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sexta-feira, 13 de setembro de 2013

'Sempre li bastante', diz autora de redação incluída no Guia do Enem

A leitura foi o diferencial

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'Sempre li bastante', diz autora de redação incluída no Guia do Enem

Larissa Comazzetto aponta leitura e dedicação como fatores diferenciais.
Texto da gaúcha foi um dos cinco apontados como modelo pelo MEC.

Felipe Truda Do G1 RS

Larissa Comazzetto estudou no Colégio Militar de Santa Maria (Foto: Larissa Comazzetto/Arquivo Pessoal)Larissa estudou no Colégio Militar de Santa Maria
(Foto: Larissa Comazzetto/Arquivo Pessoal)
No dia em que recebeu o trote do curso de Medicina da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), na Região Central do Rio Grande do Sul, a estudante Larissa Reghelin Comazzetto, de 17 anos, descobriu que a redação que fez durante o Enem do ano passado foi apontada como modelo no guia do participante do exame, lançado pelo Ministério da Educação. Empolgada com a novidade, a caloura disse que a paixão pela leitura e a dedicação nos estudos foram os principais fatores que a levaram a ser uma entre cinco estudantes do país a terem os textos usados como exemplo.

“Sempre li bastante, desde pequena. Tive uma professora particular de redação, porque sabia que era muito importante e queria investir nisso. Minhas professoras sempre me disseram que para escrever bem temos de ler muito”, conta a menina em entrevista por telefone ao G1 na quinta-feira (5), após ser pintada no trote.
Orgulhoso, o pai de Larissa, o contador Paulo Comazzetto, de 49 anos, destaca o apego da filha aos livros. “Em termos de educação no país, só se consegue uma boa formação com o incentivo à leitura, e ela gosta muito de ler”, diz. “Quando ela faz aniversário, se você perguntar que presente ela quer, ela vai dizer 'um livro'. É o que ela sempre carrega junto”, acrescentou.

Foi em um livro que Larissa encontrou conforto em um dos momentos mais difíceis que enfrentou: a doença que levou a mãe, a pedagoga Lúcia Maria Reghelin Comazzetto, à morte, há cerca de quatro anos. A obra era Eu Sou o Mensageiro, de Markus Zusak. “Não sei se era o momento que eu estava passando, mas foi muito importante, me ensinou muitas coisas”, lembrou.

O tema proposto para a redação era o "Movimento imigratório para o Brasil no século XXI". De acordo com o comentário no próprio guia do MEC, Larissa demonstrou “domínio da modalidade escrita formal”. Ela cita o crescimento econômico do país como fator que atrai estrangeiros, e sugere que sejam tomadas iniciativas pelo governo para regularizar as situações dos imigrantes. Para isso, de acordo com o manual, ela usa corretamente vários recursos da Língua Portuguesa.

“O treino foi fundamental”, destaca a estudante. “No início do ano passado, quando eu estava começando o terceiro ano, eu escrevia bem, mas tinha dificuldade para montar e fazer as ligações e deixar meu texto coerente. Mas eu fazia cinco ou seis redações por semana, e treinando a gente vai pegando o jeito”, explica.

 Além do pai, Larissa aponta a mãe como uma das maiores incentivadoras da leitura. “Ela era formada em pedagogia, então tinha muito a parte do conhecimento. E como pessoa, não tenho nem como mensurar a participação dela nisso”, conta.

Também surpreendeu Larissa que a redação de Caroline Lopes dos Santos, com quem estudou no Colégio Militar de Santa Maria, também foi apontada entre os cinco exemplos. “Fomos colegas por sete anos na escola, e agora continuamos colegas porque ela também entrou na Medicina da UFSM”, contou.

Reescrita foi diferencial, diz ex-professora

A tenente Claudete Linhares Sachett, de 40 anos, foi professora de redação de Larissa e Caroline no Colégio Militar. Ela conta que ambas eram alunas muito dedicadas, e acredita que o que ajudou muito elas foi o hábito de reescrever os textos após a correção.

