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quinta-feira, outubro 17, 2024

As pessoas que dizem graças (e têm graça) com o ar mais sério do mundo...


Eu até aquela tarde, apenas o conhecia de vista, e estava longe de ter a melhor opinião do mundo de alguém, que ainda pertencia à família do "Má Língua" (Este senhor fazia as delicias da malta quando aparecia nas assembleias gerais da Incrível e tentava virar as coisas de "pernas para o ar").

Mudar de opinião foi apenas uma questão de minutos...

E eu nem achei piada a forma como ele se sentou junto a nós, ocupando a cadeira vaga como se já fizesse parte do "mobiliário"...

Deve ter percebido o meu incómodo e foi por isso que me obrigou a baixar "a guarda", ao começar a falar de um amigo comum, sem se esquecer de demonstrar, aqui e ali, que sabia mais coisas de mim que eu dele...

Só não sabia que o melhor estava para vir...

Não estávamos tristes, mas com a chegada deste sujeito, que eu achava estranho (e não é das pessoas mais normais do mundo...), a alegria nunca mais nos desamparou. Quase tudo o que ele dizia tinha piada, ainda por cima ditas com o ar mais sério do mundo.

Ele não se limitava a procurar o lado cómico das coisas, como o bom do Dinis chegou a escrever, usava-o, para proveito de todos nós...

Quando regressava a casa, senti-me feliz por ter mudado de opinião sobre uma daquelas pessoas, que pensava ser mais "cinzenta que azul", sobretudo pelo que ouvia dizer por aí.

Ainda bem que o que o que os outros dizem, nem sempre corresponde à nossa verdade...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, setembro 30, 2024

«Qual é o problema de dizerem o nome, publicamente, de quem fez isto ou aquilo?»


Sei que a companhia dos "amargurados da vida", que passam o tempo a "lamber feridas", está longe de ser a melhor do mundo. Mas quando existe amizade e um passado comum, não faz qualquer sentido fingir que não podemos beber um café, por causa disto ou daquilo, de longe a longe.

Além disso, a sua lucidez continua a ser invejável. O  Jorge consegue ver sempre mais longe que eu, porque continua a percorrer caminhos dos quais fujo a sete pés. Não é propositado este meu sentido de abstração, capaz de me ajudar a empurrar os dramas para um canto qualquer e a seguir em frente, sem andar "a vida toda" a pensar em coisas pequeninas...

O homem que eu conheci há mais vinte anos no mundo das colectividades, além de ser um trabalhador incansável, tinha uma capacidade de invenção muito própria, capaz de nos poupar muitos cobres, pois como todos os artistas, era capaz de dar uma nova vida a qualquer pedaço de lixo.

Quando chegou a fase dos insultos, trouxe para a mesa meia dúzia de "figurões". Escutava-o em silêncio, com vontade de lhe dizer que ele estava a exagerar. Mas o problema é que não estava. Falava de todos aqueles que foram ocupando o poder, aqui e ali, que não tinham qualquer pudor em colher os louros do trabalho dos outros, por viverem "cheios deles mesmos". Sorri quando ele disse, que são sempre os outros a "enfrentar os cornos do touro", e que eles ficam sentadinhos, à espera do fim da "tourada".. 

Não estranhei quando ele me perguntou: «Qual é o problema de dizerem o nome, publicamente, de quem fez isto ou aquilo?» 

Ambos sabíamos a resposta. 

Este é o tempo deles...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, abril 27, 2024

Também é um problema da democracia...


Tal como sempre se falou da "crise no teatro", também é histórica a "crise no associativismo".

Infelizmente são crises reais, por motivos diferentes. E de alguma forma estão ambas ligadas à democracia, mais pelo que não se fez do que pelo que se fez...

A preocupação de se criarem públicos para as actividades culturais ficou-se pelo caminho, algures entre as escolas e as instituições que tutelavam a Educação e a Cultura.

É difícil gostar do que não se conhece (a não ser que sejam espectáculos cuja comunicação seja mais directa com as pessoas, como acontece com as comédias...), do que não se sabe que também serve para pensar e nos ajudar a viver...

