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segunda-feira, 25 de abril de 2011

Por prazer ou por obrigação

Daisy Trombeta

Não adianta torcer o nariz. Desligue a televisão, abaixe o som, abra um livro e se deixe levar pela história ali contada. Se você é daqueles que escova os dentes na frente do computador, não tem problema. A internet oferece boas opções de leitura

Seja por prazer, seja por obrigação, uma coisa é certa: ler é uma necessidade básica de todo vestibulando. Para tornar a tarefa menos dolorosa, o segredo é reservar um tempo, todos os dias, para mergulhar nas histórias. O ideal é desligar os aparelhos eletrônicos e voltar a atenção somente à construção dos textos, sem esquecer de observar a parte gramatical.

A fórmula nem sempre será agradável. O importante é aguçar a criatividade e nunca esquecer de estar atualizado. Além dos livros, é importante dedicar um tempo aos jornais, aos sites e às revistas.

Conforme Adriana Lebkuchen, professora de gramática e produção de textos em Joaçaba, no Meio-Oeste, para manter o gosto pelas histórias é preciso tornar a companhia dos livros um hábito. A imaginação é desenvolvida desde cedo, ainda na infância. Mas quem pulou alguma das etapas, deve ler “mesmo que seja por obrigação”.

Na infância, o encanto começa pelo visual, passa para o concreto e estaciona na imaginação. Quem não teve o incentivo dos pais e dos professores precisa trabalhar mais os estímulos.

Começar lendo títulos do momento pode ser um segredo para criar gosto pela atividade. Quem não desgruda do computador, tem a opção de acessar os arquivos digitais ou os sites de notícias. Tudo vale para incrementar o vocabulário.

Nada disso deve ser feito com desatenção, segundo a professora de gramática. É bom que a leitura seja contextualizada com os dias atuais. Uma das consequências da falta de gosto pelas páginas literárias é a dificuldade de interpretação.

Adriana explica que um livro pode ser comprado somente pelo título atraente. E deve ser observado como um produto de desejo.

– Quem não gosta de ler, deve passear em uma livraria como se fosse ao shopping. Olhar para os livros como olha para um sapato e comprar nem que seja pelo título – diz.

Caso nada disso funcione, o jeito é ler por obrigação. E isso deve começar com antecedência. Para quem vai prestar vestibular, por exemplo, a literatura brasileira terá de virar companheira de rotina pelo menos um ano antes da prova.

Manual de leitura para o vestibulando

Sérgio Murilo Machado, professor de literatura e língua portuguesa do Colégio Catarinense, fez uma espécie de manual de leitura para o vestibulando. Leia atentamente e aproveite. Ainda dá tempo de se preparar.

O QUE LER

Tudo o que puder. Não siga apenas uma linha. Leia romance, contos, reportagens e até gibi.

O QUE PRIORIZAR

Comece lendo as leituras obrigatórias do vestibular, principalmente se não tem o hábito da leitura. Lembre-se: o tempo é curto.

A ESTRATÉGIA PARA LEITURA

Quanto à leitura obrigatória para o vestibular, comece pelos mais fáceis. Quem vai fazer o concurso da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), por exemplo, pode iniciar pelo 13 Cascaes. É um livro de contos, que fala sobre a cultura mané. Da até para ler um conto por dia.

COMO LER

O ideal é ler, marcar as passagens importantes e fazer um fichamento. Então, no fim do ano, é só ler os resumos e os fichamentos.

ALÉM DA LITERATURA

Leia jornais e revistas, pelo menos uma publicação por semana. Os jornais de domingo, por exemplo, fazem um resumo da semana e já falam sobre o que vai acontecer nos próximos dias.

O QUE É IMPORTANTE LER NOS JORNAIS

Prefira os assuntos que te aguçam a curiosidade. Mas não deixe de fora política, economia e atualidades. Os vestibulares cobram cada vez mais atualidades e questões interdisciplinares.

PARA LEMBRAR

A catástrofe no Japão, junto com todas que estão acontecendo. A questão ambiental está muito forte. As mudanças do mundo Árabe e as crises financeiras também tem que serem analisadas.

Matéria publicada em 20/04/2011

segunda-feira, 18 de abril de 2011

A lista de livros da escola

As listas de livros “obrigatórios” da escola são o alvo sempre quando a discussão é incentivar crianças e jovens a ler. Mas o que temos de bom para falar disso?


Esta semana minha sobrinha Letícia, de 7 anos, deu uma parada “superestratégica” em minha biblioteca particular de livros infantis para pegar emprestado o fabuloso A Velhinha Que Dava Nome às Coisas, escrito por Cynthia Rylant e ilustrador por Kathryn Brown, lançado aqui pela editora Brinque-Book. O motivo era ainda melhor: estava na lista feita pela escola para montar a biblioteca de classe do primeiro trimestre. Fiquei muito feliz porque é um livro que amo muito (veja a resenha no Livros Pra Uma Cuca Bacana) e que está inaugurando na vida da Letícia a lista de “leitura obrigatória” da escola, o que me faz pensar em como esta relação precisa ser cuidada. Muito cuidada.