“A gente lançava o tema e elas escreviam. Eu fazia a correção, as anotações, o que poderia modificar e entregava. Elas reescreviam adequando com as correções. Esse foi o diferencial”, afirma a professora. Para ela, a “sede de conhecimento” da dupla também foi fundamental para o bom resultado.

Calma é o principal, diz a estudante

Larissa acabou ingressando na UFSM, após ser aprovada no Vestibular. A nota do Enem rendeu uma chamada para estudar medicina na Universidade Federal do Rio Grande (Furg), em Rio Grande, no Sul do estado. “Era chamada oral e eu não estava presente, pois já tinha passado na UFSM”, conta.

Além da dedicação nos estudos e o gosto pela leitura, ela recomenda aos candidatos do Enem 2013 que tenham calma na hora da prova. Ela lembra que, quando fez o exame em 2011, ainda antes de passar para o terceiro ano na escola, teve um desempenho semelhante ao de 2012. Na segunda vez ela sabia mais, mas estava mais nervosa.

“O que vale é ali na hora. Tem de estar calmo, se concentrar, ler e não pensar no tempo”, diz a universitária, que destaca, também, a importância do estudo. “A dedicação desde sempre foi fundamental. Sempre gostei de estudar e me dedicar”, conta.

Além das redações de Larissa e Caroline, de Santa Maria (RS), o Guia do Participante do Enem destaca os textos de Gabriela Araújo Attie, de Uberlândia (MG); Pedro Igor da Silva Farias, de Teresina (PI); e Danilo Marinho Pereira, de Belém (PA).
Reprodução (Foto: Reprodução/G1)
 
Fonte: G1

terça-feira, 3 de agosto de 2010

"O Poder de Transformação da Leitura" - Veja exemplos de redações que receberam nota máxima no Enem 2006

Redação 1
Ler para compreender

Vivemos na era em que para nos inserir no mundo profissional devemos portar de boa formação e informação. Nada melhor para obtê-las do que sendo leitor assíduo, quem pratica a leitura está fazendo o mesmo com a consciência, o raciocínio e a visão crítica.

A leitura tem a capacidade de influenciar nosso modo de agir, pensar e falar. Com a sua prática freqüente, tudo isso é expresso de forma clara e objetiva. Pessoas que não possuem esse hábito ficam presas a gestos e formas rudimentares de comunicação.

Isso tudo é comprovado por meio de pesquisar as quais revelam que, na maioria dos casos, pessoas com ativa participação no mundo das palavras possuem um bom acervo léxico e, por isso, entram mais fácil no mercado de trabalho ocupando cargos de diretoria.

Porém, conter um bom vocabulário não torna-se (sic) o único meio de “vencer na vida”. É preciso ler e compreender para poder opinar, criticar e modificar situações.

Diante de tudo isso, sabe-se que o mundo da leitura pode transformar, enriquecer culturalmente e socialmente o ser humano. Não podemos compreender e sermos compreendidos sem sabermos utilizar a comunicação de forma correta e, portanto, torna-se indispensável a intimidade com a leitura.

Redação 2
Quadro Negro

Se para Monteiro Lobato um país se faz de homens e livros, para os governantes diferente não poderia ser. O papel da leitura na formação de um indivíduo é de notória importância. Basta-nos observar a relevância da escrita até mesmo na marcação histórica do homem, que destaca, por tal motivo, a pré-história.

Em uma esfera mais prática, pode-se perceber que nenhum grande pensador fez-se uma exceção e não deixou seu legado através da escrita, dos seus livros, das anotações. Exemplos não são escassos: de Aristóteles a Nietzsche, de Newton a Ohm, sejam pergaminhos fossilizados ou produções da imprensa de Gutenberg, muito devemos a esses escritos. Desta forma, iniciarmos o nosso processo de transformação adquirindo tamanha produção intelectual que nos é disponibilizada.