Em relação à "crise do associativismo", ela é sobretudo humana. Se antes de Abril era fácil encontrar, pessoas com "vontade de servir", hoje aparecem pessoas é com "vontade de se servirem"... Isso explica a crise do associativismo (a excepção são as grandes instituições, onde aparecem sempre várias listas de dirigentes, porque os interesses que se escondem por detrás, económicos, políticos ou desportivos, são mais que muitos...).

Pelos dados conhecidos, hoje vai acontecer "Abril" no Porto, com o fim do reinado de 42 anos de Pinto da Costa (que nos últimos anos se escuda nos muitos títulos conquistados, mas que se revelam cada vez mais insuficientes...). Este é o nosso exemplo maior do que o poder faz as pessoas, não as deixando sair na hora certa, desbaratando, tantas vezes, tudo o que se fez de positivo. 

Em Almada existem pelo menos meia-dúzia de colectividades que são presididas pela mesma pessoa há mais de vinte anos, fazendo com que estas caiam no marasmo, quase por razões naturais. Isso acontece porque a motivação deixa de ser a mesma, ao mesmo tempo que se vai ficando cada vez mais colado "à cadeira do poder" (sei do que falo porque presidi uma colectividade durante oito anos, mas por sentir na pele os "malefícios do poder", consegui sair pelo próprio pé...). É esta colagem que faz com que não se criem condições para que exista, pelo menos, uma alternativa de mudança, para que tudo se torne mais respirável e para que exista espaço para a diferença...

Infelizmente as pessoas fingem não perceber o que se passa à sua volta. E pior ainda, fingem não ver os vários maus exemplos alheios, que poderiam muito bem servir de "espelho"...

(Fotografia de Luís Eme - Cacilhas)


quarta-feira, fevereiro 14, 2024

«Lembras-te do "Laranjadas"? O que será feito dele?»


O mundo mudou um pouco por todo o lado.

O Vitor estava na oficina a arranjar um vitrine, quando passou por lá o Dinis, mesmo a tempo de nos interromper a conversa, com as banalidades do costume.

Por saber que muitas das nossas conversas começavam e acabavam na Incrível, começou a falar de quase toda a gente que andava por ali, pelo salão, à procura de qualquer coisa para matar o tempo, enquanto ajudavam a manter de "cara lavada" que era a sua "segunda casa".

De repente soltou quase um grito, para o Vitor: «Lembras-te do "Laranjadas"? - fez uma pausa, para voltar a perguntar - O que será feito dele?»

O Vitor sorriu, lembrava-se muito bem dele, era quase a sua sombra. E era mesmo...

O rapaz que devia ser ligeiramente mais velho que eu, tinha um problema qualquer cognitivo, daqueles que costumamos associar a "fios mal ligados, na caixa dos fusíveis". Mas andava sempre por ali e gostava de ajudar. O único prémio que queria, era um copo de sumo de laranja. Foi por isso que ficou o "Laranjadas".

Ele tinha ido viver para o Alentejo com a mãe, que se reformara e foi à procura das suas raízes... e por lá ficou. Há dez, quinze anos? 

Como o tempo passa...

Gostei de me recordar desta Cidade, que era capaz de tratar os "maluquinhos" como gente quase igual a nós...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, dezembro 30, 2023

Há coisas que fazemos, que não têm volta, são levadas, irremediavelmente, para o "mar"...


Recebi um telefonema há minutos, com os desejos de bom ano e com queixas da minha ausência, ao ponto de dizer que agora tudo é diferente para pior.

Não sou grande dançarino, ainda menos ao toque de violino. Fico sempre, parado, a ouvir...

A minha companheira que estava por perto e ouviu parte da conversa, falou de hipocrisia e de cinismo. Eu não consegui ver a questão dessa forma. Provavelmente isso acontece  por continuar a gostar desta amiga, e por perceber que somos todos diferentes e todos iguais. 

Não foi preciso dizer. Ela sabe que não vou voltar.

