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sábado, janeiro 08, 2011

SUNRISE: A SONG OF TWO HUMANS (1927)

AURORA
Um filme de F.W. MURNAU



Com George O'Brien, Janet Gaynor, Margaret Livingston, Bodil Rosing


EUA / 94 min / PB / 4X3 (1.20:1)


Estreia nos EUA a 23/9/1927 (New York)
Estreia em PORTUGAL a 14/2/1929 (Lisboa)


« Por toda a parte onde se levante e ponha o sol, no turbilhão das cidades ou no ar puro de uma quinta, a vida é sempre a mesma, breve na sua amargura, breve na sua doçura, breve nos seus riscos, breve nas suas lágrimas» (F.W. Murnau)

“Sunrise” é o filme mais belo do mundo. Digo-o eu, mas não sou nada original em o dizer. Há 52 anos, esta mesma frase era expressa pelos redactores dos Cahiers du Cinéma, os quais, no número de Natal de 1958, elegiam este filme como o melhor de todos os tempos, distinguindo também o seu criador, Friedrich Wilhelm Murnau - nascido em Bielefeld, Alemanha, a 28 de Dezembro de 1988 com o apelido de Plumpe (terá escolhido o nome que o tornou célebre em memória de uma aventura amorosa vivida na cidade bávara de Murnau) e imigrante nos EUA a partir de 1926 - como o maior cineasta entre os maiores.

Visionário do delírio e dos sonhos, febril na sua letalidade, o cinema de Murnau tem a marca da consubstanciação onde nada é dissociável, tudo se penetra e confunde numa complementaridade única. Uma tal presença abissal, um tão grande inferno latente, mais não vêm que sublinhar esses universos estranhos e inquietantes, metafísicos e sagrados, letais e poéticos. Cineasta da composição com uma incomparável plástica, rica e subtil, minúcia excessiva onde todos os recursos visuais e pictórios são explorados, harmonização de movimentos e luz onde o “leit-motiv” é o factor dramático que tudo combina.

«A arte de Murnau mistura, confunde, cruza os elementos, as imagens, o começo e o final de um destino», alguém disse. Mas o que ainda surpreende em Murnau é a inserção da natureza no drama, a riqueza das diversas simbologias numa atmosfera singular. Rever os seus filmes é percorrer um itinerário de incessantes (re)descobertas, onde o “afinal já se fazia” alterna com o que “só ele é que o fez”, ou o “só ele é que podia ter feito isso”, enfim, a submissão ao génio, pelo qual todos lhe tiram o chapéu. Rever o cinema de Murnau é constatar como na construção dum espaço fílmico era possível ver tanta coisa e tão fascinante, e muitas vezes numa tão grande sobriedade e despojamento, quer ao nível narrativo, cenográfico ou interpretativo.

É verificar também como certas “arritmias” e (pretensas) quebras de acção e da espectacularidade utilizadas com um sentido e significado precisos, que só várias décadas depois se imporiam, já encontravam um vasto campo de experimentação no autor de “Sunrise”. Estamos no reino da audácia, tal como as das forças latentes que no seu cinema procuram a libertação, ou a de alguns dos seus protagonistas que enfrentam (e se consomem) nas maldições, ou naquela outra e eterna luta dos que tentam que o seu amor não seja uma vil tristeza.

Do que se trata, essencialmente, neste “Sunrise”, é da relação e do combate entre o bem e o mal. E os campos definem-se de uma forma em que o fetichismo predomina. De um lado a pureza, com a virginal personagem da mulher - que tanto remete para Lilian Gish -, a paisagem idílica, o casamento. Do outro lado, a mulher diabólica vestida de negro, a perversidade citadina. Entre os (ou nos) dois lados, o homem, que com o seu comportamento ambíguo anula toda a carga maniqueísta que poderia existir.

Ilustração desta luta e deste fetichismo é a sequência do barco, com a mudança na atitude do homem e com a assunção draculiana do seu lado diabólico a ser combatida com o cruzar das mãos da mulher, numa imploração religiosa que evoca a luta de alhos, crucifixos e estacas contra os dráculas em tantos filmes posteriores. O lado externo, visível a olho nu, desta contraposição é o binómio cidade / campo. O campo com toda a sua beleza pura e a cidade com toda a sua dimensão feérica e espectacular, e com os “benefícios” da civilização.