Este foi um dos temas da minha primeira conversa com a ilustradora e escritora Eva Furnari, em 2007. Perguntei a ela sobre o fato de se obrigar uma criança a ler, e se isso seria um estímulo ou desestímulo pelo amor pela leitura. Ela disse: “A gente tem que ter uma ordenação, disciplina, se não ela não realiza nada na vida sem autodisciplina. Não acho ruim ser obrigado a ler quatro livros por ano. Mas tem que ver caso a caso. Vai ter livro que é inadequado à idade, tem que pensar nas formas de avaliação... Sempre depende do livro, do professor, da escola, do aluno.” Ou seja, para Eva, a questão é manter o ritmo da leitura e, claro, tomar cuidado com a forma. Fez-me lembrar um encontro que participei ano passado, promovido pela Editora WMFMartins Fontes, em que o professor de literatura infantil da USP José Nicolau Gregorin Filho disse uma frase bem interessante. Para ele, quando pensamos no papel do professor no incentivo ao prazer pela leitura, temos que pensar que a tarefa é árdua. Pois o amor pela leitura, é o mesmo amor pelo teatro, pelo cinema, pela música... é da característica de cada um. Gosto não se ensina. “Se você incentivar o hábito de ler já está bom demais!”, diz Gregorin Filho.

O que fazer, então? Dar oportunidades. Esta é a principal função de um educador, seja ele pai, mãe, professor, avó, tio. E insistir nelas, claro. Tem que ter treino, tem que ter disciplina. Tem que fazer parte do dia. Agora, o como fazer é que pode ser sempre melhorado. A promessa da escola à Fabiana, mãe da Letícia, é de que o livro – e os outros que outros alunos vão levar durante o ano – será lido junto, por ela, em sala de aula. Ou seja, degustado em grupo. Em casa, você pode sempre fazer o mesmo. A leitura pode ser associada à parte boa do dia e, mais para frente, conforme os livros ficarem mais densos e profundos, a criança pode ir se acostumando a sempre estar disposta a experimentar. E entender que para ter o livro dentro de si precisa de tempo e, para conseguir tempo (principalmente hoje em dia), é necessário esforço. Entendido isso, bom leitor será. E acompanhem o que ele vem lendo na escola: será uma aprendizado para os dois e uma oportunidade de divulgar algo que vocês tenham gostado.

Cristiane Rogerio é editora de Educação e Cultura da Crescer e adora se perder entre os livros.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Ler para quê?

Publicado em 28 de setembro de 2010
Alexandre Amorim

Desde que a pedagogia passou a se preocupar efetivamente com o aluno (e não apenas com o conteúdo da matéria e com a passagem de conhecimento, sem se importar com a qualidade desse conhecimento), existe uma questão incômoda nas salas de aula: o livro a ser escolhido para leitura.

Incômoda pelos dois lados, do professor e do aluno. Entre a tradição inexorável dos sistemas de ensino e a comum negligência do aluno, o professor se esforça para escolher uma literatura ao mesmo tempo interessante e dentro dos modelos educacionais. Porque o modelo a ser seguido deve levar em consideração duas ideias ao mesmo tempo decadentes e resistentes: o vestibular e a importância dada à chamada “literatura clássica”. O professor, ainda que dotado da maior boa vontade, aos poucos nota que os livros indicados pelo sistema educacional não são exatamente os livros que motivariam seus alunos a seguir lendo e se interessando por literatura. Assim, crianças de doze ou treze anos são chamadas a encarar O Mulato ou O Cortiço, respirar uma dura realidade que está longe da vida deles e enfrentar uma linguagem que os espanta quando apresentada também como português. Todo educador sabe que o universo de um aluno está em expansão e que esse universo precisa ser preenchido.

A cultura não pode ser apenas o que o sujeito alcança, mas também o que constitui a ética e a estética da sociedade em que esse sujeito vive. Por isso, os livros de Aluísio Azevedo, José de Alencar, Lima Barreto, Mário de Andrade, Drummond ou de qualquer autor não precisam ser esquecidos ou evitados, nem devem ser impostos sem levar em consideração o preparo intelectual e afetivo de quem os lê.