Sei que nem todos nascemos para fazer o papel de "heróis", em determinados lugares e momentos. Há sempre gente que tem dificuldade em dar o passo, que às vezes é preciso dar em frente, por feitio, por cobardia ou até por conveniência. O mundo é isso. Nós somos isso...

Deve ser por isso que sinto que há algum sentimento de culpa nas palavras que vêm do outro lado, por não ter tomado a posição mais justa e correcta, no momento certo. Mas o que passou passou, e mesmo que tenhamos a capacidade de perdoar, não esquecemos...

A vida é quase como um rio. Há coisas que fazemos, que não têm volta, são levadas, irremediavelmente, para o "mar"...

(Fotografia de Luís Eme - Tejo)


segunda-feira, novembro 27, 2023

A vez do teatro (e do associativismo)...


Já falei mais que uma vez da "tertúlia" (a "Tertúlia do bacalhau com grão") que tínhamos às segundas-feiras no restaurante "Olivença", no centro de Almada. Tertúlia essa que passou a um almoço quase sempre a dois - de longe a longe passa a quatro, quando o Mário e o Marinho aparecem. Mas nem por isso é menos rica em episódios marcantes. Para que isso aconteça, basta que eu dê "corda" ao Chico...

Desta vez o Teatro voltou a ser Rei... 

O Chico não me falou apenas das peças marcantes, do olhar diferente dos encenadores em relação ao palco, desde o "certinho" Malaquias de Lemos ao "desconcertante" Rogério de Carvalho. Falou-me sobretudo da alegria que sentia em representar e do ambiente de grande cumplicidade e camaradagem que sentia, aqui e ali. Embora a Incrível fosse a sua principal casa, adorou representar na Trafaria, onde se vivia e amava o teatro de uma forma especial...

Também voltou a "idolatrar" Fernando Gil, que foi uma das figuras mais marcantes da história da Incrível Almadense, onde foi um "faz tudo". Além de ter sido Presidente da Direcção durante vários mandatos também adorava o teatro e foi um bom actor amador. Reviveu vários episódios hilariantes, vividos em peças dramáticas, como "Duas Causas" ou "Amanhã há Récita" mas também em peças carnavalescas, onde Gil se transvestia, ano após ano, com uma graça única.

E para terminarmos o almoço da melhor maneira, o Chico recordou, mais uma vez, o sentido de comunidade e de pertença que existia  na relação de muitos almadenses com a Incrível. Deu o exemplo das muitas famílias que cresceram por ali (deu um destaque especial aos Tavares, pelo desaparecimento do José Luís...) sem esquecer os muitos casamentos que tiveram a bênção da "Rainha do Associativismo Almadense"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada, com o Chico em grande plano na exposição "50 anos 50 retratos")


quinta-feira, agosto 24, 2023

Não levantar ondas, manter o mar chão...


Estou a fazer um trabalho sobre o papel da Incrível Almadense durante a ditadura salazarista e marcelista e noto que foram feitas muitas actividades entre 1926 e 1974, que colocavam, de alguma forma, em causa o regime, nomeadamente vários colóquios cuja temática enaltecia os valores democráticos.

Um dos truques usados era fazer o anúncio do colóquio sem o nome do orador. Outro era amenizar o título da temática, não colocando algumas das "palavras proibidas" pelo regime. Mesmo assim não sei como é que algumas palestras não foram "canceladas", como por exemplo: "As Virtudes e os Defeitos da Republica" (por Raul Esteves do Santos em 1946); "O Recreio na Vida dos Trabalhadores"  (por Raul Esteves do Santos em 1948); "As Instituições populares e a Emancipação do Povo" (por Gomercindo de Carvalho, em 1964); ou "O Sentido da Vida Social" (por José Correia Pires em 1966). 

As pessoas das Colectividades faziam estas coisas com a maior naturalidade possível, pois sabiam que o mais importante era não levantar ondas, manter o "mar chão"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sexta-feira, agosto 11, 2023

Ainda existem alguns "milagres humanos", aqui e ali (cheios de teimosia...)


Hoje no meu "Casario" tento fazer alguma justiça a três associativistas, que foram do melhor que conheci nesta Almada, tão fecunda em verdadeiros "operários da cultura".