A propósito desta obra-prima absoluta do cinema mudo, recorde-se o que sobre ela escreveu Bénard da Costa: «”Sunrise” segue sendo o apogeu de uma certa concepção de cinema: aquela em que prevalece, acima de tudo, o que um cineasta é capaz de dizer com movimentos de câmara e de corpos, com luzes e sombras, com composição e ritmo dos planos. Para os que consideram o cinema uma arte narrativa, “Sunrise”, sendo embora um filme admirável (tal adjectivo ninguém em seu juízo lho poderá retirar), foi ultrapassado muitas vezes, antes e depois. Para os que olham um filme como arte plástica (o que não é sinónimo de arte visual) é muito difícil deixar de repetir o juízo dos anos 50 e 60: “Sunrise” é o mais belo filme do mundo.»

Texto algum, nem o mais poético, pode conter o encanto transmitido por este filme verdadeiramente mágico. Daí a grande vantagem do cinema sobre a literatura. Murnau atinge com “Sunrise” uma simbiose perfeita entre o expressionismo alemão dos anos 20 e as raízes do cinema clássico americano. E nesse feliz enlace coloca toda a sua mestria no tratamento do espaço fílmico, na organização da cenografia, na profundidade de campo, nas sobreposições de imagens ou na subtileza dos movimentos de câmara. Mas a modernidade de Murnau não se esgota na utilização técnica. O que mais interessa é o seu olhar, impregnado de poesia, que torna o seu cinema tão límpido e tão único.

Dou uma vez mais a palavra escrita a Bénard da Costa: «É na viagem de ida que Ansass tenta matar Indre. E nessa espantosa sequência no lago (mais tarde imitada por tantos, de Sternberg a Stevens) Indre percebe as intenções do marido e foge-lhe apavorada, num eléctrico irreal que a conduz do lago à cidade. Entre travelings – nunca vimos tão belos – Ansass persegue-a para lhe dizer da sua culpa, do seu medo, da sua vergonha. E quando chegam à cidade, aquele homem que queria matar aquela mulher, aquela mulher que sabe que aquele homem a queria matar, esquecem a morte para redescobrir o amor e, como duas crianças, perdidamente se reapaixonam, irmanados na mesma inocência nova. A chuva os baptizará.

Como crianças cansadas e felizes regressam ao barco e ao lago. A tempestade é a última maldição. Indre cai à água e Ansass julga-a morta. O milagre final é o único desfecho possível para este filme de milagres e de renascimentos. “Sunrise” significa exactamente isso. Descobrir uma linha de fuga (o eléctrico) e um espaço mágico (a cidade). Então, tudo pode começar de novo, maravilhosamente de novo.»

CURIOSIDADES:

- Os negativos originais do filme foram destruídos num incêndio, em 1937

- Todas as cenas da cidade foram rodadas num enorme estúdio, construído de propósito para o filme

- A peruca loura que Janet Gaynor usa durante todo o filme decepcionou os seus fans na altura, que estavam habituados a vê-la com o seu longo e natural cabelo escuro.

- Vencedor de 3 Óscares na 1ª edição dos mesmos, em 1929: Melhor Filme ("Unique and Artistic Production"), Cinematografia e Actriz Principal. Foi ainda nomeado para a Melhor Direcção Artística




sábado, novembro 27, 2010

TABU: A STORY OF THE SOUTH SEAS (1931)

TABU






Um filme de F.W. MURNAU




Com Matahi, Anne Chevalier, Hitu




EUA / 84 min / PB / 4X3 (1.20:1)




Estreia nos EUA a 1/8/1931
Estreia em Portugal a 25/1/1932
(Lisboa, cinema Tivoli)


