A conversa estava a ser bastante cultural, quase daquelas antigas, em que parecia que o tempo não escapava e nos dizia que era hora de irmos embora.
Quando chegámos aos "públicos", aliás, à falta dele, na maior parte das actividades culturais, se excluirmos os festivais de música, é que as coisas se tornaram mais complicadas...
O Pedro, por ser alguém mais dado à intelectualidade, começou por dizer que nunca nos preocupámos em criar, e educar, públicos, a ensinar as pessoas a perceberem e a sentirem o porquê das coisas. Coisas essas que nem sempre se explicam com facilidade...
Devia ter alguma razão. Pelo menos alguma.
A Carla disse que era mais profundo que isso. Era sobretudo uma mania portuguesa. Todos tínhamos a mania que cantar, tocar, actuar, pintar, escrever, estavam ao alcance de todos. Havia demasiada mediocridade nas culturas. Deu o exemplo das televisões que apadrinhavam aos fins de semana à tarde, muita desta gente, que cantava e tocava, sem ter o mínimo de qualidade exigível para se apresentarem em público.
Pois, parece que o problema não é apenas das pessoas que não têm jeito. Há também quem alimente o "circo".
O Rui para salientar que era um problema de educação, deu como exemplo o futebol, que tinha o seu público, criado ainda antes de Abril.
Como gosto de "estragar prazeres", disse-lhe que estava enganado. A maior parte dos estádios e campos de futebol, de Norte a Sul, estão quase sempre vazios. E acrescentei: «Quem tem público é o Benfica, o Porto e o Sporting.»
Baralhei um bocado o jogo, mas claro, que começa tudo na educação.
Claro que não descobrimos, qual é a melhor forma de "educar" as pessoas para se tornarem espectadores de teatro ou de outra arte ainda mais difícil...
Todos estávamos de acordo que devia começar na escola. Mas quando e como?
(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas. desta vez com legenda: "A cultura anda nua")