Foi quando me lembrei das parecenças que existem entre o Associativismo e o Circo, na batalha pela sua sobrevivência. Dos homens que são uns "faz-tudo", porque a necessidade assim os obriga, já que o dinheiro por mais bem gerido que seja, nunca chega...

Sim, por exemplo, o Fernando Gil ou o Francisco Gonçalves, além de serem os protagonistas de qualquer peça de teatro da Incrível Almadense, também montavam e carregavam os cenários, vendiam entradas na bilheteira, entre outras coisas que fossem emergentes para que o espectáculo acontecesse.

No circo passa-se a mesma coisa. Durante a montagem das tendas gigantes é fácil descobrirmos o trapezista ao lado do palhaço ou do equilibrista, a levantar do chão, aquela "casa de sonhos". Tal como durante o espectáculo poderemos ver alguém muito parecido com eles, vestido com uma bata (para disfarçar), a ajudar a tirar as coisas da arena circular, para que não se perca muito tempo entre números, ou ainda a levar as pessoas para os respectivos lugares das bancadas antes do começo do "maior espectáculo do mundo".

Infelizmente o futuro não se compadece com estes "amadorismos" e estas duas actividades vivem grandes dificuldades. Muitas vezes só subsistem quase por "milagre".

Milagres humanos, claro (cheios de teimosia...).

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sexta-feira, junho 09, 2023

«Senti que tinha deixado passar o meu tempo. Foi por isso que não voltei.»


Falava-se das pessoas "insubstituíveis", com uma delas à mesa, que foi a primeira desmistificar a questão.

«Ninguém é insubstituível. Há sim, pessoas que são melhores que outras, que cumprem com mais qualidade e competência as suas funções que outras. E como hoje impera a mediocridade, ainda é mais fácil a quem está acima da tal média, muito baixinha, dar nas vistas.»

Dissemos-lhe que o seu afastamento fora uma estupidez, que ainda fazia falta (e fazia...). Lembrei-o do nosso amigo comum, o Fernando, que depois dos oitenta ainda continuara a ser de grande utilidade. Aceitou o argumento, mas disse logo de seguida que nunca teve feitio para ser "senador", era um prático, um homem do terreno. Quase que nos silenciou quando disse:

«As pessoas que se julgam intemporais estão erradas. Tudo e todos têm o seu tempo. Posso ter saído antes do tempo, mas depois senti que tinha passado o meu tempo. Foi por isso que não voltei.»

Ninguém foi capaz de lhe responder o que quer que fosse.

Foi por isso que ele resolveu dar exemplos e somou ao nosso Fernando o Mário Soares, que fez uma série de disparates nos últimos anos da sua vida, por se continuar a achar único.

Continuámos sem argumentário e foi ele que continuou a dar-nos "lições de vida"...

«Claro que podemos ser sempre uteis. Não deverá haver melhores conselheiros que quem viveu mais tempo e que viveu mais coisas. Só que isso não é o que pensa a maior parte das pessoas. Outro problema é quando continuamos a fazer sombra a alguém, mesmo que ela seja imaginária. Em vez de nos pedirem conselhos tentam a todo o custo que continuemos sossegados no nosso sofá a ver televisão.»

Continuámos quase sem palavras perante tanta lucidez.

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


sábado, maio 20, 2023

Passar a Tarde "Pelos Caminhos da Poesia"...


Já contei no "Casario", que hoje passei uma tarde diferente, na rua Capitão Leitão, junto à Incrível Almadense.

Aceitei o desafio de apresentar o livro, "Pelos Caminhos da Poesia", da autoria de Manuel da Várzea (o outro lado do médico Rui Melancia...), que foi antecedido de uma sessão de "Poesia Vadia", que tentou dar um ar diferente, mais poético e cultural no começo da rua Capitão Leitão, em frente ao "Cine-Incrível", que agora é, felizmente, pedonal.

Embora já não estivesse habituado a estes desafios poéticos (devido à pandemia e ao meu afastamento voluntário do associativismo), foi bom voltar.

Além de ter estado com pessoas que já não via há algum tempo e com quem conversei, também foi bom  estar ali, junto à Incrível, a falar de poesia, de um livro e de um poeta.

