma canção, acho mais proveitoso, de vez em quando, escutar algumas canções com o respeito e a atenção especial que o bom leitor jamais deixará de dedicar aos bons livros.

2.12.07

A poesia escrita

O seguinte artigo foi publicado na minha coluna da Folha de São Paulo sábado, 1 de Dezembro de 2007:


A poesia escrita

EM REVISTAS e sítios de literatura, tenho lido textos que se queixam do estado atual da poesia. É verdade que, em todas as épocas, houve quem desprezasse os poemas que não seguissem os modelos tradicionais ou que não se distinguissem pela pátina do tempo. Contudo, as queixas a que me refiro não são exatamente dessa natureza.

O que se lamenta é, antes, que a poesia não pareça mais possuir o prestígio cultural de que já desfrutou um dia. Alega-se, por exemplo, que poema algum é capaz de ter, no mundo contemporâneo, um impacto comparável ao que determinados filmes, discos e concertos de rock têm.

Nem sempre coincidem os diagnósticos propostos, nem, conseqüentemente, as terapias para essa pretensa anemia poética. Alguns pensam que a poesia perdeu sua importância porque -tendo-se esquecido de que era originalmente articulada à fala e ao corpo- deixou-se confinar à escrita. O remédio, neste caso, seria, em última análise, que o poeta se tornasse o performer dos seus próprios poemas.

Outros, reintroduzindo, com nova terminologia, o velho e compreensível ressentimento contra as torres de marfim, julgam que a poesia se tornou irrelevante porque, tendo perdido contato real com as outras artes e, de maneira geral, com a realidade contemporânea, tornou-se incapaz de produzir formas dotadas de atualidade. O remédio, neste caso, seria, em última análise, que o poeta, fazendo questão de se imbuir no seu contexto cultural, refletisse no seu trabalho uma tomada de posição em relação a ele.

No fundo, as duas posições me parecem derivar da dificuldade desses autores de lidar com a exigência extrema e singular que a poesia escrita impõe não somente ao poeta, mas ao leitor.

De fato, na poesia oral primária, como na de Homero, o que o bardo recitava ou cantava era ligado à presença, à voz, à dicção, aos movimentos corporais dele. As palavras, a música e a dança se unificavam na sua figura. Algo do que ele recitava era repetição de coisas que já havia dito, algo era novo, e não havia nem há meio de se saber o que era antigo e o que era novo. Cunhou-se para essa situação a expressão "composition in performance" (composição durante a performance). Isso quer dizer que a produção e o consumo do poema são simultâneos. Hoje, o que lembra um pouco isso é o jazz, por um lado, e o flamenco, por outro.

De fato, a escrita rompe essa unidade oral. Quem lê um poema não precisa sequer saber quem o compôs. A criação é uma coisa e a apreciação, outra, separadas temporal e espacialmente: posso, por exemplo, apreciar um poema escrito em Roma, no século 2, em latim. Não interessam mais a voz, a dicção, o canto, os movimentos do corpo, a dança, a figura do poeta. É, em primeiro lugar, a voz interna do leitor que agora lê o poema.

O que interessa são as palavras e os sintagmas de que o poema se compõe: seus sentidos, sua sonoridade, seu ritmo, suas relações paronomásicas, suas aliterações, suas rimas, seus assíndetos, as relações icônicas que estabelecem... E o poema é lido, relido e comparado e contrastado, em princípio, com todos os poemas que se tornaram canônicos e com todos os poemas que o leitor conhece.

O poema é agora um objeto de arte, como uma pintura. Para apreciá-lo plenamente -como para apreciar plenamente uma pintura-, temos que lhe dedicar o nosso tempo, convocando e deixando que interajam uns com os outros todos os recursos de que dispomos: intelecto, experiência, emoção, sensibilidade, sensualidade, intuição, senso de humor etc.

Quanto melhor o poema, mais dos nossos recursos são por ele atualizados: e essa atualização mesma é a recompensa estética que ele nos oferece. Podemos dizer, portanto, que é o grau de poesia de um objeto, e não o seu grau de contemporaneidade, a verdadeira medida da atualidade que ele nos proporciona.

Para quem desse modo aprecia a poesia escrita, ela não perdeu nem um pingo do seu prestígio cultural nem do seu impacto. É verdade que a leitura de poemas não é popular como grande parte dos filmes, discos e concertos de rock, entre outras coisas. E por que teria de ser? Mesmo a maior parte das pessoas cultas raramente -e talvez nunca- queira fazer o esforço que a leitura de um poema exige. Mas por que seriam obrigadas a tal?

Há, de fato, tantos grandes filmes, discos e concertos de rock... Os poetas escrevem, em primeiro lugar, para aqueles que, como eles, acham incomparável o prazer proporcionado pela leitura de um grande poema.