A aquisição de idéias pelo ser humano apresenta um grande efeito colateral: a reflexão. A leitura é capaz de nos oferecer o poder de questionar, sendo a mesma freqüente em nossas vidas. Outrossim, é impossível que a nossa visão do mundo ao redor não se modifique com essa capacidade adquirida.

Embora a questão e a dúvida sejam de extrema importância a um ser pensante, precisam ter um curto prazo de validade. A necessidade de resposta nos é intrínseca e gera novas idéias, fechando, assim, um círculo vicioso, o qual nos integra e nunca terminamos de transformar e sermos transformados.

A leitura é a base para o desenvolvimento e a integração na sociedade e na vida, porquanto viver não é apenas respirar. Se Descartes estiver certo, é preciso pensar. Pensando, poderemos mudar o quadro negro do país e construir o Brasil de Monteiro Lobato: quadro negro apenas na sala de aula, repleto de idéias, pensamentos, autores, repleto de transformação e de vida.

Redação 3
Quando o sol da cultura está baixo, até os mais ínfimos seres emitem luz

Marcel Proust, grande escritor e exemplo máximo de uma vida dedicada unicamente à leitura e à literatura, disse em seus escritos “cada leitor, quando lê, é um leitor de si mesmo”. O que Proust evidencia nessa frase deixa em aberto uma série de interpretações que podem ser realizadas a partir do hábito entusiástico e não visto como uma obrigação, pela leitura.

Estar em contato com o universo das palavras e nele encontrar uma atividade prazerosa, ao mesmo tempo que nos leva a absorver todo o conhecimento exterior, também nos conduz a uma busca de tudo que representa algo de nós mesmos nesse conhecimento que chega até nós. Em cada nova leitura, ocorre algo semelhante a uma lapidação de nossos desejos e predileções.

Os livros constituem um tipo de transporte de conhecimento diferente da televisão por exemplo, onde as informações são transmitidas a todo o momento, e para tal, só precisa de nossa permissão para a passagem de suas imagens através de nosso córtex. O nível de saber que podemos extrair de um livro possui o mesmo limite de nossa vontade de fazê-lo. E, ao contrário das informações “prontas” da televisão, temos a total liberdade de interpretação, o que confere o aperfeiçoamento de nosso senso crítico e o melhoramento de como nos posicionamos diante do mundo.

O hábito da leitura não possui caráter elitista e nem está associado ao poder aquisitivo. Em qualquer cidade, por menor que seja, há uma biblioteca, basta que tenhamos interesse em desvendar todo o mistério contido nela. Ao ler, nos tornamos mais cultos, mais seguros de nossas convicções, nos expressamos e escrevemos melhor. Medidas públicas devem ser realizadas para garantir essa acessibilidade e assim, seus respectivos países possam brilhar, iluminados pelo sol da cultura.

Redação 4
Benefícios da leitura

Como a leitura pode transformação nossa realidade? A leitura é extremamente importante, não apenas por ser fundamental em nossa formação intelectual, mas também por permitir a todos um acesso a um mundo de informações, idéias e sonhos. Sim, pois ler é ampliar horizontes e deixar que a imaginação desenhe situações e lugares desconhecidos e isto é um direito de todos.

A leitura permite ao homem se comunicar, aprender e até mesmo desenvolver, trabalhar suas dificuldades. Em reportagem recente, uma grande revista de circulação nacional atribuiu à leitura, a importância de agente fundamental para a transformação social do nosso país. Através do conhecimento da língua, todos tem (sic) acesso à informação e são capazes de emitir uma opinião sobre os acontecimentos. Ter opinião é cidadania e essa parte pode ser a grande transformação social do Brasil.