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


sábado, fevereiro 04, 2023

Tem Tudo para Dar Errado...


Li a notícia no site do "Record" e pensei logo que tinha tudo para dar errado...

Estou a falar da decisão tomada na assembleia geral do Clube Desportivo Cova da Piedade (aliás, tomada pelo presidente da Mesa da Assembleia Geral do Clube, através do seu voto de qualidade, após um empate entre 33 sins e de 33 nãos...), de acolher o clube "sem abrigo", cujo nome passou a designar-se por apenas uma letra a B, após ter sido "corrido" do Clube de Futebol "Os Belenenses", que apesar de ser um clube de primeira, não teve qualquer problema em voltar aos distritais.

Felizmente foi subindo todos os anos de divisão e hoje já está na Liga 3, que parece um campeonato de históricos, principalmente na sua zona, onde tem como adversários o Vitória de Setúbal, a Académica, o Caldas, o Alverca, o União de Leiria e o Amora, que já estiveram na Primeira Divisão.

Voltando ao Cova da Piedade, depois de ter tido uma SAD com capital chinês de triste memória, que depois de deixar um rasto de dívidas, decretou falência, volta a "navegar" no erro, ao juntar-se a outra sociedade que pelo exemplo que deixou em Belém, também não honra os seus compromissos. 

Percebe-se à légua que a lei sobre as sociedades desportivas devia ser mais transparente e também mais exigente. Contam-se os exemplos de mais de uma dúzia de clubes, que tiveram de mudar de nome para poderem continuar disputar os campeonatos de futebol. E outros, tiveram de fazer como o Belenenses, começar de novo nos distritais... 

Talvez o exemplo mais recente e mediático, seja o do Desportivo das Aves, que até teve a Taça de Portugal, que conquistou no jogo com o Sporting de triste memória (depois da invasão de Alcochete...), em leilão...

E é por tudo isto que digo, que esta união, tem tudo para dar errado.

E ainda há um aspecto não menos interessante: onde irá jogar esta SAD? Será que vai voltar ao Estádio Municipal da Cova da Piedade, apesar do rasto de incumprimentos que deixou atrás de si?

(Fotografia de Luís Eme - Cova da Piedade)


segunda-feira, janeiro 23, 2023

A Nossa Organização quase "Tribal"...


Embora hoje se fale muito de inclusão, normalmente quando se abordam questões sobre as minorias, a forma como nos continuamos a integrar, socialmente, contraria a tese de "incluir".

Critica-se muito as escolhas políticas, mas desde sempre que as pessoas que são escolhidas para cargos que vão desde presidente de junta de freguesia a primeiro-ministro, quando se trata de convidar os seus pares, dão preferência à confiança política e à relação pessoal existente, a competência profissional passa para terceiro ou quarto lugar. 

As únicas pessoas que são capazes de escolher aqueles que irão trabalhar debaixo da sua alçada, pela competência profissional, são os independentes e solitários. Gente que não tem actividade partidária nem muitos amigos. Ou seja, gente que se existe, não tem qualquer hipótese de chegar a qualquer poder...

É por isso que não devemos ter grandes ilusões (e não temos...) em relação aos políticos. O normal é rodearmo-nos de amigos e de pessoas da nossa confiança, desde o clube de chinquilho à sociedade filarmónica. O associativismo sempre viveu desta organização quase tribal. 

Tudo isto para dizer que os problemas que nos saltam diariamente para os olhos, não se devem unicamente a esta forma de organização. A verdadeira questão está ligada à forma como estes "compadres" exercem o poder. E lá vem a ética e a estética, que são hoje apenas "figuras de retórica" e tanta falta fazem às nossas organizações...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


quinta-feira, janeiro 19, 2023

"Há pessoas que pensam o que são, mas não são aquilo que pensam"


O meu amigo Orlando Laranjeiro, deixou um texto inédito, que intitulou "Testamento", com reflexões sobre a sua vida, agradecimentos e também alguns desejos finais.

