Noivos Sangrentos
Um filme de TERRENCE
MALICK
Com Martin Sheen, Sissy Spacek, Warren Oates, etc.
EUA / 94 min / COR /
16X9 (1.85:1)
Estreia nos EUA: NY, 15/10/1973
Estreia em PORTUGAL:
Outubro de 1976
Deputy: «You know who that
son of a bitch looks like?
You know, don't you?»
Sheriff: «No»
Deputy: «I'll kiss your ass
if he don't look like James Dean»
Primeiro filme importante de Martin Sheen (32 anos, vindo
de um longo período - 17 anos - de participações televisivas, em mais de 50 (!)
séries e alguns filmes) e de Sissy Spacek (então uma jovenzinha de 23 anos,
ainda com muito pouca experiência, apenas três participações em televisão - um filme e
duas séries - e um primeiro papel digno de relevo no filme "Prime Cut /
Carne de Primeira" (1972), um sub-produto americano sem qualquer
interesse, mas onde tem a oportunidade de contracenar com Gene Hackman, e, sobretudo, com Lee Marvin.
Interessante notar aqui a sua fisionomia, bastante diferente (até mesmo sem sardas,
cuja ocultação teria sido feita propositadamente, sabe-se lá com que intenção)
daquela que apenas um ano depois se daria a conhecer ao mundo cinéfilo como
Holly, a companheira sonhadora do jovem delinquente Kit.
"Badlands" seria de igual modo o primeiro filme de
fundo do realizador, Terrence Malick, na altura também um jovem, de apenas 29
anos, um dos realizadores mais académicos aparecidos no início dos anos 70. Nascido
em Illinois, a 30 de Novembro de 1943, no seio de uma família do petróleo,
estudou filosofia, e foi professor e jornalista, antes de iniciar a sua
carreira no cinema como argumentista. Depois de ter dirigido mais um filme, o
belissimo "Days of Heaven / Dias do Paraíso", em 1978, Malick ficaria,
por opção própria, 20 anos sem filmar, regressando apenas em 1998 com o filme
"The Thin Red Line / Barreira Invisível", um projecto antigo sobre a
II Guerra Mundial. Em 43 anos (1973-2015) realizaria apenas 7 filmes, o que o
torna um dos realizadores americanos menos prolíficos de sempre. Há quem o chame, por isso, o "eremita" do cinema.
"Badlands", como não podia deixar de ser, é
assim um filme jovem e inconformista, que tem em Kit a personificação do
anti-herói americano do final dos anos 50, cujas referências básicas eram o rock 'n' roll
e a mítica figura de James Dean, falecido em 1955 com apenas 24 anos. «In 1959 a lot of people were
killing time, Kit and Holly were killing people», anunciava
a publicidade. De
facto, a principal característica de Kit, à parte alguns traços de
esquizofrenia, é o enorme aborrecimento com que parece encarar tudo à sua
volta, incluindo a relação com Molly, que de excitante tem muito pouco. Depois
de lhe ter morto o pai (Warren Oates), um pouco por acidente, um pouco por
impulso, partem os dois numa viagem sem rumo, semeando um rastro de sangue por onde passam, com
Kit a abater quem se lhes atravessa no caminho e Molly a testemunhar toda essa
violência de um modo passivo e apático. É ela quem vai relatando os acontecimentos da sua relação com Kit, num tom igualmente monocórdico e desprendido: «And what's the man I'll marry gonna look like? What's he doing right this minute? Is he thinking about me now, by some coincidence, even though he doesn't know me? Does it show on his face? For days afterwards I lived in dread. Sometimes I wished I could fall asleep and be taken off to some magical land, and this never happened.»
Inspirado num caso verídico que abalou a América (Charles
Starkweather e Carol Fugate, foram os adolescentes que em 1958 resolveram imitar
Bonnie & Clyde), não era o primeiro filme que abordava o tema dos "amantes
em fuga"; mas a grande novidade foi "Badlands" ter sido filmado
por Malick de um ponto de vista poético, austero na sua beleza visual, como que
em contraponto com a crueldade do argumento (da autoria do próprio Mallick), do
qual ele se distancia sem ceder lugar à interferência de qualquer emoção ou
julgamento moral (deixando claramente esse papel para o público). Provavelmente
terá sido esse contraste, essa dualidade violência-indiferença, que fez com que
o filme se evidenciasse ao longo dos anos, tornando-se um verdadeiro cult-movie.
De qualquer forma, o cinema de Terrence Malick é sempre pródigo
em mostrar-nos a relação directa entre as suas personagens e a natureza. Como
disse um dia o crítico norte-americano Scott Tobias, «o valor principal dos
filmes de Mallick está em simplesmente nos lembrar que as nossas vidas
acontecem dentro de um contexto maior da natureza e do transcendental.»
Deixando de lado os conteúdos e falando apenas da produção dos seus filmes, o modus operandi de Terrence Mallick ajuda a cimentar a opinião de que ele parece "desenhar" o
que é humano. Filma horas intermináveis com os seus actores, sempre aberto a
sugestões e improvisações. Mas depois, quando se senta à mesa de montagem (durante muitos meses a fio) os diálogos são normalmente reduzidos aos estritamente necessários,
sendo substituídos pela narração em off ou, a maior parte das vezes,
simplesmente por imagens, reduzindo drasticamente a participação dos actores,
para grande frustração destes.
Outra característica que se evidencia em "Badlands" é a belissima
banda-sonora, a influenciar claramente a música de um outro filme, "True
Romance / Amor à Queima-Roupa", realizado 20 anos depois por Tony Scott,
com Christian Slater e Patricia Arquette. Nela podemos encontrar a assinatura
de músicos como James Taylor, Gunild Keetman, Carl Orff e Erik Satie, mas o destaque vai
direitinho para dois grandes momentos em que Kit e Molly dançam, primeiro na
floresta, e depois já no deserto, como quaisquer teenagers despreocupados, longe do mundo que os rodeia, ao som,
respectivamente, de "Love Is Strange", de Mickey & Sylvia, e de
"A Blossom Fell", do saudoso Nat 'King' Cole.
"Badlands" teve a sua premiére no Festival
Internacional de Cinema de Nova Iorque, em 13 de Outubro de 1973, logo depois
da exibição de "Mean Streets", de Martin Scorsese. Apesar de ter sido
dos mais aclamados do Festival, o filme não obteve qualquer
sucesso junto ao grande público. E teria sido votado ao esquecimento se
entretanto os críticos e os profissionais do cinema não o tivessem "descoberto",
incluindo-o nas listas dos seus filmes favoritos. Numa votação da revista Sight
And Sound, 846 críticos e 359 directores, colocaram "Badlands" no número
147 dos melhores filmes de toda a história do cinema.
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