Os benefícios da leitura são cientificamente comprovados. Pesquisas indicam que crianças que tem (sic) o hábito da leitura incentivado durante toda a vida escolar desenvolvem seu senso crítico e mantém seu rendimento escolar em um nível alto. O analfabetismo, um dos grandes obstáculos da educação no Brasil está sendo combatido com a educação de jovens e adultos, mas a tecnologia está afastando nossas crianças dos livros.

Permitir a uma criança sonhar com uma aventura pela selva ou imaginar uma incrível viagem espacial são algumas das mágicas da leitura. Ler amplia nosso conhecimento, desenvolve a nossa criatividade e nos desperta para um mundo de palavras e com elas construímos o que gostamos, o que queremos e o que sonhamos.

Portanto, garantir a todos o acesso à leitura deve ser uma política de Estado, mas cabe a nós dedicarmos um tempo do nosso dia a um bom livro, incentivar nossos amigos, filhos ou irmãos a se apegarem à leitura e acima de tudo utilizar nosso conhecimento para fazer de nossa cidade, estado ou país, um lugar melhor para se viver.

terça-feira, 23 de março de 2010

Os segredos da leitura e da redação

Concepções de língua e de escrita mudam o modo como se entenderão os conteúdos que não estão explícitos num texto

Ingedore G. Villaça Koch

A VISÃO CLÁSSICA A depender da concepção de língua, muda o modo como lemos. A visão clássica vê o leitor como um ser passivo. O texto seria a representação do pensamento de um sujeito dono de sua vontade e de suas ações. Caberia ao leitor apenas "captar" a maneira como essa vontade foi mentalizada

Para discutir a leitura e a produção textual, partimos do pressuposto de que o texto é lugar de interação entre sujeitos sociais, os quais, dialogicamente, nele se constituem e são constituídos; e que, por meio de ações lingüísticas e sociocognitivas, constroem objetos-de-discurso e propostas de sentido, ao operarem escolhas significativas entre as múltiplas formas de organização textual e as diversas possibilidades de seleção lexical que a língua lhes oferece. A esta concepção subjaz a idéia de que há, em todo texto, uma grande gama de implícitos, os mais variados, só detectáveis pela mobilização do contexto sociocognitivo no interior do qual se movem os atores sociais.

A leitura de um texto exige mais que o simples conhecimento lingüístico compartilhado pelos interlocutores: o leitor é, necessariamente, levado a mobilizar estratégias tanto de ordem lingüística, como cognitivo-discursiva, com o fim de levantar hipóteses, validar ou não as hipóteses formuladas, preencher as lacunas que o texto apresenta, enfim, participar, de forma ativa, da construção do sentido. Desta forma, autor e leitor devem ser vistos como 'estrategistas' na interação pela linguagem.

Há diversas concepções de leituraw que variam, naturalmente, de acordo com a concepção de sujeito, de língua, de texto e de sentido que se adote, e que exigem diferentes estratégias de ensino.

À concepção clássica de língua como representação do pensamento corresponde a de sujeito psicológico, individual, dono de sua vontade e de suas ações, que constrói uma representação mental e deseja que esta seja "captada" pelo interlocutor da maneira como foi mentalizada: o leitor exerceria, assim, um papel totalmente passivo. A leitura, aqui, é entendida como a atividade de captação das idéias do autor, sem que se levem em conta as experiências e os conhecimentos do leitor, a interação autor-texto-leitor com propósitos constituídos socio-cognitivo-interacionalmente. Daí as perguntas que freqüentemente se fazem em sala de aula: Foi isso mesmo que o autor quis dizer? Será que o autor realmente pensou nisso?

Dialogismo da língua

Por sua vez, à concepção de língua como estrutura corresponde à de um sujeito determinado pelo sistema. É a concepção de língua como código, isto é, o texto é visto como simples produto da codificação de um emissor a ser descodificado pelo leitor / ouvinte, bastando a este, para tanto, o conhecimento do código utilizado: a leitura é vista como uma atividade que exige do leitor unicamente a atenção na linearidade do texto, uma vez que "tudo está dito no dito". Se, na concepção anterior, ao leitor cabia o reconhecimento das intenções do autor, nesta concepção, cabe-lhe somente o reconhecimento do sentido das palavras e estruturas que o texto contém. Em ambas, porém, o leitor é caracterizado como passivo, por realizar uma atividade de reconhecimento, de reprodução.