A notícia de que um livro deve ser lido até uma determinada data e de que nessa data haverá um teste sobre o livro geralmente cai sobre uma turma como uma bomba de aborrecimento e desinteresse. Ouvem-se os protestos de que nunca se ouviu falar de tal autor (mesmo que seja Shakespeare ou Machado de Assis), ouve-se a temida frase “para que ler isso aí? Eu quero fazer engenharia, isso não vai me ajudar em nada” e, por fim, ouve-se o suspiro baixo do professor, quase desistindo de dar aula e pensando em se tornar bolsista em um projeto de dedicação exclusiva no CNPq. As demonstrações de desinteresse são recheadas de ignorância e de falta de visão da formação humanista em que nossa civilização se baseia desde a Grécia Antiga. Mas não podemos deixar de considerar a visão do aluno, ainda que obliterada por preconceitos. O importante é notar que, nessa visão, existe, sim, uma força importante que desloca o interesse e a vontade de ler para o ostracismo: a completa falta de contextualização do livro na vida do aluno.

Existe uma agenda a ser cumprida pelo professor. O aluno precisa ser informado de que existem movimentos literários (mesmo que esses movimentos tenham se provado mais didáticos do que factuais), precisa pelo menos conhecer algumas páginas de nossa história literária. Como essa agenda é formulada e por que determinados livros são escolhidos nas redes públicas é um mistério para a grande maioria dos mortais, professores incluídos. Como não há tempo ou meios de criticar ou ao menos reclamar do processo, o professor chega à turma com a tarefa árdua de vender o peixe que ele nem ao menos pescou. Daí a se criar uma boa expectativa em relação àquele livro e – principalmente – daí a se tentar conscientizar a turma de que aquele livro é o ideal para ser lido naquele momento vai uma distância enorme, quase tão grande quanto a distância entre o simbolismo de Cruz e Sousa e a conta de Twitter do aluno que vai fazer vestibular para medicina.

Temos, então, uma equação interessante: um professor cansado de seguir tarefas premeditadas por pedagogos a que ele não tem acesso, alunos incultos e com pouca vontade de mudar esse status e um tempo tão pequeno em sala de aula que mal daria para estudar um conto da Carochinha. Matematicamente, é uma inequação, já que suas relações não conseguem chegar a uma equivalência. E se, no começo deste parágrafo, eu classifiquei a equação de interessante, posso compreender perfeitamente quem a considere desanimadora. Talvez a única maneira de resolvê-la seja mesmo tentar buscar o prazer que a literatura pode dar.

Acreditando no prazer lúdico que a arte pode nos trazer, vejo a escolha de um livro a ser estudado em uma sala de aula como algo maior do que apenas sua interpretação gramatical e de conteúdo. Um livro pode ser visto como ferramenta de ensino e compreensão da língua, o que só o valoriza ainda mais. Mas, se vamos usar O Cortiço como leitura obrigatória, por que não contextualizar sua história e a moral envolvida nele? Por que não simular em sala o que sempre repetimos aos alunos, que um livro é resultado de uma experiência de vida e que alimenta a vida de quem o lê? A complexa relação de trabalhadores simples, que convivem entre diferenças entre as paredes de uma casa de cômodos, já é o bastante para criar uma minipeça, uma pequena história a ser dramatizada em sala de aula. Uma dramatização que ajuda bastante o adolescente a entender melhor o livro e a compreender por que aquela história pode ser enriquecedora em sua vida, mesmo que ele vá fazer vestibular para, digamos, Administração. Se o aluno se pergunta sobre a razão de ler, o prazer de compreender e vivenciar dramaticamente uma história já o ajuda a perceber que ler é um propósito em si mesmo. As consequências da leitura (cultura, desenvoltura na língua, boa nota no vestibular etc.) são isso mesmo, meras consequências.

Jogos sobre a leitura, ou mesmo histórias criadas a partir do tema do livro a ser analisado, são maneiras de inserir o leitor em potencial no mundo daquela obra. Se um texto é cheio de mesóclises e palavras que não são usadas desde o século XIX, pode-se criar um dicionário das palavras mortas ou uma brincadeira em que todos esses termos seriam subvertidos, reinventados. A obrigação de ler um texto não significa que esse texto deve ser lido de uma forma ou de outra. Literatura é, antes de tudo, o estudo de uma expressão artística, e como tal deve ser vista com a liberdade que a poesia traz em si.

“Leitura obrigatória” é um termo por si só desanimador. Nada obrigatório soa muito bom. Mas deixar que ela se torne apenas isso, uma leitura obrigatória, é relegar a literatura a uma mediocridade a que ela não merece pertencer. Por isso, é preciso um pouco mais do que apenas dar o título do livro e a data da prova para que os alunos se interessem em expandir seu próprio universo. A arte é inerentemente lúdica, não há por que perder essa característica tão sedutora. A próxima vez que um aluno perguntar “ler isso para quê?”, o professor deve responder com uma aula em que o livro seja o centro das atenções. Porque ler é, sim, assunto central de nossas vidas.