F. W. Murnau foi provavelmente um dos poucos visionários do Cinema. Visionário do delírio e dos sonhos, febril na sua letalidade, nada nos seus filmes é dissociável, tudo se penetra e confunde numa complementaridade única. Cineasta da composição com uma incomparável plástica, rica e subtil, de minúcia excessiva, onde todos os recursos visuais e pictórios são explorados, a sua arte mistura, confunde, cruza os elementos, as imagens, o começo e o final de um destino. Mas o que ainda mais surpreende em Murnau é a inserção da natureza no drama, a riqueza das diversas simbologias numa atmosfera singular. Rever o seu cinema é constatar como na construção de um espaço fílmico era possível ver tanta coisa tão fascinante, e muitas vezes com adornos de uma grande sobriedade e despojamento, quer ao nível narrativo, cenográfico ou interpretativo.
Murnau morreu muito cedo, aos 42 anos, de braço dado com o desaparecimento do cinema mudo, não chegando portanto a colocar toda a sua criatividade ao serviço das novas modas. Uma escassa semana depois da conclusão deste seu último filme, o cineasta alemão radicado nos EUA encontraria a morte num desastre de automóvel, não assistindo já à sua estreia alguns meses depois. Na origem concebido como uma parceria com o documentarista Robert J. Flaherty, “Tabu” revelar-se-ia muito mais “murnau”, até porque o realizador não era homem de partilhar de ânimo leve as suas ideias sobre o cinema. Mesmo assim, o nome de Flaherty ainda figura nos créditos como co-autor do argumento e algumas passagens do filme, sobretudo na primeira parte, evocam uma certa atmosfera documental.
“Tabu” foi rodado inteiramente nos cenários naturais dos mares do sul, para onde Murnau se exilou após os conflitos havidos com os produtores do seu anterior filme, “Our Daily Bread” / “City Girl”. Dividido em duas partes, “Paraíso” e “Paraíso Perdido”, o filme tem por objectivo subjacente mostrar-nos o poder corrupto da chamada civilização sobre uma sociedade ainda imune e onde o hedonismo prevalece como doutrina orientadora dos prazeres da vida. No centro das atenções está a história de amor entre dois jovens ilhéus que têm de fugir para escapar ao castigo máximo imposto pela tradição. Sobre Reri (Anne Chevalier), a rapariga por quem o pescador de pérolas (Matahi) se perde de amores, recaía um tabu de conotação sexual por ter sido a escolhida para substituir uma donzela sagrada, acabada de morrer - tabu esse que é obviamente transgredido pelos dois apaixonados.
A fuga dos amantes para uma outra ilha onde as transações comerciais impõem já o poder do dinheiro está à partida condenada, até porque a ingenuidade de Matahi o levará a ser presa fácil desse novo mundo. Hitu, o ancião zelador pelo cumprimento das tradições ancestrais (mais uma das figuras sinistras da filmografia de Murnau, símbolo da opressão e da morte) acaba por descobrir o paradeiro dos dois jovens e levar consigo a bela Reri que assim se submete ao seu destino na esperança de conseguir salvar a vida do companheiro. Este ainda tenta perseguir a nado o barco que se afasta com a sua amada mas as forças vão-lhe faltando, acabando por se consumar a tragédia. O seu desaparecimento, lento e compassado, nas águas revoltas, é um momento pungente de invulgar beleza, que será para sempre associado à memória deste filme.
“Tabu” poderá estar longe das melhores obras de Murnau mas ainda assim é uma obra invulgar que terá o grande mérito de não ter equivalências na história do cinema e que 80 anos depois ainda conserva muito da sua frescura, dinamismo e inovação. A excelente cinematografia de Floyd Crosby (que por insistência de Murnau substituíu o próprio Flaherty como operador de câmara) foi devidamente recompensada com o respectivo Oscar. Apesar dos cortes feitos na altura da estreia (todas as cenas que mostravam alguma nudez foram elimindas) o filme revelou-se um sucesso junto do público, tendo estado em cartaz mais de 14 semanas numa sala de cinema em Nova Iorque.

POSTERS

sexta-feira, novembro 26, 2010

BIO-FILMO: FRIEDRICH WILHELM MURNAU

Nascido a 28 de Dezembro de 1888, em Bielefeld, Alemanha
Falecido a 11 de Março de 1931, em Santa Barbara, EUA
  

“No momento em que o cinema procurava tornar-se uma arte autónoma, Murnau foi um dos realizadores que recusaram as influências do teatro e dos livros e que criaram novos meios de expressão” (Denis Marion)

"Don't act - think!"