Diferentemente das anteriores, na concepção interacional (dialógica) da língua consideram-se os sujeitos como atores / construtores sociais, sujeitos ativos que - dialogicamente - constroem-se e são construídos no texto, considerado o próprio lugar da interação e da constituição dos sujeitos da linguagem. Desse modo, há lugar, em todo texto, para uma enorme gama de implícitos, dos mais variados tipos, só detectáveis quando se tem, como pano de fundo, o contexto sociocognitivo dos participantes da interação.

Nessa ótica, o sentido do texto é construído na interação texto-sujeitos e não algo que preexista a essa interação. A leitura é, pois, atividade interativa complexa de produção de sentidos, que se realiza com base nos elementos lingüísticos presentes na superfície textual e na sua forma de organização, mas que requer a mobilização de vasto conjunto de saberes no interior do evento comunicativo. Ou seja:

a) a leitura é uma atividade na qual se levam em conta as experiências e os conhecimentos do leitor;

b) a leitura exige do leitor bem mais do que o conhecimento do código lingüístico, uma vez que o texto não é somente o produto da codificação de um emissor a ser decodificado por um receptor passivo.

É esta a concepção sócio-cognitivo-interacional de língua que privilegia os sujeitos e seus conhecimentos em processos de interação. O lugar mesmo de interação é o texto, cujo sentido "não está lá", mas é construído, considerando-se, para tanto, as "sinalizações" ou pistas textuais fornecidas pelo autor e os conhecimentos do leitor que, durante todo o processo de leitura, deve assumir uma atitude "responsiva ativa" (Bakhtin, 1992:290). Em outras palavras, espera-se que o leitor concorde ou não com as idéias do autor, complete-as, adapte-as, etc., uma vez que "toda compreensão é prenhe de resposta e, de uma forma ou de outra, forçosamente, a produz" (Bakhtin, 1992:290).

O LEITOR INTERATIVO A leitura é vista como atividade em que pesam as experiências e os conhecimentos do leitor; e exige dele mais do que o conhecimento do código. Cada leitor lerá o texto a seu modo. O sentido "não está lá", é construído por "sinalizações" textuais fornecidas pelo autor e pelos saberes prévios de quem lê. O texto é lugar de interação e constituição dos sujeitos da linguagem.

Nos Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa (ver quadro abaixo), de 1998, encontra-se reforçado, na atividade de leitura, o papel do leitor enquanto um construtor de sentido, que se utiliza, para tanto, de uma série de estratégias, entre as quais a seleção, antecipação, inferência e verificação.

A antecipação consiste em levantar hipóteses sobre o conteúdo do texto, que, na leitura, vão sendo submetidas à verificação. Para tanto, o leitor seleciona pistas - elementos lingüísticos do texto que autorizem sua leitura - e produz inferências que lhe permitem preencher as lacunas do texto ou desfazer ambigüidades, com base em seu conhecimento de mundo.

Espera-se que o leitor processe, critique, contradiga ou avalie a informação que tem diante de si, que a aceite ou a conteste, procure construir um sentido para o que lê e seja capaz de justificar a leitura feita. Em outras palavras, ele age estrategicamente, o que lhe permite dirigir e auto-regular seu processo de leitura.