Muitas das reflexões que nos deixa, são extremamente pertinentes e actuais. Basta olharmos para o panorama político e associativo que nos cerca, para nos revermos nas palavras do Orlando, que transcrevo, com a devida vénia:

«O meu Avô ensinou-me uma frase que normalmente uso, escrevo, e por vezes até exemplifico, com algumas personagens que conheço. A frase como muitos dos meus Amigos, e outros que eventualmente me tivessem lido, conhecem, é a seguinte: “Há pessoas que pensam o que são, mas não são aquilo que pensam”. O facto de estas ditas pessoas terem um pensamento errado de si próprias, leva-as por vezes, um pouco levianamente, a mentirem, a tomarem determinadas atitudes, e a assumirem posições, cargos, e respectivos reconhecimentos, que as tornam no mínimo, quanto a mim, simplesmente ridículas. Mas, curiosamente, não sei bem porquê, é um enigma que não consigo ou, simplesmente, não me interessa decifrar, lá vão vivendo, e muitas vezes ou quase sempre, levando a água ao seu moinho.»

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, junho 27, 2022

«Como nós bebíamos as palavras do professor Vieira de Almeida»


Um dos trabalhos de pesquisa que estou a fazer é sobre as histórias que fazem parte da história da principal colectividade de Almada. Nesta fase inicial é um trabalho muito gratificante, porque se limita a conversas com vários amigos, que me vão contando as histórias que acham mais interessantes e importantes sobre a Incrível Almadense.

Hoje o meu amigo Francisco recordou alguns dos vultos que eram convidados para abrilhantar as Assembleias Gerais (que eram um acontecimento na então Vila, ao ponto de encher primeiro o Cine-Teatro e depois, já nos anos cinquenta, o Salão de Festas) e também algumas conferências que faziam parte do programa do aniversário, que na actualidade ainda continua a encher o mês de Outubro de Cultura em Almada.

Além do professor Simões Raposo Júnior, um senhor com umas barbas enormes que era um prazer ouvir, por ser um democrata e não ter medo de usar as palavras, todas, nem de "cavalgar" em cima do Estado Novo, para gáudio da assistência. Recordou também a visita do professor universitário, Francisco Vieira de Almeida, enaltecendo o  prazer inesquecível que era estar ali a ouvir durante mais de duas horas aquele distinto filósofo, historiador e político, que além de ser um dos grandes intelectuais portugueses da época, era também um comunicador extraordinário.

O Francisco disse mesmo: «Como nós bebíamos as palavras do professor Vieira de Almeida.» Acrescentando depois, que já ninguém tem paciência para ouvir alguém durante quinze minutos, quanto mais duas ou três horas...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


segunda-feira, junho 13, 2022

As Marchas, os Bairros e as Colectividades Lisboetas


Provavelmente o meu filho foi excessivamente sincero quando disse, ontem ao jantar, que não conseguia encontrar qualquer encanto nas marchas populares. Não suportava a falta de originalidade, que começava na música, praticamente igual há cinquenta anos, e sem grandes variações, de marcha para marcha.

A única coisa que tem mudado são os cenários e a coreografia. De ano para ano as roupas e os arcos das marchantes vão mudando de cor e de temática, assim como a forma como se apresentam.

Embora saiba que o meu filho tem razão, também sei que há coisas tão ou mais importantes, que o espectáculo na Avenida...

Sim, as marchas são hoje um dos principais incentivos para a sobrevivência de muitas das colectividades, que representam nestes dias festivos os bairros lisboetas. Estas participações, além de trazerem os jovens para o seu seio, animam os seus arraiais, que acabam por ser a principal fonte de receitas para as suas actividades do ano inteiro.

Normalmente nestes dia falo dos dois aniversariantes, os dois Fernandos e os dois Antónios, que continuam a ser tão importantes para Lisboa. Mas hoje apeteceu-me falar do Associativismo Popular Lisboeta...

(Fotografia de Luís Eme - Lisboa)


terça-feira, abril 05, 2022

«Vá lá, escreve qualquer coisa e manda...»