O  apelido de nascença era Plumpe e pertencia a uma remediada família de comerciantes da Vestefália, no seio da qual Friedrich nasceu e passou a sua infância. Desde tenra idade que revela tendência para o teatro e de 1905 a 1910 estuda Filologia, Literatura e História da Arte, em Berlim e Heidelberga. Acabado de completar os 21 anos, ingressa como actor na escola teatral de Max Reinhardt, onde adopta o pseudónimo de Helmuth e depois de Murnau. A I Grande Guerra mobiliza-o no ano de 1914 para a infantaria, passando três anos depois a tenente da aviação; durante os combates aéreos o seu avião é derrubado por oito vezes, mas ele não sofre sequer uma única beliscadura.
"O Castelo Maldito" - 1921
Terminada a guerra, ganha em Berna o primeiro prémio num concurso de direcção cénica. Em 1919, a grande impressão que lhe causa o “Gabinete do Dr. Caligari”, de Robert Wiene, é determinante na sua vocação cinematográfica, fundando pouco depois uma produtora de cinema com um grupo de amigos. Dos primeiros filmes realizados não restam quaisquer cópias, sendo “Nosferatu, o Vampiro” (1922) a sua primeira obra significativa. Tratando-se de uma adaptação livre do romance “Drácula”, de Bram Stoker, o filme mostra já uma influência claramente perceptível do expressionismo alemão; mas o seu carácter pictórico teatral surge compensado pelo sentido excepcional de captação da natureza de que o cineasta faz gala.
"Nosferatu, o Vampiro" - 1922
Nos sete filmes que se seguem até 1926 o denominador comum é a rigorosa precisão com que se apresentam personagens e ambientes, em que o fantástico parece encontrar a sua contrapartida no realismo extremo de temas rurais. Ambas as tendências se equilibram harmoniosamente nas três obras-primas que encerram a sua actividade no cinema alemão: “O Último dos Homens”, crónica realístico-satírica da decadência do porteiro de um grande hotel que, por velhice, perde o seu vistoso uniforme e se vê relegado para zelador dos sanitários; “Tartufo”, meditação sobre o ser e o parecer, através da comédia de Molière; e “Fausto”, que a partir do mito da eterna juventude apresentado na tragédia de Goethe, propõe uma recriação do tema do homem e do seu duplo.
"O Último dos Homens" - 1924
 Toda a maturidade temática que o cinema de Murnau já apresenta nesta fase coincide com uma plenitude de recursos expressivos nunca alcançada no cinema mudo: ângulos de filmagem deliberados, liberdade completa no movimento da câmara, admirável utilização da luz, trucagens de toda a espécie, constituem uma autêntica musica visual, a par de uma capacidade total de recriação do mundo - neste sentido, há que considerá-lo como um dos maiores inventores de formas da história do Cinema.
"Fausto"- 1926
 Apesar do seu fracasso comercial, o prestígio de “Fausto” consegue-lhe um contrato particularmente vantajoso da Fox. Já instalado em Hollywood realiza “Sunrise”, comovente poema de amor que representa o auge da sua arte de visualizar plasticamente os sentimentos das personagens. Apesar do frio acolhimento que o público da época lhe dispensa, esta absoluta obra-prima torna-se com os anos no seu filme mais emblemático, chegando-se a chamá-lo (e eu pessoalmente partilho tal convicção) do filme mais belo de toda a história do Cinema. Depois de “The Four Devils”, um drama circense de poucas pretensões, Murnau filma “Our Daily Bread” em 1929, que será remontado e sonorizado pelo produtor e exibido com o título de “City Girl” – uma versão muito mais curta do que a original muda e que se veio a perder. Ambos os filmes foram estreados comercialmente em 1930.
"Aurora" - 1927
 Em 1930 Murnau compra um iate e vai para o Tahiti, onde decide radicar-se. Aí, em colaboração com o documentarista Robert Flaherty, roda para a Paramount aquele que viria a ser o seu derradeiro filme, “Tabu”. Embora a associação entre os dois realizadores denote a diferença de critérios entre duas personalidades tão antagónicas, o resultado é uma bela e trágica história de amor que sintetiza as duas obsessões constantes de Murnau ao longo de toda a sua obra: a proximidade da morte e a luta do homem e da mulher contra as forças superiores do mal. Por estranha coincidência, poucos dias depois de concluír o filme, Murnau encontra a sua própria morte num acidente de automóvel em Santa Barbara, Califórnia. O corpo regressou à Alemanha, onde foi enterrado em Berlim. Flaherty, Greta Garbo, Emil Jannings e Fritz Lang estiveram presentes no funeral, tendo este último feito o elogio fúnebre. Murnau tinha apenas 42 anos mas deixava para a eternidade meia dúzia de títulos que lhe reservariam um lugar de excepção entre os grandes cineastas da Sétima Arte.
"Tabu" - 1931

FILMOGRAFIA:

1931 – Tabu: A Story of the South Seas / Tabu
1930 – City Girl (Our Daily Bread) / A Rapariga da Cidade
1928 – The Four Devils / Os Quatro Diabos
1927 – Sunrise / Aurora
1926 – Faust / Fausto
1925 – Tartüff / Tartufo
1924 – Der Letzte Mann / O Último dos Homens
1924 – Die Finanzen des Grossherzogs / As Finanças do Grão-Duque
1922 – Phantom / Fantasma
1922 – Nosferatu / Nosferatu, o Vampiro
1922 – Der Brennende Acker / A Terra Ardente
1922 – Marizza, Genannt die Schmugglermadonna
1921 – Schloss Vogelöd / O Castelo Maldito
1921 – Sehnsucht
1921 – Der Gang in die Nacht / Passeio de Noite
1920 – Abend..., Nacht..., Morgen...
1920 – Der Januskopf
1920 – Der Bucklige und die Tänzerin
1920 – Satanas
1919 – Der Knabe in Blau