EXPLOSÃO
Um Filme de BRIAN DE
PALMA
Com John Travolta, Nancy Allen, John Lithgow, Dennis Franz, Peter
Boyden, etc.
EUA / 107m / COR /
16X9 (2.35:1)
Estreia nos EUA a
24/7/1981
Estreia em PORTUGAL a 30/4/1982 (Lisboa, cinemas
Alfas, Berna e Mundial)
Por
esta altura, Brian De Palma tornava-se mais descarado – provavelmente por estar
já farto das acusações de plágio aos filmes de Hitchcock – e inclui no seu
filme referências mais que óbvias a outros universos fílmicos. Se bem que tenha
referido, numa entrevista, que a inspiração para “Blow Out” lhe apareceu
durante a montagem de “Dressed To Kill” (a sua obra imediatamente anterior), a
verdade é que, para além do mestre do suspense, sempre presente (veja-se por
exemplo a sequência das cabines telefónicas, decalcada de “North By
Northwest”), De Palma não hesita em socorrer-se de filmes conhecidos, como “The
Conversation” (1974), do seu amigo Francis Coppola ou, sobretudo “Blow-Up”
(1966), de Michelangelo Antonioni para escrever e dirigir o seu próprio filme.
É aliás este último clássico do realizador italiano que está sempre presente.
Troque-se a imagem pelo som e as semelhanças são de facto inequívocas.
Mas
será que, no fim de contas, podemos perdoar mais esta acção de “plágio” ao
realizador americano? Sinceramente acho que sim, porque apesar de se ter
apropriado de todas essas ideias alheias, De Palma consegue criar um
interessante thriller, ágil e
desenvolto, de tensão constante, que resiste muito bem a múltiplas visões. E
quando isso acontece, a razão não se prende com a curiosidade do espectador –
que já sabe como aquilo irá acabar – mas sim com o modo como a história nos é
contada. Consequentemente, é a mestria do realizador que vem ao de cima, ao
conseguir despertar-nos interesse para além do enredo propriamente dito,
bastando para tal o rigor da mise-en-scène.
Ou seja, a Brian De Palma interessa fundamentalmente pegar numa situação e
desenvolvê-la, até dela ter extraído todas as potencialidades dramáticas. E é
nesse terreno, estritamente cinematográfico, onde a expressividade da imagem (e
do som) ganha uma força preponderante, que sobressai o melhor do cinema de De
Palma.
Jack
Terry (John Travolta) é um sonoplasta que trabalha num pequeno estúdio,
especializado em filmes de terror de série B. Possui um vasto arquivo de sons
que vai usando aqui e ali para sonorizar certas passagens dos filmes. “Blow
Out” inicia-se no visionamento de uma sequência de um desses filmes (onde
parece ter havido o cuidado de implantar o maior número possível de clichés por frame), em que os técnicos não conseguem encontrar o grito adequado
para colocarem na boca da personagem que vai ser esfaqueada em mais uma “cena
do chuveiro”. As audições sonoras sucedem-se mas cada uma é pior que a
anterior. Impaciente, Jack resolve dar um passeio nocturno para descontrair,
aproveitando para adicionar mais alguns sons à sua colecção.
Nessa
deambulação, de contornos algo voyeuristas, Jack testemunha um acidente em que
uma viatura se despenha da ponte existente sobre o lago onde se encontra.
Atira-se à água, mas só tem tempo de resgatar um dos ocupantes, uma jovem, que
iremos saber tratar-se de Sally (Nancy Allen, na altura mulher de Brian De
Palma), uma espécie de “prostituta de ocasião”, um engodo usado por um
proxeneta, Manny (Dennis Franz) para chantagear figuras públicas. Já no hospital,
Jack fica a saber que a vítima mortal era o candidato a Governador com mais
possibilidades de vir a ser eleito. Evocando uma questão moral, o responsável
pela campanha tenta abafar o caso, convencendo Jack a testemunhar que no carro
sinistrado não se encontrava nenhuma mulher. Com alguma relutância Jack acede
ao solicitado, mas pouco depois vem a descobrir que as coisas não são tão
simples assim e que o acidente foi premeditado, na tentativa concretizada de se
assassinar o candidato.
Perante
a hostilidade que o ameaça (a ele e a Sally, ligados entretanto por uma
cumplicidade de cambiantes amorosas), Jack inicia uma investigação por sua
conta e risco, que o leva a reunir várias fotografias do “acidente”, surgidas
na imprensa, adicionando ao pequeno filme daí extraído o som registado no
gravador. A partir daqui é a fuga para diante, com o assassino (John Lithgow)
na sua peugada, determinado a eliminar qualquer testemunha do crime. Brian De
Palma faz que cada situação despolete outras, num clima crescente de
inquietação, que termina com a morte de Sally e o aproveitamento do seu
derradeiro grito para a dobragem da “cena do chuveiro” do filme de terror do
início. «É um bom grito…, é um bom grito...», vai repetindo Jack ao acompanhar a montagem.
“Blow
Out” é a prova clara de que o chamado “plágio” não deverá ser
antecipadamente censurado. Na verdade, somos todos influenciados pelo passado,
quer o queiramos quer não. O que realmente importa não é o que se copia, mas
como se copia. Há quem o faça bem, há quem o faça mal. Brian De Palma situa-se
sem qualquer dúvida no primeiro caso. Pegou em (boas) ideias constantes em filmes
anteriores e desenvolveu-as, dando-lhe o seu cunho muito pessoal. Não vejo
qualquer problema nisso. Porque, no fim, foi o cinema que ficou a ganhar: “Blow
Out” é um filme muito agradável de se seguir, onde o visual se sobrepõe à lógica
narrativa. De Palma estabeleceu há muito as regras do seu cinema e cumpre-as
mais uma vez.
- John
Travolta sofria de insónias na altura da rodagem do filme, o que de algum modo
o ajudou a protagonizar a personagem de Jack Terry (por coincidência – ou talvez
não – os dois nomes iniciam-se pelas mesmas letras, “J” e “T”)
- Foi
por causa deste filme que Quentin Tarantino (admirador confesso do cinema de
Brian De Palma) ofereceu um dos papéis principais de “Pulp Fiction” (1994) a
John Travolta