Ando há quase três meses a organizar a papelada que me enche a garagem. Tenho deitado bastantes papeis fora (muito menos do que devia...) e também vou ter de me desfazer de livros. O problema é seleccionar os que não me interessam mesmo...

No meio destes papeis tenho descoberto muitas colaborações avulsas em boletins, poezines e afins, algumas das quais já nem sequer me lembrava... Mesmo sem me envergonhar das coisas que escrevo, sei que podia ter "evitado" a publicação de alguns textos e poemas, mas o apelo insistente de alguns amigos era mais forte: «Vá lá, escreve qualquer coisa e manda...» e fazia com que se fosse à procura do que se escreveu "ontem" e se enviasse em anexo, sem pensar muito na qualidade (como eram colaborações "pro bono" e sem grande "futuro", enviei duas ou três coisas que podia ter ficado esquecidas na gaveta...) e na posteridade.

Claro que não vem mal nenhum ao mundo por isso (é apenas um pequeno desabafo...), até por serem publicações de tiragens reduzidas, cuja existência já caiu no esquecimento... Mas alguns continuam a ter o seu quê de especial, como o "Sabor das Palavras" (título "inventado" pela Nia... que até foi premiada como o meu primeiro e único romance...), quando pegamos neles... 

O "Sabor das Palavras" era o fanzine do "Café com Letras", dirigido pela Ermelinda. Café de tão boa memória e curta existência, em Cacilhas, no começo do milénio...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


segunda-feira, setembro 13, 2021

"Há pessoas que mesmo sem terem nada de importante para dizer, andam a vida toda a dizer coisas"


A pandemia parou quase tudo aquilo que continua a ser "acessório" à sociedade, ou seja, quase tudo o que tem pouco peso na economia do país.

A cultura e os seus agentes talvez tenham sido as maiores vítimas deste tempo estranho, que ainda tornou mais difícil, aquilo que já era difícil. Não sei quem se segue na lista. Talvez seja o desporto amador e de lazer (o futebol profissional deixou de ter público mas esteve parado muito pouco tempo, por ser uma "indústria de milhões"...), com o encerramento prolongado de pavilhões, piscinas, ginásios, sedes de clubes desportivos e muitas outras instalações ao ar livre.

Antes da pandemia tinha feito uma pausa voluntária na minha participação associativa e cultural. Isso fez com que não sentisse tanto na "pele" o fecho das bibliotecas, teatros, auditórios, galerias, sedes de associações, etc. Provavelmente é por isso que só esta semana é que vou participar em dois eventos culturais (lançamentos de livros...).

Pensei nestas coisas porque um dos meus amigos, que é uma mistura de "António Aleixo" e de "Alberto Caeiro", cuja quarta classe somada aos muitos anos de café e de associativismo, vale mais que alguns cursos universitários, fez-me uma pergunta curiosa.

Ele perguntou-me há dias, qual seria a vidinha, neste último ano e meio, de algumas pessoas que nós conhecemos que passavam o tempo a correr atrás de um microfone. Eu disse-lhe que se deviam socorrer dos espelhos de casa, para não perderem o "palco". Havia também a possibilidade de terem descoberto o "youtube"...

Muito tempo antes ele tinha caracterizado esta gente de uma forma exemplar, depois de saber que eu enquanto moderador de uma sessão literária tinha somado mais um inimigo, ao recusar dar-lhe o microfone (havia pessoas convidadas para falar e não estava prevista a participação do público, por falta de tempo... e abrir uma excepção era o mesmo que abrir a famosa  "caixa de pandora"). 

Ele disse-me: "Há pessoas que mesmo sem terem nada de importante para dizer, andam a vida toda a dizer coisas." 

A simplicidade da frase tocou-me bastante e faz-me sempre pensar duas vezes quando sou convidado para falar sobre isto ou aquilo em qualquer lugar público...

(Fotografia de Luís Eme - Ginjal)


quinta-feira, julho 01, 2021

"Uma Certa Vanguarda"


Acabei de ler a peça de teatro, "Uma Certa Vanguarda", escrita por Alexandre Castanheira, um almadense que já nos deixou e que foi um bom companheiro das culturas e do associativismo.