É claro que não devemos nos esquecer de que a constante interação entre o texto e o leitor é regulada também pelo propósito com que o texto é lido. De modo geral, podemos dizer que há textos que lemos para nos manter informados (jornais, revistas); outros que lemos para realizar trabalhos acadêmicos (dissertações, teses, livros, periódicos científicos); outros, ainda, cuja leitura é por puro deleite (poemas, contos, romances); os que lemos para consulta (dicionários, catálogos), os que somos "obrigados" a ler de vez em quando (manuais, bulas), os que nos caem em mãos (panfletos) ou que nos são constantemente apresentados (outdoors, cartazes, faixas). São, pois, os objetivos do leitor que nortearão o modo de leitura, em mais tempo ou em menos tempo, com mais atenção ou com menos atenção, com maior engajamento ou com menor engajamento, enfim.

Se, portanto, a leitura é uma atividade baseada na interação autor-texto-leitor, nesse processo faz-se necessário ter em conta a materialidade lingüística do texto, elemento sobre o qual e a partir do qual se constitui a interação; e, por outro lado, é preciso levar em conta o autor e os conhecimentos do leitor, condição para o estabelecimento de interação com maior ou menor intensidade, durabilidade, qualidade. É por essa razão que falamos de um sentido para o texto, não do sentido do texto, e justificamos essa posição, visto que, na atividade de leitura, é preciso ativar, além dos conhecimentos textuais, muitos outros saberes como conhecimento de mundo, lugar social, vivências, relações com o outro, valores da comunidade.

Assim, o sentido que se constrói a partir de um texto pode variar conforme o modo como o texto foi constituído, do que foi explicitamente revelado e implicitamente sugerido; por outro lado, na dependência da ativação, por parte do leitor, de conhecimentos de natureza vária e de sua atitude perante o texto.

Pluralidade

Desse modo, considerar o leitor e seus conhecimentos e que esses saberes são diferentes de um leitor para outro implica aceitar uma pluralidade de leituras e de sentidos em relação a um mesmo texto.

Com isso não preconizamos que o leitor possa ler qualquer coisa com base em um texto, pois o sentido não está só no leitor, nem no texto, mas na interação autor-texto-leitor. Por isso, é de fundamental importância que o leitor considere, na e para a produção de sentido, as "sinalizações" que o texto lhe oferece, além de ativar os conhecimentos que possui.

Nos quadros apresentados ao longo destas páginas é possível verificar que o uso da linguagem, quer em termos de produção, quer de recepção, repousa visceralmente na interação produtor- texto-ouvinte/leitor. Assim, todo o conjunto de fatores aqui discutidos vai ser responsável pela construção de sentidos, tanto em termos de leitura, quanto em termos de produção.

O que afeta a compreensão da leitura

Há fatores relativos ao autor/leitor, por um lado, ou ao texto, por outro, que podem interferir no processo de compreensão da leitura, de modo a dificultá-lo ou facilitá-lo

O leitor modelo

Os fatores relacionados ao autor / leitor referem-se ao conhecimento dos elementos lingüísticos (certas expressões pouco usuais, léxico antigo etc.), esquemas cognitivos, bagagem sociocultural, circunstâncias em que o texto foi produzido.

Isto é, os conhecimentos selecionados pelo autor na e para a constituição do texto "criam" um leitor-modelo: um texto, pela forma como é constituído, pode exigir mais ou menos conhecimento prévio de seus leitores. Isto é, um texto não se destina a todo e a qualquer leitor, mas pressupõe um determinado tipo de leitor e exclui outros.

Em nosso dia-a-dia, deparamo-nos com inúmeros textos veiculados em meios diversos (jornais, revistas, rádio, TV, internet, cinema, teatro) cuja produção é "orientada" para um determinado tipo de leitor (um público específico), o que, aliás, vem evidenciar o princípio interacional constitutivo não apenas do texto, como do próprio uso da língua.

Fatores relativos ao texto

Os fatores da compreensão de leitura ligados ao texto dizem respeito à sua legibilidade. Dentre os aspectos materiais que podem comprometer a legibilidade, costumam-se mencionar o tamanho e a clareza das letras, a cor e a textura do papel, o comprimento das linhas, a fonte empregada, a variedade tipográfica, a constituição de parágrafos excessivamente longos, entre vários outros.

