Quando alguém nos diz que «todas as profissões são dignas, desde que os seus profissionais sejam dignos», a nossa primeira tendência é achar que não. O preconceito é tramado. A primeira profissão que nos surge no pensamento é aquela que estupidamente chamam "a mais velha profissão do mundo", a prostituição.
Temos dificuldade em olhar para esta profissão como mais uma, mesmo que seja tão antiga como dizem. Esquecemos que presta um serviço que pode ser tão importante como outro qualquer, que tenha a ver com a "limpeza" do corpo.
Fala-se quase sempre da "humilhação" e da "exploração" da mulher. Mas esse não é o problema da profissão em si, mas sim de todos aqueles que gravitam na sociedade, à espera de uma oportunidade para ganhar dinheiro à custa de alguém e que fazem desta (entre outras...) profissão quase um "lixo" social.
Durante o "Estado Novo" houve três alterações legislativas, na tentativa de "apagar" esta profissão do mapa, em 1949, 1954 e 1963. A partir de 1 de Janeiro de 1963, a prostituição foi mesmo proibida, assim como a assistência médica que era dada a estas profissionais. Esta proibição teve pouco efeitos práticos, apenas a tornou "clandestina", aumentando ainda mais a exploração do corpo da mulher, assim como o risco da transmissão de doenças sexuais aos clientes. Só vinte anos depois é que a prostituição foi legalizada, mas com muitas limitações, e com a hipocrisia do costume...
A frase-título deste texto foi dita por uma mulher que foi prostituta durante vinte anos (praticamente sempre na clandestinidade, de 1964 a 1884...). Teve a sorte de exercer esta profissão como se fosse um emprego, trabalhando durante o dia, quase sempre com clientes certos... Nunca teve nenhum "chulo", apenas uma Senhora que sempre procurou dignificar a profissão. A sua história de vida dava uma crónica com dezenas de páginas... mas apenas acrescento que aos dezassete anos ficou grávida de um dos senhores da casa de família para quem trabalhava. Não só foi expulsa do emprego, como foi abandonada à sua sorte pelos familiares mais próximos.
Foi graças a histórias como a desta mulher, que houve alguém, também "abandonada e com um filho nos braços", que se preocupou com este terrível destino feminino e tentou que tivessem uma vida quase normal.
A "casa de meninas" onde sempre trabalhou ficava no centro da cidade e tinha letreiro e tudo. Era uma alfaiataria, com quatro "modistas" a tempo inteiro (todas com carteira profissional...) e uma ama que tomava conta dos filhos das empregadas. A sala de entrada era exactamente igual a qualquer atelier de alfaiate, com modelos e casacos com provas e três máquinas de costura, que eram usadas pelas funcionárias nas horas mortas da tal profissão, que dizem ser tão velha como a nossa existência...
(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)