Gostei particularmente da peça por falar do dia a dia de uma associação recreativa (podia ser a Incrível ou a Academia Almadense...), que começava a abrir as portas às mulheres, que queriam deixar de ser objectos decorativos, queriam participar também na "revolução" social e cultural.

Achei curioso o tom crítico sobre alguns homens-dirigentes, que eram progressistas fora de casa, mas dentro das quatro paredes, continuavam a querer manter as mulheres com os velhos hábitos machistas, "criadas para todo o serviço"...


terça-feira, fevereiro 16, 2021

Os "Copistas" e a Ignorância Atrevida...


Apeteceu-me continuar a escrever sobre o mundo das artes plásticas, para falar de uma realidade, um pouco estranha, com a qual tomei contacto através da minha experiência como associativista cultural.

Durante mais de duas décadas participei na organização de mais de uma centena de exposições artísticas (de pintura, desenho, escultura, fotografia e artesanato...). Contactei com todo o género de artistas, desde vários jovens com talento, à espera de uma oportunidade (que nem sempre surgiu...), às pessoas que depois de se reformarem voltaram aquele que foi um dos seus "amores" na juventude... 

Estas últimas pessoas acabam por ser as mais curiosas, pela forma como olham para a arte e para os artistas. Muitas voltaram a pintar nas universidades de terceira idade. Percebi que nas aulas não se estimulava muito a criatividade, usava-se mais a "cópia" das obras de vários pintores. 

Em algumas exposições alguns destes novos artistas participavam com estas "cópias", sem usarem da tal criatividade, que talvez também vá desaparecendo com o tempo... Perguntava-lhes porque razão não tentavam oferecer um cunho pessoal ao quadro, alterando as cores e acrescentando ou retirando este ou aquele motivo. Olhavam-me com algum espanto e depois diziam que nunca tinham pensado nisso. Mas que era boa ideia. Por vezes acrescentava ainda outro argumento, o direito de autor, que também fingiam desconhecer. 

Dentro da sua "ignorância atrevida", nem sequer tinham noção que o "copiar" pode ser um "caso de polícia"...

(Fotografia de Luís Eme - Almada)


quinta-feira, dezembro 24, 2020

Um Texto Muito pouco Natalício...


Escrevi há poucos minutos no "Casario" sobre a falta de sensibilidade social dos políticos do PS e PSD que governam em Almada. Mas quase tudo o que escrevi poderia ser transposto para o país, que sempre preferiu dar "esmolas" a investir com seriedade nas áreas sociais que o substituem desde sempre.

É por isso que em alturas de crise como a que estamos a viver, o fosso social aumenta sempre. 

Sei que houve melhorias significativas na saúde, na educação e na habitação. São inclusive as áreas onde se nota um maior desenvolvimento desde Abril de 1974. Mas continua a haver muita coisa a fazer...

Foi por isso que me fiquei pela cultura e pelo desporto (o futebol profissional é outra coisa...), cujo desenvolvimento nas últimas décadas se deve mais à chamada "sociedade civil" que ao Estado. Os políticos gostam muito é de tirar fotografias com as nossas grandes vedetas, seja do futebol ou do teatro, o resto vai para o "saco sem fundo de promessas". 

Ninguém olha com respeito para os dirigentes associativos, anónimos, dos bairros pobres e degradados, que passaram as últimas décadas a desviar jovens do mundo do crime e da droga, para o desporto e para a cultura. Preferem fingir que eles não existem.

Olham sim, para quem abre casas para praticar a "caridadezinha", para distribuir um pacote de arroz ou de bolachas, a quem engana a fome e o desespero, por não conseguir ter uma vida digna. Muito gostam os políticos que existam "pobrezinhos"...

Embora não seja simpático de dizer isto,  compreendo cada vez mais o crescimento do populismo do nosso país. As pessoas estão fartas destes políticos (que fingem ser diferentes e são tão iguais...) que passam a vida a distribuir milhões por empresas mal geridas e tostões pelo resto na população. 

(Fotografia de Luís Eme - Cova da Piedade. E sim, viviam pessoas nessa barraca, quando tirei o retrato...)