Além dos fatores materiais, há fatores lingüísticos que podem dificultar a compreensão, tais como: a seleção lexical; estruturas sintáticas muito complexas, caracterizadas pela abundância de elementos subordinados; orações supersimplificadas, marcadas pela total ausência de nexos para indicar relações de causa/efeito, espaciais, temporais; ausência de sinais de pontuação etc. Uma bula, por exemplo, é conhecida como um texto de difícil leitura por seus aspectos materiais, língüísticos e de conteúdo, a tal ponto que já existe em andamento uma proposta oficial para resolver esse problema.


O texto "age" depois de criado
Diferenças entre o contexto de produção e de uso também definem a leitura

Depois de escrito, todo texto ganha uma existência independente de seu autor.

Entre a produção do escrito e a sua leitura, pode passar-se muito tempo, de modo que as circunstâncias da escrita (o contexto de produção) podem ser absolutamente diferentes das circunstâncias de sua leitura (o contexto de uso), fato esse que interfere na produção de sentido.

O mesmo acontece quando o texto vem a ser lido num lugar muito distante daquele em que foi escrito ou quando ele foi reescrito de muitas formas, mudando consideravelmente o modo de constituição da escrita, com o objetivo de atingir diferentes tipos de leitor.

Como um leitor participa do texto
O processo de leitura implica a inserção de obra em modelos de pensamento

A leitura é uma atividade que solicita intensa participação do leitor, pois, se o autor apresenta um texto lacunoso ou incompleto, por pressupor a inserção do que foi dito em esquemas cognitivos compartilhados, é preciso que o leitor o complete, produzindo uma série de inferências.

Assim, no processo de leitura, o leitor aplica ao texto um modelo cognitivo (frame ou esquema), baseado em conhecimentos que tem representados na memória social. A hipótese inicial pode, no decorrer da leitura, confirmar-se e se fazer mais precisa; ou pode exigir alterações e, por vezes, até mesmo, a completa reformulação da hipótese inicialmente levantada.

Essa é uma evidência de que o autor pressupõe a participação do leitor na construção do sentido, considerando a (re)orientação que lhe é dada. Nesse processo, ressalta-se que a compreensão não requer que os conhecimentos do texto e os do leitor coincidam, mas que possam interagir dinamicamente (Alliende & Condemarín, 2002: 126-7).

A discussão em sala de aula
Turmas de português podem ser laboratório para os diferentes sentidos atribuídos ao mesmo texto

Sobre a produção do sentido, defendem os Parâmetros Curriculares Nacionais que o trabalho de análise epilingüística em sala de aula é importante por possibilitar a discussão sobre os diferentes sentidos atribuídos aos textos e sobre os elementos discursivos que validam ou não essas atribuições, propiciando, inclusive, a construção de um repertório de recursos lingüísticos a ser utilizado quando da produção textual.

A Lingüística Textual vem trazendo ao professor subsídios indispensáveis para a realização das atividades acima sugeridas, visto que ela tem por objeto o estudo dos recursos lingüísticos e condições discursivas que presidem à construção da textualidade e, em decorrência, à produção textual dos sentidos. Tudo isso vai significar, inclusive, uma revitalização do estudo da gramática: não mais, é claro, como um fim em si mesma, mas com o objetivo de evidenciar de que modo o trabalho de seleção e combinação dos elementos lingüísticos nos textos que lemos ou produzimos, dentro das variadas possibilidades que a gramática da língua nos põe à disposição, constitui um conjunto de decisões que vão servir de orientação na busca pelo sentido.

