Uma simples frase do folheto de um partido que parece ser uma "multinacional" (Volt), com uma cabeça de lista bonitinha e bem falante, sem ter tiques de "vendedora de feira", criou uma conversa, que a breves momentos parecia uma discussão. Tudo isto porque adoramos o nosso lado italiano de comunicação, em que falamos com tudo, palavras, mãos, braços, cabeça (mas sem qualquer vestígio de violência ou chatice séria, mesmo que isso possa transparecer para as mesas ao lado, durante o almoço...).
Todos estávamos de acordo que não era preciso irmos tão longe e termos "paixão pelo bom senso", como a Inês, mas que cada vez se notava menos equilíbrio e até inteligência, nas relações humanas, fosse no trabalho, em casa ou no comércio, ninguém qualquer tinha dúvida...
Quando dizíamos uns aos outros, que nunca fomos muito bons da cabeça, mas desde a pandemia, vamos mais facilmente do "oito ao oitenta". Parece que cada vez há menos meio termo, em praticamente tudo. Ergueu-se uma voz discordante.
O Jorge disse que a "pandemia" não tinha nada a ver com isso.
Não concordámos. Foi quando ele trouxe a justiça para a mesa, que era um dos factores essenciais de equilíbrio social, e que desde que se tornou uma "telenovela", com actores alexandrinos e rosinhas com e sem limões (são palavras dele...), nunca mais houve bom senso. E isso tornou-se mais grave quando se prendeu um ex-primeiro-ministro em directo no aeroporto. Ainda faltavam uns anitos para levarmos com a pandemia. E depois trouxe o último caso, não menos polémico nem menos telenovelesco, em que embarcaram 300 pessoas, a maioria inspectores da judiciária, num avião militar, para prenderem meia-dúzia de pessoas, que depois de estarem detidos de forma ilegal durante uns quinze dias, foram libertados sem que lhes fosse atribuída culpa de qualquer crime.
Como o Jorge estava com a corda toda, ainda nos deu mais um exemplo, este ainda mais gritante e verdadeiro, a acção policial. Onde devia existir mais sangue frio e bom senso, opta-se quase sempre, ora pelo deixa andar ou pela violência gratuíta. Ora se fecha os olhos (se foram meia-dúzia os criminosos, não vá sobrar para eles e ultimamente tem sobrado mais vezes...), ou se apanham um ou dois suspeitos, e antes de fazerem perguntas, usam-se logo os cassetetes, as botas e até os punhos nos seus corpos.
Não estávamos à espera de ser tão contrariados (houve mais exemplos). Pensávamos que tudo mudara depois da "pandemia", e afinal as coisas já estavam desequilibradas, vários anos antes...
Claro que as coisas estão pior. E ainda temos a guerra, que estando longe, parece estar perto...
(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)