A importância do contexto
Construção do sentido de um texto só se estabelece com o entendimento da situação de interação em que a mensagem é lida

O recurso ao contexto é indispensável para a produção e compreensão e, deste modo, para a construção do sentido. O contexto engloba não só o co-texto, como a situação de interação imediata, a situação mediata (entorno sociopolítico cultural), o contexto acional e, portanto, o contexto sociocognitivo dos interlocutores. Este último, na verdade, subsume os demais. Ele reúne todos os tipos de conhecimentos arquivados na memória dos actantes sociais, que necessitam ser mobilizados por ocasião do intercâmbio verbal: o conhecimento lingüístico propriamente dito, o conhecimento enciclopédico, o conhecimento da situação comunicativa e de suas "regras" (situacionalidade), o conhecimento superestrutural ou tipológico (gêneros e tipos textuais), o conhecimento estilístico (registros, variedades de língua e sua adequação às situações comunicativas), bem como o conhecimento de outros textos que permeiam nossa cultura (intertextualidade).

Nesta acepção, portanto, o contexto é considerado constitutivo da própria interação pela linguagem. É neste sentido que se pode dizer que certos enunciados são gramaticalmente ambíguos, mas o discurso se encarrega de fornecer condições para uma interpretação unívoca. Admite-se, pois, que:

1. o contexto desambigüiza;
2. o contexto completa, visto que permite preencher as lacunas do texto,
pelo acionamento de inferências-ponte;
3. o contexto modifica, isto é, os fatores contextuais podem alterar o que se diz,
como, por exemplo, no caso da ironia;
4. o contexto justifica, isto é, os fatores contextuais se incluem entre
aqueles que explicam por que se disse isso e não aquilo.

É por isto que o sentido de um texto, qualquer que seja a situação comunicativa, não depende tão-somente da estrutura textual em si mesma (daí a metáfora do texto como um "iceberg").

Como vimos, o produtor do texto pressupõe da parte do leitor/ouvinte conhecimentos textuais, situacionais, culturais e enciclopédicos e, por isso, não explicita as informações consideradas redundantes. Ou seja, visto que não existem textos totalmente explícitos, o produtor de um texto necessita proceder ao "balanceamento" do que necessita ser explicitado textualmente e do que pode permanecer implícito, por ser recuperável via inferenciação. Na verdade, é este o grande segredo do locutor competente. O leitor/ouvinte, por sua vez, espera sempre um texto dotado de sentido e procura, a partir da informação nele encontrada, construir uma representação coerente, por meio da ativação de seu conhecimento de mundo e/ou de deduções que o levam a estabelecer relações de causalidade, temporalidade etc. Para tanto, ele põe em funcionamento todos os componentes e estratégias cognitivas que tem à disposição para dar ao texto uma interpretação adequada.

Critérios de leitura
A interação autor-texto-leitor segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais

"A leitura é um processo no qual o leitor realiza um trabalho ativo de construção do significado do texto, a partir dos seus objetivos, do conhecimento sobre o assunto, sobre o autor, de tudo o que sabe sobre a língua: características do gênero, do portador, do sistema de escrita etc. Não se trata simplesmente de 'extrair informação da escrita' decodificando-a letra por letra, palavra por palavra. Trata-se de uma atividade que implica, necessariamente, compreensão. Qualquer leitor experiente que conseguir analisar sua própria leitura constatará que a decodificação é apenas um dos procedimentos que utiliza quando lê: a leitura fluente envolve uma série de outras estratégias como seleção, antecipação, inferência e verificação, sem as quais não é possível rapidez e proficiência. É o uso de procedimentos desse tipo que permite controlar o que vai sendo lido, tomar decisões diante de dificuldades de compreensão, arriscar-se diante do desconhecido, buscar no texto a comprovação das suposições feitas etc."
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Confira

Ingedore G. Villaça Koch e Vanda M. da Silva Elias. Ler e Compreender: os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2006.
Felipe Alliende e Mabel Condemarín. A leitura: teoria, avaliação e desenvolvimento. Porto Alegre: Artmed, 2005.
Mikhail Bakhtin. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1992[1953]
Brasil. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do Ensino Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1997.